Nosso grito de independência energética ainda está atravessado na garganta
Produzido a partir da cana-de-açúcar e conhecido pelos brasileiros há mais de 30 anos, o etanol foi a resposta nacional para a crise do petróleo e a busca de um combustível mais limpo. Entretanto, para encher o tanque do seu carro, é necessário meia tonelada de cana. E mais: o etanol tem apenas 2/3 da eficiência da gasolina e requer áreas que poderiam ser empregadas para o plantio de alimentos. O Projeto Pró-Álcool, criado na década de 70, parecia ser nosso grito de independência na área de energia automotiva. Mas este grito corre o risco de ficar atravessado na nossa garganta. Em 1975, uma tonelada de cana-de-açúcar era capaz de produzir 65 litros de álcool. Quase quarenta anos depois, este número subiu para apenas 90 litros.
Em 2012, durante o encontro Rio +20, quarenta minivans abastecidas com etanol de segunda geração foram utlizadas no evento. A diferença do etanol de segunda geração é que este pode ser fabricado a partir da celulose, presente em qualquer parte da planta, como bagaço, palha e folhas. Essa nova tecnologia deve aumentar em 40% a produção sem que haja crescimento da área plantada e espera-se que atinja preços competitivos em 2016. Isso é muito importante pois o plantio da cana no Brasil já ocupa 8,1 milhões de hectares, uma área quase do tamanho de Portugal. A expansão desta cultura deslocaria pastos e outras plantações para o interior do país, intensificando o desmatamento, o uso de fertilizantes e o aumento dos preços.
Por isso, diversas empresas, principalmente americanas, estão correndo atrás dos combustíveis conhecidos como “drop in fuels”, assim chamados pois utilizam a mesma infraestrutura de distribuição e armazenamento dos combustiveis fósseis e não exigem alterações no motor. A start-up Joule Unlimited pretende entregar o que eles chamam de Liquid Fuel from the Sun™ usando apenas três ingredientes: luz solar, CO2 e água não potável. Sem ocupar áreas agrícolas, alimentos nem água limpa, a empresa emprega cianobactérias geneticamente modificados para produzir lipídios e carboidratos que podem ser convertidos em etanol, gasolina, diesel e combustível para avião. A Audi está apostando nisso. Ela fez uma parceria com a Joule Unlimited para testar os combustíveis Sunflow™-E (etanol) e Sunflow™-D (diesel) e oferecer um transporte pessoal sem emissão de CO2.
Embora a primeira coisa que venha à mente quando se fala em petróleo seja combustível, ele na verdade está incorporado em muitos dos produtos que usamos no dia-a-dia. Fertilizantes, pesticidas, cimento, plástico, produtos farmacêuticos, roupas sintéticas são apenas alguns itens que dependem dele. Por isso, para a LS9 (Life Sustain 9-Billion), “o melhor substituto do petróleo é o petróleo”. A empresa que tem como co-fundador o cientista George Church está desenvolvendo uma E. coli capaz de produzir hidrocarbonetos sob medida utlizando uma variedade de fontes de carbono, como cana-de-açúcar e milho. O objetivo maior é desenvolver o micro-organismo para utilizar polissacarídeos não comestíveis ao invés de fontes de alimento. A tecnologia permite que sejam selecionados o comprimento da cadeia carbônica, ramificações, saturação e grupo funcional. O produto então formado é secretado pela bactéria e permite que seja facilmente removido do meio de cultura. Um dos produtos da LS9, é o UltraClean DieselTM, que já recebeu aprovação da EPA (Environment Protection Agency) para ser comercializado. Para a produção em massa a empresa adquiriu em 2010 uma planta de biodiesel em Okeechobee, na Florida onde pretende produzir incialmente entre 190 e 380 mil litros.
