Ex-general dos marines e ex-astronauta é o novo chefe da Nasa

Sim, são a mesma pessoa: o general Charles Bolden, veterano da guerra do Vietnã e o mesmo homem que pilotou o ônibus espacial que levou o Hubble ao espaço em 1990 foi nomeado, no sábado, novo administrador da Nasa.
Às portas da festa dos 40 anos do pouso na lua da Apollo 11 e com o destino do Programa Constellation — estabelecido depois que o então presidente Bush determinou um retorno à Lua até 2020 — ainda indefinido, Bolden terá muito trabalho pela frente.
Abaixo, um vídeo da missão em que Bolden levou o Hubble o espaço, e no qual alguns reflexos na lente da câmera acabam gerando um pequeno mal-entendido ufológico entre o astronauta e o comando da missão (o áudio em inglês é meio ruim, mas vale a pena):

Pró-maconha e antitabaco: contradição?

Conversando outro dia com um amigo, deixei escapar que sou a favor de restrições ao fumo em locais públicos, e também a favor da descriminação (não confundir com discriminação) da cannabis sativa. Sabendo como sou pentelho com questões de lógica e coerência, o amigo ficou olhando para mim como se eu tivesse acabado de cometer apostasia do culto de São Aristóteles e Santo Russell.
A ideia de que as duas posições são autoexcludentes e fazem parte do rol de contradições politicamente corretas da civilização moderna parece estar ganhando força — se formos levar as seções de comentários dos portais noticiosos a sério — e merece ser rapidamente posta para dormir.
Trata-se de uma confusão de grau: tirar da ilegalidade não equivale a liberar geral, e restringir o uso não equivale a declarar ilegal. Por exemplo, as restrições ao fumo não preveem pena de prisão para o comerciante que vender cigarros, nem o confisco das terras usadas para o plantio de tabaco para fins de reforma agrária — duas medidas que, hoje, atingem a maconha.
Da mesma forma, a hipotética legalização do plantio e da comercialização da erva não garantirá a ninguém o direito automático de sair bafejando THC na cara de criancinhas dentro da área infantil do McDonald’s.
No meu tempo de faculdade, surgiu um acalorado debate sobre o consumo de maconha nas dependências do Centro Acadêmico — se deveria ser tolerado ou não. Tentei chamar atenção para o fato de que lá já havia uma placa de “proibido fumar”, e que isso devia bastar para pôr fim à questão, mas acho que ninguém estava ouvindo.
No fim, os fumantes que se queixam de estarem sendo “tratados como criminosos” na verdade estão se ressentindo da crescente reprovação social que o ato de fumar atrai. Mas essa reprovação faz parte da consciência coletiva da comunidade, não das leis. E nada garante que ela não vá se estender ao (de novo, hipotético) uso legal da maconha.
O que é preciso buscar é um equilíbrio que evite submeter cidadãos adultos a uma tutela paternalista estatal — onde o governo dita ao indivíduo de que formas ele pode ou não se divertir e/ou se autodestruir — e que preserve, ao mesmo tempo, o dever do Estado de proteger a coletividade e regular o uso civilizado dos espaços públicos.
É difícil? Claro que é. Mas fica um pouco mais fácil se nos dermos ao trabalho de notar que uma coisa é uma coisa e outra coisa, outra coisa.

Sir Arthur Conan Doyle, 150

Eu raramente faço duas postagens no mesmo dia, mas a ocasião merece: hoje faz 150 anos do nascimento de Sir Arthur Conan Doyle, criador de Sherlock Holmes, do Professor Challenger, amigo pessoal de Harry Houdini, defensor da existência de fadas e descrito como o “apóstolo Paulo do espiritualismo”.
A tensão entre o frio racionalismo de Holmes e o envolvimento de Conan Doyle com o sobrenatural é uma fonte inesgotável de especulações sobre a natureza humana e a fragilidade da razão perante a dor — o escritor perdeu um filho, um irmão e dois sobrinhos na Primeira Guerra Mundial.
Seu conturbado relacionamento com Harry Houdini ilustra bem o conflito complexo entre fatos e esperanças, integridade e vontade de acreditar. Escritos autobiográficos de Houdini descrevem como Conan Doyle era parcial na análise da evidência, ingênuo diante da fraude — e, ao mesmo tempo, inteligente e generoso.
O Professor Challenger, um cientista turrão e irascível que descobre dinossauros na Amazônia (entre outras coisas) foi um personagem criado por Conan Doyle já no século 20, e protagonizou a que talvez tenha sido a primeira superprodução de ficção científica e efeitos especiais do cinema.
Além das aventuras de Holmes e Challenger, Conan Doyle escreveu muita ficção científica, histórica (seu romance Miquéias Clarke, sobre as guerras religiosas na Inglaterra, é realmente muito bom) e boxe. Assim como as aventuras de Holmes, suas narrativas de pugilismo são empolgantes até hoje.

