Diga ao povo que escrevo

Pessoal, uma nota rápida para agradecer os comentários e o apoio a respeito da temática bíblica e assemelhada por aqui. Vou começar a postar a respeito de vez em quando então, e tentarei começar com algo que pouca gente por aqui talvez conheça: os livros “céticos” (e quase ateus) do Antigo Testamento. Aguardem!

O jardineiro é Jesus

bompastor.jpgEstou com a mão coçando pra começar um experimento por aqui, mas não gostaria de fazer isso sem a benção — ou ao menos a anuência — de vocês. A questão é que se trata de um tema tabu, que já me rendeu alguns detratores: arqueologia bíblica (porque “arqueologia do Levante” ou “do Oriente Próximo Antigo” é meio cifrado demais, vamos combinar).
Os problemas quanto a essa temática são dois. Primeiro, não é segredo pra ninguém que, durante minha estada no G1, eu inventei a série “Ciência da Fé”, justamente para abordar esses temas. Sucesso de pública, sim; sucesso de crítica, nem tanto.
Bastou eu botar os pés para fora do G1 para perceber amigos e colegas que, no geral, gostavam do meu trabalho, dando graças aos céus pelo enterro da série. Um ou outro leitor dos textos do G1 também sugeria às vezes que a série fosse encerrada ou que eu fosse demitido (é, o pessoal é gente fina às vezes).
Nas entrelinhas ou nem tão nas entrelinhas, tais críticos diziam que tocar nesse tipo de tema era, na melhor das hipóteses, irrelevante e, na pior, picaretagem e/ou proselitismo disfarçado. Ou, resumindo numa frase: “Mas o Reinaldo é católico! Não vale”.
Imparcialidade imaginária
É, o Reinaldo é católico. E você é agnóstico — ou umbandista, ou zen-budista. Whatever. Vamos deixar de lado o fato de que o lide de várias das minhas reportagens vai diretamente contra o que eu “deveria” aceitar como dogma por causa da minha religião — tipo “Pedro foi o primeiro papa” (não foi, dizia a matéria) e “Maria não teve mais filhos depois de Jesus” (provavelmente teve, mostrava o texto). A questão é mais profunda.
Isso porque os temas que eu gosto de abordar nesse tipo de reportagem interessam, creio eu, a todos, independente da crença ou descrença de cada um.
E interessam no sentido de “mexem com os interesses de” todo mundo. Você pode ser ateu desde o berçário, mas, desculpe, não pode se dar ao luxo de ignorar a importância das origens de Israel, ou a busca pelo chamado “Jesus histórico”, para entender o mundo que nós temos nas mãos hoje. E, para temas que mexem tanto com tantas pessoas, todo mundo traz seus próprios vieses. (Em “Deus, um delírio”, por exemplo, há uma discussão muito legal sobre o “Jesus histórico”, mas Dawkins se deixa levar pelos vieses dele ao traçar suas conclusões. Desculpe, pessoal, mas viés é que nem bunda: todo mundo tem o seu. E não consegue simplesmente deixá-lo em casa antes de ir pro trabalho.)

Híbrido

OK, esse era o primeiro problema. O segundo é ao mesmo tempo mais e menos simples. Dá mesmo para encaixar todos esses temas debaixo da rubrica “arqueologia”? Não estaria eu hijacking sequestrando este blog com algo off-topic que foge do tema dele?
Como em quase tudo na vida, depende. Por exemplo: nós temos zero evidência arqueológica, material, direta, da vida de Jesus, por exemplo. Mas, e esse é um mas importante, qualquer reconstrução do passado usa evidência textual quando disponível.
Por isso, o trabalho do historiador e do arqueólogo se complementam. Tanto os vasos quanto os textos de Homero nos ajudam a traçar um retrato melhor da Grécia pré-clássica. Nesse sentido, reconstruir as origens de Israel não é diferente de estudar a arqueologia da Idade do Ferro no Levante em geral, e as origens do cristianismo são só um caso especial da arqueologia da Antiguidade Clássica tardia.
Bom, esse é o dilema que temos na mão. Vocês acham um sacrilégio e uma picaretagem eu abordar esses temas de vez em quando? Eles interessam a vocês? Qualquer feedback ajudará um bocado.

