Paradoxo de sexta (42)

Nos comentários sobre o da semana passada, o Paradoxo de Braess, surgiu a ideia de que ele nasce do fato de que cada pessoa tende a buscar o que é melhor para si mesma, sem pensar na coletividade. Isso é parte da solução, mas a explicação global é mais complexa, já que envolve o Equilíbrio de Nash (é, aquele Nash). Um Equilíbrio de Nash é uma situação onde nenhum participante de um jogo é capaz de melhorar seu resultado sozinho.
Meu exemplo favorito é o do trânsito em São Paulo: suponha que você, um cidadão dotado de espírito público e ecológico, decida passar a deixar o carro em casa e a ir de ônibus para o trabalho todos os dias. O que acontece?
Há uma boa chance de que a sua qualidade de vida e a de outras pessoas piore muito — já que sua presença no ônibus vai aumentar a lotação para todos os que estão lá — e a qualidade de vida do restante a população não melhore nada (afinal, um mísero carro a menos não vai acabar com o congestionamento, e nem limpar o ar da cidade).
No caso do Paradoxo de Braess, é isso o que acontece: fechar a rua pode ser, eventualmente, o único jeito de melhorar o trânsito porque isso força uma mudança coordenada e coletiva, que é a única coisa capaz de quebrar o equilíbrio.
(Deixo ao leitor a sugestão de refletir sobre o que o fato de existirem equilíbrios de Nash diz a respeito da mão invisível do liberalismo laissez-faire e da necessidade, ou conveniência, da ação do Estado na economia.)
Em termos do jogo de futebol, onde podemos tratar os jogadores como “ruas” que a bola pega para chegar ao gol — sei que parece mais natural tratar os jogadores como os nós da rede, mas o modelo que apresento, onde os nós são posições do campo e os jogadores, as arestas, também faz sentido e permite algumas simulações úteis — o artilheiro do time pode se tornar uma “via congestionada”, criando um Equilíbrio de Nash em campo. Sacá-lo do time pode forçar a equipe a encontrar vias alternativas.
O desta semana é o Paradoxo do Cérebro de Boltzmann (nada a ver com o Cérebro de Donovan, romance de ficção científica de Curt Siodmak, que também é o autor da história em que se baseia o novo filme de Lobisomem com Benicio Del Toro…).
Boltzmann, no caso, é o cara da entropia termodinâmica. Você sabe: num sistema fechado, a energia tende a dissipar-se em formas inúteis, as temperaturas tendem à uniformidade e, cedo ou tarde, todos morreremos de tédio.
À constatação de que, estatisticamente, o universo tende à uniformidade desordenada, soma-se a constatação de que no universo existem estruturas altamente organizadas — os cérebros (ou seus análogos) das formas de vida inteligentes. E a essas duas constatações, acrescenta-se uma outra: cérebros surgiram tarde na história do universo. É como se, num sistema de passou bilhões de anos rolando ladeira abaixo, movendo-se na direção da desordem, de repente alguma coisa desse um enorme salto para cima.
Nada, nas leis da terdodinâmica, proíbe o surgimento espontâneo e pontual de ordem: com uma infinidade de partículas flutuando à vontade por aí, é praticamente inevitável que uma ou duas de vez em quando se juntem num padrão interessante — um triângulo, um quadrado, uma rosa, um cérebro.
É aí que entra o paradoxo: É infinitamente mais provável que um único cérebro surja espontaneamente do caos termodinâmico, repleto de memórias e sensações falsas, do que bilhões de cérebros capazes de interações reais. Ou: O Universo que observo é extremamente mais complexo que o que seria necessário para justificar a existência de minha mente.
Será, então, que só eu (ou você?) existo, e todo o resto é ilusão do caos termodinâmico? cartas para a redação.

Discussão - 2 comentários

  1. Igor Santos disse:

    Questão de ponto de vista.
    Para mim, meu cérebro é um primor organizacional da natureza, mas ele é apenas parte de um sistema tão pequeno que se torna cosmicamente desprezível.
    Mas eu devo admitir que não entendi direito o de hoje.

  2. André Souza disse:

    Tome cuidado com este tip de paradoxo...dq a pouco vai ter nego pensando em fundar uma religião dizendo q deus é o único cérebro e que somos todos lembranças do cérebro único...ehehe
    Esqueci...
    Este tipo de gente não costuma vir aqui (eu acho)

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