Uma fria manhã de inverno

Imagine uma fria manhã de inverno. Você acorda, olha pela janela e vê tudo branquinho lá fora (pelo menos aqui no sul….). Aí você acha tão lindo que tira uma foto! Ela vai se parecer muito com essa aí em cima, embora uma coisa não tenha nada a ver com a outra…. Essa imagem na verdade corresponde a nanofibras de SnO2 – a técnica para sua obtenção foi a microscopia eletrônica de varredura, e o artista chama-se Suresh Donthu, da Northwestern University. Essa imagem ganhou o primeiro lugar do prêmio Science as Art de 2007, promovido pela MRS.

P.S.: Se eu mesma não tivesse lido no site que se trata de imagem de nanofibras, não teria acreditado.

P.S.: Essa brincadeira de descobrir o que são as imagens obtidas por microscopia eletrônica está sendo feita pelo pessoal da Globo na série de reportagens sobre nanotecnologia do Jornal Bom Dia Brasil, que passa às 7h30 – se quiser ver as imagens, clique aqui. Até o momento, nenhum absurdo foi dito – só acho que poderia ter sido traçado um panorama mais amplo sobre as pesquisas brasileiras na área, há muita gente boa trabalhando com o assunto nesse Brasilzão e é legal valorizar isso.

O espaço… a fronteira final.

Estas são as viagens da nave estelar Enterprise. Sua missão de cinco anos: explorar novos e estranhos mundos, procurar novas formas de vida, novas civilizações, audaciosamente indo onde nenhum homem jamais esteve …

Sim, sou nerd e gosto de Star Treck. O capitão Kirk era meio canastrão, mas o Dr. McCoy era impagável! E, claro, tinha o Spock. Quando vi a imagem aí em cima, juro que pensei naquela musiquinha de abertura da série antiga.
E você, acha que a foto acima é de algum objeto estelar? Há! Não é não! Tudo bem, você já deve estar descolado e não se deixou enganar, não é mesmo? A imagem foi obtida por microscopia eletrônica e nada mais é que pólen revestido por dióxido de titânio (que é a mesma substância que compõe protetores solares para a pele e está presente em várias maquiagens).
O tamanho do pólen está muito longe das dimensões planetárias – é de apenas 200 micrometros (o que equivale à espessura de uns 2 fios de cabelo juntos). A cor e os efeitos de luz ficam por conta do programa de imagem usado pelo “artista”, Samuel Shian, do Georgia Insitute of Technology.

(essa imagem ganhou o segundo lugar no prêmio “Science as Art” de 2007 da MRS)

Além de nerd, como diria alguém, adoro um clichê. Então, nada mais justo que encerrar esse post com um:

“Vida longa e próspera!”
Hehehe, até mais 😀

Grandes personalidades da nanociência e nanotecnologia: Gerd Binnnig e Heinrich Rohrer

1981. Grande ano! Você lembra dele? Bem, eu não – minha memória não chega a tanto, pois nesse ano longínquo ocorreu justamente o meu nascimento. Como a relevância de tal fato para o resto do mundo (excluindo a minha mãe, obviamente) não é lá grande coisa, vou tratar de um acontecimento realmente impactante de 1981 que mudou a forma como a humanidade enxerga o mundo… literalmente!

Foi nesse ano que dois criativos funcionários da IBM, o suíço Heinrich Rohrer e o alemão Gerd Binning, desenvolveram uma técnica de microscopia eletrônica capaz de mostrar imagens na escala do átomo em uma superfície metálica ou semicondutora. A técnica foi batizada de microscopia eletrônica de tunelamento. Nessa técnica, uma ponta metálica de dimensões quase atômicas passa a uma distância muito próxima da superfície da amostra (como um scanner) de forma que ocorre o tunelamento de elétrons entre a ponta metálica e a amostra. A ponta metálica atua como aquela agulha dos aparelhos para escutar disco de vinil, subindo e descendo conforme a rugosidade da superfície. O resultado é uma imagem digital tridimensional da superfície, muito útil para detectar a presença de defeitos de superfície e para determinar o tamanho e conformação de moléculas e agregados ali presentes.

Tunelamento eletrônico é um efeito quântico que permite que ocorra uma corrente de elétrons entre duas superfícies muito, muito próximas. O espaço entre duas superfícies é considerado uma barreira de potencial, e quanto mais fina for a espessura dessa barreira, maior é a probabilidade do elétron de atravessá-la. Quando eu me refiro a “fina”, é fina mesmo, na escala de Angstrons (ou seja, igual a 0,0000000001 m !!!!).

O primeiro microscópio desse tipo foi desenhado pelo cientista alemão Ernst Ruska. A invenção da técnica que permitiu que o mundo “visse” átomos na superfície de materiais e os manipulasse rendeu a Rohrer e Binning o prêmio Nobel de Física em 1986, e originou uma foto que se tornou lendária além dos muros da academia.

