A Biologia Sintética pode tornar sua bebida mais segura? – Um possível projeto para o iGEM 2013

Os preparativos para o iGEM 2013 já começaram e os times já avaliam as possibilidades de projetos. Nós, do time da USP, não ficamos para traz e já reunimos algumas boas idéias e começamos a explorá-las para sondarmos suas viabilidades.

Dentre essa idéias, apresento agora em uma série de dois vídeos curtos, a possibilidade de detectores de substâncias nocivas comuns encontradas em bebidas não certificadas baseado em uma levedura. O primeiro vídeo traz uma abordagem geral e inicial que fiz do assunto e o segundo vídeo, feito por Otto Heringer, explora mais a fundo possibilidades e gargalos deste projeto.

Fiquem portanto com primeiro vídeo da série!

[youtube_sc url=”http://youtu.be/0CWPcHP8jVY”]

Neurobiologia Sintética

Interciência

Esse post é parte da blogagem coletiva “interCiência“. O Amigo Oculto dos Blogs de Ciência Brasileiros! Algum blogueiro da primeira rodada escreveu esse post para o SynbioBrasil e eu escrevi um post para um dos blogs participantes (a lista dos blogs ficará disponível em breve no Raio-x). Através do estilo e tema (dentro do assunto Biologia Sintética) do post, quem você acha que escreveu esse presente que o SynbioBrasil ganhou!? Aliás, alguém suspeita de qual post fui eu que escrevi num dos blogs participantes!? Vejamos o que o nosso amigo secreto escreveu para o synbiobrasil, com vocês, o autor desconhecido!

Ao entrar na brincadeira proposta pelo InterCiência, não imaginava o quanto iria me interessar pela área estudada pelo meu blog parceiro. Como o blog trata de uma temática ainda pouco conhecida por mim, tive que, agindo como um bom cientista, estudar e pesquisar bastante para poder entender o que é essa tal Biologia Sintética e, com uma pitada da minha especialidade (Psicologia, Neuropsicologia e Psicobiologia), escrever um post que agradasse a todos e fizesse uma boa síntese dos nossos temas. E cada vez que lia mais sobre as possibilidades para essa ciência ia também me encantando com ela. E, sem amarras para o meu espírito imaginativo, escrevo para vocês sobre…

Neurobiologia Sintética:

A neurociência que realizará os sonhos da literatura de ficção científica!

As neurociências são as ciências que tem ocupado maior destaque na mídia nos últimos anos, avanços consideráveis sobre as nossas capacidades cognitivas e funcionamento cerebral a todo o momento surgem e provocam grande mobilização da mídia e mesmo do público em geral. Para entender o homem e suas nuances é preciso ir além das perguntas filosóficas e, com ciência, entender o funcionamento do órgão que gere todas as nossas funções mentais, corporais e mesmo aspectos subjetivos. Para adentrar neste mundo, apenas uma metodologia bem delineada não seria o suficiente, o entendimento do cérebro – esse órgão maravilhoso – precisa de muita tecnologia. A década de 90 – escolhida como a década do cérebro – trouxe uma infinidade de instrumentos que poderiam ser utilizados para esse entendimento e, com eles, ainda mais perguntas e possibilidades.

Como não sou especialista na área da Biologia Sintética, as limitações técnicas não me impedem de imaginar maravilhas com o que os cientistas da área poderiam fazer quando relacionada com as ciências do cérebro. Criar um organismo de materiais que nos possibilitaria fazer de forma mais efetivas as tarefas diárias ao aumentar a nossa percepção e sensação, exacerbar as nossas capacidades mnemônicas, aumentar de forma inimaginável o processamento cognitivo e assim nos dar agilidade, inteligência e, com uma maior conectividade e plasticidade neural, aumentando e melhorando a psicomotricidade, reabilitação cognitiva e, bom, para ilustrar, nos tornando mais ou menos isso aqui:

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fonte: http://robertatkinsart.blogspot.com.br

Hum… Seria realmente ótimo ter um uniforme como o do Venom criado em laboratório a partir das técnicas da Biologia Sintética, ainda mais quando se retiraria a problemática da perda progressiva de sanidade proveniente da influência telepática-neural de um organismo alienígena, mas seria isso apenas uma viagem de um aficionado pela literatura de ficção científica?

Na verdade não. Já existe uma série de projetos se propondo a aperfeiçoar a ligação entre o cérebro e os outros sistemas do corpo, além da criação de sistemas neurais e tecnológicos que nos permitam ir além da capacidade do nosso frágil corpo.

