Paradoxo de sexta (45)
Como bem notado, o da semana passada se resolve simplesmente imaginando um outro monge subindo o morro da mesma forma que o original (ou, para quem gosta de ficção científica, o monge original, depois de chegar no topo, volta ao passado e começa a descer no mesmo instante em que ele mesmo começa a subir).
O curioso é que a demonstração sequer depende do fato de que os dois monges comecem o percurso na mesma hora: supondo que o monge “do futuro” só comece a descer a montanha, digamos, às 15h, ele ainda assim vai se encontrar no caminho com seu duplo “do passado”, que começou às 8h da manhã.
Nesta semana vamos a um paradoxo lógico-teológico, o Paradoxo da Onipotência. Sua formulação mais recente deve-se ao filósofo australiano J.L. Mackie, e pode ser parafraseada assim:
Um ser onipotente pode criar agentes genuinamente livres?
Se a resposta é “não”, então o ser não é onipotente, porque há algo que ele é incapaz de fazer; se “sim”, então ele também não é onipotente porque, ao criar um agente genuinamente livre, ele está criando algo que não tem o poder de controlar.
Certo?
Discussão - 6 comentários
Sim, caso ele queira deixar de ser onipotente.
http://problemasfilosoficos.blogspot.com/2009/06/onipotencia-e-tarefas-possiveis.html - um bom raciocínio do prof. Alexandre Machado contra esse argumento (não necessariamnete contra a conclusão desse argumento). Depois dizem que o estudo de lógica não ajuda a argumentar melhor: aí está um contra-exemplo 😉
Esse não é um paradoxo de facto e sim uma definição errada de premissas.
Se assumimos como premissa aprioristicamente que o tal Deus é onipotente, é ilógico contrariar a premissa durante a argumentação.
A proposição correta seria:
É possível logicamente existir um Deus onipotente que crie seres completamente livres?
A resposta é não e é a mesma para um Deus onisciente.
Essa foi a grande cag**a feita pelos teólogos católicos originais. Não há justificação bíblica para tal afirmação de onipotência ou onisciência. São conceitos meio absurdos per se. Há a justificação filósofico-teológica interessada de Aquino, que não passa por qualquer teste lógico coerente.
Tomismo é para católicos ignorantes.
O problema é pretender com a lógica o que não se pode fazer (só) com a lógica: provar teses. A lógica pode nos apontar a impossibilidade da conjunção ("alguém que pode fazer qualquer coisa" e "algo que não pode ser feito"), mas a lógica não permite aplicar essa impossibilidade aos próprios conjuntivos, como em (é impossível "alguém que faz qualquer coisa"). O paradoxo da onipotência se transforma em um mero raciocínio inválido.
Talvez essa discussão fique mais interessante se desatrelarmos a qualidade de onipotencia da figura de "deus", de um "ser onipotente". Se pensarmos onipotencia não como "um ser que pode fazer tudo", mas como "tem o controle sobre tudo", chegaremos à questão da existencia ou não de uma lei da fisica universal, que em tese tudo controla. Nesse cenário, fica mais patente a gravidade sobre a existencia de seres genuinamente livres, ou seja, seres que não estão sob o controle dessa lei fisica universal. Se somos livres, a todo momento estamos desobedecendo essa suposta lei da fisica universal. Portanto, não existe lei da fisica universal.
Estive pensando recentemente sobre um comentário a respeito de um argumento de ANSELMO DA CANTUÁRIA(Século XV), considerado antológico na defesa da fé religiosa. Uma motivação extra, talvez. Mas a propósito do que se discute acima, paradoxo lógico ou não, CREIO QUE SEJA INTERESSANTE CONSIDERAR-SE O SEGUINTE:
SENDO DEUS O DEUS ONIPOTENTE, ISTO É, UM DEUS CAPAZ DE TUDO, "Deus seria igualmente capaz de se esconder da razão", se assim o entendesse como necessário. Daí resulta até admissível que Deus apenas EXISTA para aqueles que Nele crêem.
Sim, entendo que seja possível admitir tal tese. Mas, com que finalidade se faria esse divino jogo de esconde-esconde? Seria a razão – criada por esse mesmo Deus - algo assim tão deplorável? E, sendo dessa forma, não seria razoável deduzir que o mundo ideal, o mundo preconizado/idealizado por Deus seria o mundo da não-razão (ou melhor, mundo da não desobediência em relação ao fruto da árvore de Adão)? E, se assim o fosse? Que mundo seria esse? Seria bom de viver? Seria melhor do esse que conhecemos? Seja como for, é certo que não seria o mundo do livre-arbítrio. Seria o mundo do desobedeceu-pecou; pecou-“morreu”. E só por curiosidade, pagamos até hoje pelo pecado de Adão; já nascemos pecadores, entranhado no pecado original!
Bem, seja como for, uma coisa parece certa: tal idéia/conceito de Deus não poderia admitir nem definições e nem forma humanas, quaisquer que fossem: seja onipotente, onisciente, seja onipresente, ou mesmo perfeito ou bom. Porque se assim não o fosse, Deus seria alcançado ou apreendido pela percepção - fé e/ou razão - humana. Fato que constituiria um grave problema, pois a partir daí, imediatamente, Ele simplesmente deixaria de ser o Deus e passaria a ser um simples deus; algo talvez apenas um pouquinho melhor do que um Bill Gates, ou um deus da mitologia greco-romana, qualquer. E aí poderia, se não me engano, estar o cerne da questão do debate teológico: se Deus não pode ser definido, então seria impossível afirmar-se que Ele é perfeito, ou onipotente, ou onisciente ; mesmo porque, nesse contexto, afirmativas como essas constituiriam , a meu ver, um paradoxo lógico insolúvel.
E é por essa e por outras que continuo ateu. É por essa e por outras que afirmo: das duas, uma, ou Deus NÃO existe e minha razão pode ser tênue; Ou Deus EXISTE e minha razão NÃO é tênue! Seguramente, e por não temê-Lo, prefiriria a última opção.