Paradoxo de sexta (30)
O da semana passada foi o Paradoxo do Compatibilismo. “Compatibilista” é o nome dado à postura filosófica de que o determinismo — a ideia de que todos os fenômenos do universo são causados por outros fenômenos, segundo leis fixas — e a noção de que agentes conscientes têm livre arbítrio são compatíveis.
Um dado curioso a respeito do compatibilismo é de a maioria das pessoas é, instintivamente, compatibilista (as pessoas acreditam que o universo segue leis, e também acreditam que são livres). Mas basta pensar um pouco no assunto para notar que existe uma contradição — ou a sugestão de uma contradição — aí. Afinal, se minha decisão de digitar a palavra “digitar” foi causada pelo movimento dos elétrons no meu cérebro, então eu não decido nada: sou um escravo dos íons em meus axônios.
A questão do compatibilismo tem várias ramificações e abordagens (recomendo fortemente Freedom Evolves, de Daniel C. Dennett), portanto vou me limitar a citar aqui apenas três pontos a favor dessa doutrina:
(a) Existe uma diferença entre causa “necessária” e causa “suficiente”. Por exemplo, pra que a rua esteja molhada é suficiente que o vizinho lave a calçada, que chova, que um caminhão-pipa vaze enquanto espera o sinal abrir, etc. O fato de que todo fenômeno tem uma causa suficiente não implica que haja causas necessárias — isto é, inescapáveis — também para tudo.
(b) O Teorema de Turing: Allan Turing demonstrou um impressionante teorema dando conta de que é impossível criar um programa de computador genérico capaz de prever à perfeição se outros programas vão rodar direito ou travar. Isso significa que até mesmo a coisa mais determinística já criada pelo homem — conjuntos de instruções precisas encadeadas de forma lógica — são, a partir de um certo grau de complexidade, imprevisíveis. Talvez pudéssemos dizer, de certa forma, livres?
(c) O que, afinal, queremos dizer com “liberdade”. Muitas vezes, a noção de livre arbítrio parece referir-se a um poder de abstração absoluto, que permitiria a uma pessoa tomar uma decisão de forma totalmente independente das circunstâncias, das emoções, das condições físicas e das consequências em jogo. Mas isso faz sentido? Afinal, a necessidade da decisão nasce, exatamente, das circunstâncias, condições físicas, emoções, consequências. O nível de desapego implícito nesse conceito de livre arbítrio simplesmente nega a possibilidade de se decidir qualquer coisa.
Para esta semana, voltamos ao reino da matemática.
É óbvio que (1/3) x 3 = 1.
Mas também é verdade que 1/3 = 0,3333333… (consulte sua calculadora, se duvida!).
Mas (0,3333….) x 3 = 0,9999999…., que é menor que 1 — só um pouco menor, claro, mas a matemática devia ser uma ciência exata, certo? Então, onde foi parar o 0,00000….9 que sumiu?
Discussão - 5 comentários
Sendo x = 0,999…, podemos ter algo como 10x – x = 9,999… – 0,999… : 9x = 9 : x = 1.
Então, matematicamente, 0,999… = 1.
Ou há alguma falha aí?
Na verdade o que sumiu foi 0,00000….1
Faz tempo que eu vi isso, acho que é Calculo certo? esse 0.3333… se estende a tal ponto que chega à terça parte de um e o 0.9999… do mesmo jeito na verdade chega até o um. Só não tem um número que represente a terça parte de um, então usamos esse ai.
Eu acho hehe
Na verdade o que sumiu foi 0,00000….1
Faz tempo que eu vi isso, acho que é Calculo certo? esse 0.3333… se estende a tal ponto que chega à terça parte de um e o 0.9999… do mesmo jeito na verdade chega até o um. Só não tem um número que represente a terça parte de um, então usamos esse ai.
Eu acho hehe
O problema está no infinito.
Neste caso, o 0,00000….9 que você cita continua lá.
Ele é um número finito e tão bem compreendido quanto 1, 2 ou 10.
Quando represento a dízima periódica 0,33333… na forma 1/3 tudo fica mais fácil. Mas quando uso as reticências as coisas não ficam tão óbvias.
Se considerarmos apenas duas casas após a vírgula, a razão 1/3 se torna (aproximadamente) 0,33.
E 0,33 x 3 é 0,99. O erro foi devido ao arredondamento. Qualquer valor mínimo que eu acrescente (neste caso limitado por duas casas após a vírgula será 0,01) chegarei ao 1,00.
O número que você argumenta que sumiu é finito está entre 0 e 1,000000…
Para que 0,333… x 3 se torne 1,0000… temos que levar em conta que será “no infinito” onde …999 virará …100. A chave está aí.
O “bug” surgiu quando percebemos que a razão entre dois números finitos dá algo só bem representado pela noção de infinito.
Para lidar com infinito podemos apelar para o próprio ao fazer:
dízima – D = 0,333333….
O que queremos é que 3xD = 1. Como,
D = 0,3333… = 0,3 + 0,03 + 0,003 + 0,0003 + …,
podemos fazer:
10xD = 3 + 0,3 + 0,03 + 0,003 + …
10xD = 3 + D,
que bacana, eliminamos as reticências. Agora podemos voltamos a visualizar o raciocínio por trás disso:
(10 – 1)xD = 3
9xD = 3
D = 3/9
D = 1/3,
multiplicando os dois lados da equação por 3:
3xD = 3/3
3xD = 3x(0,33333…) = 1.
Para corrigir o “bug”, só mesmo eliminando as reticências para que a lógica volte.
Note que tive que retroceder da dízima para a fração, o que não era tão direto assim. Uma vez com a fração de volta a partir da dízima (representada por D), o raciocínio saiu facilmente.
Um grande abraço,
Alessandro
Nunca vi tamanha asneira matemática.