Paradoxo de sexta (28)

Primeiro, o da semana passada: o que distingue um gêmeo do outro, ao final do experimento, é o fato de que o que viajou no foguete experimentou acelerações, tanto na partida quanto ao fazer a volta para retornar à Terra e, por fim, ao frear para pousar a nave.
Um dado que omiti propositalmente do enunciado foi o de que o princípio da relatividade — de que dizer que “eu me movo em relação a você” equivale precisamente a dizer que “você se move em relação a mim” — só vale se o movimento em questão for retilíneo e uniforme (na verdade, a Relatividade Geral complica um pouco isso, mas a questão não vem ao caso nesta situação específica).
A partir do instante em que um dos membros do par em movimento sofre uma aceleração e o outro não, a simetria é quebrada, e é perfeitamente possível para um observador qualquer — seja um dos componentes do par, seja um observador externo — dizer exatamente quem acelerou, por quanto tempo e com que intensidade.
Meu exemplo favorito para isso é o do balde. Imagine uma caixa fechada, contendo um balde com água e uma webcam. Você, em sua casa, recebe a imagem gerada pela câmera: o que vê é a superfície plácida da água dentro do balde (a câmera é uma daquelas de visão noturna).
Você supõe que a caixa com o balde dentro está parada, mas não há como afirmar isso com certeza. Não há nada que a câmera lhe mostre que permita distinguir a caixa parada de uma caixa montada sobre rodas, puxada por uma corda sobe uma superfície plana, a uma velocidade constante.
Mas se a caixa sofrer uma aceleração — for erguida, derrubada, receber um empurrão ou um puxão mais forte, girar — a água vai denunciar o efeito imediatamente.
Agora, o desta semana: é o Paradoxo do Prefácio (o link é para o paper original que descreve o problema). Ele é assim: muitos autores de livros de não-ficção costumam escrever no prefácio de seus livros coisas do tipo “todos os erros contidos nesta obra são de minha inteira responsabilidade”, ou “esta obra certamente conterá diversos erros e imprecisões…”.
Agora, como pode o autor realmente acreditar que o livro contém erros? Ele obviamente não pôs nenhum erro deliberado ali. Ele certamente pesquisou o assunto a fundo. SE você abrir o livro ao acaso, apontar para um parágrafo e perguntar ao autor “isto aqui está certo”, ele vai responder, “sim”. Você pode repetir a operação tantas vezes quantas forem necessárias até esgotar todo o conteúdo do livro, e verá que o autor, na verdade, acredita que tudo o que escreveu está certo.
No entanto, a experiência indica que a afirmação do prefácio é verdadeira. Livros de não-ficção recebem resenhas e críticas que, geralmente, acabam produzindo novas edições corrigidas. Assim, da mesma forma que o autor tem motivos para acreditar que tudo que está no livro é verdade — afinal, ele pesquisou o assunto e, ao publicar a obra, está apostando sua reputação nisso — ele também tem motivos para acreditar que o livro precisará ser corrigido no futuro. São crenças contraditórias, mas ambas racionais e bem embasadas!

O uso de senhas de segurança é sustentável?

