Paradoxo de sexta (10)
Quanto ao paraoxo, número 9, ele morreu rapidinho e de boa morte: realmente o erro está na extração das raízes quadradas, que não levou em consideração a possibilidade das raízes negativas.
Como o desta semana é o número 10, resolvi pegar um osso mais duro de roer (ou, ao menos, que a mim me parece mais duro…). Ele parte de duas constatações lógicas simples.
Primeiro: a formulação lógica a -> b (“se a, então b”) é sempre verdadeira quando o primeiro termo, “a”, é falso (para mais detalhes, leia aqui).
Segundo: uma disjunção — uma formulação do tipo A ou B — já é verdadeira se apenas um dos termos for verdadeiro. Assim, “Elvis estão vivo ou a Lua tem fases” é verdade.
Desses dois fatos, dá para concluir que a construção (a->b) ou (b->a) é sempre verdade. Porque, se “a” for falso, o primeiro termo entre parênteses é verdadeiro; se “b” for falso, o segundo é. Se tanto “a” quanto “b” forem verdadeiros, os dois parênteses também são, e a disjunção continua verdadeira.
Mas se estamos validando essa estrutura, estamos validando também a seguinte afirmação:
(Se um número é primo então ele é ímpar) ou (Se um número é ímpar, então ele é primo). Como 2 é par e primo, e já provamos que essa estrutura lógica só dá resultados verdadeiros, somo sentão obrigados a concluir que todos os números ímpares são primos.
O que, obviamente, não é verdade. Então, onde escorregamos…?
Metafísica e ortografia
Sempre impliquei um pouco com a idéia, relativamente comum mesmo entre cientistas, de que a compreensibilidade da natureza — isto é, o fato de que é possível, por meio de observações, descobrir leis naturais, elaborar teorias, prever o comportamento futuro do mundo — seria um “dogma metafísico” da ciência. Ou, em outras palavras: que é algo que é preciso aceitar “por fé”, sem justificativa, algo tão arbitrário quanto, digamos, acreditar em deus.
Minha implicância vem do fato, que a mim me parece óbvio, de que, embora a pressuposição de que o universo é inteligível seja, mesmo, necessária para dar início à atividade científica, essa pressuposição não é mais dogmática que, digamos, a existência do éter luminífero ou do flogísitico: uma idéia útil, um ponto de partida conveniente mas que pode, eventualmente, vir a ser descartado.
Se for descartado a ciência acaba, mas e daí? Talvez a última descoberta científica seja a de que a ciência, a partir de um certo ponto, é impossível. Frustrante, sem dúvida, mas perfeitamente concebível (embora muito pouco plausível).
O fato é que a inteligibilidade do mundo vem se confirmando. Ao pressupô-la, o cientista é como o homem que, andando numa noite escura e aproximando-se do lugar onde sabe que há um abismo, diz a si mesmo: “Suponho que há uma ponte à frente”. Ele pode até dar o primeiro passo sobre a ponte como um ato de fé; mas se ela não estiver ali, ele vai cair. O fato de a ciência não ter caído (ainda) no caos permite supor que a ponte se estende ainda por alguns metros adiante. Dado o primeiro passo, os seguintes não são sustentados por fé ou por dogma, e sim por um piso muito concreto.
No entanto, nos debates em torno do tema, sempre me vi incapaz de oferecer um exemplo que convencesse os defensores da idéia de que a ciência tem base dogmática de que seria possível detectar “o fim da ciência”. Será que o dogma simplesmente não impeliria os cientistas cada vez mais á frente, levando à criação de teorias cada vez mais malucas e cada vez menos eficientes, a impor regularidades baseadas em wishful thinking e leis imaginárias ao caos?
Bom, achei o exemplo de ciência impossível: a reforma ortográfica da língua portuguesa!
Ortografia não é uma ciência mas, em teoria, poderia ser um modelo de objeto de estudo: um conjunto de algoritmos que permite escrever palavras dentro da norma culta da língua. Cientificamente — por observação, dedução, formulação e teste de hipóteses — deveria ser possível descobrir esses algoritmos, como um cientista descobre as leis da natureza.
O fato, no entanto, é que o aparente algoritmo ortográfico é uma ilusão: ele funciona até certo ponto, e em seguida se perde em exceções, dúvidas, no gosto pessoal dos autores. Microonda virou micro-onda porque o pseudo-algoritmo diz que o hífen deve separra duas vogais iguais no encontro de prexifo (micro) e raiz (onda). Mas preexistir não vira pre-existir, continua como era.