E nesse quesito, um brasileiro é um dos nomes mais próximos de criar algo parecido com esta proposta.

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Nicolelis

Miguel Nicolelis é professor de Neurobiologia e Engenharia Biomédica e co-diretor do Centro de Neuroengenharia da Universidade de Duke e é atualmente o brasileiro mais próximo de ganhar um Nobel com suas pesquisas sobre a interface cérebro-máquina.

Com seus estudos, Nicolelis conseguiu mapear as ondas elétricas disparadas pelo cérebro, e assim, desenvolveu experimentos onde seus parceiros – como costuma chamar os animais que o ajudaram – podiam mover braços mecânicos apenas com o pensamento. A proposta de Nicolelis é que na abertura da Copa do Mundo do Brasil de 2014, o chute inicial seja dado por uma criança paraplégica, utilizando uma espécie de exoesqueleto.

Se a interface cérebro-máquina já está tão perto de ser desenvolvida, poderíamos olhar com esperança para a criação também de uma interface cérebro-organismo-sintético. E este passo, só seria possível de realizar com o empreendimento de esforços de neurocientistas dispostos a conhecer mais a Biologia Sintética.

Observando as possibilidades, consigo sonhar um pouco mais. Cérebros artificiais! A Neurobiologia Sintética poderia finalmente nos presentear com um cérebro totalmente artificial, digno dos melhores livros de Isaac Asimov, com todas as competências cognitivas necessárias para a premissa Cartesiana: Penso, logo existo. Personalidade, cognição, memória e consciência sendo moldada pelas mãos de cientistas e, posteriormente, se desenvolvendo em pleno relacionamento com o ambiente em que este cérebro fosse inserido, possibilitando não só um entendimento ainda maior do nosso funcionamento mental e aprendizagem, como abrindo portas para, quem sabe, investigações mais elegantes para os temas mais espinhos da ciência atual, como o Alzheimer, a Esquizofrenia ou o Autismo. Ou mesmo temas que não parecem tão complexos, mas ainda guardam dúvidas diversas a serem respondidas, como “Por que dormimos?” ou “Por que sonhamos?”.

Ainda que exista o medo do senso comum com as possibilidades de criação da Biologia Sintética – vemos isso observando as notícias relacionadas que saem na mídia quando tratam da área, normalmente utilizando termos como “Laboratórios Frakenstein” ou “Cientistas brincando de Deus” – isso não deveria ser um impedimento para os avanços tecnológicos e científicos. Muito pelo contrário, ensinar e apresentar à população as vantagens dos trabalhos na área se faz cada vez mais necessários, pois qualquer área da ciência que ainda esteja dando os seus primeiros passos – mesmo que grandiosos – enfrenta o ceticismo e temor do senso comum, para depois – caso tenha condições científicas reais e tangíveis – crescer e contribuir para a humanidade. Apenas consigo enxergar os empreendimentos da Biologia Sintética somados às Neurociências como um caminho de desenvolvimento grandioso para a humanidade.

E assim, como os escritores que escreviam um mundo tecnológico em prol da humanidade em suas ficções científicas, só nos resta sonhar. E como os profissionais dedicados ao conhecimento, fazer ciência.

 

Este texto é parte da primeira rodada do InterCiência, o intercâmbio de divulgação científica. Saiba mais e participe em: http://scienceblogs.com.br/raiox/2013/01/interciencia/

Referências:

Blog SynbioBrasil

EASEC. Biologia Sintética: Uma Introdução. 2011. www.easec.edu

Espetáculo da ciência

We’ve arranged a global civilization in which most crucial elements profoundly depend on science and technology. We have also arranged things so that almost no one understands science and technology. This is a prescription for disaster. We might get away with it for a while, but sooner or later this combustible mixture of ignorance and power is going to blow up in our faces.”

(Carl Sagan, The Demon-Haunted World: Science as a Candle in the Dark )

[youtube_sc url=”http://youtu.be/cP2VhadII84″ title=”A%20ciência%20como%20uma%20enigmatica%20caixa%20preta%20que%20ao%20ser%20manipulada%20por%20um%20misterioso%20personagem,%20o%20cientista,%20produz%20inovações%20tecnológicas.”]

Caixa preta é um conceito que designa um sistema cujos detalhes de funcionamento são desconhecidos ou mesmo ignorados. Computadores, micro-ondas, aparelho celulares são alguns dos vários exemplos de objetos que são amplamente usados pela sociedade mas que, em geral, não há uma preocupação maior por parte dos usuários com relação ao seu funcionamento.

