Os nanorrobôs vão dominar o mundo?

Um amigo me perguntou hoje, em tom de brincadeira, se os nanorrobôs vão dominar o mundo. Esse tema já havia sido levantado por um colega de doutorado, o Eduardo, durante um intervalo de trabalho no laboratório: ele me contou que alguns de seus alunos imaginavam que as nanopartículas eram mini-robôs como um monte de microscópicas Roses dos Jetsons. Talvez esse mito do imaginário popular tenha começado por influência de obras de ficção como o livro Engines of Creation, de autoria de Eric Drexler (publicado em 1986). Imagine robôs muito pequenos cuja função seria construir coisas para nós. Num belo dia (ou nem tanto) esses robôs sairiam de controle e começariam a se replicar alucinadamente e a consumir toda a Terra no processo. Eis o cenário do livro Engines of Creation. Seria uma versão nanotecnológica do apocalipse, ou como preferem os fãs da ficção científica, grey goo (“gosma cinza”). Até o príncipe Charles já andou se preocupando seriamente com essa ameaça….

Mas será que corremos o sério risco de virar comida de nanorrobô um dia? Embora o cenário acima seja aterrorizante, há alguns “poréns” que justificam a existência dos grey goo apenas na ficção e garantem nossa segurança contra esse trágico destino (ufa).

Um grey goo teria tarefas muito mais complicadas do que simplesmente se auto-replicar. Ele precisaria sobreviver e se mover no ambiente, além de converter o que encontrasse no caminho em matéria-prima para obtenção de energia. Um nanorrobô grey goo também precisaria de uma capacidade computacional relativamente considerável para processar todas essas funções e harmonizá-las conforme a necessidade. ISSO REQUER UMA QUÍMICA MUITO, MAS MUITO SOFISTICADA. Coisa difícil de se conseguir na nossa escala de tamanho, que se dirá na escala nano. E um nanorrobô sem uma dessas funcionalidades sequer não poderia ser de fato um grey goo. Será que conseguiremos construir nanorrobôs que reúnam todas essas características? Acho bastante improvável.

P.S.: Obrigada ao Eduardo Bender pela ótima sugestão desse tema, e ao Luis por perguntar.


N&N: uma nova janela de oportunidade para o Brasil

N&N; é uma sigla que está na moda. N&N significa Nanociência & Nanotecnologia. Fala-se de seus benefícios, de seus riscos e de seus impactos econômicos e sociais em todo o globo. No entanto, será que o domínio da N&N também é global?

Nas minhas buscas sobre o tema, descobri o trabalho de mestrado do economista Leonardo de Assis Santos, intitulado Sistema Brasileiro de Inovação em Nanotecnologia (UFRJ). De acordo com os dados levantados pelo autor, Japão, Estados Unidos e a União Européia estão entre os maiores investidores em nanotecnologia. Certos países emergentes, tais como China e Coréia do Sul, estabeleceram antes do Brasil programas para o desenvolvimento de produtos nanotecnológicos, com um investimento médio de US$ 200 milhões/ano. Até aqui, fica claro que o domínio da N&N não é igual em todas as partes do globo.

Em seu trabalho, Santos menciona que o advento da N&N abre uma nova janela de oportunidade para o Brasil aumentar sua competitividade no mercado mundial. Só que, para inovar, é preciso que a indústria absorva pessoal qualificado. Esse pessoal qualificado é formado nas universidades, onde a nanociência é construída. Como estaria o Brasil quanto à produção de nanociência (em especial na área de medicamentos, que é a minha área) em comparação com outros países? Para ter uma ideia, busquei o número de artigos científicos com os termos “nano* and drug” na base de dados Web of Science, e achei 11215 publicações. É claro que não tenho a menor pretensão de responder de forma apurada qual é a posição do Brasil em relação a N&N, mas essa rápida consulta mostrou que ainda temos muito chão pela frente no que se refere a nanotecnologia e fármacos. Organizei os dados por país – não passou despercebido o fato de que um artigo pode conter endereços de mais de um país, e que outras bases de dados deveriam ser consultadas também (de forma alguma considero essa rápida análise conclusiva, é para ser apenas meramente ilustrativo).

Como podemos ver, deu a lógica: Estados Unidos na frente, seguido por China, Alemanha, França e Japão. Esses países somados detêm 67 % do total de publicações. Ao Brasil, cabe 1,65 % do total.