Enfim: o Universo poderia ser como a nova ortografia do português: a conservação da energia poderia ser tão arbitrária como micro-ondas e peexistir. Mas não é.
Pelo menos, não até onde sabemos…
Conhecimento, para quê?
Perguntaram-me, em um comentário a uma postagem mais antiga, se, afinal de contas, inteligência é uma coisa que realmente vale a pena. Comecei a responder ao comentário dizendo que “inteligência” é um conceito meio amplo — pode se referir desde à principal estratégia evolucionária do Homo sapiens, ao discernimento para tomar decisões sábias, ao acúmulo de conhecimento e à aplicação tecnológica desse conhecimento.
De tudo isso, pessoalmente só sou cético quanto ao valor evolucionário da “inteligência” entendida como aquilo que o cérebro humano faz e que é diferente de tudo aquilo que os cérebros das outras criaturas da Terra fazem. Minha explicação favorita para o Paradoxo de Fermi é a de que somos a única espécie inteligente da galáxia, mas não porque sejamos especiais, e sim porque a autoconsciência e a capacidade de conceptualização simplesmente são ineficientes demais, darwinianamente falando, para terem sido adotadas em outras biosferas.
Mas, bem: diante do fato consumado de que temos inteligência no sentido, digamos, biológico… Ciência e tecnologia são realmente o que de melhor podemos fazer com ela? A humanidade não era mais feliz em tempos mais ignorantes? Não deveríamos estar tentando responder às perguntas realmente importantes?
Respostas curtas: sim, não, importantes para quem, cara-pálida?
Começando pela pergunta número dois: a idealização do passado é, basicamente, um erro de foco. Talvez a melhor explicação disso tenha sido dada por Isaac Asimov, quando disse que todo mundo que acha que teria sido mais feliz na Atenas de Péricles, Sócrates e Sófocles sempre se imagina reclinado em liteiras, comendo azeitonas e queijo de cabra, ou discutindo filosofia na ágora… Mas não trabalhando até a morte como escravo nas minas de prata.
Generalizando: a vida melhor do passado não passa de uma versão altamente idealizada a vida da classe dominante do passado.
A faxineira cabeça-dura que bagunça meus livros toda vez que vem tirar pó aqui em casa me enche de saudades do tempo em que os mordomos falavam três línguas e sabiam organizar os clássicos gregos em ordem alfabética (grega) na estante, mas o fato é que, naquela época, provavelmente eu seria o tal mordomo.
O que me traz à primeira pergunta: ciência e tecnologia são as duas forças mais democratizantes que existem. Mesmo que num primeiro momento o conhecimento pareça concentrar ainda mais o poder e a renda, no médio e longo prazo o que ele faz é disseminar oportunidades (permitindo, por exemplo, que ex-mordomos tenham blogs).
Por fim: importante, para quem? Perguntas do tipo “qual o sentido da vida”, “existe uma razão para tanto sofrimento” ou “bacalhau vai melhor com vinho verde tinto, branco ou com um calamares rosé” são questões de foro íntimo, que não admitem, realmente, uma resposta do mesmo jeito que “qual a causa da gravidade” (o bóson de Higgs, espera-se) admite.
A busca da iluminação é uma busca solitária, a ser empreendida por quem acha que esse tipo de coisa vale a pena. Ou, se você é o tipo de pessoa que prefere que lhe digam as coisas (em vez de descobri-las por conta própria), saia de casa e vire à esquerda: cedo ou tarde um templo, igreja ou terreiro vai aparecer no seu caminho para aliviá-lo de suas dores metafísicas (e da carteira também, temo).
Um exemplo final: Carlos V (1500-1558), rei da Espanha e imperador romano, um dos homens mais poderosos de todos os tempos – além de boa parte da Europa, dominava a maior parte das Américas – tinha gota. A doença o transformou num inválido, incapaz até de andar, e o levou a abdicar em 1556.
Também tenho gota. Mas tomo meu remédio, controlo a dieta e, graças a isso, sou capaz de desfrutar de longas caminhadas. Enfim, eu, que só sou rei para a minha gata siamesa (e olhe lá), vivo melhor do que o mestre e senhor de dois continentes vivia, 500 anos atrás.
Paradoxo de sexta (9?)