Grande parte da população brasileira não tem acesso à educação científica, fazendo com que os avanços tecnológicos que a ciência promove apareçam aos olhos do cidadão sob uma forma não muito diferente de um espetáculo mágico. Tem-se uma sociedade industrializada derivada dos avanços na ciência e tecnologia (sem mais discussões apontarei estas duas como indissociáveis) sentada na platéia de olho apenas para o output de uma caixa preta cuja única razão de ser é a geração de mais aplicações tecnológicas. Já o enigmático e estereotipado personagem que manipula a caixa, o cientista, faz parte de uma pequena porcentagem que detém os saberes do que está por trás do funcionamento da mesma.

Apesar de atualmente haver uma maior mobilização relacionada à divulgação científica no Brasil (como o scienceblogs), maior cobertura em revistas e jornais televisivos e principalmente na internet, o quadro ainda é frágil. A mídia, não raramente, apresenta a ciência como um empreendimento espetacular, realizado por pessoas super-dotadas, gênios que nunca cometem equívocos e que fornecem informações cem por cento confiáveis. Consequência dessa mídia exagerada é uma visão distorcida de como funciona a ciência, exemplo recente (e trágico em todos sentidos) foi o ocorrido com cientistas italianos que foram condenados por não preverem um terremoto. É dado uma grande ênfase as aplicações da ciência mas o processo de sua produção, seu contexto, suas limitações e incertezas são ignorados.

Essa falta de compreensão, reflexão e educação cientifica no entanto não impede que tenhamos uma sociedade aberta à ciência (sim!!), e como vimos bem confiante no saber tecnocientífico que superficialmente lhe é apresentada. Não é incomum, por exemplo, comerciais de televisão usarem dessa confiança no conhecimento cientifico afim de ganhar os clientes, do tipo “está comprovada cientificamente a eficácia do produto…”. Ficamos diante de uma sociedade impaciente, exigente e que aguarda cada vez mais da ciência mas que muitas vezes não consegue filtrar as informações sensacionalistas e contraditórias que lhe são apresentadas (Parece milagre! Novo remédio faz emagrecer 7 a 12 quilos em cinco meses. E sem grandes efeitos colaterais!!).

A sociedade comanda direta e indiretamente o que é produzido e proposto cientificamente. A ciência, que antes tinha somente o papel investigativo e sociologicamente marginal, tornou-se hoje o centro da sociedade humana controlada pelos poderes econômicos, estatais e subjulgada a exigências dessa  sociedade. Portanto, ao mesmo tempo que a ciência possui autoridade e é dominadora, ela também é dominada por essa demanda da sociedade meramente usuária. Isso é perigoso, vamos olhar como exemplo para um cenário particular de interesse aqui do blog; a biologia sintética é hoje uma área onde a sociedade está depositando muito de suas expectativas (e dinheiro). Esta pressão social por inovações pode ser bastante trágica nesta área, uma vez que pequenos bugs num produto biológico pode apresentar consequências drásticas.

O ponto principal a ser pensado aqui é a importância e necessidade que TODOS tenhamos consciência do que estamos criando e para que isto está sendo feito frente ao avanço cientifico e tecnológico. Para os envolvidos diretamente com ciência resta pensar no poder do que produzem, um poder pelo qual muitas vezes pode-se perder o poder. Instala-se a necessidade de uma verdadeira reflexão sobre os caminhos que os cientistas e o conhecimento científico podem seguir para que se tornem mais acessíveis. O avanço na divulgação científica tem que continuar crescendo, no entanto, prezando pela boa qualidade. Para os não envolvidos ansiosos pelas novidades do ano, pelos produtos recém-saídos do forno, embalados e “pronto para consumo” resta tomar uma postura crítica maior com relação a mudanças que afetam diretamente as suas vidas. Abrir caixas pretas é uma tarefa árdua mas o primeiro passo é se dar conta de que existem. Vale a tentativa(!!!) uma vez que o progresso da ciência e por sua vez de toda sociedade depende disso, depende das ideias inovadoras, das discussões, das críticas. Dependemos do conhecimento.

Autoria: Carolina Menezes Silvério e Marcelo Boareto.

iGEM 2012 – Projeto Campeão

Autor: Pedro Medeiros

O iGEM 2012 passou e muitas coisas interessantes rolaram. Falamos da fase regional, dos projetos que nela foram apresentados e das nossas impressões pessoais a respeito do evento mas, algo ainda falta ser mostrado!

