Se a Física não concorda com você, modifique a Física!

O que uma pessoa normal faria se, ao desenvolver uma determinada argumentação, esbarrasse em um pequeno detalhe: as Leis da Física não apoiam seus argumentos?

É de se esperar que a pessoa modifique seu argumento de forma que não mais vá de encontro à Física, ao menos se ela quiser ser levada minimamente a sério.

Mas o que o Impostor faria?

Modificaria a Física é claro!

Em 20 de Julho de 1969 quando a Apollo 11 pousou na superfície lunar, marcando “um grande salto para a humanidade”, marcou também uma nova classe de conspiracionistas: aqueles que diziam que a Nasa havia forjado o pouso da Apollo 11 e, após algum tempo, das outras 5 missões (Apollo 12, 14, 15, 16 e 17) que também levaram tripulantes à Lua. Esses conspiracionistas nunca tiveram muito espaço. Isto é, até o advento da Internet e de sua capacidade de dar espaço a todo tipo de lunático (com o perdão do trocadilho).

Um desses é André Basílio, o autor do site A Fraude do Século. Dentre a grande quantidade de erros que Basílio comete, abrangendo diversas áreas, encontra-se um que chama à atenção pelo absurdo de sua construção.

Observe a foto abaixo (clique para ampliar) :

Basílio argumenta que a Penunbra vista na foto, no traje do astronauta, é uma prova da fraude das missões lunares porque, pasmem, não existe formação de penumbra na Lua porque ela não possui atmosfera! Não, você não leu errado. Confira abaixo o trecho do site em que Basílio comete essa pérola:

(…)

Agora, note como são perfeitas as definições de sombra na roupa do astronauta Edwin Aldrin sendo que, na Lua, não há refração da luz. Ou seja, não existe penumbra. Ou a sombra é total (totalmente preta), ou não há sombra. Penumbras como estas, perfeitamente visíveis na roupa de Aldrin, são impossíveis de existirem na Lua porque na Lua não há atmosfera. E são os gases existentes na atmosfera os responsáveis pelas penumbras no nosso planeta.

(…)

Como é que funciona a refração? Para ficar mais fácil de você entender, utilize a sua mão próxima ao tampo de uma mesa. Veja como é a sombra de sua mão incidindo sobre a mesa. Aproxime a sua mão do tampo da mesa e perceba que a sombra passa a ficar mais escura. Aproxime mais ainda, quase encostando a sua mão na mesa e você verá que a sombra ficou ainda mais escura. Se você fizer isso à noite, com uma luz acesa, você verá que a tendência é de se criar uma sombra tão escura que fique impossível conseguir ver a mesa com perfeição quanto mais próxima da mesa estiver a sua mão. Por quê isso acontece? É devido às partículas de oxigênio (e outros gases) existentes no ar. Quando a sua mão está mais distante da mesa, há uma sombra, mas você ainda consegue enxergar esta parte da mesa com perfeição. Isto ocorre porque a luz que incidiria diretamente sobre a mesa foi barrada pela sua mão. Mas, parte da luz ainda conseguiu chegar à mesa porque entre a sua mão e a mesa existem partículas de oxigênio; e a luz que estava incidindo, de cima para baixo, conseguiu fazer uma pequena curva, através da refração da luz, uma vez que uma partícula iluminada de oxigênio conseguiu iluminar, em menor escala, uma partícula de oxigênio ao lado, que refletiu esta luminosidade para outra partícula, para outra, outra, até que chegasse ainda um pouco de luz na mesa. Portanto, com sua mão um pouco distante da mesa, você vê a sombra da sua mão, mas ainda consegue enxergar a parte da mesa na qual há a sombra. Mas, quanto mais perto sua mão fica da mesa, menos partículas de oxigênio existem para refletir a luz. Então, a sombra fica mais escura. Portanto, esta é a explicação sobre a formação da penumbra no nosso planeta, que existe devido às partículas de gases existentes no ar. Mas, e na Lua? Por quê não deveria haver penumbra na Lua? Simplesmente porque na Lua não existe atmosfera. Muito menos oxigênio! Não há gás algum sobre a superfície lunar, o que impede que haja penumbra. Portanto, se a foto acima possui penumbra, pode ter certeza que ela não foi tirada na Lua! Foi tirada na Terra! No nosso próprio planeta! E nos fizeram todos de trouxas!

(…)

Ou seja, segundo Basílio é o fenômeno da Refração da Luz o responsável pela formação da penumbra, e como a Refração ocorre devido reflexão da luz nas moléculas da atmosfera, e como a Lua não possui atmosfera não é possível haver Penumbra na Lua. Brilhante não?

Mas completamente ERRADO!

O surgimento de penumbra não têm qualquer relação com a refração da luz, fenômenos que Basílio parece não conhecer já que sua explicação, e a suposta ligação entre os dois, não passa nem perto da verdade.

As sombras são formadas quando um corpo se encontra no caminho da luz emitida por uma fonte qualquer, seja primaria ou secundária. Quando a fonte é pontual, ou seja, é possivel desprezar suas dimensões, a sombra formada é completamente escura. Entretanto, quando a fonte é extensa a sombra formada é composta de duas partes distintas: uma escura, a Umbra, e uma clara, a Penumbra. Note que em nenhum momento é necessária a presença de atmosfera para a formação de penumbra, o único pré-requisito para o fenômeno é a presença de uma fonte de luz extensa.

