Paradoxo de sexta (12)

O da semana passada envolvia um erro até que bem estúpido no cálculo de porcentagens (ou não tão estúpido assim, dada a incapacidade da maioria das pessoas em entender conceitos envolvendo porcentagens em geral, como juros compostos). Resumindo, com um desconto de 10% em cada dúzia de cervejas, nosso amigo beberrão estará pagando por 11 cervejas (10,8, mais precisamente) ao comprar uma dúzia. Com 12 dúzias (144 unidades), ele terá pago por 129,6 cervejas, e não por 144. Agora, 144 – 129,6 = 14,4, ou seja, 10%, e não 120%.
Ao de hoje: em homenagem ao caso Cesare Battisti,  vou apeesentar o Euatlo, ou o Paradoxo do Tribunal. Deve o nome a Euatlo, aprendiz do sofista Protágoras (sofistas, que ganharam uma má reputação por conta da falta de honestidade intelectual inerente à atividade, eram pensadores e retóricos gregos que se orgulhavam de ser capazes de argumentar a favor de qualquer coisa, por mais absurda que fosse, e principalmente se alguém os pagasse bem; algo como os modernos advogados). 
Bom, como eu ia dizendo: Euatlo fez um curso com Protágoras e prometeu pagar pela instrução assim que vencesse seu primeiro caso no tribunal (a ligação entre sofistas e advogados, como se vê, vem de longe). Por algum motivo, essa vitória demorou a chegar (Euatlo não conseguia clientes), Protágoras então perdeu a paciência e processou o ex-aluno, exigindo pagamento.
No tribunal, Protágoras argumentou da seguinte forma: se a corte decidir que Euatlo tem de me pagar, ele tem de me pagar; se a corte decidir que Euatlo não tem de me pagar, ele terá vencido seu primeiro caso e, portanto, tem de me pagar.
Euatlo já encarava a coisa de forma diferente: se a corte decidir que não tenho de pagar, então não tenho de pagar; se a corte decidir que tenho de pagar, então também não tenho de pagar, porque isso representará uma derrota e não terei vencido ainda meu primeiro caso.
E aí, quem está certo?

Discussão - 5 comentários

  1. Silvio disse:

    Acho que os sofistas de hoje não são os advogados, são os jornalistas.

  2. Conrado disse:

    Vamos lá... acho que Protágoras está certo. Os dois argumentos de Euatlo são incorretos:
    "se a corte decidir que não tenho de pagar, então não tenho de pagar"
    A decisão jurídica não não altera a promessa que ele fez.
    "se a corte decidir que tenho de pagar, então também não tenho de pagar, porque isso representará uma derrota e não terei vencido ainda meu primeiro caso."
    Ele prometeu que iria pagar quando vencesse seu primeiro caso, mas não *somente* quando vencesse seu primeiro caso.
    Não me convenci muito, mas foi o melhor que consegui.

  3. João Carlos disse:

    Afinal, o que o tribunal vai resolver?... Se o "contrato" entre Protágoras e Euatlo é válido.
    Caso o tribunal declare o contrato válido, Euatlo terá que pagar... quando ganhar a primeira causa! (São os termos do contrato). Caso contrário, Euatlo fica livre da dívida.
    Como dizem que Voltaire disse: "Duas vezes eu fiquei arruinado: a primeira, quando perdi uma causa; a segunda, quando ganhei outra"... 🙂

  4. Roberta disse:

    Bem, acho que Protágoras está correto, pois, ao meu ver, em seu argumento, Euatlo está escondendo uma verdade: A de que, uma vez ganho um processo, ele tem de pagar Protágoras. E se a corte disser que ele não tem de pagar, então ele terá ganho a causa. Euatlo não ta errado, mas está omitindo uma verdade (ou não, confesso que to confusa heauehuahe)

  5. Jr. disse:

    Ao meu ver é simples.
    O caso a ser julgado é um processo pelo atraso do pagamento por parte do aluno.
    Ponto.
    O juiz decidirá com mérito nisso, se achar que a aposta é válida então no caso Protágoras(P) terá perdido o processo. Em consequência Euatlo(E) ganha.
    Mérito julgado, a partir desse momento (E) passa a dever a (P), a partir de então, se mesmo assim (E) não pagar, P deveria abrir outro processo por não cumprimento da promessa.
    Se o Juiz por contrário, decidir que (P) merece receber mesmo a promessa estando de pé e ainda não cumprida, (P) ganhará e (E) terá de pagar, mas não nos méritos da promessa inicial e sim por decisão judicial.
    Portanto, jogada muito inteligente de (P), mas não há paradoxo, apenas uma armadilha que já estava presente desde o primeiro momento da promessa, de fato, (P) poderia ter processado (E) logo em seguida à promessa.
    (desconsiderei penalizações a (P) caso ele perdesse o processo)

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