Esta não é uma questão ecológica, a menos que se considerem os números inteiros como uma espécie ameaçada (o que seria estranho porque, afinal, eles são infinitos). Mas há algum tempo chegaram aqui em casa novos cartões de crédito, em substituição a alguns que estavam vencendo. Todos com chip e senha.
Somando-se a isso a senha dos cartões de débito, a senha do computador do trabalho, a senha para editar este blog, as senhas das minhas contas de e-mail, do twitter, orkut, scribd… Bom, não dá. Simplesmente, não dá.
Existe um princípio irônico-matemático chamado Lei Forte dos Números Pequenos, que diz que “não existem números pequenos suficientes para dar conta de tudo que se exige deles”.
Essa “lei” foi sugerida originalmente como uma observação do fato de que várias séries numéricas começam da mesma forma (a On-Line Encyclopedia of Integer Sequences registra nada menos que 13.526 séries começando com 1,2,3…), mas ganha um novo significado neste nosso mundo de códigos de acesso. E ela também merece uma generalização, que poderíamos chamar de Lei Forte do Teclado Qwerty: não existem combinações aleatórias suficientes de caracteres arábicos, latinos e especiais para dar conta de tudo o que se exige deles.
Claro, matematicamente falando falando, as combinações possíveis de letras e números superam em muito a população da Terra (são 48 teclas no meu computador, sendo que cada uma delas pode gerar pelo menos dois caracteres, num total de 96. O total de senhas de seis caracteres que isso pode produzir é de 96 à sexta potência, ou quase 800 bilhões), mas na prática é preciso levar em consideração que (a) em várias partes do mundo já temos muito mais de uma senha por habitante e (b) a memória humana é falível, limitada, o que leva as pessoas a criar senhas em torno de padrões pré-estabelecidos ou a andar com os códigos anotados na carteira. O que derrota todo o propósito das senhas, para começo de conversa.
Enquanto a antropometria não chega, eu já tomei uma decisão, duplamente sudável: vou cortar radicalmente o uso de cartões de crédito.

Mikhail Gromov recebe o Prêmio Abel

O russo naturalizado francês Mikhail Gromov foi agraciado com o Prêmio Abel deste ano. O Abel é uma tentativa bastante cuidadosa de emular o Nobel, premiação que não contempla a matemática. Há várias lendas urbanas para explicar essa aparente negligência de Alfred Nobel, minha favorita sendo a de que um matemático dormia com a esposa do velho Alfred — o único problema com isso é o fato de que Nobel morreu solteiro.
O Abel é um prêmio recente, instituído em 2002, mas que tem boas chances de se tornar uma instituição nos próximos anos e décadas. O premiado deste ano tem uma carreira longa e produtiva no campo da geometria não-euclidiana, mais precisamente da geometria de Riemann, na qual a cada ponto do espaço são associados um ou mais vetores.
Há um breve material introdutório (em inglês) sobre o assunto aqui, e uma visão simplificada do trabalho de Gromov aqui.
Por fim: o Prêmio Abel deve seu nome ao matemático norueguês Niels Henrik Abel, que demonstrou que não existe uma fórmula geral para a solução de equações de quinto grau — ao contrário do que acontece, por exemplo, com as de segundo, que se rendem à fórmula de Báscara. Mais tarde, o trabalho de Abel foi generalizado para uma demonstração de que também não há fórmulas genéricas para nenhuma equação de grau superior a cinco.
Isso não significa que essas equações sejam insolúveis, mas sim que não existem mais “balas de prata” algébricas para altos expoentes. Ou: para resolver, é preciso suar.

Jornada nas Estrelas

Ninguém comentou o filme aqui, ainda? Lá vou eu, então. Tentando manter a taxa de spoilers baixa, direi apenas que os roteiristas acharam um modo bem criativo de zerar o seriado original de TV sem desrespeitá-lo (muito pelo contrário) e que o ator que faz o Dr. McCoy realmente rouba o show: só esse cara já me dá vontade de comprar o DVD.
Cientificamente falando, a trama depende de algo que é chamado de “red matter”, e que parece ser uma espécie de “combo” ficcional de matéria escura com matéria exótica.
Algo parecido já havia sido usado por Greg Bear em sua série de livros iniciada por Eon, nos longínquos anos 80, o que mantém o velho ditado de que os conceitos que aparecem na ficção científica literária só chegam à cinematográfica de 20 a 30 anos mais tarde.
O mais interessante, filosoficamente falando, no entanto, (atenção! isto pode ser um spoiler!) é a presença do Spock “velho” (Leonard Nimoy) no presente do Spock “jovem” (Zachary Quinto). Sempre que vejo uma história de viagem no tempo onde uma pessoa volta ao passado, eu me pergunto: da onde vêm os átomos desse cara?
Digo, não podem ser os mesmos átomos que compõem seu ego passado, certo? Eles já estão em uso, e além disso o corpo humano (e possivelmente o corpo vulcano, também) troca todas as partículas que o compõem a cada, o quê, sete anos?
A resposta óbvia e que os átomos vieram do futuro, mas se esse é o caso, então agora no passado eles também estão em uso, só que em outros lugares — paredes, plantas, naves espaciais, outras pessoas. Para evitar uma violação da lei da conservação da energia, seria preciso que esses átomos fossem arrancados de seus locais atuais para compor o corpo do viajante do tempo.
Isso parece fácil — afinal, uma planta, uma árvore ou uma pessoa não vão sentir falta de um átomo de carbono aqui, um de hidrogênio ali. Mas, e se um átomo de nitrogênio acabar arrancado do DNA de alguém? A materialização do homem no passado pode produzir um ou mais casos de câncer ou de defeitos congênitos!
Outro problema: quanto maior a “distância” viajada em direção ao passado, maior a probabilidade de os átomos estarem muito afastados: neste fim de semana bebi um vinho argentino, o que significa que, hoje, alguns átomos do meu corpo são originários de parreiras de Mendoza; e nem me pergunte a origem do bife do almoço de ontem.
Num universo como o de Jonada nas Estrelas, onde viagens a dobra espacial são corriqueiras, é provável que os átomos que, no futuro, irão se reunir para dar forma ao corpo de Spock estejam, no passado, dispersos por todos os cantos da galáxia. Para dar corpo ao viajante do tempo em sua chegada ao passado, eles terão de percorrer vários anos-luz em poucos instantes!
O escritor Philip José Farmer lidou com essa dificuldade em seu romance Time’s Last Gift, uma das histórias de viagem no tempo mais bem resolvidas que conheço.
Por fim: não me entenda mal. Não estou escrevendo isto para fazer pouco caso do filme, nem com espírito nitpicker. É só que a ficção científica às vezes também é chamada de ficção especulativa, e para mim uma das maiores diversões oferecidas pelo gênero é exatamente essa: a oportunidade de especular.