Já estou perdendo a conta dos paradoxos… Bom, quanto ao da semana passada: o problema está no fato de que a frase “menor número natural que não pode ser especificado em menos de 14 palavras” refere-se a si mesma (já que se propõe a definir um número e pressupõe a si mesma como essa definição) mas o faz de modo autocontraditório, pois tem 13 palavras. Trata-e, ao fim e ao cabo, de uma versão disfarçada da boa e velha “esta sentença é falsa”.
Como se trata de uma frase inconsistente, ela não pode ser usada para derivar provas.
Nesta desta semana, voltamos ao reino da álgebra. É mais uma prova de que 2=1, mas esta aqui não usa divisão por zero…
4 – 6 = 1 – 3 (porque -2 = -2)
4 – 6 + 9/4 = 1 – 3 + 9/4 (somamos 9/4 dos dois lados, a fim de criar dois binômios de Newton — a2 – 2ab + b2 — que podem ser reduzidos à forma (a – b)2, que é exatamente o que fazemos no próximo passo…)
(2 – 3/2)2 = (1 – 3/2)2
Daí:
2 – 3/2 = 1 – 3/2
Somando 3/2 aos dois lados da igualdade, voilà:
2 = 1
Dia em que a Terra Parou
Críticos e jornalistas já escreveram esmerilhando a triste refilmagem do clássico de Robert Wise, mas do ponto de vista da divulgação científica, o mais asustador é ver como um filme tão ruim se esforça tanto para soar cientificamente plausível. Produções desse tipo correm o risco de dar à verossimilhança científica uma fama tão ruim que em breve teremos gente saudando o valor estético a propagação do som no vácuo.
Senão, vejamos (spoiler alert, pra quem liga para essas coisas): o alienígena Klaatu chega à Terra num corpo humano sintético, clonado a partir de uma amostra de tecido — ponto para o filme, já que escapa do clichê do alienígena “naturalmente” humanóide; a astrobióloga interpretada por Jennifer Connelly estuda bactérias extremófilas, algo que muitos astrobiólogos de verdade realmente fazem; os alienígens decidem destruir a Terra usado máquinas de Von Neumann, o que não deixa de ser uma boa idéia e um pensamento original — para os padrões de Hollywood.
(Ok, eles invantam um prêmio Nobel esquisito para “pesquisa em altruísmo biológico”. Seria o de fisiologia? Da paz? Ou o de economia? Mas o de economia não é um Nobel “oficial”.)
E, a despeito disso tudo, o filme é uma bomba. Péssimo roteiro, atuações nada inspiradas e um monte de outras coisas. Ninguém ainda disse que o filme é chato por ser “científico demais”, mas é preciso manter a vigilância: O Dia em que a Terra Parou não é um filme lamentável por ter tentado acertar na ciência, mas a despeito disso.
Paradoxo de sexta (atrasado)
Oi, gente!
Por motivos de força maior (i.e., uma viagem a Campos do Jordão onde uma série de degustações de cerveja me manteve com um nível de álcool no sangue que me tornou incapaz de blogar) o primeiro paradoxo do ano chega com um dia de atraso…
Quanto ao paradoxo da semana passada, o das Gerações Futuras: ainda há um bocado de discussão sobre onde exatamente está a falácia do enunciado, mas o principal ponto fraco do paradoxo é a suposição (que não é explicitada) de que deveres morais só existem entre indivíduos específicos. Assim, se o “Plano Devastação” não tivesse sido posto em prática, é verdade que os 50 milhões de mortos do futuro não teriam nascido, mas outras pessoas teriam, e teriam tido vidas mais longas e melhores.
Resumindo: meu dever para com as gerações futuras de minha família (por exemplo) é meu dever para com meu bisneto Chico Cretino, que vai ser médico, heterossexual, surfista, ganhador do Nobel ou para com qualquer descendente que venha a surgir?
A solução do paradoxo está na resposta a esta pergunta.
Para refrescar um pouco a área, vamos a um paradoxo matemático. Esta é a prova de que qualquer número natural (1,2,3,4…, nada de frações ou negativos) pode ser perfeitamente especificado em 14 palavras ou menos da língua portuguesa.
“Perfeitamente especificado” quer dizer exatmente isso: dada uma frase de menos de 14 palavras, existe um, e penas um número que corresponde à descrição, como “número primo e par” especifica perfeitamente o número 2.