Em uma série de 3 posts iremos falar um pouco sobre os grandes campeões do iGEM 2012, começando pelo primeiro lugar: Groningen! O vídeo abaixo contém uma uma apresentação dos principais pontos do projeto, bem como os fatores que, em nossa análise, fizeram de sua campanha um sucesso.

O time de Groningen, uma universidade holandesa, foi campeão na fase regional européia, bem como levou os prêmios de melhor pôster, melhor projeto em comida e energia e melhor apresentação com um projeto enxuto e muito bem delimitado. Um fato relevante diz respeito ao sucesso na criação de um produto real e de grande utilidade: Um dispositivo portátil que sinaliza se a carne guardada em sua geladeira ainda está boa para ser comida ou se já está na hora de você se livrar desse fóssil guardado em sua geladeira, haha.

Enfim, mais informações no vídeo abaixo! Enjoy!
[youtube_sc url=http://www.youtube.com/embed/eINwFGvXbA4]

 

Modelagem em biologia (sintética), um guia para ateus em modelagem.

Para uma pessoa que lida diariamente com biologia, pode ser bastante difícil imaginar uma maneira de abordar matematicamente um problema em sua área ou como isto poderia ter alguma utilidade. A biologia é uma ciência considerada bastante complexa, pois são muitas as variáveis que podem afetar o sistema. Até mesmo um sistema relativamente simples como a expressão de uma proteína em E. coli, pode se tornar um problema bastante complexo de se modelar se todas as variáveis que afetam a expressão desta proteína forem levadas em consideração. Na realidade, não há nem mesmo quem seja capaz de listar todas estas variáveis. Assim sendo, como é possível fazer um modelo disto, se não consigo nem mesmo listar as variáveis que alteram meu sistema? Neste caso, melhor mesmo fazer como o Calvin e ser um ateu em modelagem, não é mesmo?

Na verdade não, fazer um modelo não é tão complicado assim. Pensar que é necessário colocar tudo no modelo é o erro conceitual mais comum de quem tem formação em áreas complexas como a biologia. Já os físicos por exemplo, tem uma visão dita reducionista, de tentar entender um problema dividindo-o em pequenas partes fundamentais e começar pelo modelo mais simples possível para depois aumentar a complexidade, se necessário (ou possível). Reza a lenda que um dono galinheiro certa vez chamou um fisico para solucionar o porquê as galinhas não estavam botando. Uma semana depois o fisico apareceu com a solução. Entretanto, a solução só era válida para galinhas esfericamente simétricas e no vácuo. True story!

Pode parecer contraditório, mas um modelo que leva mais variáveis em consideração não necessariamente é melhor ou mais “realistico”. Na verdade se um modelo leva mais variáveis em consideração do que outro e ambos tem a mesma efeciência, o segundo modelo é considerado melhor, conforme veremos.

Portanto, o melhor caminho para fazer um bom modelo é considerar as poucas e relevantes variáveis do problema, ou seja, ao fazer um modelo, a principal regra é:

Keep it simple, stupid!!
Este é o famoso princípio KISS, uma boa regra para começar um modelo. A maioria dos modelos funcionam melhor e são melhor entendidos se mantidos simples. Complexidade desnecessária deve ser evitada, mas obviamente, simplicidade demasiada não deve resultar em um modelo útil (como no caso das galinhas). Assim, uma boa maneira de se começar um modelo é pensar quais são as variáveis que devem ser realmente importantes para o problema. Tente formular seu modelo com o mínimo de variáveis e veja se seus resultados condizem com o esperado, ou com os experimentos. Se isto não ocorrer, é um sinal de que seu modelo ou é demasiadamente simples e você esqueceu alguma variável muito importante ou você pode ter feito hipóteses que não sejam válidas. Fazer hipóteses condizentes não é uma tarefa na simples e exige um conhecimento profundo do problema em questão.

O principio KISS é um conceito bastante semelhante à famosa navalha de Occam. Este princípio, introduzido por William Occam diz:

“Se em tudo o mais forem idênticas as várias explicações de um fenômeno, a mais simples é a melhor.”

 

Exemplo

Para exemplificar o que foi dito, vamos brincar de modelar com um simples exemplo que discutimos certa vez em nosso grupo.

O problema consiste em estimar a concentração de uma proteína (nosso caso era a Cre recombinase) dentro das bactérias E.coli, ou seja, quantas Cre-recombinases existem, em média, por bactéria? Esta inferência é base para estimar o PoPS (veja post anterior)

Este parece ser um problema simples mas pode se tornar bastante complicado de resolver caso o princípio KISS não seja utilizado. Quem é importante neste problema? Devo considerar a temperatura? Devo considerar a quantidade de alimento no meio?