Fazendo troco

O táxi da rodoviária até minha casa fica em R$ 11, o que é um valor bem desajeitado, dada a falta de vocação do brasileiro para lidar com moedas e o fato de a menor nota de real que se encontra com facilidade por aí ser a de R$ 2 (grato ao Roberto Takata pela correção — confira no primeiro comentário abaixo). O que geralmente faço é pagar R$ 15 e receber R$ 4 (duas notas de dois) de troco.
Em linhas gerais, a forma mais eficiente de se fazer troco costuma ser (nem sempre é; isto é uma algoritmo heurístico, não um teorema) dar o máximo de notas (ou moedas) da denominação mais alta possível abaixo do valor a trocar, depois o máximo de notas ou moedas da denominação imediatamente inferior, e assim por diante.
Seguindo essa técnica, às vezes chamada de “método ganancioso”, a melhor forma de se fazer um troco de R$ 0,95 (o maior valor que se pode obter com moedas baixo de R$ 1, já que o real aboliu a moeda de R$ 0,01) é com uma moeda de 50 centavos, uma de 25 e duas de dez — quatro moedas. Isso faz com que o tamanho do troco médio em reais seja de 2,5 moedas (4 moedas do maior troco, mais 1 moeda do menor, que é R$ 0,05, dividido por dois).
Esse é um número menor que as médias da maioria das moedas que, como nós, também usam o sistema decimal. O dólar, o euro e a libra esterlina atual requerem um troco médio de cerca de 4 moedas. Mas, até aí, todos eles têm a moeda correspondente a 1 centavo, e o maior troco possível não é 95 centavos, e sim 99.
Em notas, no entanto, é possível fazer R$ 99. Pelo método ganancioso, é preciso usar uma nota de 50, duas de 20, uma de 5 e duas de 2 — seis notas, média de 3,5, mais próxima da internacional.
Já a quantia média de notas e moedas para se obter qualquer valor entre 5 centavos de real e R$ 99,95 é de 5,5. Uma questão interessante é tentar descobrir se a substituição de uma das denominações existentes por uma outra (digamos, a nota de R$ 20 por uma de R$ 25, ou a moeda de 10 centavos pela de 20 centavos ) não poderia gerar um resultado ainda mais eficiente.

Paradoxo de sexta (27)

