É amanhã!

O instante cabalísitico que anunciei em uma postagem anterior ocorrerá nesta sexta-feira. Na hora do almoço, assistiremos a um alinhamento numerológico ímpar, com a passagem das
12h34min56seg de 7/8/9.
Pedi aos leitores do blog que me ajudassem a profetizar algo de momentoso para o segundo fatídico, mas o que mais recebi foram zombarias de incréus (putz, eu sempre quis usar essa palavra!).
Alguns tentaram até mesmo apresentar apelos ao bom senso, como por que não incluir frações de tempo menores que o segundo, ou o fato de que nada ocorreu nos países que usam a notação contrária (mês antes do dia) em julho. Como se o bom senso pudesse se sobrepor aos ditames do cosmo!
Mas, ok, a profecia ganhadora do concurso foi esta aqui:
Eu professo que neste exato momento um protótipo de computador quântico conseguirá dividir seu próprio overflow por zero.
Como vai ser lua cheia, o alinhamento Sol-Terra-Lua-Júpiter-Netuno durante o eclipse do dia 5 causará terremotos nos andes e na polinésia.
Alguém importante vai morrer de complicações cardiovasculares.
E eu vou ganhar um emoticon exclusivo. xD

Por dois motivos: primeiro, cita um eclipe (nenhuma profecia realmente é comme il faut sem um eclipse para acompanhar, seria como um Big Mac sem fritas), e “alguém importante morrer de complicações cardiovasculares” me lembra muito da minha previsão favorita de um fim de ano, “um membro da academia brasileira de letras terá problemas graves de saúde”.
E, bom, eu tinha prometido um emoticon exclusivo para a melhor profecia… Então aí vai. Não é grande coisa, mas eu o chamo de “Nostradamus”:
+;^)~~

Agosto, um mês político

Não, o título desta postagem não se refere ao fim do recesso parlamentar, nem ao suicídio de Getúlio Vargas, mas a uma peculiaridade do par de meses julho/agosto: são os únicos meses consecutivos que têm, ambos, 31 dias. E a razão disso é política.
Política do império romano, diga-se de passagem. O fato é que quando os romanos resolveram homenagear César Augusto com um mês (o nosso agosto, que na época tinha outro nome e apenas 30 dias), Júlio César já tinha o dele (julho, claro).
E julho tinha 31 dias.
Agora, será que bastava mudar o nome do mês? Mas aí o mês de Augusto seria menor que o de Júlio. Imagine as piadinhas no Senado. A solução: tirar um dia de um mês sem patrono (fevereiro, que na época tinha 29 dias, com 30 em anos bissextos) e transferi-lo para o mês com pistolão.
Agosto também é o mês 8. E 8 é um número interssante: é o primeiro cubo (depois de 1), o único cubo da sequência de Fibonacci (de novo, descontando o 1) e o único cubo que é exatamente uma unidade menor que um quadrado (9). Essa propriedade se preserva, de certa forma: qualquer número triangular (1, 3, 6, 10…) vezes 8 é sempre uma unidade menor que um quadrado.
“O Oito ” também é o nome de uma organização terrorista combatida pelo mágico Mandrake. E 8 é o número máximo de rainhas que se pode pôr num tabuleiro comum de xadrez sem que uma possa capturar a outra. Isso pode ser feito de 12 modos diferentes.