Sobre neandertais e despedidas

Neanderthal_child.jpgDizer adeus nunca é fácil. Publiquei ontem a última coluna no meu blog de biologia evolutiva, o Visões da Vida, do G1. Para combinar com o clima elegíaco da coisa toda, decidi abordar a mais intrigante de todas as extinções de hominídeos (ou homininos, como prefere o grande Roberto Takata): o sumiço dos neandertais. Confiram o texto abaixo. Com um pouquinho de paciência, juro que virá muito material inédito por aí.
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Num dia de despedidas como este, é no mínimo adequado abordar o maior de todos os adeuses, a mãe de todas as despedidas. Ela aconteceu em algum lugar da Europa Ocidental, há menos de 30 mil anos. Esse é o momento aproximado em que os seres humanos anatomicamente modernos se tornaram a única espécie de hominídeo da Terra (há controvérsias; um evento parecido pode ter se dado um pouco mais tarde no Sudeste Asiático, mas deixemos isso para lá por enquanto). Quem nos deixou para sempre foram os neandertais, provavelmente as criaturas mais parecidas com o homem que já existiram. O sumiço desses primos tão próximos é indiscutível; difícil mesmo é explicar por que ele aconteceu.
E, antes que você pergunte, sim, o desaparecimento dos neandertais – e o dos outros hominídeos que chegaram a conviver com a nossa linhagem – exige uma explicação especial por uma razão bem simples: é algo totalmente fora da série. Durante os últimos 6 milhões de anos, a convivência entre múltiplas espécies mais ou menos “humanas” na Terra foi a regra, e não a exceção. Por razões completamente pessoais, costumo dizer que a situação-padrão durante a trajetória evolutiva humana não era muito diferente da que se vê em “O Senhor dos Anéis” ou em outras obras da literatura de fantasia. Várias espécies humanoides inteligentes conviviam no mesmo mundo – como neandertais, Homo erectus e Homo sapiens nos papéis de elfos, anões, hobbits e quejandos.
O caso dos neandertais é especialmente chocante porque, em plena Era do Gelo, os seres humanos anatomicamente modernos oriundos da África invadiram uma Europa que era dominada por nossos primos havia 150 mil anos – e no fim do processo só restaram os africanos recém-chegados. As visões mais épicas desse processo traçam um quadro de combate e genocídio, no qual os humanos modernos “superiores” fizeram picadinho dos “primitivos” neandertais e, assim, herdaram a Terra. Análises do DNA de pessoas de hoje e do material genético obtido de ossos neandertais parecem favorecer a ideia de que uma população substituiu a outra (sem especificar bem como, é bom ressaltar), porque até hoje não foram encontrados exemplos inequívocos de genes neandertais no organismo de gente moderna.
Apesar desse quadro aparentemente simples, porém, as pesquisas mais recentes estão mostrando que é preciso cautela na hora de postular uma vitória de goleada dos humanos modernos sobre os neandertais. Os dados mais atualizados sobre essa controvérsia estão resumidos numa reportagem equilibradíssima, assinada por Kate Wong, na edição deste mês da revista “Scientific American”. Os últimos estudos mostram que o suposto abismo comportamental e cultural entre “nós” e “eles” é muito menor do que nos acostumamos a imaginar. É fato que nós sobrevivemos e eles pereceram – mas a diferença entre uma coisa e outra foi decidida nos detalhes e talvez tenha envolvido uma boa dose de sorte.