Você pode pensar, e com razão, que a temperatura e a quantidade de alimento são importantes pois afetam a taxa de produção das proteínas. Entretanto estes são exemplos de variáveis que não precisam
ser levados em consideração pois, nos experimentos não trabalharemos com situações extremas de escassez de alimento nem de mudanças de temperatura e pequenas variações destas variáveis (fora de um regime extremo) não devem afetar significantemente a produção da proteína. Muitas são as variáveis que não afetam significamente o sistema e ter intuição disto é fundamental e repito, exige um bom entendimento do problema.

OK, mas por onde começar?

Bom, sabemos que para se produzir uma proteína primeiramente precisamos da produção do RNA mensageiro. A quantidade de mRNA certamente é uma variável relevante!!!
Portanto, vamos tentar criar uma equação sobre como o mRNA deve variar no tempo. A variação temporal de uma variável é representada matematicamente pela derivada da variável no tempo  

Sabemos que nosso mRNA deve ser produzido pela leitura do DNA, feita pela DNA polimerase. OK, mas com que velocidade ela lê isto? Uma boa referencia, é o Bionumbers (tipo um google para dados biológicos)

Lá encontramos que nossa taxa de transcrição (Ktrans) é de, em média, 40 pares de base por segundo. Mas então precisamos saber qual o tamanho do RNA que gera nossa proteína. No caso da Cre é de 1032 pares de base (Nbp). Portanto, quantidade de proteína produzida por tempo e por volume (V) é de:

Dividimos pelo volume pois queremos saber a variação de concentração, ou seja, quantidade de proteínas por volume (unidade em Molar). Este será o primeiro termo de nossa equação, que se refere a produção do mRNA. Existem outras maneiras dele ser produzido? Se sim, novos termos devem ser adicionados. Neste caso, aparentemente esta é a unica forma dele ser produzido. Mas ele pode ser degradado, não é mesmo? Então precisamos de mais um termo, o de degradação. Novamente se formos até o bionumbers teremos a taxa de degradação (KdRNA) do mRNA. Este novo termo fará com que a taxa do mRNA diminua no tempo, e por este motivo ele é negativo. Portanto nossa equação fica:

Onde o termo positivo se refere a produção e o negativo se refere a degradação.

Agora vamos escrever uma equação para a tradução do mRNA em proteína. Neste caso encontramos uma taxa de tradução de 15 aminoacidos por segundo. Como nossa proteina tem 1032 pares de base ela deve ter 1032/3=344 aminoacidos. Como, além de produzida, nossa proteína também pode ser degradada então temos uma equação bastante semelhate à anterior:

Podemos supor que inicialmente a concentração desta proteína é zero, isto não fará diferença nos cálculos mas suponhamos que não haja proteina inicialmente. Ao longo do tempo, a concentração
desta proteína irá crescer até alcançar o equilibrio entre produção e degradação. Neste equilibrio, a concentração das proteínas não mudam mais no tempo e portanto nossas equações são iguais a zero. Para entender o equilibrio, pense na equação logistica que descreve a curva de crescimento de uma população de bactérias. Inicialmente temos um crescimento exponencial, mas depois de um tempo a população satura, ou seja, estabiliza em uma determinada população. Este ponto de saturação é que chamamos de ponto de equilibrio, onde a quantidade de bactérias não muda mais no tempo. Neste ponto, a quantidade de bactérias que morrem é proporcional às que “nascem”. Matematicamente o ponto de equilibrio é um ponto onde a derivada no tempo é igual a zero, portanto:

ou seja:

e

Agora podemos isolar a concentração do mRNA na primeira equação e substituir na segunda. Com isto, chegamos a:

Qual o sentido deste valor? Bem você pode utilizar o volume da bactéria e calcular qual a concentração de uma única proteína dentro de uma bactéria e você chegará que isto é aproximadamente 1 nM. Portanto, nosso resultado nos diz que há aproximadamente 2.000 proteínas, em média, dentro da bactéria.

OK, isto quer dizer que se eu fizer um experimento eu vou encontrar exatamente 2000 proteínas dentro da bactéria?