Síndrome de Abraão

Este é o nome que eu sugiro para o distúrbio particular exemplificado no caso da família Neumann, de Wisconsin, que preferiu ficar rezando em vez de levar a filha ao médico, o que fez a garota morre de diabete.
O casal Neumann foi considerado culpado pela morte da menina de 11 anos. O que realmente assusta nesse caso é a lógica cristalina do pai. Ao explicar por que optou pela oração, ele simplesmente afirmou que não “poderia colocar o médico à frente de Deus”.
“Biblicamente, não vejo que esta (ir a um médico) seja a forma de curar pessoas”, disse Neumann pai que, segundo a Associated Press, submeteu o júri, à guisa de defesa, a uma longa pregação da Bíblia. “Se eu vou a um médico, estou pondo o médico à frente de Deus. Eu não estaria acreditando no que Ele disse que faria”.
De novo, o assustador é que o argumento faz perfeitamente sentido. Biblicamente, quem cura é Deus e os médicos são meio inúteis — o que deviam ser mesmo, dado o estado da ciência na época: “No trigésimo nono ano de seu reinado, Asa tornou-se gotoso e sofreu violentamente. Durante sua doença, ele não procurou o apoio do Senhor, mas o dos médicos/Ele adormeceu com seus pais e morreu no quadragésimo primeiro ano de seu reinado” (2 Crônicas 16:12-13).
A exceção ao desapreço à profissão médica são alguns versos do Eclesiástico, um livro que os protestantes consideram apócrifo, mas que a Bíblia católica preserva. Ali se lê: “Honra o médico por causa da necessidade, pois foi o Altíssimo quem o criou/(Toda a medicina provém de Deus), e ele recebe presentes do rei:”, (38:1-2); “O Altíssimo deu-lhes a ciência da medicina para ser honrado em suas maravilhas/e dela se serve para acalmar as dores e curá-las; o farmacêutico faz misturas agradáveis, compõe ungüentos úteis à saúde, e seu trabalho não terminará” (38: 6-7).
Como a família Neumann é pentecostal e não católica, esses versículos laudatórios à Medicina provavelmente não valem, e a única coisa que poderia ter salvo a menina seria um anjo com uma espada de fogo (ou, o que seria melhor, com uma injeção de insulina).
Na prisão, é provável que Neumann se console com o versículo 18 do capítulo 22 do Gênese: “Juro por mim mesmo, diz o Senhor: pois que fizeste isto, e não me recusaste teu filho, teu filho único, eu te abençoarei.”

Gripe suína e a inércia da notícia

Tenho visto pela internet muitos comentários a respeito da atuação dos meios de comunicação frente à pandemia da gripe suína, que vão desde a acusação de que a mídia está “bombando o assunto para desestabilizar o governo Lula” até a noção de que os jornalistas estão seguindo a linha oficial e ocultando a incompetência das autoridades. Um Velho Ditado da Selva dizia que uma ação que desagrada a ambas as facções em uma disputa é provavelmente justa, mas não vamos aceitar o argumento de autoridade aqui (nem mesmo da autoridade do Espírito-Que-Anda).
Vou tentar, então, esboçar algumas respostas sobre o assunto com a perspectiva de um soldado nas trincheiras da informação:
1. Por que a gripe continua a ser chamada de gripe suína? o nome não mudou?
Basicamente, porque ela começou a ser conhecida como gripe suína, foi como gripe suína que ela gerou preocupação mundial ao irromper no México, e passar a chamá-la de outra coisa a esta altura só iria confundir a comunicação.
2. Por que a imprensa não é mais crítica da atuação do ministério da saúde?
Bom, a mim me parece que a imprensa vem sendo crítica o suficiente. Por exemplo, já foram publicadas declarações de epidemiologistas alertando para o fato de que os médicos e enfermeiros dos postos de saúde e hospitais públicos não parecem bem preparados para implementar o protocolo de combate à doença do ministério.
Além disso, o noticiário deixa claro que há estratégias alternativas de enfrentamento da doença (por exemplo, as que preveem ampla administração de antivirais) adotadas em outros países.
3. Por que a imprensa faz tanto alarde com essa gripe? É para pegar no pé do governo?
Não, não é. O que ocorre é que a gripe parece não ser pior que a gripe comum, mas é preciso acompanhar os acontecimentos para saber exatamente até onde a semelhança vai. Isso inclui manter (principalmente nos veículos online) um “body count” atualizado e prestar atenção nos aparentes desvios da norma. A memória da trágica gripe de 1918 e a saudável desconfiança atávica quanto à informação oficial mantêm os jornalistas atentos.
4. A mídia não deveria colaborar mais com o governo, para instruir as pessoas e evitar pânico?
A mídia não deve, em princípio, colaborar com governo algum. Jornalismo é oposição, o resto é balcão de secos e olhados, já dizia Millôr Fernandes. Tendo dito isto, os grandes jornais (e sites, e redes de TV e rádio) vêm cobrindo de modo responsável as coletivas do ministro Temporão e as orientações oficiais (e sempre que possível, com o devido contraponto crítico).
5. Então, a cobertura está sendo perfeita?
Não, não está. Se por um lado o risco potencial representado por essa gripe justifica a cobertura continuada, eu creio que os sites de notícias, principalmente, entraram numa espécie de “inércia da gripe” — noticiando qualquer novo desdobramento, antes mesmo de verificar sua relevância.
Mesmo reconhecendo que a velocidade da internet e a pressão da concorrência muitas vezes não permitem o tempo necessário para medir o significado exato das coisas (se o lance se mostrar importante no futuro, o editor pode dizer que deu em primeira mão; se se mostrar irrelevante, ninguém vai lembrar daquela notinha, mesmo), está chegando a hora de descobrir um jeito de perguntar primeiro e publicar depois, até para não saturar o pobre leitor.
Outra questão que, a meu ver, mereceria esclarecimento: essa pandemia não está mostrando que as autoridades sanitárias são negligentes em relação à gripe comum? Afinal, se as duas doenças são igualmente letais, por que o combate à gripe sazonal não é melhor estruturado? Se os funcionários dos postos de saúde e hospitais públicos estão falhando em distinguir uma ocorrência grave de um simples caso de “canja de galinha e cama” quando se trata do H1N1, o que fazem com os casos da gripe comum?