O da semana passada, que chamei de Primeiro Paradoxo da Democracia, perguntava o que uma pessoa deve fazer quando está convicta de que uma decisão tomada democraticamente está errada. Esse paradoxo vem da Grécia Antiga — mais precisamente, do julgamento de Sócrates, que foi democraticamente condenado à morte, mesmo sendo inocente. A solução socrática é a máxima de que “os homens bons devem obedecer às leis ruins, para que os maus não tenham pretexto para desobedecer às boas”. No geral, parece-me um bom princípio… mas realmente não sei como eu reagiria diante de um copo de cicuta!
Nesta semana, volto aos paradoxos lógico-científicos. E vou direto a um clássico: o Paradoxo dos Gêmeos.
É assim: de dois irmãos gêmeos idênticos, um embarca numa nave espacial capaz de atingir um fração significativa da velocidade da luz; o outro fica na Terra, e espera 80 anos pelo retorno do irmão que, quando retorna, aparenta ter envelhecido apenas cinco ou seis anos — enquanto que o irmão que ficou por aqui é um senhor centenário!
Ao contrário da crença popular, o paradoxo não é a diferença de idade entre os gêmeos. Ela se explica perfeitamente com a aplicação da relatividade restrita, e pode ser calculada em detalhes por meio das transformações de Lorenz.
O paradoxo reside no fato de que, pelo princípio da relatividade, faz tanto sentido afirmar que a nave espacial se afastou da Terra a uma fração significativa da velocidade da luz quanto dizer que a Terra se afastou na nave a uma fração… etc, etc.
Se não existe um sistema de coordenadas privilegiado pelas leis da física — que, ora bolas, é o que princípio da relatividade sustenta, pra começo de conversa — então como podemos afirmar que foi o irmão a bordo da nave que envelheceu mais devagar? Por que não é ele que volta centenário e encontra a Terra praticamente como a deixou (só que com a Dilma eleita presidente, ou algo assim)?
Cartas para a redação.

E depois do Hubble?

Os astronautas a bordo do Atlantis estão arriscando o pescoço para consertar o Telescópio Espacial Hubble. Eu diria que há motivos piores para arriscar o pescoço, e se há uma missão espacial tripulada que vale o perigo e o custo é esta, a STS-125.
O problema é: e todas as outras? Para que precisamos de astronautas, afinal? Trata-se de uma pergunta incômoda, especialmente para mim, entusiasta da exploração espacial “humana” (adjetivo aqui usado para contrastar com “robótica”).
Meu primeiro impulso é responder: tá, e para quê precisamos de pilotos de fórmula 1? Esses caras também arriscam a vida sem um propósito claro, a bordo de equipamentos caríssimos. O problema, óbvio, é que a fórmula 1 não faz isso sugando parte do (minguado) orçamento da ciência.
O que aponta para a ideia de tornar a exploração espacial humana “presencial” uma atividade econômica que ande com as próprias pernas. Deixe que as grandes corporações extraiam titânio da Lua e logo teremos metrópoles dentro das crateras, com a vantagem de que teremos menos crateras de mineração aqui na Terra.
Não vai surpreender a ninguém o fato de que, nos Estados Unidos, existe toda uma subcultura dedicada a promover exatamente esse ponto de vista, que ganhou impulso nos clima intelectual de ultra-mega-hiper liberismo econômico do governo Reagan, murchou um bocado desde então, mas nunca desapareceu.
Talvez o primeiro plano de negócio para colonização espacial tenha sido o de Gerard O’Neil, com seu visionário livro de 1976, The High Frontier. Mais recentemente, o geólogo, ex-astronauta, ex-senador republicano e único cientista a pisar na Lua (todos os outros astronautas do programa apollo eram militares ou ex-militares), Harrison Schmitt publicou Return to the Moon, um plano de negócios para a reconquista da Lua que pede, logo de cara, a revogação dos tratados internacionais que proíbem a posse de corpos celestes — afinal, quem vai investir num terreno do qual não se é dono?
Menos radical, a Planetary Society (PS) apresentou, no fim do ano passado, seu plano para exploração espacial no século 21, que começa tímido, pedindo viagens tripuladas a asteroides antes de um retorno à Lua. A matriz do plano da PS se baseia num esforço estatal e intergovernamental, não apostando numa nova era de hipercapitalismo extraplanetário.
Enquanto isso, o governo Obama ainda não nomeou um novo diretor para Nasa, e pôs o plano de estabelecimento de bases lunares do governo Bush em revisão.
Pessoalmente, creio que o espaço terá de desempenhar um papel importante nas discussões sobre a sustentabilidade da civilização humana. E não se trata da velha estratégia do gafanhoto — vamos sugar a Terra e depois partir para outra (mesmo porque não há outra) — mas, sim, de complementaridade: vamos trocar Carajás por um asteroide de ferro, produzir energia solar em órbita (onde não há nuvens e o sol brilha o tempo todo) e não em termelétricas ou hidrelétricas, dar às pessoas em busca de oportunidade econômica a opção de desbravar a Lua ou Marte, e não a floresta amazônica ou o hábitat dos gorilas do Congo.
É óbvio que isso tudo custaria caro pra burro, e sendo a humanidade o que é, o tal custo só vai ser encarado quando for — mesmo — inevitável e — talvez — tarde demais.

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