Guerra e paz

Primeiro, é bom tirar da cabeça a imagem de uma guerra de conquista entre humanos modernos recém-chegados e neandertais na defensiva. Seria, para começo de conversa, uma guerra absurdamente lerda: levando em conta apenas a Europa, o intervalo entre a chegada dos humanos anatomicamente modernos e o desaparecimento dos neandertais é de uns 12 mil anos (entre 40 mil e 28 mil anos atrás). Isso é o DOBRO do tempo que separa o Brasil do século XXI das primeiras civilizações do Oriente Médio, como os sumérios. Portanto, é MUITO tempo para uma suposta ofensiva-relâmpago. Além disso, não há sinais claros de conflito armado entre as duas espécies, assim como não há indícios indiscutíveis de casamentos mistos, embora alguns fósseis salpicados pela Europa (um deles o famoso “menino do Lapedo”, de Portugal) sugiram, para certos antropólogos e arqueólogos, que algum grau de hibridização ocorreu.
Durante muito tempo, diferenças em tecnologia e em diversidade de hábitos alimentares foram citadas como vantagens competitivas importantes em favor dos nossos ancestrais e contra os neandertais. A sofisticação das ferramentas produzidas pelo Homo sapiens, bem como a nossa maior versatilidade alimentar – obtendo mais alimentos de origem vegetal, pequenos animais, peixes, frutos do mar etc. – teria favorecido os humanos anatomicamente modernos na luta pela sobrevivência.
Mas trabalhos recentes, como o liderado por Chris Stringer, do Museu de História Natural de Londres, sugerem que as diferenças são menos importantes do que parecem. Stringer e companhia mostraram que os neandertais de Gibraltar, território britânico no sul da Espanha, tanto eram capazes de caçar grandes animais em terra como também capturavam focas e golfinhos, coletavam mariscos e abatiam coelhos e aves – uma variedade alimentar comparável à dos primeiros europeus modernos.
Já o americano Bruce Hardy, do Kenyon College, teve a boa sorte de comparar os padrões de ocupação de uma caverna na Alemanha, onde primeiro neandertais e depois humanos modernos viveram. As diferenças, diz ele, são mínimas, embora a variedade de ferramentas produzidas pelos humanos modernos seja um pouco maior. Os neandertais também produziam armas com cabo (grudado com resina vegetal) e faziam instrumentos de osso, capacidade normalmente vista como algo exclusivo dos modernos.
Simbolistas
Até as capacidades simbólicas dos neandertais – ou seja, a produção de arte, adornos corporais e provavelmente linguagem falada – andaram ganhando mais probabilidade nos últimos tempos. Que alguns deles usavam colares de presas de animais no pescoço – a chamada cultura Chatelperroniana – já se sabia há tempos. Alguns especialistas ainda defendem que a cultura Chatelperroniana surgiu apenas por aculturação, com os neandertais copiando os recém-chegados modernos sem saber muito bem o que fazer com os adornos. Outros, como o português João Zilhão, afirmam que as datas do Chatelperroniano antecedem o contato direto com os Homo sapiens, tendo surgido por uma dinâmica própria da sociedade neandertal.
Seja como for, análises do DNA neandertal feitas em 2007 mostraram que eles carregavam uma versão idêntica à humana do gene FOXP2, considerado essencial para o desenvolvimento da fala articulada. É claro que outros genes são importantes para a linguagem, e ainda sabemos muito pouco sobre eles, mas a descoberta, no mínimo, sugere que temos poucas razões para crer que os neandertais não tivessem capacidade linguística como a nossa. É quase um empate em capacidades simbólicas, digamos.
Todos esses dados nos ajudam a encarar com um novo respeito nossos primos extintos, mas também nos deixam numa situação não muito confortável do ponto de vista científico. Por que diabos eles se foram e nós ficamos, então?
Nessa altura do campeonato, só temos hipóteses a esse respeito – algumas delas melhores que outras, claro. Uma das ideias, defendidas por Clive Finlayson, do Museu de Gibraltar, indica que a situação começou a ficar feia para os neandertais muito antes do contato com humanos modernos na Europa, por volta de 55 mil anos atrás. Novos dados paleoclimáticos indicam que o continente passou a sofrer com oscilações bruscas de condições ambientais, do frio intenso para o mais temperado e de volta para o frio intenso. O resultado é que, no tempo de vida de um indivíduo, um ambiente florestal poderia se transformar totalmente em estepe – e voltar a virar floresta ao longo da vida do filho dele. Não é brincadeira se adaptar a mudanças tão radicais.
Talvez seja por isso que outro estudo recente, publicado por Virginie Fabre e seus colegas da Universidade do Mediterrâneo em Marselha (França), tenha detectado sinais de fragmentação populacional no DNA de neandertais de várias regiões da Eurásia. Tudo indica que as mudanças ambientais estavam reduzindo e isolando as populações do hominídeo umas das outras, dificultando cada vez mais a chance de encontrar parceiros saudáveis e ter bebês também com saúde.
Mais dois pequenos detalhes, desta vez relativos ao estilo de vida neandertal, podem ter sido importantes para o sumiço. Outras pesquisas indicam que menos neandertais conseguiam chegar à idade de ser avós do que ocorria entre humanos modernos no fim da Era do Gelo. Isso diminuía o sucesso reprodutivo de um grupo como um todo e talvez dificultasse a transmissão cultural de conhecimentos para sobreviver num mundo difícil. E o corpo musculoso e atarracado dos neandertais provavelmente exigia um aporte extra de alimentos – entre 100 e 350 calorias a mais por dia – para sobreviver quando comparado ao nosso.
Pois é – entre 100 e 350 calorias por dia. Dá algo entre uma e três e meia barrinhas de cereais diárias. Talvez essa tenha sido a diferença entre a extinção deles e a nossa sobrevivência há 28 mil anos. Podia ter sido bem diferente, e as posições poderiam estar invertidas. Tênue é o cordão umbilical que nos prendeu à Terra. Parece um bom motivo para sermos gratos por ainda estarmos aqui – e honrar a chance de vida que nossos primos não tiveram.