Uma historinha sobre a Justiça

Mais um vez, peço licença à comunidade ScienceBlogs pra blogar sobre um assunto que não tem ligação direta com a divulgação científica: o caso da liminar que proibiu o Estadão de divulgar os grampos telefônicos da família Sarney.
É mais um causo dos meus tempos de jornalista do interior. Assim:
Certa vez, uma mulher pobre, vamos dizer que se chamava Maria, foi à polícia dar queixa do desaparecimento da filha de 13 anos. ela disse às autoridades que suspeitava do padrasto da menina, que, digamos, chamava-se José.
Os policiais “convidaram” José a prestar esclarecimentos e, depois de 12 horas de depoimento (sem acompanhamento de advogado), ele teria confessado ter abusado da garota, matado-a e, ainda, indicado aos policiais onde o corpo estaria enterrado.
A polícia encontrou o corpo. Um juiz determinou a prisão de José. Na cadeia pública, ele foi linchado pelos colegas de cela. Fim de caso.
José era culpado? Muito provavelmente, sim. Mas o Brasil não tem pena de morte. E, mesmo se tivesse, ela só poderia ser aplicada ao cabo de um devido processo legal.
Não foi por ser culpado de um crime hediondo que José morreu espancado, sem direito a defesa, sem advogado, liminar ou habeas-corpus que o socorresse. Morreu porque se chamava José, mas tinha o sobrenome errado.

Paradoxo de sexta (37)

O da semana passada foi um paradoxo teológico, e como todo paradoxo do tipo, a solução mais simples é supor que o ser a que o paradoxo se refere simplesmente não existe. Caso essa saída seja bloqueada, há três soluções:
1. O ser não é onipotente (ele nos fez o melhor que pôde, dentro de suas limitações)
2. O ser é malicioso (ele poderia ter feito melhor, mas preferiu deste jeito por que curte mandar humaninhos para o inferno)
3. O ser é misterioso (não somos capazes de entender seus motivos e/ou um dia tudo ficará claro e veremos que tudo foi para o melhor e cantaremos sua infinita sabedoria)
A solução 3 traz à tona a questão, mas então por que então não nos fez mais espertos logo de cara?, mas aí a coisa já começa a cansar.
Nesta semana, voltamos ao mundo da lógica e da matemática.
Suponha que, por algum motivo, você se veja envolvido numa aposta com um trapaceiro. (Este é um dado do problema: o cara é trapaceiro). Ele mostra a você três cartas. Uma é branca dos dois lados, uma tem um lado branco e o outro preto, a outra é preta dos dois lados.
O cara põe as três cartas num saco preto (que você inspecionou cuidadosamente e tem certeza de que estava vazio antes do início do procedimento), mistura-as, puxa uma e a coloca rapidamente sobre a mesa.
O que você vê é um lado preto.
O trapaceiro diz: “Esta certamente não é a carta toda branca. O outro lado ou é preto, ou é branco. Se você estiver disposto a casar dez reais, eu também ponho dez meus em jogo e aposto que o outro lado é preto. Topa?”
Você sabe que o cara é trapaceiro, mas a aposta parece honesta. Onde está o catch?