Mas o verdadeiro combustível de uma nação não é o petróleo, o etanol, a energia atômica ou solar, mas sim o capital financeiro e o capital humano que são investidos em P&D. Este é o caminho que temos que seguir. A biologia sintética pode ajudar a solucionar muitos dos nossos problemas de modo eficiente, utilizando micro-organismos que não dependam de terras aráveis, fontes de alimentos e água potável para produzir hidrocarbonetos. Investir em pesquisas, em novas tecnologias, em empreendedores e profissionais brasileiros é o que o país precisa para dar seu verdadeiro e definitivo grito de independência.
Referências:
- Regenesis: How Synthetic Biology Will Reinvent Nature and Ourselves – George McDonald Church, Edward Regis
- The Ripple Effect: Biofuels, Food Security, and the Environment – by Rosamond L. Naylor, Adam J. Liska, Marshall B. Burke, Walter P. Falcon, Joanne C. Gaskell, Scott D. Rozelle, and Kenneth G. Cassman
- http://www.clicrbs.com.br/especial/rs/expointer-2010/19,0,2888234,Area-plantada-de-cana-cresce-9-2-para-8-1-milhoes-de-hectares.html
- http://exame.abril.com.br/meio-ambiente-e-energia/energia/noticias/o-etanol-de-segunda-geracao-esta-mais-proximo
Sequenciamento em Marte
Tem gente que jura já ter visto discos voadores e até ter entrado em contato com extraterrestres. Verdade ou não, esse é um assunto que desperta curiosidade em muitos e medo em tantos outros. Ao contrário do imaginário popular, é provável que os seres extraterrestres já tenham chegado na Terra há 4 bilhões de anos e que nós evoluimos a partir deles. É isso o que sugere uma teoria conhecida como panspermia.
Talvez não seja mais necessário esperar por alienígenas visitarem nosso planeta ou uma longa discussão sobre a veracidade dos organismos fossilizados encontrados em meteoritos para confirmar a existência de ETs. Em breve teremos acesso ao código genético de organismos marcianos, de acordo com a proposta de dois cientistas, Craig Venter e Jonathan Rothberg. Ambos estão em uma corrida, embora não declarada oficialmente, para sequenciar o DNA de possíveis formas de vida que existam ou existiram em Marte. Por isso, eles querem uma carona até o planeta vermelho para sequenciar possíveis formas de vida que possam encontrar por lá.
A carona não é para eles, mas para o sequenciador que pretendem enviar. Venter está confiante que
encontrará formas de vida que contenham DNA em Marte, como afirmou em uma conferência da Wired Health no ano passado, em Nova York. Sua equipe está desenvolvendo e testando o que ele chama de “teletransporte biológico”. Um robô que será enviado para Marte capaz sequenciar o DNA encontrado no local, mesmo que seja de uma única célula, e transmitir a sequência do organismo extraterrestre para um computador aqui na Terra. De acordo com ele, testes já estão sendo feitos no deserto de Mojave, onde cientistas simulam as condições de exploração do espaço. Com o DNA digitalizado será possível sintetizá-lo, injetá-lo em uma célula universal receptora e dar vida a um ET. A entrevista completa sobre esse assunto pode ser assistida aqui (11:00).
Correndo em outra frente está Jonathan Rothberg, fundador da Ion Torrent, em um projeto financiado pela NASA chamado SET-G (The Search for Extra-terrestrial Genomes) também pretende sequenciar DNA no planeta vermelho. Para isso será necessário reduzir o tamanho de seu sequenciador de grande sucesso, o Ion Personal Genome Machine, de trinta para apenas três quilos, viabilizando a viagem de milhões de quilômetros.
Mas por que não trazer uma amostra de Marte? Tessi Kanavarioti, químico envolvido no estudo de pedras que vieram da lua na década de 70, garante: “Devido a possibilidade de contaminação, ninguém iria acreditar em você”. Foi o que aconteceu em 1971, quando astronautas da Apollo 12 trouxeram uma câmera de TV que ficou três anos na lua. Nela foi encontrada uma única bactéria Streptococcus mitis. Muitos disseram se tratar de uma contaminação, embora fosse apenas uma única bactéria. O micro-organismo estava dormente e ganhou vida novamente na Terra. Além da contaminação, o sequenciamento em Marte reduziria o tempo para obter essa amostra, caso ela fosse enviada para ser analisada por aqui.