Obviamente não, devemos ter em mente a limitação de nosso modelo. Aproximações foram feitas e há muitas variáveis que podem fazer com que este valor mude. Entretanto, podemos dizer com certa segurança que teriamos algo de 1.000 à 10.000 proteínas na bactéria. Pode parecer muito inexato e que nosso modelo não foi tão útil por não ser preciso. Mas devemos lembrar que inicialmente não tínhamos nenhuma ideia de quantas proteínas haviam. Se alguém chutasse que há somente 10 ou 100 proteínas em média poderiamos pensar que era uma estimativa boa. Com o modelo sabemos que esta estimativa não é boa, que devem haver bem mais proteínas que isto!

Além da quantidade de proteína, com este simples modelo poderiamos estimar o tempo que demora para que a quantidade de proteína sature, ou seja, atinja o ponto de equilibrio. Estas são estimativas que podem ser muito úteis na hora de definir um protocolo experimental e pode economizar uma razoável quantidade de tempo e reagentes durante os experimentos.  Portanto, não é necessário de ser ateu em modelagem, mas, tampouco, é recomendado acreditar religiosamente no modelo!!

Carnaval Macabro

Bem vindo à "festa da carne"!

ResearchBlogging.orgPreparado para curtir o carnaval? Beber bastante, soltar as frangas, viver como se o mundo fosse acabar? Parabéns! Isso significa que você está vivendo o pré-apocalipse do jeito certo! Mas se você não gostar muito de carnaval e das coisas que todo mundo faz nessa época: dane-se! Você sabe que o mundo não passa desse ano mesmo!

Guerra, Fome, Peste… Escolha o seu cavaleiro do apocalipse. Se é para ser antinatural e apelativo, escolho então algo entre a Peste e a Morte. Escolho Zumbis! Vamos divagar como essas criaturas hipotéticas podem existir, e se existirem, se nós realmente estaríamos perdidos. Além de como a Biologia Sintética pode dar um empurrãozinho nisso tudo, é claro.

Jumbie, Nzambi, Zonbi… Zumbi!

Feiticeiro Haitiano, "bokor"

Apesar das referências folclóricas europeias envolvendo indivíduos que insistem em não admitir que estão mortos (como espíritos amaldiçoados e vampiros), as grandes influências na noção popular do Zumbi de hoje são mais africanas (e de outras culturas derivadas do continente mãe). Em especial no Haiti, onde o Vodu (Voodoo) é ainda culturalmente marcante. Até existem “feiticeiros” que trazem os “mortos à vida”.

Existem vários tipos de Zumbi, que podem ser classificados à partir da maneira como eles se tornam “mortos-vivos”. Acho que é possível separar o joio do trigo em duas classificações iniciais: “punição divina”, e “coquetel de substâncias” (drogas) ou “doença bizarra”. Como vamos falar de algo mais científico prefiro não comentar como um deus raivoso (ou simplesmente sacana) pode criar coisas meio-mortas .

Dorgas Zumbi

"Cadê as minhas Dorgas!?"

Os Zumbis existem de verdade, sem brincadeira. Pelo menos aqueles criados com um coquetel de substâncias. Há anos no Haiti existe o “processo de zumbificação”, em que “feiticeiros” (chamados de bokor) preparam um poderoso (e controverso) coquetel de substâncias que, segundo os praticantes do ritual, podem trazer pessoas aparentemente mortas à vida, mas sem vontade própria, sem personalidade. No caso, o indivíduo não é realmente um “morto”-vivo: fica mais para um “dopadão”-vivo.

Essa história é fascinante demais para algum cientista – e portanto nerd – não se importar. Por isso, lá nos idos dos anos 80, um canadense chamado Wade Davis viajou até o Caribe para escrever – talvez um dos primeiros estudos sobre Zumbis – o que se tornou um marco da “etnofarmacologia” (estudos de potenciais agentes farmacológicos através de referências etnográficas – resumindo: é quando um cientista “vai lá” ver se realmente faz sentido as mandigas xamânicas que a sua vó usa para curar seus “resfriados”): o best seller “The Serpent and the Rainbow” (“A Serpente e o Arco-íris” – tem um filme de terror mesmo nome baseado no livro). Nele, além das narrativas de viagem pelo Haiti, Davis documentou através de dois “informantes” duas receitas do “veneno Zumbi”, além de narrar seus efeitos nos “rituais” que presenciou. Como eu não quero ninguém criando Zumbis por aí e botando a culpa em mim, só vou mostrar os ingredientes que o Dr. Davis encontrou (como consegui-los e preparar o negócio é segredo!). Dê uma olhada aqui.

