É possível concluir qualquer coisa… (2)

Continuando a postagem de anteontem, vamos ver porque os lógicos consideram que uma contradição “explode” o discurso — e o termo técnico é esse mesmo, “explosão” — permitindo que sejam admitidas como verdadeiras quaisquer sentenças, por mais absurdas que sejam.
A primeira razão, intuitiva, é a de que a contradição acaba com a possibilidade de uma argumentação honesta: não é correto defender e atacar um mesmo ponto de vista, ainda que essa seja uma manobra confortável, já que, não importa o resultado, você terá vencido a discussão.  Também não vale aquele papo de “concordo com você, mas não exatamente…”. Se esse é o caso, então diga primeiro COM O QUÊ exatamente você concorda, ora bolas, e depois conversamos.
A segunda razão, técnica, tem a ver com a manobra lógica da disjunção. Ela é representada pela conjunção “ou”, e dá forma a sentenças do tipo: “O PT ou o PSDB governará o Brasil a partir de 2010”. Essa afirmação é uma disjunção, e é verdadeira se o PT, o PSDB ou ambos formarem o próximo governo brasileiro (existe outro uso do “ou”, o “ou excludente”, que forma sentenças como “Marcelo ou Cláudio casará com Vilma”, onde para um dos lados do “ou” ser verdadeiro o outro tem de ser falso, mas não é disso que estamos tratando no momento).
Então: para uma disjunção ser verdadeira, basta que um dos lados seja verdadeiro. O outro pode ser uma abobrinha qualquer. O Brasil fica no hemisfério sul ou Santos Dumont era marciano é verdade porque a parte sobre o Brasil é. 
Agora, vamos admitir uma contradição. Digamos: Elvis está vivo e Elvis está morto. Onde isso nos leva?
(1) Elvis está vivo e Elvis está morto (premissa dada como verdadeira)
(2) Elvis está morto (verdade)
(3) Elvis está morto ou a Terra é plana (verdade, por disjunção)
Até aí, tudo bem. Mas agora a contradição volta para nos assombrar…
Elvis está vivo (verdade, porque admitimos a sentença (1))
Só que também sabemos que…
Elvis está morto ou a Terra é plana (admitido como verdade na sentença 3)
Logo, 
A Terra é plana.
As chamadas lógicas paraconsistentes tentam domar esse problema, criando pequenos domínios onde contradições não levam necessariamente a uma explosão de conclusões absurdas. Uma possibilidade é admitir que, em vez de verdadeiro e falso (simbolizados por 1 ou 0) os valores das sentenças possam ser também frações — nesse caso, o valor final da conclusão de uma seqüência de argumentos seria, por exemplo, igual ao valor do argumento mais fraco da série, num tipo de referência semelhante (mas não necessariamente idêntico) ao que se usa para quantificar probabilidades. 
Mas na minha opinião, pelo menos, toda afirmação, desde que propriamente formulada, é ou verdadeira ou falsa. Uma idéia que parece estar entre zero e um é apenas uma idéia que não foi expressada com clareza suficiente. Logo, o princípio da explosão, embora possa ser temporariamente afastado, na verdade nunca  desaparece de vez.

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