(crédito: Laboratórios de pesquisa da IBM em Almaden)

Il nome della rosa

Imagem que ganhou o primeiro lugar, empatado com mais duas (uma delas é o nano-ursinho Teddy) no concurso de 2008 da MRS.
Autoria: PaiChun Wei, National Taiwan University.

“Stat rosa pristina nomine, nomina nuda tenemus”
(A rosa antiga permanece no nome, nada temos além dos nomes)
A rosa é uma flor cheia de significados nas culturas ocidental e oriental. Essa flor era consagrada à deusa egípcia Isís, e era também símbolo da deusa grega do amor Afrodite. Para os romanos, as rosas eram uma criação de Flora, deusa da primavera e das flores. Na tradição Hindu, a deusa do amor Lakshmi nasceu de uma rosa. Posteriormente, o cristianismo adotou a rosa como o símbolo de Maria.

Inúmeros são os mitos sobre a rosa, que como sabemos é símbolo do amor. Algo que não é tão notório é que o miolo da rosa fechado fez com que a flor também fosse símbolo de segredo em muitas culturas. Um costume medieval era colocar uma rosa no teto da sala de reuniões indicando que, onde houvesse a flor no teto, os assuntos deveriam ser mantidos em segredo.

É claro que algo tão carregado de simbolismo não poderia faltar no mundo nano!!! A imagem acima, que parece uma linda rosa vermelha, foi obtida através da reação de indio e ácido hidrazoico (HN3), que produziu uma estrutura cristalina de nitreto de indio (InN) do tipo wurtzita. Cabe salientar que a imagem foi obtida por microscopia eletrônica e colorizada depois em computador.

Wurtzita parece uma daquelas palavras de sociedades secretas medievais? Que nada, é só o nome de como os íons se organizam no espaço para formar um certo tipo de cristal. As unidades cristalinas de sal de cozinha, por exemplo, se organizam como cubos – sendo que o cloreto e o sódio ficam nos vértices do cubo. O cristalzinho de sal que vemos é a união de milhares de unidades cristalinas de cloreto de sódio. Viu? Nenhum segredo – apesar da nano-rosa no teto desse post.

Um campo de girassóis poético

(primeiro lugar do prêmio “Science as Art” de 2008, da MRS, de autoria de K. Hark, Chinese University of Hong Kong – “Field of Sunflowers”)

Linda foto de girassóis, não é mesmo?

Hummm, girassóis? Parece… mas não é !
Essa é mais uma daquelas imagens obtidas por microscopia eletrônica e colorizada depois com fins artísticos. Também há arte e poesia no nano(bio)mundo!

Nanofibras de óxidos de silício possuem a habilidade de se organizar de várias formas, inclusive como essa, que se assemelha de forma impressionante a girassóis. Gálio e ouro atuaram como catalisadores da reação entre silício e oxigênio que resultou nessas lindas nanofibras, cada uma com cerca de 10 nm de diâmetro.

Não acha a reação das nanofibras poética? Pois bem, para ninguém dizer que não há poesia nesse post, transcrevo abaixo um dos meus poetas favoritos, no seu melhor heterônimo (na minha humilde opinião):

“O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás…
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem…
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras…
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo…”

(Alberto Caeiro)

Nano ursinho Teddy

(Nano Teddy Bear – um dos três trabalhos empatados como primeiro lugar do prêmio Science as Art no encontro da MRS de 2009 – de autoria de Helia Jalili, University of Waterloo)

Essa é pelo dia dos namorados. Que tal dar um (nano)ursinho para sua namorada nessa sexta-feira? Essa é mais uma imagem de nanocoisas, colorizada depois de obtida para ficar “artística”. O que nos parece um ursinho fofo no meio de outros bichinhos de pelúcia na verdade é óxido de zinco depositado em um substrato de óxido de indio. A técnica empregada para obter a imagem chama-se microscopia eletrônica de varredura, e o óxido de zinco foi depositado por uma técnica de deposição eletroquímica.
A deposição eletroquímica funciona assim: o elemento metálico (no caso, zinco), que está inicialmente na forma de um eletrólito solúvel no meio, é transformado em uma forma insolúvel (no caso, óxido de zinco) através de eletrólise. Estando insolúvel, ele se deposita sobre o substrato (no caso, óxido de indio), formando um filme finíssimo na sua superfície. O eletrólito de partida para produzir a imagem acima foi o nitrato de zinco hexaidratado (cuja fórmula química é [Zn(NO3)2 . 6H2O] ).

Perdeu um pouco do romantismo? Que nada, é só olhar a imagem novamente – eu, por exemplo, continuo vendo um ursinho muito fofo!