Por uma arqueologia menos antropocêntrica

ResearchBlogging.orgQuando, nos idos de 2003, uma pesquisa revelou que chimpanzés também deixavam para trás sua própria versão de registro arqueológico, ninguém imaginava que a descoberta fosse gerar uma nova área de pesquisa multidisciplinar, a arqueologia de primatas (ou, sendo mais amplo, a arqueologia animal). Um artigo de revisão interessantíssimo, recentemente publicado, esmiuçou as potencialidades desse novo campo, e eu abordei o tema na minha penúltima coluna para o G1. Confiram o texto na íntegra abaixo.
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macacoprego.jpgQue atire a primeira pedra quem não começou a se interessar por arqueologia, ao menos em parte, por causa do indefectível Henry “Indiana” Jones Jr. (Mulheres! Chicotes! Glamour! Corações fumegantes palpitando fora do corpo!) Aí o sujeito logo descobre que esse mundo de luxúria e fantasia ocupa um limbo entre o “muito raro” e o “inexistente”. Não foi por falta de aviso. O próprio Indy já advertia que 90% do trabalho arqueológico é feito na biblioteca. Tudo bem, é a vida. Mas ficar vendo macaco-prego quebrar coquinho? Aí já é demais.
Ou melhor, pode até ser demais, mas cuidadosas observações do comportamento de macacos-pregos (e de outros primatas, e até de outros animais) podem ser justamente a fronteira final da arqueologia, uma ferramenta ímpar para entender com quantas pedras se faz uma espécie tecnológica e construtora de civilizações como a nossa. Uma argumentação fascinante em favor dessa ideia está numa edição recente da revista científica britânica “Nature”. O artigo, capitaneado por Michael Haslam, do Centro Leverhulme para Estudos Evolutivos Humanos da Universidade de Cambridge, propõe nada menos que a fundação de um novo campo de estudos, a arqueologia de primatas – e, de forma mais genérica, a arqueologia animal.
Acredite, Haslam e companhia não estão delirando. É verdade que macacos e outros bichos não constroem pirâmides nem sacrificam outros bichos ao Deus Sol (ao menos pelo que a gente sabe), mas inúmeros animais satisfazem a condição fundamental dos estudos arqueológicos – eles produzem cultura material. Ou, em linguagem menos empolada: animais também usam ferramentas, às vezes fabricadas por eles próprios, com relativo grau de sofisticação.
A lista desses comportamentos se tornou tão vasta que nem vale a pena tentar colocar aqui uma versão exaustiva dela. Uma amostra representativa inclui bichos tão diferentes quanto chimpanzés, macacos-pregos, macacos-resos, golfinhos, lontras-do-mar, araras e várias espécies de corvos e assemelhados. Grande parte, se não a totalidade desses casos, encaixa-se nas definições tradicionais de cultura humana: são comportamentos aprendidos num contexto social, que variam entre as diferentes populações de cada espécie e parecem formar “tradições”. Mas é claro que a produção de cultura material satisfaz apenas uma das condições para o estudo arqueológico de um fenômeno. A outra é o fenômeno em questão ser detectável no passado – de preferência no passado distante.
Do tempo das pirâmides
Se você apostou contra essa última possibilidade, perdeu feio. Colegas de Haslam, como Julio Mercader, da Universidade de Calgary, no Canadá, passaram os últimos anos estudando em detalhes a história do uso de ferramentas entre os chimpanzés do Parque Nacional Taï, na Costa do Marfim. Os bichos de lá desenvolveram uma tradição de usar “bigornas” e “martelos” de pedra para quebrar coquinhos, extraindo a valiosa gordura da polpa e suplementando sua alimentação. Essa atividade cria marcas características nos martelos e bigornas, bem como um acúmulo constante de restos de coquinhos.
Ora, usando esses indícios modernos, Mercader e companhia conseguem farejar instâncias mais antigas de quebra-nozes na floresta. Isso permitiu que eles datassem certos sítios de quebra de coquinhos, os quais remontam a pelo menos 4.300 anos atrás – mais ou menos a época em que os egípcios estavam colocando suas pirâmides de pé. A “civilização” dos quebradores de cocos no Parque Nacional Taï é, portanto, milenar.