E a nave espacial privada continua em seu périplo…

Nesta semana o pessoal d Virgin Galactic fez uma apresentação do WhiteKngihtTwo, o avião-lançador que deverá levar ao espaço a primeira nave privada de turistas, a chamar-se SpaceShipTwo ou VSS (de “Virgin Space Ship”) Enterprise.
Só para relembrar: a equipe do engenheiro Burt Rutan havia feito história em 2004 ao lançar a primeira nave espacial tripulada financiada exclusivamente com recursos privados, a SpaceShipOne. A nave fez três voos, chegando ao limite da atmosfera terrestre e pousando de volta em segurança.
Na época, o então diretor da Nasa, em meio à crise de credibilidade causada pela explosão do ônibus espacial Columbia e confrontado com a “prova de eficiência do setor privado”, referiu-se à SpaceShipOne como “um planador movido a gás hilariante”.
O que, subtraindo-se o veneno das palavras, é verdade. A nave de Rutan passa a maior parte do tempo planando usa NO2 como oxidante de combustível.
Mas o cara da Nasa tinha razão em uma coisa: é muito difícil comparar o que o time de Rutan fez com o que a agência espacial faz. A complexidade de se levar um homem à beira do espaço e minutos depois fazê-lo descer é ordens de magnitude menor que a de lançar um ônibus espacial, ou de manter uma tripulação de seis pessoas em órbita por meses a fio.
É difícil saber até onde a Virgin Galactic conseguirá ir — aos meus céticos olhos cansados, a empresa parece ter muito marketing (oferecendo passagens grátis ao espaço a Stephen Hawking e William Shatner, por exemplo) e poucos feitos concretos até agora — mas, no momento em que o governo do EUA tem um comitê reavaliando toda a estratégia estatal de voo espacial tripulado, é bom lembrar que a iniciativa privada também está na jogada — e não apenas por meio das grandes empreiteiras da indústria aeroespacial.

Apelo ao suposto beneficiário

Mais uma da série, falácias que a gente vê por aí. Esta é talvez a mais insidiosa de todas as que surgem no discurso público, porque insinua que algumas coisas são importantes demais para serem atrapalhadas por algo tão comezinho como, por exemplo, a verdade dos fatos.
Eu a encontrei pela primeira vez na faculdade. Na época, o Jornal do Campus (um jornal feito pelos estudantes de jornalismo da USP) havia publicado uma matéria sobre “Os marajás da USP”, apresentando alguns salários estratosféricos que eram pagos a figuras do mundo administrativo e acadêmico uspiano. Lembro-me de um professor, que eu até respeitava muito, esbravejar que a reportagem “fazia o jogo do (então governador) Quércia”.
Bolas, a reportagem ou estava correta ou estava errada, era ou isenta ou tendenciosa. Se era correta e isenta, e o que dizia poderia servir de argumento para o governador tomar medidas vistas como contrárias à universidade, a culpa era da universidade que havia deixado as coisas chegarem a esse ponto, não do jornal que apresentava os fatos.
Esse apelo ao suposto beneficiário lembra o cui bona (quem ganha?) das histórias policiais, a pergunta que ajuda a definir o quadro de suspeitos. Mas quando o que está em questão é uma alegação de fato, não um homicídio, o cui bona é tão relevante quanto, ao receber um telegrama com más notícias, você se preocupar com a identidade do carteiro.
Como já disse, essa falácia é especialmente malévola porque leva as pessoas a imaginar que alguns valores, nomes ou princípios (a Revolução, a Livre Iniciativa, o Partido, a Igreja…) são mais importantes que a verdade. E, claro, quem não enxerga isso — que a causa é mais importante que os fatos — é um “ingênuo”, que “faz o jogo” dos comunistas, dos capitalistas, dos verdes, dos poluidores, dos tucanos, dos petistas, whatever.
Se você realmente acha que o fato de o líder da sua causa ter cometido o crime “X” não mancha a causa em si, defenda o argumento no livre mercado de ideias, mas não tente suprimir “X”. E nem mudar de assunto.

