Espaço Aberto Ciência & Tecnologia: uma batida e uma assoprada
Acabo de assistir ao mais recente programa Espaço Aberto: Ciência & Tecnologia, do canal de TV a cabo Globo News. O tema? Adivinhe lendo o título – Nanotecnologia nos alimentos: você sabe o que está comendo? Pois bem, como dizem as avós desse mundo, dessa vez vou bater e assoprar.
A matéria inicia com o jornalista fazendo a seguinte comparação: quem consome cigarros está ciente dos riscos associados a eles, mas quem consome alimentos nanotecnológicos não está. Eu entendo aonde o jornalista quer chegar com essa comparação, mas não posso deixar de apontar o quão infeliz ela foi. Sim, infeliz porque acaba dando margem para extrapolações e conclusões falaciosas, do tipo “cigarro e alimentos nanotecnológicos são tóxicos e perigosos, a diferença é que no primeiro caso quem consome sabe disso”.
Ora, se tem algo que me incomoda é quando o assunto nanotecnologia é abordado na mídia com tons alarmistas e como algo único, estanque e homogêneo. Já foi anteriormente discutido aqui neste blog que o universo de nanopartículas para uso biológico é vasto e diversificado, e que seus efeitos (benéficos e maléficos) no organismo e no ambiente estão intrinsecamente relacionados com sua composição, formato, tamanho e características de superfície. É excessivamente simplista e até contraproducente juntar tudo no mesmo balaio de gatos, pois isso não esclarece o assunto e estimula a criação de preconceitos difíceis de serem quebrados.
Como mencionei que assopraria depois de bater, não posso deixar de apontar que o tom foi mudando no decorrer da reportagem. Essa questão da complexidade e diversidade de nanomateriais e seus efeitos acabou sendo abordada pelos entrevistados de forma bastante clara e razoável. Andrew Maynard é físico, diretor do University of Michigan Risk Science Center e ex-conselheiro chefe de ciências do PEN (Project on Emerging Nanotechnologies) – além de blogueiro e tuiteiro. Em sua entrevista para a reportagem da Globo News, Maynard mencionou que, embora a ciência esteja no caminho certo, ainda há um grande grau de incerteza quanto aos riscos de tecnologias emergentes. Ele está certo. Mas isso não quer dizer que produtos nanotecnológicos sejam necessariamente inseguros, de acordo com o próprio Maynard. William Waissmann, cientista da Fiocruz também entrevistado pela equipe de reportagem, afirmou que a nanotecnologia “é um mundo novo do ponto de vista toxicológico”. Um exemplo mencionado na reportagem foi a prata que, na sua forma macroscópica, não oferece grandes riscos. No entanto, nanopartículas de prata vem sendo usadas nos mais diversos produtos ao redor do mundo, de potes plásticos para armazenar comida a máquinas de lavar roupas (e sua presença, às vezes, é completamente desnecessária). A redução do tamanho da prata à escala nanométrica muda suas propriedades. Isso pode causar que riscos toxicológicos e ambientais? Em que situações vale a pena utilizá-la? Tais perguntas são fundamentais, e para respondê-las, urgem pesquisas de impacto toxicológico e ambiental dos produtos contendo nanotecnologia, em especial daqueles com nanopartículas ditas insolúveis. Nesse sentido, faço coro com Maynard. A nanotoxicologia é uma área que precisa de expansão-relâmpago.
A regulamentação dos nanoprodutos também ainda é incerta. De acordo com Maynard, não existe lei que exija que o consumidor seja informado de que há materiais nanotecnológicos no produto consumido. É fundamental dar ao consumidor o direito de escolher e, dessa forma, exercer sua cidadania. E para isso, ele precisa não só saber o que um produto contém. Ele precisa estar (bem) informado a respeito da nanotecnologia, suas vantagens, seus riscos e suas complexidades. Durante sua entrevista, Waissmann comentou sobre um estudo americano curioso que aponta que o público se baseia menos em informações científicas e mais em seu contexto cultural para construir opiniões. Eu torço sinceramente para que você, leitor, conte por aí sobre informações científicas que vem aprendendo a respeito da nanotecnologia a partir de fontes REALMENTE confiáveis. Mas não conte apenas para um amigo ou dois. Conte a um bando de gente, incluindo pai, mãe, tia, avó, primo, vizinho. Quem sabe assim, nosso contexto cultural mude um pouquinho, e sejamos uma nação menos assombrada pelos demônios.
P.S.: Dessa vez, o pessoal da Globo lembrou de mencionar pesquisas brasileiras de excelência na área, tais como a língua eletrônica e a nanopelícula à base de proteína de milho para ajudar a conservar frutas, ambas ligadas à Embrapa Instrumentação Agropecuária (São Carlos, SP). A reportagem também usou imagens da Nanoarte criada pela equipe do prof. Élson Longo (UNESP), made in Brazil e internacionalmente reconhecida! Quanto a esse aspecto, mais que uma assoprada da blogueira, fica a apreciação da telespectadora – e a expectativa de que a lembrança se repita nas próximas.
A matéria inicia com o jornalista fazendo a seguinte comparação: quem consome cigarros está ciente dos riscos associados a eles, mas quem consome alimentos nanotecnológicos não está. Eu entendo aonde o jornalista quer chegar com essa comparação, mas não posso deixar de apontar o quão infeliz ela foi. Sim, infeliz porque acaba dando margem para extrapolações e conclusões falaciosas, do tipo “cigarro e alimentos nanotecnológicos são tóxicos e perigosos, a diferença é que no primeiro caso quem consome sabe disso”.