Ainda não temos datas comparáveis para os macacos-pregos (Cebus libidinosus – isso é que é nome científico) que habitam a Caatinga e o Cerrado, mas o comportamento dos bichos, conforme documentado por uma série de pesquisadores brasileiros e estrangeiros, é incrivelmente parecido com o dos chimpanzés. Até o tamanho das pedras que eles utilizam como “martelo” para quebrar coquinhos é similar, apesar do tamanho diminuto dos bichos quando comparado ao de seus primos distantes africanos. Estudos de longo prazo detectaram o transporte de pedras por longas distâncias até “bigornas” apropriadas (que podem também ser raízes de árvores, além de pedras maiores). De quebra, os macacos tupiniquins também são mestres em utilizar pedras para escavar tubérculos suculentos.
Além da idade da pedra
Entender esses comportamentos e a antiguidade deles tem uma série de implicações importantes para a pré-história do próprio homem. Primeiro, pode muito bem ser que esses dados nos ajudem a detectar os mais antigos rastros do uso de ferramentas entre ancestrais da humanidade.
A questão é que, embora a linhagem humana tenha se separado da que desembocou nos chimpanzés há cerca de 6 milhões de anos, as primeiras ferramentas indiscutíveis – lascas e “núcleos” de pedra com bordas cortantes, bastante rudimentares – só aparecem no registro arqueológico há uns 2,5 milhões de anos. Pior: não sabemos quem as produziu, embora o melhor chute possível aponte para o Homo habilis. Acredita-se que elas eram usadas para carnear as carcaças que os hominídeos roubavam de predadores maiores ou, bem mais raramente, obtinham por seus próprios meios.
No entanto, se os sítios de quebra produzidos pelos chimpanzés e macacos-pregos forem um bom modelo do que um usuário de ferramentas realmente primitivo deixava para trás, pode ser que a gente esteja procurando nos lugares errados, e que talvez o uso de instrumentos de pedra na nossa linhagem remonte a época bem mais recuadas do que imaginávamos. Se for possível detectar análogos antigos dos primatas quebradores de nozes atuais, esse mistério será elucidado.
Um ponto ainda mais importante é que a arqueologia de primatas pode acabar com a nossa tara por pedras. Instrumentos de pedra são importantes, lógico, porque são imperecíveis, mas as ferramentas mais sofisticadas produzidas por outros bichos em geral são feitas com matéria vegetal. Os chimpanzés do Congo oferecem um exemplo um bocado interessante. Para capturar cupins, eles primeiro pegam um galho, retiram todas as folhas dele e depois desbastam a ponta do dito cujo, de maneira a criar algo como as cerdas de uma escova. Para obter mel, os primatas se valem de uma combinação de ferramentas: um “pilão” para quebrar a colmeia, um galho mais delicado para abrir espaço na abertura inicial, como alavanca, e finalmente uma “colher” para recolher a guloseima.
Tudo isso pode significar que a mais antiga das “Idades da Pedra” talvez estivesse mais para “Idade do Galhinho”, e ajuda a traçar um retrato completamente diferente da cultura material dos nossos ancestrais mais remotos, com foco bem menor numa quebra interminável de pedra, pedra e mais pedra.
Inevitável?
Finalmente, a questão mais interessante e especulativa de todas: como a tecnologia se fixa numa espécie. Até pouco tempo atrás, o fato de que tanto os chimpanzés quanto nós utilizam instrumentos parecia indicar que o nosso ancestral comum também era um bicho (moderadamente, ou quiçá toscamente) tecnológico.
Mas pense de novo: e os macacos-pregos? E os resos? Esses primatas estão tão distantes de nós (com separação evolutiva há cerca de 40 milhões, no caso dos primeiros) que o mais provável é que o uso de ferramentas seja um clássico caso de evolução convergente de um comportamento, ou seja, de uma característica que apareceu de forma independente, por razões diferentes, nas várias espécies.
Isso levanta uma questão intrigante: a de que a capacidade tecnológica, ao longo da nossa linhagem, pode ter aparecido e desaparecido inúmeras vezes antes de se fixar. A arqueologia animal, portanto, talvez seja uma faca de dois gumes. Sim, ela usa outras espécies como espelho para ajudar no entendimento da nossa própria trajetória tecnológica. Mas também mostra que produzir ferramentas não é garantia nenhuma de sucesso evolutivo – do contrário, a tecnologia seria mais central na vida de muito mais espécies planeta afora. Eis aí um fato que deveria fazer o bicho homem calçar as sandálias da humildade, só pra variar.
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Haslam, M., Hernandez-Aguilar, A., Ling, V., Carvalho, S., de la Torre, I., DeStefano, A., Du, A., Hardy, B., Harris, J., Marchant, L., Matsuzawa, T., McGrew, W., Mercader, J., Mora, R., Petraglia, M., Roche, H., Visalberghi, E., & Warren, R. (2009). Primate archaeology Nature, 460 (7253), 339-344 DOI: 10.1038/nature08188