Agora, é óbvio que é impossível especificar todos os números em 14 palavras ou menos. Afinal, há infinitos números, e o total de frases do português que fazem sentido e que podem ser compostas por até 14 palavras é finito. Um conjunto finito não pode exaurir um conjunto infinito. Logo…
Mas, eis a prova:
Suponha que exsite um número “n”, que é o menor número natural que não pode ser especificado em menos de 14 palavras.
Mas, ei, eu acabei de especificar esse número em menos de 14 palavras: “menor número natural que não pode ser especificado em menos de 14 palavras” é uma fase de TREZE palavras! (pode contar).
Logo, a suposição de que existe um menor número qu não pode ser especificado em menos de 14 palavras leva a uma contradição. Logo, trata-se de uma suposição falsa.
Portanto, não existe um menor número natural que não pode ser especificado em menos de 14 palavras. E como todo conjunto de números naturais pode, por definição, ser organizado em ordem crescente, o fato de não existir um número menor em um conjunto só pode significar que o conjunto inteiro não existe.
Portanto, todos os números naturais podem ser especificados em menos de 14 palavras.
Paradoxo de sexta (7)
O da semana passada foi abatido assim que levantou a cabeça: trata-se, de fato, de uma divisão por zero. Existe toda uma coleção de “provas” matemáticas absurdas que dependem de um pouco de prestidigitação para passar uma divisão por zero por baixo do nariz das pessoas — a que apresentei nem foi a mais das mais sofisticadas (algumas, depois de introduzir a igualdade a = b, um pouco mais adiante inventam uma fração com o denominador 2a2-2ab, bem melhor que o meu tosco a-b).
Bom, como este é o último paradoxo do ano, resolvi apresentar um clássico da encruzilhada entre ética e ambientalismo, o Paradoxo das Gerações Futuras. É o seguinte:
Imagine que surja um plano econômico para, digamos, liberar geral na exploração da Amazônia. Corte-se madeira à vontade, cavem-se minas de todo tipo, espalhe-se a soja, a cana, o gado. Imagine, ainda, que fique demonstrado que esse plano trará enormes benefícios econômicos prara as próximas 5 gerações de brasileiros: desfavelização das grandes cidades (com as pessoas correndo em busca de oportunidades no Norte), crescimento desenfreado do PIB, desemprego zero, fim da miséria e da pobreza. Mas a sexta geração enfrentará um colapso ecológico sem precedentes, que causará a morte — por fome, sede, doenças — de 60 milhões de pessoas.
A questão é se as pessoas responsáveis pela adoção do plano têm algum tipo de responsabilidade moral para com as vítimas da sexta geração (e, claro, das gerações seguintes, já que o pepino será passado adiante). A resposta paradoxal é: não. Por quê? Porque, sem a grande movimentação social, a elevação de renda e as migarções geradas pelo plano, essas pessoas sequer teriam nascido. Seus pais, muito provavelmente, sequer teriam se encontrado. Não importa se vão morrer por causa do plano: elas devem a vida a ele, e portato não têm do que reclamar.
Generalizando, a geração atual não tem nenhuma obrigação para com as gerações futuras, porque todos os indivíduos do futuro devem a existência ao que é feito no presente — tanto aos erros quanto aos acertos.
Certo?
Feliz Newtal!
Esta época do ano sempre foi de festas para povos da Europa, mesmo antes do nascimento de Jesus. Os romanos celebravam a Saturnália; os bárbaros germânicos, o Yule. Sob um ponto de vista secular, o Natal é apenas mais uma das várias celebrações que, no Hemisfério Norte – da onde tiramos isto que chamamos de civilização – coincidem com o início do inverno.
Antes das pessoas notarem que o Sol é um fenômeno natural, não um deus cheio de ciúmes e caprichos, o inverno chegava envolvido num forte misticismo. Daí, a riqueza e antigüidade dos velhos festivais.
Aliás, como não se sabe o dia em que Cristo nasceu, especula-se que o 25 de dezembro foi escolhido para o Natal para bater com as festas antigas. Assim, as pessoas poderiam largar o deus-sol sem abrir mão dos presentes e da comilança.
O Natal não é a última festa a se apropriar da data. Há também o “Newtal”, homenagem ao cientista Isaac Newton, nascido em 25 de dezembro de 1642. A árvore de Newtal é uma macieira, porque a lenda diz que Newton pensou na Lei da Gravidade quando uma maçã lhe caiu na cabeça.