Será que o Brasil vai perder essa janela ou vai aproveitar a oportunidade? Em 2001, o governo brasileiro apoiou a criação de quatro redes de pesquisa em diferentes áreas da nanotecnologia, sendo uma delas dedicada à nanobiotecnologia. Em 2004, foram instituídas, no Brasil, a Ação Transversal de Nanotecnologia nos Fundos Setoriais e a Rede BrasilNano. Em 2005, foi lançado o Programa Nacional de Nanotecnologia (PNN) e criado o Centro Brasileiro-Argentino de Nanotecnologia para impulsionar as pesquisas latino-americanas na área. O Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) tem concentrado os financiamentos dos Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia em quatro áreas industriais – fármacos, bens de capital, microeletrônica e software – e em três áreas de pesquisa denominadas “portadoras de futuro” – a nanotecnologia, a biotecnologia e a biomassa. Nesse contexto, a nanobiotecnologia é tanto área estratégica quanto portadora de futuro. Formemos, pois, o maior número possível de pessoal qualificado na área de N&N. Além de contribuir para o desenvolvimento da ciência nacional, pode ser um grande investimento econômico.

A participação das mulheres na ciência brasileira

Estava eu à toa lendo blogs alheios, e me deparei com um post do All of My Faults Are Stress Related, do ScienceBlogs, que trata sobre as mulheres na geociência. Achei bem inspirador, e me fez pensar qual seria o papel das mulheres no desenvolvimento da ciência brazuca. O sucesso das mulheres nas carreiras técnico-científicas (em especial nas ditas ciências “duras” – ou desumanas, como diria um amigo meu das humanas, hehehe) ainda é carregado de tabu aqui também – ou não é verdade que ainda circula aquela piadinha cretina de que, antes de nascer, a mulher escolhe se vai ser bonita ou engenheira/ médica/ matemática/ química (……………… preencha à vossa escolha)?

Toda mulher que segue a carreira científica acaba se deparando com algumas dificuldades práticas, como o abandono temporário do trabalho devido à maternidade, a difícil decisão de sair ou não do país para estágio científico sem os filhos/marido, a estafa pelo acúmulo de tarefas (trabalho + lar + filhos – sim, muitas mulheres ainda hoje acabam assumindo tudo isso praticamente sozinhas), a impossibilidade de assumir cargos políticos e de docência em outras cidades por causa da família, etc etc. Questões desse tipo são motivo justificado de angústia e, muitas vezes, até de desistência da carreira científica, o que é muito triste e uma grande perda para o país. Isso sem contar que ainda passa por certas cabeças antiquadas (masculinas e femininas!) o velho estereótipo de que mulher inteligente que se preze é aquela que não cuida da própria aparência (como se fossem coisas incompatíveis).

O senso comum sempre me disse que as mulheres enfrentam mais obstáculos para seguir a carreira acadêmica até o fim (entenda-se pesquisador sênior); mas como achismos não servem pra muita coisa, fui atrás de alguns números. Para ter uma medida aproximada do grau de discrepância entre a participação masculina e feminina na ciência brasileira, consultei as estatísticas do CNPq.

Em 2008, o número de bolsas-ano no país na área das ciências exatas e da terra foi igual a 3217 para mulheres e 5744 para homens. Na área de engenharia e computação, foi igual a 3219 para elas e 7428 para eles. A situação se inverte na área da saúde, com 3997 para elas e 2019 para eles, e na área biológica, com 6043 para elas e 3944 para eles [aqui].

Do total de bolsas de doutorado no país concedidas em 2001, 49 % foram para mulheres. Essa proporção não se alterou muito em 2008, com 51 % para elas. Isso pode dar a idéia de que a ciência brasileira é igualitária quanto ao gênero, porém o número de bolsas de produtividade em pesquisa (que são concedidas a pesquisadores com produção científica destacada) aponta uma discrepância considerável: em 2001, apenas 32 % foram concedidas a mulheres, sendo que esse número subiu para 34 % em 2008. [aqui]. Se considerarmos os números de 2008 referentes aos níveis que categorizam a bolsa de produtividade [aqui], vemos que de cada 10 bolsas do nível 2 (o mais baixo), 4 foram para mulheres; e de cada 10 bolsas do nível 1A (o mais alto), apenas 2 foram para elas. Ou seja, embora as primeiras etapas da carreira acadêmica sejam equilibradas quanto ao número de homens e mulheres, ainda é mais complicado para as mulheres galgar os seus degraus mais altos.

Talvez políticas afirmativas sejam um paliativo importante… talvez as próprias mulheres precisem repensar seu papel no mundo científico e acreditar que podem. Porém, mesmo com a discrepância que há hoje, acho que estamos progredindo. Como diria Adélia Prado, “mulher é desdobrável”. Sou muito otimista com relação ao crescente papel da mulher na ciência brasileira nos próximos anos.

Encerro esse post citando a Profa. Dra. Eva Blay:

“- Abrir espaço para as jovens, mostrando que elas podem fazer parte do campo científico, é uma tarefa de todos nós”.

Homens e mulheres, estamos todos convidados a fazer parte dessa mudança.

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