Lançando luz sobre artefatos do passado

bannerluz.jpgPouca gente (fora cientistas, claro; bom, às vezes nem eles…) tem estômago pra ficar pensando em metodologia e ferramentas técnicas diante de uma descoberta realmente sensacional. Mas nunca é demais lembrar que, sem essas coisas aparentemente chatinhas, nenhuma boa descoberta acontece, fora raros golpes de sorte. Por isso, como parte da nossa blogagem coletiva sobre luz, resolvi abordar rapidamente um dos métodos de datação mais legais e pouco conhecidos em arqueologia (e outras ciência do “tempo profundo”, claro): a termoluminescência.
Essa técnica, junto com sua “irmã gêmea”, a datação óptica, quebra um galhão em contextos nos quais o arqueólogo ou paleoantropólogo dá o azar de não ter à mão matéria orgânica para datar. E, sem matéria orgânica — carvão, osso, conchas etc. –, adeus possibilidade de usar o tradicional método do carbono-14, o qual depende, claro, da presença dessa forma instável do elemento carbono em matéria anteriormente viva. (Aliás, nota mental: explicar a metodologia do carbono-14 em post futuro.)
Portanto, sem restos desse tipo (imaginemos que você só achou ferramentas de pedra), o que o sujeito faz? Senta e chora? Não, graças à termoluminescência. Se houver indícios de que essas ferramentas foram jogadas numa fogueira, ou passaram um tempo de baixo do sol quente, ou se as amostras a datar são representadas por utensílios de cerâmica, nem tudo está perdido.
O que acontece é que minerais como os que compõem uma ponta de lança ou um vaso tupi possuem uma estrutura microscópica de cristal. Isso sugere que essa estrutura é ordenadíssima, e pode ser mesmo, mas volta e meia aparecem impurezas e imperfeições cuja ação funciona como “armadilhas” para os elétrons do cristal. Com o passar do tempo, aumenta a quantidade de elétrons aprisionados nessas armadilhas microscópicas.
Acontece que, quando um objeto é submetido a calor ou luz intensos, essas armadilhas são “zeradas” e os elétrons voltam para onde deveriam estar na estrutura cristalina, liberando fótons — isso mesmo, partículas de luz. Portanto, quando o vaso de cerâmica foi produzido originalmente, ou quando as ferramentas caíram no fogo do acampamento, é como se seu relógio tivesse zerado, criando, portanto, um período inicial a partir do qual determinar a idade do objeto. (É o equivalente da morte no caso do carbono-14: quando alguém morre, seu organismo cessa de absorver carbono-14, tendo, portanto, uma proporção fixa do elemento, que daí pra frente só diminui.)
Pois bem: em laboratório, basta esquentar a amostra ou iluminá-la com força e observar a energia luminosa que vem do objeto — no caso da datação óptica, luz ultravioleta. A quantidade de fótons é correspondente à quantidade de elétrons antes aprisionados, que corresponde, por sua vez, à idade do objeto. O limite da técnica é de 230 mil anos — bem melhor que os cerca de 50 mil anos do carbono-14.
Objetos como a mais antiga forma de arte humana — o bloco de pedra de Blombos, na África do Sul, com 77 mil anos (abaixo) — foram datados com ajuda dessa técnica.
blombos.jpg

Discussão - 3 comentários

  1. Claudia Chow disse:

    Interessante essa técnica, eu como geologa só conhecia técnica de datacao de idade de rocha!

  2. Atila disse:

    Essa técnica tem um erro muito grande? Se não, pq não é muito usada? (assumindo que o fato de eu não ter ouvido falar dela antes significar que ele é rara)

  3. Grande Huno,
    Ela não é tããããão rara assim, apenas meio rara. Minha impressão é que, pra contextos arqueológicos, a preferência vai pro carbono-14 pq ele fornece datas absolutas do material orgânico que vc está datando (tipo aquele osso mesmo, aquele dente mesmo). A termoluminescência é quase sempre uma datação por associação - vc data o artefato, mas se a relação estratigráfica dele com o resto do sítio estiver um tantinho bagunçada, alguém sempre pode te dizer que vc está subestimando ou superestimando a data. Abraço!

Envie seu comentário

Seu e-mail não será divulgado. (*) Campos obrigatórios.

Sobre ScienceBlogs Brasil | Anuncie com ScienceBlogs Brasil | Política de Privacidade | Termos e Condições | Contato


ScienceBlogs por Seed Media Group. Group. ©2006-2011 Seed Media Group LLC. Todos direitos garantidos.


Páginas da Seed Media Group Seed Media Group | ScienceBlogs | SEEDMAGAZINE.COM