Os verdadeiros revolucionários

Ninguém duvida que Apple, Tesla e Google sejam sinônimos de inovação e tecnologia. E que seu sucesso está diretamente ligado a mentes brilhantes como Steve Jobs e Elon Musk, visionários de primeira hora. Mas os investimentos necessários para desenvolver a tecnologia que está presente num iPhone ou num Tesla com certeza espantaria a maior parte dos investidores do mercado, impacientes e ávidos por lucros no espaço de tempo mais curto possível.

Pouca gente sabe que foi o dinheiro do contribuinte americano ao longo de décadas que ajudou estas empresas a serem o sucesso que são e forneceu as bases para o surgimento dos produtos revolucionários de algumas das empresas mais inovadoras do mundo. Essa é a ideia defendida pela economista Mariana Mazzucato no seu livro “O Estado Empreendedor”.

Apesar das críticas, às vezes merecidas, de serem estruturas pesadas e burocráticas, as agências do governo americano financiaram pesquisas que trouxeram para a indústria de consumo a tela touch screen, o display de cristal liquido, o SIRI e ajudaram Steve Jobs a fazer da sua empresa a marca icônica que ela é.

apple

Mas não são apenas as agência de defesa que produzem inovações. A partir de 1983 as empresas de biotecnologia se beneficiaram de um belo empurrão dado pelo Governo. Naquele ano foi aprovado nos Estados Unidos o Orphan Drug Act, decreto que fornece incentivos fiscais e subsídios de P&D para o desenvolvimento de medicamentos para o tratamento de doenças raras (doenças que afetam menos de 200 000 pessoas). Sem este apoio eles praticamente não existiriam. Esta iniciativa foi fundamental para o crescimento de empresas como Amgen, Genentech e Genzyme. Hoje os medicamentos para doenças raras são responsáveis por mais de 70% da receita das principais empresas de biotecnologia.

Os produtos inovadores dependem fundamentalmente dos investimentos em pesquisa de base. Se quisermos saber o que o futuro nos reserva, temos que olhar o que está sendo feito hoje neste campo, um exemplo é a biologia sintética. Entre 2008 e 2014 as agências governamentais americanas já investiram quase 1 bilhão de dólares em pesquisas nessa área. O MIT-Broad Foundry é um dos institutos apoiados com recursos da agência de defesa DARPA e, de acordo com Ben Gordon, diretor do Foundry, ele tem o objetivo de trazer soluções para a saúde, a agricultura e a química que são desafiadoras demais para a indústria e para a academia.

Synthetic-Biology

Aqui no Brasil, além da pesquisa básica, o Governo tem investido em pesquisas na indústria e na criação de empresas de base tecnológica como forma de aproveitar as pesquisas, as patentes e o conhecimento produzido nas universidades. Entre as agências de fomento está a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), que por meio do Plano Inova Empresa apoia a inovação em setores que o Governo Federal considera estratégicos. Lançado em 2013, é o projeto mais ambicioso de inovação que o país já teve. Uma verdadeira revolução. Ele conta com R$ 32,9 bilhões que serão destinados a áreas como energia, nanotecnologia e biotecnologia nos próximos anos.

Uma das instituições que receberam recursos do FINEP foi a Embrapa Agroenergia. Em um prédio com 10.000 m2 no Distrito Federal, a instituição trabalha para produzir um futuro sustentável para o planeta e para a economia brasileira. Mais de 50 projetos estão em desenvolvimento, entre eles a pesquisa em processos de conversão da biomassa em bioenergia, biomateriais e químicos renováveis de alto valor agregado. Mas nem sempre os recursos públicos são bem aplicados. O programa Ciência sem Fronteiras é um desses casos. Com mais de 100.000 bolsas, a maior parte delas para alunos de graduação, o programa investe na formação de pessoal altamente qualificado, colocando estudantes e pesquisadores em instituições de excelência no exterior e atraindo jovens talentos para trabalhar no Brasil. Apesar de proporcionar a vivência internacional aos alunos, a iniciativa falha pela falta de um acompanhamento rigoroso das disciplinas e atividades desenvolvidas por eles no exterior. Isso nunca poderia acontecer num programa onde o custo de um aluno pode chegar a 80.000 reais por ano. Rogerio Meneghini, professor da USP e diretor científico da biblioteca virtual SciELO afirma: “No contexto do desenvolvimento da ciência, a ida desses estudantes de graduação ao exterior não vai fazer qualquer diferença”.

Num momento de dificuldades econômicas como a que enfrentamos hoje e viveremos nos próximos anos, é vital utilizar com mais sabedoria os recursos públicos. Gerenciar e avaliar os resultados ficou mais importante do que nunca. Ter a parceira das empresas privadas é essencial. Resumindo: é fundamental não perdermos essa revolução que o Governo começou.