Mas este é um projeto de alto risco. As moléculas de DNA possuem uma meia-vida de 521 anos (tempo que leva para metade das ligações fosfodiéster se romperem), portanto temos que acreditar que exista vida agora em Marte, ou organismos mortos há menos de 1,5 milhões de anos, caso contrário os fragmentos encontrados seriam muito pequenos e não trariam informações úteis. Além disso, nada garante que as formas de vida que possam existir por lá tenham os mesmos componentes do nosso DNA.
O espaço parece um local improvável de abrigar formas de vida como conhecemos, seja por conta da baixa temperatura, pouco oxigênio ou elevada radiação. Mesmo sem foguetes podemos encontrar organismos que vivem em condições que não consideramos favoráveis. Esses organismos são os extremófilos, ou seja, eles adoram condições extremas de pH, salinidade, temperatura ou radiação. Um caso interessante é a bactéria Deinococcus radiodurans, encontrada vivendo dentro de reatores nucleares. É provável que esses sejam os tipos de organismos que possamos encontrar em outros planetas.
Além de micro-organismos que conseguem sobreviver em condições que consideramos extremas, novas
evidências obtidas pelo robô Curiosity da NASA sugerem que o planeta já foi habitável. A análise de uma rocha sedimentar mostrou a presença de enxofre, nitrogênio, hidrogênio, oxigênio, fósforo e carbono, o que aumenta as chances de um possível sequenciamento dar certo.
Caso seja encontrado DNA, teremos mais evidências para sustentar a hipótese de que a vida não teve origem aqui na Terra e que ela pode ter evoluído de forma diferente em outros planetas. Uma próxima viagem para Marte está planejada pela NASA para 2018, mas nem Venter nem Rothberg tem lugar garantido ainda. O que torna a corrida ainda mais emocionante.
Referências:
- The Biological Big Bang: Panspermia and Origins of Life. Edited by Chandra Wickramasinghe, Ph.D.
- http://www.nature.com/news/dna-has-a-521-year-half-life-1.11555
- http://www.jpl.nasa.gov/news/news.php?release=2013-092
- http://www.technologyreview.com/news/429662/genome-hunters-go-after-martian-dna/
Experiência em Biologia Sintética – Monique Gasparoto
Entrevista feita por Mira Melke.
A Biologia Sintética é extremamente motivadora. Para provar isso e para mostrar o quão importante e distinta pode ser uma experiência em Biologia Sintética acima do equador convidei uma amiga, companheira dos tempo de Biomol (Ciências Físicas e Biomoleculares) para escrever um pouquinho para a gente.
Quem fala agora é a Monique:
Biologia sintética: impossível não se apaixonar!
Minha história com a Biologia Sintética começou como toda história de amor, umas paquerinhas para cá, um google search para lá, mas nada muito sério. A primeira vez que ouvi falar da área foi em 2009, quando nem havia descrições em português. O amor adormeceu enquanto eu me desdobrava para ser aprovada em todas as disciplinas do curso de Ciências Físicas e Biomoleculares da USP de São Carlos, do qual atualmente sou aluna do último ano. Envolvi-me em outra área de pesquisa, o mundo continuou a andar, mas quando eu menos esperava fui me reencontrar com minha paixonite dos tempos de caloura.
Como bolsista do programa Ciências sem Fronteiras, passei um ano na Boston University e além da incrível experiência de intercâmbio, tive a oportunidade de trabalhar no laboratório do professor Doug Densmore (CIDAR) e fazer parte do time do iGEM da Boston University. Eu não poderia sonhar em um lugar mais incrível para me aproximar da Synbio: estar em Boston onde as primeiras bases da área foram lançadas, fazer pesquisa em um laboratório exclusivamente de Biologia Sintética – em que todo mundo tem o site do Registry nos favoritos(!), assistir a palestras e seminários dos pesquisadores referência da área, como o Jim Collins, com quem dividíamos espaço de laboratório , visitar o Headquarters do iGEM e muitos outros aspectos me fizeram ter a certeza de que a Synbio veio para ficar não só na minha vida, mas certamente na de todos os que a conhecem.
