A proverbial agulha na piscina de Xenônio

Se deus está nos detalhes, desta vez ele só pode estar de sacanagem.

Semana passada, a Symmetry publicou em seu site um artigo sobre o experimento EXO (Observatório de Xenônio Enriquecido) projetado para a observação (ou não) do fenômeno do Decaimento Beta Duplo sem Neutrino.

No Decaimento Beta comum, um nêutron decai em um próton emitindo um elétron e um antineutrino. É esse decaimento, por exemplo, o responsável pela transformação de Carbono 14 em Nitrogênio 14 e do Rubídio 87 em Estrôncio 87, que são usados em métodos de datação radiativa.

Alguns isótopos podem sofrer Decaimento Beta Duplo, com emissão de 2 elétrons e 2 neutrinos. Esse tipo de decaimento é bem mais raro e foi observado pela primeira vez em 1986. A observação do Beta Duplo é tão rara devido à meia-vida média de mais de 1019 anos (como comparação, a idade do Universo é da ordem de 1010 anos).

Mais raro ainda, tão raro que ainda não foi observado, é o Decaimento Beta Duplo sem emissão de neutrinos. E esse é o objetivo do experimento EXO (dentre outros em operação com o mesmo objetivo).

O EXO utiliza um tanque de 200kg de Xenônio 136 líquido para tentar observar o decaimento em Bário 136 através do Beta Duplo e, se derem bastante sorte, do Beta Duplo sem Neutrinos. O grande problema é que, mesmo com toda essa quantidade de Xenônio (a ser aumentada para 10 toneladas) espera-se um decaimento de vez em quase nunca e a detecção de um átomo de Bário num tanque com 1028 átomos de Xenônio é de um desafio imenso. 

O leitor astuto pode estar se indagando: independentemente da detecção do Bário, que deve ocorrer pelo decaimento duplo com ou sem neutrinos, se os neutrinos são partículas que pouco interagem com outras, como diferenciar se ele é emitido ou não, já que tão poucos serão produzidos?

Para responder a isso podemos voltar à própria descoberta do Neutrino, que, não surpreendentemente, aconteceu através do decaimento Beta.

Ao se medir a energia com que o elétron era emitido no decaimento Beta, foi observado uma coisa inusitada: ele não era emitido sempre com a energia máxima possível mas apresentava uma distribuição da forma abaixo:

betaspectrum.jpg

O eixo horizontal indica a energia do elétron. O eixo vertical indica o número de elétrons medidos com aquela energia. Esse tipo de distribuição indicava que uma terceira partícula  (que deveria ser neutra, já que não deixava rastros nas câmaras de nuvem) estaria envolvida no decaimento. Essa partícula carregava parte da energia liberada no decaimento e fazia com que pouquíssimos elétrons fossem emitidos próximos da energia máxima.

Analogamente, se os responsáveis pelo EXO medirem um espectro de energia para os elétrons emitidos semelhante ao acima, significa que o decaimento envolvido é o Beta Duplo normal. Por outro lado, se observarem um pico em torno da energia máxima, o decaimento é o Beta Duplo sem neutrinos.

Nesse último caso, estará confirmado um dos fenômenos chave para entender a física dos neutrinos Não vou me estender mais sobre isso já que daria material para várias postagens. Os interessados podem pesquisar sobre neutrinos de Majorana, sobre a hierarquia das massas dos neutrinos, etc.

Para finalizar, gostaria de ecoar o comentário do  blog Physics and Physicists. Todo esse esforço experimental é para se observar um fenômeno raríssimo. E mesmo assim, com bastante dedicação e esperteza, é possível superar as dificuldades.

Não é raro vermos defensores de MUCHALOKICES inventando desculpas das mais esfarrapadas para a não observação de suas doideiras por experimentos controlados. Um dos argumentos seria que as MUCHALOKICES seriam muito raras para serem observadas.

Só que pelo que vimos do experimento EXO, quanto mais controladas as condições do experimento melhores são as chances de observá-lo, por mais raro que seja.

Discussão - 1 comentário

  1. […] descobrir — envolvendo o EXO-200, a última geração do Enriched Xenon Observatory (EXO), um Observatório de Xenônio Enriquecido que fica no Novo México. Mas essas experiências são extraordinariamente difíceis e não se […]

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