Livros lunáticos
Perguntaram-me, numa postagem anterior, sobre quais livros já foram escritos propondo e defendendo planos de negócios (por assim dizer) que viabilizariam a presença humana sustentada em Marte e/ou na Lua.
A lista abaixo não é exaustiva, mas pretende representar um corte transversal da bibliografia. Para os de estômago fraco (e/ou com inclinações políticas e ideológicas mais à esquerda) já aviso que muitos desses planos pressupõem um sistema solar dominado por algo muito próximo de um capitalismo laissez-faire e a revogação de tratados da ONU como os que declaram a Lua e os corpos celestes patrimônio comum da humanidade.
(O raciocínio sendo, bolas, por que alguém investiria numa operação de mineração na Lua se o terreno e o lucro não seriam dele, e sim “da humanidade”?)
Os livros são:
The High Frontier – Human Colonies in Space, de Gerard K. O’Neill. É o clássico do gênero, ainda que esteja ultrapassado em vários pontos. O’Neill foi uma espécie de Carl Sagan da colonização espacial, no sentido de ter lutado muito para popularizar a ideia e vendê-la às autoridades. Seus planos eram ciclópicos: previam a construção de enormes cilindos no espaço, dentro dos quais vivieriam populações comparáveis às de cidades inteiras.
The Case for Mars, Robert Zubrin. Zubrin é o fundador e presidente da Mars Society, uma ONG que faz lobby para que os EUA mandem logo astronautas a Marte. Seu livro apresenta um plano para a conquista de Marte que foi canibalizado pela Nasa em vários aspectos, e enfatiza um conceito, o ISRU — In Situ Ressource Utilisation, ou uso de recursos locais — que hoje está em praticamente todo e qualquer plano de viagem espacial que aparece por aí. Basicamente, a ideia é preparar os astronautas pra se virarem com o que houver no ambiente que vão explorar, em vez de mandar todo o ar, água, comida e combustível de que precisam diretamente da Terra.
Mining the Sky, John S. Lewis. Neste livro, Lewis apresenta o sistema solar, seus planetas, asteroides, luas e cometas como a solução para o esgotamento dos recursos naturais da Terra, pra a crise ecológica e para a pobreza. O argumento básico é de que qualquer plano realista para trazer a humanidade a um padrão de vida sustentável sem assimilar os recursos do espaço implicaria, basicamente, em levar a raça humana de volta aos padrões demográficos, econômicos, culturais e tecnológicos da idade média — e mantê-la assim pelos séculos amém.
Moonrush, Dennis Wingo. Este é um livro que se lê realmente como um plano de negócios. O argumento de Wingo é parecido com o de Lewis (ver livro cima), mas ele foca especialmente a Lua e é bem mais detalhista. O subtítulo é exatamente “Melhorando a vida na Terra com os recursos da Lua”. Wingo faz uma troça impiedosa com a ideia de uma “economia do hidrogênio”, e apresenta os cálculos do dano ambiental causado por uma mina de platina — metal necessário para as células de combustível a hidrogênio — e conclui que a emenda acaba sendo muito pior que o soneto.
Return to the Moon, Harrison H. Schmitt. Este é talvez o livro que carrega maior autoridade de todos os já citados — não só seu autor, Harry Schmitt, é o único geólogo que já trabalhou na Lua (foi membro da missão Apollo 17) como conta, ainda, com prefácio de Neil Armstrong. É uma pena, portanto, que o livro muitas vezes soe como um panfleto do Partido Republicano (pelo qual Schmitt serviu um mandato como senador). Ainda assim, a obra tem um plano de negócios e apresenta diversas propostas de reforma institucional necessárias para que se abra o espaço à livre iniciativa.
Living off the Land in Space, com o subtítulo “Estradas Verdes para o Cosmo”, tem três autores — Gregory L. Matloff, Les Johnson e um artista-ilustrador, C. Bangs. Este livro é basicamente um conjunto de artigos sobre como a expansão da humanidade pelo sistema solar pode ser feita, e os modos pelos quis essa expansão pode beneficiar a Terra, economica e ecologicamente. Este é mais recente de todos os livros citados aqui, e como se vê no título, já assume como pressuposto o conceito de ISRU (confira a entrada sobre The Case for Mars.)
Discussão - 3 comentários
Obrigado pela lista!
De todos, eu só conhecia mesmo o Return to the Moon, ainda assim, só e "ouvir falar".
Vou agora mesmo correr atrás deles em sebos e bibliotecas!
A propósito, bem que eu estava desconfiando desse "The Case for Mars"...não seria esse livro do Arthur Clarke? Ou é homônimo?
Oi, Wendell! O Case for Mars tem prefácio do Clarke... será que não é isso que está causando confusão?