O projeto que desenvolvemos para a competição trabalhava os três pilares do iGEM: construção, caracterização e compartilhamento das informações do Registry. Para isso introduzimos na competição o método de Clonagem Modular (MoClo) descrita por Weber et al, propusemos um protocolo de caracterização padrão para circuitos com proteínas fluorescentes usando citometria de fluxo e esboçamos uma página comum a ser usada no Registry em que as informação sobre as partes poderiam ser geradas automaticamente a partir do Clotho, uma plataforma para Biologia Sintética desenvolvida pelo meu orientador, Doug Densmore. Mais detalhes vocês podem conferir na nossa Wiki.
Foi um período de aprendizado intenso, porque era a primeira vez que o Densmore Lab apoiava um time de WetLab, a tradição dos anos anteriores era o time de software. Éramos dois alunos de graduação orientados por três alunos de doutorado e uma pós-doc, e nunca imaginei participar de um ambiente tão colaborativo e estimulante. É claro que parte disso é devido à excelente estrutura do laboratório e às facilidades dos meios de pesquisa, quem não ficaria feliz e contente com sequenciamentos de DNA que ficam prontos no mesmo dia e enzimas que chegam ao laboratório em no máximo 48h após a encomenda!? Mas o diferencial dessa experiência veio da oportunidade de vivenciar um ambiente de apaixonados por Biologia Sintética e perceber como eles desenvolvem suas pesquisas: com muita competência, muito estudo e muita motivação!
O que mais me cativa nessa área da ciência que agrega à biologia molecular conceitos e ferramentas da engenharia é que tão importante quanto o conhecimento técnico, é a inovação e a criatividade. Características que eu pude testemunhar de perto em todos aqueles que participaram do iGEM, e que ficaram ainda mais nítidas quando na fase final da competição em Boston, times do mundo inteiro, desde do Leste Asiático até a América do Sul se reuniram para sonhar, discutir e compartilhar suas propostas para tornar o mundo melhor, “one part at a time”.
Talvez não haja outro grupo de (malucos) cientistas que acredite tanto que seus projetos e conhecimentos podem mudar o mundo. Aí está o brilho da Synbio, que uniu pesquisadores de fronteira que não queriam mais ficar confinados às suas especialidades, mas decidiram sair de sua zona de conforto e ousar e empreender em grupos multidisciplinares. A ousadia desses biólogos sintéticos é tão grande que são capazes de investir cifrões de patrocínio e meses de trabalho em uma competição em que o grande prêmio, aos olhos dos mais céticos, é somente um BioBrick gigante. É como dizem por aí, a biologia sintética tem razões que a própria razão desconhece.
Especulações e Biologia Sintética
Minha vontade de discutir e aprender biologia, especialmente tudo aquilo que envolve a palavra DNA já me acompanha antes mesmo de entrar na faculdade. A solução que encontrei para suprir essa vontade e viagens por esse mundo, até então feitas apenas acompanhado de meu computador foi prestar uma prova de seleção para dar aulas de biologia no cursinho da UNESP.
Comecei dar aulas em 2012 e o melhor, da matéria que mais gosto, citologia e genética, afinal, eu queria falar de células, DNA, Mendel e não sobre insetos que possuem três pares de patas e um de antenas.
Certo dia, véspera de feriado e com chuva, resolvi passar um filme para discussão. O filme escolhido foi GATTACA. Ao final do filme, um aluno com os olhos arregalados que aparentavam demostrar grande interesse pelo assunto, levanta a mão e pergunta: “Esse tipo de previsão é possível?”