Dessa lista, os ingredientes mais interessantes são os peixes. Deles é possível obter duas neurotoxinas poderosas, componentes chave da zumbificação, induzindo catalepsia ou paralisia motora: a saxitoxina e a tetroxina (TTX). Outros sintomas dessas substâncias incluem:

  • Entorpecimento (“paralisia”) da face e de outras áreas
  • Paralisia motora das extremidades
  • Descoordenação
  • Fala “arrastada”
  • Pupilas dilatadas

Tudo isso com o indivíduo ainda consciente e com seus reflexos inalterados. Até nos piores filmes trash sobre zumbis essas características estão presentes na pantomima do ator.

Davis afirmou em sua tese de PhD que o uso do coquetel de neurotoxinas do “Zombie Poison” pode causar danos no sistema nervoso, em especial devido à TTX. Alucinógenos , bem como os danos das neurotoxinas poderiam adicionar aquele conhecido comportamento demente dos zumbis aos sintomas ditos anteriormente.

O Escândalo Científico

OK, vocês acharam que os cientistas iriam acreditar nessa história de Zumbis sem ser detalhadamente bem contada!? Sim: o senhor Davis causou um reboliço. Por cinco motivos principais:

“Indiana Jones”

Foi assim que muitos antropólogos criticaram o texto do primeiro livro de Davis, que mistura relatório científico, narrativa de viagem e história de aventura. Uma senhora pseudociência. Claramente atingido pelas críticas, Davis escreveu outro livro (“Passage of Darkness”). Mais acadêmico, agradando grande parte dos críticos:  “[O livro] Tece as conclusões de vários diferentes campos acadêmicos em um argumento provocativo…”, segundo um review da obra, que apesar dos pesares, também foi chamada de “sensacionalista”.

Caricatura

Muitos antropólogos acusaram Davis de caricaturar o Vodu como um sistema cultural fechado desde o século 18, desconectado de todas as formas de mudança social de política do Haiti.

TTX

O grande trunfo da ideia era tentar relacionar o comportamento zumbi com um efeito de uma neurotoxina, só que isso não deu muito certo. Um estudo feito por dois eminentes toxicologistas japoneses testou oito amostras do veneno zumbi que Davis coletou e encontrou a presença de TTX em apenas uma das amostras, e mesmo assim, o meio alcalino em que essa substância se encontrava a deixava farmacologicamente inativa. Isso sem falar que Davis foi acusado de forjar os resultados da presença de TTX em sua tese de PhD, apresentando os resultados antes de serem confirmados.

Questão Cultural

Alguns críticos disseram que o coquetel de substâncias era um grande efeito placebo associado a alucinógenos: só funcionava porque as pessoas realmente temiam ser transformadas em zumbi e realmente acreditavam na existência de mortos-vivos. Davis dizia que o efeito cultural tinha enorme influência no funcionamento do “zombie poison”, para ser realmente algo “zumbificante”. Críticos rebateram o argumento dizendo que não fazia nenhum sentido uma substância como a TTX – que em certas concentrações pode matar – “não fazer efeito” por uma questão cultural.

Prova

Algo que irritou profundamente os críticos foi a posição de Davis em rebater as críticas à falta de provas envolvendo a TDT. Segundo ele, assim como ele não provou nada, os críticos não provaram o contrário para refutar suas teorias. Péssimo argumento.

Assim fica difícil confirmar os efeitos relatados por Davis em sua pesquisa. Alguns dizem que grande parte da resistência acadêmica ao seu trabalho provinha da quebra de protocolos científicos referente ao estilo de relato científico de Davis, outros ainda afirmam que se a mesma pesquisa tivesse sido realizada dez anos depois, a comunidade científica da etnofarmacologia (campo interdisciplinar que une áreas quase incompatíveis, nova na época) seria mais flexível e se comportaria diferente em relação à pesquisa e como foi feita. Mesmo assim, é um jeito possível – falta provar! – de criar zumbis de verdade, mesmo que temporariamente (isso se houver sobrevivência!). Só que isso ainda está longe de criar um apocalipse.

Doenças Bizarras Hipotéticas

"Warning: Zombies!"

Um apocalipse zumbi só pode acontecer com uma doença fulminantemente transmissível e que dê características de um zumbi ao infectado. De todos os filmes, séries, livros e jogos sobre zumbis, a teoria mais interessante que explica sua existência é aquela envolvendo o vírus da raiva: essa doença é perfeita como vetor zumbificante! Partindo do pressuposto que um zumbi é um ser humano doente, agressivo  e psicótico o suficiente (perdendo até mesmo sua “personalidade”) para continuar seu comportamento agressivo mesmo quando severamente sequelado; a raiva se encaixaria muito bem em muitas dessas características. Isso sem falar no quesito biológico: ela age no sistema nervoso e se transmite pela saliva! Logo, mordida = infecção, igual a todo bom zumbi que se vê por aí na cultura pop.