Ora, se tem algo que me incomoda é quando o assunto nanotecnologia é abordado na mídia com tons alarmistas e como algo único, estanque e homogêneo. Já foi anteriormente discutido aqui neste blog que o universo de nanopartículas para uso biológico é vasto e diversificado, e que seus efeitos (benéficos e maléficos) no organismo e no ambiente estão intrinsecamente relacionados com sua composição, formato, tamanho e características de superfície. É excessivamente simplista e até contraproducente juntar tudo no mesmo balaio de gatos, pois isso não esclarece o assunto e estimula a criação de preconceitos difíceis de serem quebrados.
Como mencionei que assopraria depois de bater, não posso deixar de apontar que o tom foi mudando no decorrer da reportagem. Essa questão da complexidade e diversidade de nanomateriais e seus efeitos acabou sendo abordada pelos entrevistados de forma bastante clara e razoável. Andrew Maynard é físico, diretor do University of Michigan Risk Science Center e ex-conselheiro chefe de ciências do PEN (Project on Emerging Nanotechnologies) – além de blogueiro e tuiteiro. Em sua entrevista para a reportagem da Globo News, Maynard mencionou que, embora a ciência esteja no caminho certo, ainda há um grande grau de incerteza quanto aos riscos de tecnologias emergentes. Ele está certo. Mas isso não quer dizer que produtos nanotecnológicos sejam necessariamente inseguros, de acordo com o próprio Maynard. William Waissmann, cientista da Fiocruz também entrevistado pela equipe de reportagem, afirmou que a nanotecnologia “é um mundo novo do ponto de vista toxicológico”. Um exemplo mencionado na reportagem foi a prata que, na sua forma macroscópica, não oferece grandes riscos. No entanto, nanopartículas de prata vem sendo usadas nos mais diversos produtos ao redor do mundo, de potes plásticos para armazenar comida a máquinas de lavar roupas (e sua presença, às vezes, é completamente desnecessária). A redução do tamanho da prata à escala nanométrica muda suas propriedades. Isso pode causar que riscos toxicológicos e ambientais? Em que situações vale a pena utilizá-la? Tais perguntas são fundamentais, e para respondê-las, urgem pesquisas de impacto toxicológico e ambiental dos produtos contendo nanotecnologia, em especial daqueles com nanopartículas ditas insolúveis. Nesse sentido, faço coro com Maynard. A nanotoxicologia é uma área que precisa de expansão-relâmpago.
A regulamentação dos nanoprodutos também ainda é incerta. De acordo com Maynard, não existe lei que exija que o consumidor seja informado de que há materiais nanotecnológicos no produto consumido. É fundamental dar ao consumidor o direito de escolher e, dessa forma, exercer sua cidadania. E para isso, ele precisa não só saber o que um produto contém. Ele precisa estar (bem) informado a respeito da nanotecnologia, suas vantagens, seus riscos e suas complexidades. Durante sua entrevista, Waissmann comentou sobre um estudo americano curioso que aponta que o público se baseia menos em informações científicas e mais em seu contexto cultural para construir opiniões. Eu torço sinceramente para que você, leitor, conte por aí sobre informações científicas que vem aprendendo a respeito da nanotecnologia a partir de fontes REALMENTE confiáveis. Mas não conte apenas para um amigo ou dois. Conte a um bando de gente, incluindo pai, mãe, tia, avó, primo, vizinho. Quem sabe assim, nosso contexto cultural mude um pouquinho, e sejamos uma nação menos assombrada pelos demônios.
P.S.: Dessa vez, o pessoal da Globo lembrou de mencionar pesquisas brasileiras de excelência na área, tais como a língua eletrônica e a nanopelícula à base de proteína de milho para ajudar a conservar frutas, ambas ligadas à Embrapa Instrumentação Agropecuária (São Carlos, SP). A reportagem também usou imagens da Nanoarte criada pela equipe do prof. Élson Longo (UNESP), made in Brazil e internacionalmente reconhecida! Quanto a esse aspecto, mais que uma assoprada da blogueira, fica a apreciação da telespectadora – e a expectativa de que a lembrança se repita nas próximas.
Discussão - 3 comentários
"Assombrada pelos demônios", engraçado mesmo.
Otimo este seu texto, coisa de uma nano-jornalista
de primeira.
Voto por você postar imagens e vídeos
{tipo dessa matéria fiquei com vontade
de ver a matéria, se souber o link no youtube}..
{radiohead depois de ler os artigos do bala mágica...
eu indico}...0/
Oi, João Guilherme
Obrigada - dizer que o texto é coisa de jornalista é um dos melhores elogios que já recebi 🙂
Não consegui colocar o vídeo aqui, mas você pode encontrá-lo no G1: http://migre.me/zj99
Apareça sempre!
Olá
Todos já sabemos o que é nanotecnologia e as diversas maneiras a são aplicadas, por isso acho de extrema importancia que se comece a falar do que podem fazer(e podem estar fazendo)com essa tecnologia para triplicar os ganhos e assim,nesse caso, prejudicar nossa saúde ! Entendo vc, já que é o que está estudaando e com certeza está super empenhada em faze-lo bem,mas gostaria de saber não só das maravilhas como ficar ciente das trapaças a que estamos sujeitos com essa tecnologia fascinante