Ninguém precisa ser cristão para celebrar o Newtal. É uma vantagem. Mesmo assim, não creio que ele vá substituir o Natal tão cedo (e nem tão tarde). Mas seria legal se todos se deixassem tocar pelo espírito de Newtal: mais descobertas, mais inteligência e idéias novas, menos tradicionalismo e preconceito. Eis meus votos para 2009.
Histórias de Natal
Há alguns anos, a revista Time fez uma reportagem de capa sobre as inconsistências que existem nas duas narrativas da natividade de Jesus presentes na Bíblia. Pouca gente teria como saber disso só pelos trechos do evangelho que costumam ser lidos na missa, mas o fato é que, das quatro “biografias autorizadas” de Jesus, só duas — as atribuídas a Mateus e Lucas — narram o nascimento do messias, e o fazem de forma gritantemente auto-excludente: só com muita teologia do crioulo doido é que dá para pensar que ambas são a mesma história.
Em Mateus, o casal José-Maria é natural de Belém, mas foge para o Egito a fim de escapar da perseguição de Herodes (no caso do “massacre dos inocentes”, que nenhum historiador da época, nem mesmo os inimigos políticos de Herodes, registra) e, depois, acaba radicando-se em Nazaré. Jesus nasce na casa de José (nada de manjedoura e vaquinhas de presépio) e recebe avisita do três sábios do Oriente.
Em Lucas, a família é de Nazaré para começo de conversa, mas é forçada a viajar a Belém por conta de um censo ordenado pelos romanos e que exige que cada família seja contada na terra de sua tribo, e não no local onde vive — outro detalhe que nenhuma história registra e que, de fato, não faz sentido: afinal, para que diabos um adminsitrador precisaria saber da onde cada família se origina? o importante é saber quantas bocas a para alimentar em cada lugar (ou, talvez, quantos homens saudáveis cada cidade tem a oferecer ao exército…).
Aí entra a conversa da manjedoura. Mas neca de Egito, magos ou Herodes.
Curiosamente, essas inconsistências estão entre os fatores que levam os historiadores a supor que é provável que o mito de Jesus tenha, de fato, se inspirado em uma pessoa real: ambos os autores se dão a um bocado de trabalho para explicar como um sujeito conhecido pela alcunha de “Nazareno” poderia ter nascido em Belém — o que é algo como um cara nascido em Porto Alegre acabar ficando famoso como “Alagoano”.
A idéia geral é que o Jesus histórico provavelmente era de Nazaré, mas que o mito judaico exigia que o messias fosse nascido em Belém, daí a embromação.
Sempre que penso nessa história, fico com pena de Herodes. O cara estava longe de ser uma flor, ma não era essencialmente pior que a média dos monarcas da época, com a queda usual para intriga palaciana, paranóia e assassinato político de parentes e amigos. Mas acabou entrando para a consciência coletiva como um monstro sanguinário.
Paradoxo de sexta (6)
Mais uma vez, a Advogada detonou o da semana passada: tanto os pontos na reta quanto os pontos no quadrado são instâncias do continuum, ou aleph-1, um dos números cardinais definidos por Georg Cantor para se referir às propriedades de conjuntos infinitos. Antes de aleph-1 há aleph-0, que é o número cardinal do conjunto dos números naturais (1,2,3,4…). É possível demonstrar que aleph-1 é maior que aleph-0.
Em linhas gearis, o paradoxo da última semana chama atenção para uma propriedade comum a conjuntos infinitos: basicamente, que o cojunto inteiro pode ser posto em relação um a um com uma parte de si mesmo. O exemplo clássico é o dos números pares. É possível criar uma lista assim:
1 -> 2
2 -> 4
3 -> 6
etc.
De forma que, embora apenas metade dos números naturais seja par, fica provado que a cada número natural, corresponde um número par.
Mas vamos ao desta sexta. Este é um clássico, que não poderia ficar fora da lista:
a = b
a2 = ab
Subtraindo b2 de ambos os lados, temos:
a2-b2 = ab-b2
Fatorando:
(a+b)(a-b) = b(a-b)
Rearranjando os termos:
b = (a+b)(a-b)/(a-b)
Simplificando a fração à direita, temos:
b= a+b
Mas, pela premissa inicial, a = b, logo:
b = 2b
1 = 2.