O que falta então para termos uma epidemia de raiva que gere zumbis!? Três coisas: letalidade, efeitos no sistema nervoso e principalmente: a transmissibilidade do vírus.

Sendo menos letal, ou seja, demorando mais para matar o indivíduo (ou quem sabe, nem chegando a o matar), poderíamos ter zumbis que vivessem o suficiente para causarem estrago por aí. Também, se o efeito causado no sistema nervoso central se espalhasse para regiões específicas do cérebro, seria possível causar os comportamentos dementes e animalescos dos zumbis. Mas o grande fator pandêmico de tudo seria a transmissão da doença. Ultimamente, tornar super transmissível uma doença em laboratório é o grande “tiro pela culatra” do momento nos esforços em tentar fazer o oposto: combater doenças. Isso é um grande problema de…

Biossegurança

Gripe Aviária provocada pelo H5N1

Um recente trabalho submetido para publicação na Science causou grande alarde mostrando como fazer o vírus da gripe aviária (H5N1) se tornar extremamente contagioso com apenas cinco mutações “fáceis” no código genético do vírus. A pesquisa foi prontamente passada para a supervisão da americana NSABB (National Science Advisory Board for Biosecurity), e ainda há o debate entre os benefícios e malefícios da publicação de tal conteúdo, que poderia ser utilizado para construir uma arma biológica.

Com um índice de letalidade quase chegando aos 60% – controvérsias à parte, segundo outros dados, esse número poderia ser bem menor devido à um grande número de pessoas infectadas mas que não mostraram sintomas -, uma epidemia de H5N1 seria devastadora. Imagine então se fosse possível fazer o mesmo com o nosso vírus hipotético da raiva: estaríamos perdidos. Se duvida, veja o resultado de alguns modelos matemáticos simplificados envolvendo um apocalipse zumbi no Meio de Cultura.

Some a tudo isso a grande facilidade que a Biologia Sintética traz à engenharia genética. Com a padronização de partes biológicas, métodos rápidos de síntese de DNA e o crescente desenvolvimento de técnicas de biologia molecular, é extremamente mais fácil para um bioterrorista iniciar desde um  hipotético apocalipse zumbi até a uma super gripe aviária em sua própria “garagem”! O que devemos dar importância na verdade é na regularização dessas atividades, que apesar de revolucionárias, também podem ser usadas para o mal como todo grande avanço da ciência. Segundo uma recente publicação em um dos blogs da Nature, até mesmo nos EUA as políticas envolvendo biologia sintética estão devagar demais para serem implementadas. Imagine no Brasil, que nem conhece direito Synbio, e que ainda luta para conter epidemias menos letais, como a dengue.

Se 2012 é realmente o último dos anos como os Maias dizem, é melhor não acelerar o processo nesse carnaval. É a época perfeita não só para iniciar um apocalipse zumbi, mas também ideal para qualquer doença “menos pior” (ou nem tanto). Também, dado o conjunto de particularidades que devem acontecer simultaneamente para existir uma doença zumbificante, é melhor se preocupar em não se tornar um morto-vivo, mas em um “morto-morto” mesmo! Ou pelo menos em não ficar tão estúpido quanto um zumbi.

 

Referências

Papers

Albuquerque, UP. et al. (2011). Natural Products from Ethnodirected Studies: Revising the Ethnobiology of the Zombie Poison Evidence-Based Complementary and Alternative Medicine, 2012 : 10.1155/2012/202508

Inglis D (2010).The Zombie from Myth to Reality: Wade Davis, Academic Scandal and the Limits of the Real scripted, 7 (2) : 10.2966/scrip.070210.351

Sites

Nature News Blog: “Report finds US slow to implement synthetic biology policies

NewScientist: “Five easy mutations to make bird flu a lethal pandemic

Info: “Cientista cria vírus H5N1 mutante, super contagioso

 

Blogagem coletiva Fim do Mundo

Esse foi um post da blogagem coletiva “2012: o último carnaval?” promovida pelo ScienceBlogs Brasil, com a colaboração especial do desenhista Pedro Pantai, que elaborou a primeira imagem desse post. Clique nela para acessar o blog de tirinhas do artista.