Caiu, caiu Angband, a Grande

“Thus an end was made of the power of Angband in the North, and the evil realm was brought to naught; and out of the deep prisons a multitude of slaves came forth beyond all hope into the light of day, and they looked upon a world that was changed.”
(The Silmarillion, J.R.R. Tolkien)
Quem tem ouvidos para ouvir, que ouça.
*Em homenagem ao Renan, que provavelmente sabe o que eu estou sentindo (ao menos seguindo a pista da referência tolkieniana), e em honra a um novo começo. Voltei para casa. E para cá também.

Arqueoficção

lascaux300.jpgComo vocês podem ver pelo post acima, estou precisando MUITO me animar, então resolvi relembrar glórias passadas. Como coincidentemente elas são on-topic, ei-las aqui. Provavelmente o pessoal que visita o ScienceBlogs não conhece um pequeno conto de arqueoficção científica (vocês já vão entender) que eu publiquei na seção Futures, da revista Nature, alguns anos atrás. Apreciaria os comentários de todos a respeito, seja do ponto de vista científico, seja do literário. Aqui vai. O conto original e seu PDF podem ser encontrados neste link.
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Gathering of the clans – Get in touch with your past
You could see the pavilions for miles around in the bright summer morning. Only a little less conspicuous was the line of people moving slowly towards two signposts. “Got your marker ready? This way, please,” said one. “First time? Come and shed your blood,” informed the other. And above them, a bigger signpost shouted in fake-Celtic letters: “Welcome to the 5th GATHERING OF THE CLANS!”
The enthusiasm was almost palpable — or was it the smell of sweat? — except for a tiny segment of the line where a group of friends was arguing. They seemed to be having a hard time convincing one of them that yes, despite the evidence, this was going to be cool.
“Don’t be such a baby, Pat. It’ll be fun.”
“And I still say it’s gonna be ludicrous. And I hate needles. Do you really think they’ll use a different one for every single person in this crowd?”
“You sound like a sissy. It’s just a drop, for goodness sake! You know how efficient those sequencers are nowadays. They read the bases, tell you who was your great-great-great-grandpa of a couple of thousand years ago and that’s it — you’re free to drink mead and get the chicks.”
“Yeah, Pat, what’s wrong with that? After all, we’re just connecting with our past, buddy. Thought you appreciated that.”
“Look, I’m as likely to engage in hero-worship as anyone. It’s the impersonality of it that bothers me. There was certainly a point in us claiming descent from Hengist and Horsa. Those guys at least had a story — they cut Finn and his gang to pieces and conquered Britain. Been there, done that. People can connect with that kind of stuff. But now you’re asking me to worship a DNA sequence. No sir — I’d rather go drink mead with old Hengist in Valhalla.”
Soon they were right in front of the gates, where a stout fellow in white was grinning at Pat — everyone, of course, had made sure he was the first to get in.
“Alright, mate, what’s it gonna be? Mt? Y? Autosomal markers?”
Pat sighed. “Whatever. Surprise me.”
Very carefully, his thumb was pierced. Ten seconds later, a robotic voice that seemed to be suffering from a dreadful case of personality emulation (of the irritatingly happy sort) announced: “Congratulations! Your mtDNA has been assigned to the V haplogroup, fairly common in western and northern Europe, where it originated right after the Last Glacial Maximum! Your people were probably among the earliest and greatest artists the human race has known, creating those fine murals of extinct megafauna in Altamira and Lascaux. Way to go!”
“Thrilling,” growled Pat. “Can I go now?”
“Hang on a sec,” said the gatekeeper, “you need your totem!” He gave Pat a little plastic horse that looked like a poor imitation of the ones from Lascaux. Pat sighed still louder, grabbed the horse and moved on.
“Hey, what’s wrong with Marvin there?” asked the gatekeeper.
“Oh, the usual thing. Don’t talk to him about life,” answered his friends, laughing.
The Gathering seemed to confirm Pat’s worst fears. In one corner, somebody dressed as a Mongol warrior was calling “all Star-Cluster kids under ten” to learn how to shoot with a composite bow, just like Grandpa Genghis. A few yards away, some French families were being instructed in the minutiae of cannibalism among the Tupinambá tribes of Brazil — it turned out a young chief from that nation had married the daughter of a Norman trader in the sixteenth century. Elsewhere, a rabbi was always ready in case you found out your chromosomes were Jewish and wanted an impromptu bar mitzvah.
Pat wandered miserably until he spotted a girl with long black hair who also seemed to be walking alone. Predictably, he was happy to inflict on her (Vera was the name, and she was from the Basque Country in Spain) all the talk about how ridiculous the whole Gathering concept was. Vera seemed to dig his grumpy-old-man charm, but didn’t quite agree.
“I think everyone is aware of that stuff,” she said. “But think of it for a second. Isn’t it wonderful that all these different people are learning about a past that seems plain legend but is written in our blood? Besides, look at the scale of it. We used to think in terms of two or three generations at most. Now you can look back thousands of years and still recognize yourself.”
Pat was still unconvinced. “I see what you mean. But I don’t know quite how to feel about it. You see, I…Whoa!”
They had wandered to the very heart of the Gathering and were right in front of an awesome panel. Picture the largest family tree you have ever seen, hundreds of feet across. There was a huge ‘YOU ARE HERE’ on the right side, and all the lineages of men (well, of women, actually, because it was an mtDNA family tree) ramified from ‘EVE’ on the left, crowned with their achievements, from the Internet to, yes, the horses of Lascaux.
“Well, I don’t think you can argue with that,” muttered Pat.
“I guess you can’t,” smiled Vera.
“You didn’t tell me what your clan was,” he asked.
“Oh,” said Vera, “here it is.” She showed him a plastic horse.
It was only his imagination, but he could almost see Vera in a different guise altogether. She was clad warmly in fur, and in ochre the most fantastic designs graced her white skin. She raised a torch and, for a split second, all the beasts of the Ice Age danced in the rock roof. There was only one thing to do: he kissed the apparition.
“You don’t think that counts as incest, do you?” joked Pat. She laughed.