Mas quais as fontes extensas que iluminam a Lua?

Primeiramente o Sol. Assim como sombras formadas aqui na Terra devido à luz solar apresentam penumbra, também o fazem as formadas na Lua. O Sol não está a uma distância suficientemente grande para que o consideremos como fonte pontual. Como fontes extensas secundárias (fontes de luz refletida) podemos citar a reflexão da luz solar no solo lunar e a na própria atmosfera da Terra . Essa ultima, a propósito é a responsável por podermos, às vezes, perceber mais nitidamente a parte da Lua não iluminada pelo Sol nas fases Crescente e Minguante.

Ora, e a refração? O fenômeno da refração ocorre quando a luz passa de um meio de propagação para outro (do ar para a água, por exemplo) o que, devido à mudança de velocidade de propagação (que depende do meio), provoca alteração na direção de propagação da luz. Mas pode ocorrer refração sem mudança de meio? Sim, desde que o meio possua “camadas” com, por exemplo, densidades diferentes, fazendo com que a luz tenha velocidades diferentes para cada camada do meio. Entretanto, não há diferenças significativas de densidade no ar entre sua mão e uma mesa. E muito menos a refração têm qualquer relação com a reflexão da luz nas moléculas de gás da atmosfera.

Enfim, Basílio ou erra feio ao tentar definir penumbra, refração etc ou mente descaradamente apenas para tentar convencer seus leitores (tipicamente adolescentes com um forte sentimento anti-EUA), menos familiarizados com a Física, de que a ida do Homem à Lua foi uma farsa. Mentir para provar que algo é uma mentira parece não ser contraditório para Basílio afinal.

Aliás, se Basílio comete um erro tão básico de Física de Ensino Médio, como alguém pode confiar nas outras informações, ou “provas”, de que as missões à Lua foram forjadas?

Uma análise mais completa pode ser encontrada no site Projeto Ockham, com refutação de boa parte dos argumentos conspiracionistas.

Midiotices: Não Somos da Via Láctea?

O que acontece quando um jornalista usa como fonte um site nada confiável para escrever uma matéria sobre astronomia? O Sistema Solar deixa de pertencer a Via Láctea e passa a pertencer á Galaxia Anã de Sagitário como num passe de mágica!

O Site do Jornal El Universal publicou uma matéria, escrita pelo jornalista (?) Demian Magallán, na qual é afirmado que uma pesquisa recente publicada no Astrophysical Journal mostrava que o Sistema Solar não se formou na Via Láctea mas sim na Galáxia Anã de Sagitário, galáxia esta que está sendo “canibalizada” por aquela.

Interessante, não?

O problema é que essa notícia é mentira! O site que a matéria citada indica como fonte (de um suposto pesquizador de nome Matthew Perkins Edwin) mistura dados reais sobre a galáxia anã com interpretações completamente loucas.

Mas como Jornalismo preguiçoso nunca vem sozinho outros sites cairam na mentira e acabaram publicando a notícia sem verificação: o Macrocosmo (que já publicou uma retratação) e o Astronomia na Paraíba.

Uma refutação (em inglês) praticamente completa dessa matéria se encontra no site Bad Astronomy, que também possui refutações de outros mitos de internet ligados à astronomia.

Um Dragão na Garagem

(…)

Um dragão que cospe fogo pelas ventas vive na minha garagem.

Suponhamos (estou seguindo uma abordagem de terapia de grupo proposta pelo psicólogo Richard Franklin) que eu lhe faça seriamente essa afirmação. Com certeza você iria querer verificá-la, ver por si mesmo. São inumeráveis as histórias de dragões no decorrer dos séculos, mas não há evidências reais. Que oportunidade!

– Mostre-me – você diz. Eu o levo até a minha garagem. Você olha para dentro e vê uma escada de mão, latas de tinta vazias, um velho triciclo, mas nada de dragão.
– Onde está o dragão? – você pergunta.
– Oh, está ali – respondo, acenando vagamente. – Esqueci de lhe dizer que é um dragão invisível.

Você propõe espalhar farinha no chão da garagem para tornar visíveis as pegadas do dragão.
– Boa idéia – digo eu –, mas esse dragão flutua no ar.

Então você quer usar um sensor infravermelho para detectar o fogo invisível.
– Boa idéia, mas o fogo invisível é também desprovido de calor.

Você quer borrifar o dragão com tinta para tomá-lo visível.
– Boa idéia, só que é um dragão incorpóreo e a tinta não vai aderir.

E assim por diante. Eu me oponho a todo teste físico que você propõe com uma explicação especial de por que não vai funcionar.

Ora, qual é a diferença entre um dragão invisível, incorpóreo, flutuante, que cospe fogo atérmico, e um dragão inexistente? Se não há como refutar a minha afirmação, se nenhum experimento concebível vale contra ela, o que significa dizer que o meu dragão existe? A sua incapacidade de invalidar a minha hipótese não é absolutamente a mesma coisa que provar a veracidade dela. Alegações que não podem ser testadas, afirmações imunes a refutações não possuem caráter verídico, seja qual for o valor que possam ter por nos inspirar ou estimular nosso sentimento de admiração. O que estou pedindo a você é tão-somente que, em face da ausência de evidências, acredite na minha palavra.

(…)

Trecho extraído do livro “O Mundo Assombrado por Demônios:
a ciência vista como uma vela no escuro”, de Carl Sagan

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