Glossário:

Eletrólise = é um processo que separa os elementos químicos de um composto através do uso da eletricidade.
A reação feita para produzir o revestimento de óxido de zinco na imagem acima é:
2[Zn(NO3)2 . 6H2O] —–> 2ZnO + NO2(g) + O2(g) + 6H2O

Nano spaghetti com almôndegas

(One of three first place winners of the the Science as Art competition at the 2009 MRS Spring Meeting. Submitted by Blythe G. Clark, Sandia National Lab., and Dan Gianola, Forschungszentrum Karlsruhe GmbH)

Essa foto está na última Newsletter da Materials Research Society. É uma imagem obtida pela técnica de microscopia eletrônica de varredura, e colorizada depois para ficar “artístico”. O “spaghetti” da foto nada mais é que uma coleção de nanofibras de ouro com 100 nm de diâmetro. As “almôndegas” são feitas de partículas de silício, com diâmetro de cerca de 1,5 micrometro.
Na microscopia eletrônica de varredura, feixes de elétrons são emitidos por um filamento capilar de tungstênio e incidem sobre a amostra. O resultado que vemos é a transcodificação da energia emitida pelos elétrons em uma imagem que reflete a “topografia” da amostra.

Buon appetito !

Se a gente não consegue ver as nanopartículas, como se faz para determinar o tamanho delas?

Quem pensou em microscópio eletrônico, acertou …. em parte. Antes de inventarem o microscópio eletrônico, já era possível determinar o tamanho de nanopartículas. Não acredita? Pois bem, uma brincadeira que todo mundo já fez na vida é olhar a dança das partículas de poeira suspensas no ar em um quarto na penumbra, com uma janela semi-aberta onde apenas alguns raios de sol possam passar (um amigo meu, quando era pequenininho, queria pegar um raio de sol desses de qualquer maneira – existe até uma foto do fato, mas essa é outra história). Alguém já se perguntou por que a poeira só é visível quando a luz incide sobre ela? Pois é, um físico da Grã-Bretanha chamado John Tyndall deve ter se perguntado justamente isso lá no século 19. Ele descobriu que as partículas de poeira refletem a luz. O que nós vemos não é a poeira em si, mas sim o efeito da luz sobre ela. Hoje chamamos esse fenômeno de efeito Tyndall.

Lord Rayleigh, o cientista que estudou o espalhamento de luz em partículas muito pequenas e, com isso, tornou possível determinar o tamanho de nanopartículas antes da construção do primeiro microscópio eletrônico.

Ah, mas a poeira do ar pode ser vista em microscópio óptico – portanto não é nanométrica! É verdade, mas John William Strutt, terceiro Barão Rayleigh e prêmio Nobel de física de 1904, descobriu um fenômeno parecido para partículas nanométricas. Lord Rayleigh percebeu não só que um feixe de luz pode ser espalhado por nanopartículas (que é quase a mesma coisa que refletido), mas também que a intensidade de luz espalhada depende do tamanho da nanopartícula e do ângulo de observação em relação ao feixe de luz que incide na amostra. A partir desse princípio, foi possível explicar porque o céu é azul (outra pergunta que todo mundo já se vez na vida). É esse fenômeno, chamado hoje de espalhamento Rayleigh, que os pesquisadores usam para determinar o tamanho de suas nanopartículas. Até porque ir correndo ao microscópio eletrônico no dia-a-dia de erros e acertos do lab, para contar um monte de nanopartículas em uma foto, além de mais trabalhoso (às vezes passa-se um turno inteiro tirando fotos de uma ou duas amostras) é bem mais caro.

Uma curiosidade: duas crateras, uma em Marte e outra na Lua, foram batizadas como Rayleigh em homenagem a esse Lord da ciência.

Uma diferença que pode auxiliar na cura e diagnóstico do câncer

ResearchBlogging.org

Pesquisadores da Clarkson University (New York, USA) identificaram uma diferença importante nas propriedades de superfície de células normais e cancerosas. As células epiteliais humanas apresentam uma superfície “enrugada” devido às suas microvilosidades, lembrando uma escova. Os pesquisadores descobriram que o comprimento dessas microvilosidades nas células cancerosas é o dobro que nas células normais. Isso significa que células cancerosas e normais podem interagir de maneira diferente com nanopartículas, algo que poderia ser explorado para detecção e tratamento do câncer via drug delivery.

Créditos: Sokolov Group, Clarkson University

Os resultados dessa pesquisa foram obtidos empregando-se uma técnica chamada microscopia de força atômica (AFM, na sigla em inglês). Nessa técnica, um microcantilever com um probe faz a varredura de uma amostra submetida a um campo elétrico, o que permite determinar sua topografia. A resolução da AFM é de frações de um nanometro, podendo-se “visualizar” estruturas com dimensões atômicas.

Iyer, S., Gaikwad, R., Subba-Rao, V., Woodworth, C., & Sokolov, I. (2009). Atomic force microscopy detects differences in the surface brush of normal and cancerous cells Nature Nanotechnology, 4 (6), 389-393 DOI: 10.1038/nnano.2009.77

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