Exército de um homem só

Rápida nota pessoal, mas on-topic, antes de voltarmos a posts mais suculentos: neste momento eu sou a única pessoa que restou na editoria de Ciência e Saúde do G1. Meu chefe (e um de meus melhores amigos) acaba de ser demitido.
Sabe aquela crise do jornalismo científico mundial? Aquela que está quase deixando todo mundo out of business? Pois é. A água acaba de bater por aqui…
São Marcus Brody, orai por nós!

Rohan e Gondor

runasvarangianas.jpg“Sveinn e Ulfr ergueram esta pedra em memória de Halfdan e em memória de Gunnar, seus irmãos. Eles encontraram seu fim no Oriente.” Bem-vindos à história sangrenta e romântica da Guarda Varangiana, os vikings que viraram os guerreiros mais fiéis do Império Bizantino. Esse epitáfio aqui ao lado, ao que tudo indica, foi criado por dois deles depois que voltaram para seu lar, a Suécia.
A Guarda Varangiana é um dos fenômenos mais esquisitos e fascinantes da história medieval. O crescimento populacional e a tradição guerreira na Escandinávia fizeram com que mercenários de fala germânica se espalhassem pela Europa Oriental, pelo Egeu e até pelo Cáucaso a partir do século X. Um batalhão deles se tornou a guarda pessoal dos imperadores bizantinos, uma unidade de elite que manteve sua identidade étnica, apesar de ter se cristianizado.
Isso explica uma descoberta completamente maluca: inscrições rúnicas em plena catedral (hoje mesquita) de Santa Sofia, em Istambul. A inscrição — hoje ilegível, fora, curiosamente, o nome Halfdan, de novo — está abaixo.
runashagiasofia.jpg
Não resisti à referência tolkieniana no título. A Guarda Varangiana tinha com Bizâncio uma relação muito parecida com a de Rohan e Gondor: uma cultura guerreira mais “primitiva” aliada a um império antigo e sofisticado. Ademais, as runas que aparecem em O Hobbit (não as de O Senhor dos Anéis, é bom lembrar) são versões das que se vê na inscrição que abre este post.

É ou não é escrita?

ResearchBlogging.orgOs caracteres nos sinetes abaixo, usados pela misteriosa civilização do vale do Indo por volta de 2000 a.C., são inegavelmente estilosos. Mas são uma forma de escrita? Uma pesquisa recente na revista “Science” usou análises estatísticas para tentar dar uma resposta objetiva a esse dilema. (Veja a imagem em tamanho grande clicando aqui.)
indo500.jpg
Com essa abordagem, você provavelmente não vai se surpreender se eu disser que o primeiro autor do estudo é do Departamento de Ciência da Computação e Engenharia da Universidade de Washington. (Ainda menos surpreendente é o fato de ele se chamar Rajesh Rao). Para enfrentar o mistério dos antigos sinais da Índia e do Paquistão, Rao e seus colegas avaliaram a entropia condicional da sequência de sinais — em outras palavras, o grau de aleatoriedade do aparecimento de um sinal dada a presença de um sinal anterior na “linha de código”.
A lógica por trás disso é simples, explicam eles. Em sistemas simbólicos não-linguísticos, o mais comum é que os sinais sigam ou uma sequência aleatória ou uma ordem sequencial rígida demais. Sistemas simbólicos de natureza linguística ficam entre esses dois extremos, apresentando uma combinação delicada entre ordem e caos — do contrário, em qualquer língua humana, não dá para seguir a sintaxe correta e ainda assim dizer o que se quer dizer.
Com isso na cabeça, os pesquisadores computaram a entropia condicional em cinco tipos de sistemas linguísticos escritos (sumério, tâmil antigo, sânscrito do Rig Veda e inglês) e sistemas não-linguísticos (sequências de DNA humano e de aminoácidos em proteínas bacterianas), além de avaliar também a linguagem de programação computacional Fortran. Isso feito, compararam esses valores de entropia condicional ao valor prevalente numa antologia de “textos” do vale do Indo.
E aconteceu o que esperar-se-ia que acontecesse caso os sinais de 2000 a.C. fossem mesmo uma forma de escrita: entropia condicional compatível com a da linguagem humana. Para ser mais específico, e aí a coisa começa a ficar interessante, a aparente escrita do Indo bate com o sumério e com o tâmil antigo nos níveis de entropia condicional.
Rebu do rébus
Primeiro, isso pode indicar que, como o sumério, trata-se de um sistema logossilábico, no qual os sinais podem corresponder a palavras inteiras, ou então funcionar como rébus. (O rébus é um jeito gambiarra de usar palavras não-relacionadas, cujo som é parecido, para representar outra mais abstrata, combinando-as. Por exemplo, desenhar uma mão e uma vaca para expressar o adjetivo “mão-de-vaca”. As escritas primitivas faziam isso direto.)
Adendo pós-post: o grande Roberto Takata, nos comentários abaixo, deu um exemplo bem melhor de rébus que o meu: desenhar um sol e um dado para expressar o conceito de “sol-dado”. (Pegou? Pegou?)
Em segundo lugar, a semelhança com o tâmil intriga porque ele pertence ao grupo das línguas dravidianas, hoje faladas no sul da Índia, mas aparentemente presentes em todo o subcontinente indiano antes da chegada dos indo-europeus (falantes de idiomas distantemente aparentados ao nosso) séculos depois. As línguas dravidianas seriam as línguas originais dos indianos e paquistaneses do vale do Indo.
Para ir além dessas indicações, só mesmo achando um jeito de decifrar a escrita, o que não vai ser fácil. Mas pelo menos o trabalho indica que não é perda de tempo fazer a tentativa.
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Rao, R., Yadav, N., Vahia, M., Joglekar, H., Adhikari, R., & Mahadevan, I. (2009). Entropic Evidence for Linguistic Structure in the Indus Script Science, 324 (5931), 1165-1165 DOI: 10.1126/science.1170391