Para formigas, o irrelevante é irrelevante

Um dos critérios normalmente usados em Teoria da Decisão para definir se uma escolha é racional ou não é a independência de opções irrelevantes. Digamos que você, sendo um homem e heterossexual (leitores de outra conformação cromossômica e/ou inclinação afetiva, por favor, usem a imaginação) tenha uma marcada queda por loiras magras. Eis que, numa balada, surgem duas garotas que parecem interessadas em sua pessoa — uma loira gorda e uma morena magra.
Pode ser um dilema, mas qualquer que seja a sua solução pra ele (Incluindo a de passar a noite sozinho), o fato de haver uma terceira menina disponível, uma ruiva rechonchuda, não deveria afetar a decisão que você vai tomar. Certo? Afinal, você não se sente atraído por ruivas e prefere não ficar com gordas, logo essa terceira moça, por mais inteligente e charmosa que seja é, para o seu gosto pessoal, irrelevante.
Curiosamente, no entanto, a mente humana não funciona desse jeito: a presença de uma alternativa irrelevante tem, frequentemente, o poder de alterar a forma como as pessoas escolhem entre as alternativas reais. Isso acontece muito em eleições: mesmo que a disputa pra valer seja entre Serra e Dilma, o fato de haver um terceiro candidato sem chances, e de esse candidato ser o Maluf ou o Gabeira, pode fazer pender a balança para um lado ou para o outro.
Nesse aspecto, o homem não é lá um animal muito racional (conte-me algo novo, dirá você). Mas as formigas, são. A constatação está no periódico científico Proceedings of the Royal Society B. Diante da oferta de dois locais razoáveis pra instalar um formigueiro, os insetos optavam por um um outro, indiferentemente. O aparecimento de um terceiro local, claramente ruim, não afetou essa distribuição.
Falando ao noticioso online Science Now, da revsita Science, um dos autores do trabalho, Stephen Pratt, especula que as formigas se comportam dessa forma porque a colônia, como um todo não conhece todas as opções disponíveis: a massa dos insetos simplesmente acompanha a opinião das formigas batedoras, que sempre rejeitam a oferta de ninho ruim e aceitam indiferentemente a primeira oferta razoável que aparece.
O que sugere que, ao menos em questões de múltipla escolha, ignorância às vezes é poder.

Porrada em Júpiter: o follow-up

Na semana passada, postei aqui a primeira foto divulgada do “ponto preto” que surgiu em Júpiter no dia 19 deste mês. Desde então, a Nasa até tirou o Hubble de seu estado de calibragem pra fazer uma foto da evolução da mancha:
Clique aqui para abrir a imagem.
Brincadeiras a respeito do monolito do Clarke a parte, as principais reações populares à notícia parecem dividir-se em três vertentes: (a) como ninguém viu este negócio chegando?; (b) isso deve ser uma coisa de alienígena e (c) que bom que Júpiter nos protege dos grandes impactos.
O ponto (a) ajuda a ilustrar como o sistema solar é um coisa enorme, e como tempos muito pouco controle, de fato, quanto ao que a acontece nele. Blockbusters de ficção científica nos acostumaram a pensar em termos de galáxias inteiras como e fossem quarteirões, mas o fato é que a escala do nosso minúsculo sistema solar já é demais para nós — ao menos, no nosso estágio atual.
O ponto (b) é interessante como partida pra um novo seriado de TV, mas não muito mais que isso. Citando a surrada frase de Carl Sagan, “alegações extraordinárias requerem evidências extraordinárias”. Pode até ser que o caiu em Júpiter tenha sido o caça TIE de Darth Vader, mas diabo, onde está a evidência? Um excesso de raios gama emanando da zona de impacto poderia sugerir a presença de antimatéria na colisão (caças TIE usam antimatéria? não, nesse caso seriam os klingons…), mas ninguém parece ter detectado isso.
Quanto a (c), a ideia de Júpiter como uma espécie de “guarda-costas” do sistema solar interior (isso quer dizer nós, Marte, Vênus e Mercúrio) se encaixa na concepção geralmente chamada de Terra Rara — a hipótese de que a vida inteligente só pôde emergir na Terra por conta de uma série de circunstâncias muito especiais, entre elas, a presença de um planeta gigante que atuaria como estabilizador e protetor contra impactos devastadores.
Mas seria isso mesmo?
Um interessante artigo em The New York Times contesta essa visão. Um astrônomo ouvido pelo jornal, Brian G. Marsden, cita o caso do cometa de Lexell, que foi desviado de sua trajetória e jogado na direção da Terra… pela gravidade de Júpiter.
Além disso, provavelmente é a gravidade de Júpiter que volta e meia desestabiliza asteroides do cinturão principal, além da órbita de Marte, e os arremessa sobre nós. Foi um desse caras, aliás, que acabou (ou ajudou a acabar) com os dinossauros.
Então, quanto ao papel protetor de Júpiter, o júri ainda não chegou a um veredicto. Talvez o efeito protetor e o desestabilizador se cancelem; talvez um supere o outro. O fato é que a decantada atuação de Júpiter como guarda-costas da vida na Terra em geral, e da civilização humana em particular, parece ser mais uma daquelas hipóteses científicas que acabam promovidas a “fato” no processo de divulgação e, no fim, viram uma espécie de mito moderno.

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