Leão-marsupial: numa caverna perto de você

ResearchBlogging.orgthylacoleoconcepto.jpgAs cores e os desenhos na pelagem de um bicho extinto em geral são especulação pura — a não ser que pessoas que o viram ao vivo no passado tenham resolvido retratar a fera em sua arte. Segundo um artigo na revista arqueológica “Antiquity”, esse pode ter sido o caso do rapaz aqui ao lado — Thylacoleo carnifex, o leão-marsupial-australiano. Esqueça essas pintinhas esbranquiçadas da concepção artística: o mais provável é que ele tenha tido listras pelo corpo.
Um hipercarnívoro com incisivos afiadíssimos e dentes carnassiais que limpariam a carne do seu braço com ridícula facilidade, o T. carnifex sumiu do planeta há cerca de 30 mil anos, vários milênios após a chegada dos seres humanos modernos à Austrália. (Talvez seja mais adequado chamá-lo de “leopardo-marsupial”, a julgar pelas suas dimensões relativamente mais esguias — pesava uns 100 kg quando vivo — e por suas aparentes adaptações para subir em árvores.)
Os primeiros aborígines australianos já eram artistas talentosos, tendo deixado abundantes pinturas rupestres. Numa visita a abrigos da região de Kimberley, no oeste da Austrália, Kim Akerman e Tim Willing viram e fotografaram um grande painel na rocha que, para eles, provavelmente representa o bichão. Eles repassaram as imagens a três paleontólogos que estudaram fósseis da espécie, os quais concordaram com a identificação. Veja abaixo a imagem original, pintada com ocre, e a silhueta dela, redesenhada digitalmente.
thylacoleopintura.jpg
thylacoleoutline.jpg
Seria até possível argumentar que a pintura representa não a fera do Pleistoceno, mas um marsupial caçador mais modesto, o tilacino ou lobo-da-tasmânia (Thylacinus cynocephalus), que foi extinto no começo do século XX. (Confira uma das últimas fotos de tilacinos abaixo.) Mas, segundo a dupla, alguns detalhes importantes da imagem vão contra essa ideia:
Thylacinus.jpg
1)Primeiro, o focinho do animal na pintura é curto e rombudo, ao contrário da fuça “cachorresca” do lobo-da-tasmânia;
2)As patas da frente são representadas como mais robustas e musculosas que as de trás, o que está de acordo com a anatomia óssea do leão-marsupial;
3)As garras aparecem em destaque, estendidas para a frente — e, tal como a maioria dos felinos (embora não fosse um), o T. carnifex tinha garras retráteis;
4)O dedo correspondente ao nosso dedão na pata traseira é maior que os demais, outro dado que parece casar com a anatomia dos fósseis. Especula-se que o bicho tivesse um “dedão opositor” que lhe facilitava escalar árvores.
Outros detalhes que simplesmente não se fossilizam e estão presentes na pintura são as orelhas triangulares e a cauda com um aparente “pompom” na ponta. Mas o mais curioso é que o animal, representado claramente como um macho, está com o focinho diante do que parece ser a cauda de um companheiro de espécie (cuja imagem teria se apagado). Seria uma cena de acasalamento? Se sim, é mais um exemplo da obsessão da arte paleolítica pela fertilidade…
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Kim Akerman, & Tim Willing (2009). An ancient rock painting of a marsupial lion, Thylacoleo carnifex,
from the Kimberley, Western Australia Antiquity, 83 (319)

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