[youtube_sc url=”http://www.youtube.com/watch?v=L8yYjKa36No”]
GATTACA trata-se de um filme hollywodiano de ficção científica, infelizmente não poderemos prever a expectativa de uma pessoa ao nascer, mesmo uma década após a conclusão do Projeto Genoma. Hoje sabemos que os organismos dependem de dois tipos de informação, uma delas é o código genético e a outra são estímulos recebidos do meio ambiente em que vivem, sobre o qual não podemos fazer previsões.
O Projeto Genoma Humano, considerado por muitos a bola de cristal do futuro, foi cercado de promessas e esperanças da mídia e de Wall Street para o lançamento de medicamentos personalizados e previsões sobre riscos de doenças como Alzheimer e cânceres. Tal projeto prometia revolucionar a medicina, ao estilo do filme de ficção científica.
Pouco mais de dez anos já se passaram desde sua conclusão, uma batalha inciada em 1990 travada entre a iniciativa pública e a privada, que chegou ao fim depois de três bilhões de pares de bases sequenciadas e três bilhões de dólares gastos, além de uma briga entre o famoso James Watson e Craig Venter, marinheiro nas horas vagas. Para Nicholas Wade do NYT, o projeto falhou e não trouxe os benefícios tão esperados.
Embora as promessas aguardadas por muitos não chegaram, ele trouxe avanços significativos para a área da biologia. O Projeto Genoma Humano foi um projeto interdisciplinar, contando com a participação de cientistas de diversas áreas como computação, matemática, biologia entre outras, além da colaboração de laboratórios ao redor do mundo, inclusive do Brasil. Ele contribuiu significativamente para o avanço na área de biocomputação e nas técnicas de sequenciamento de DNA, além de permitir a democratização da informação por meio do acesso gratuito ao sequenciamento humano e de diversos outros seres vivos. Genes agora não precisam mais ser estudados de forma individual, hoje dispomos de uma extensa lista de partes biológicas que tem permitido o avanço na área de biologia de sistemas, que promete revolucionar o modo de tratar doenças e o sistema de saúde conhecido atualmente.
Tal fato nos faz refletir sobre as promessas em torno da área de biologia sintética, a qual acredita-se ser capaz de solucionar muitos de nossos problemas atuais como o elevado preço do petróleo, desastres ambientais e uma população cada vez maior para se alimentar. Ao invés de manipular alguns genes de cada vez, como se tem feito a mais de três décadas, graças a descoberta das enzimas de restrição, o campo da biologia sintética vai além e tem como objetivo recodificar e redesenhar circuitos genéticos. Parece não haver limites do que podemos fazer, no entanto tais circuitos não se comportam como circuitos eletrônicos. Sistemas assim costumam ter muita interferência e comportamento imprevisivel, além de estarem sujeitos a mutações. Segundo o cientista Christopher Voigt, “A célula é uma espécie de burrito, tudo dentro dela está misturado” e sujeito a uma variedade de reações bioquímicas, tal complexidade tem limitado o tamanho dos circuitos criados. Drew Endy, um dos pioneiros do ramo, acredita que a biologia sintética só atingirá seu potencial quando os cientistas forem capaz de prever com exatidão como um circuito genético se comportará dentro de uma célula. Para isso tem-se aplicado estratégias de engenharia, como a padronização, dissociação e a abstração.
Outro problema enfrentado é a caracterização das partes biológicas. Embora o Registry of Standard Biological Parts possua mais de cinco mil partes disponíveis, menos da metade tem seu funcionamento confirmado. Caracterizar algumas partes biológicas pode levar anos e não gerar dados para uma publicação. Na cultura do “publique ou pereça”, o que temos é uma grande quantidade de trabalhos, porém com poucos dados reproduzíveis e úteis.
Embora o custo de sintese e sequenciamento tenham caido de forma significativa facilitando o avanço da área, não podemos negar que ainda há muitas pedras no caminho. Nosso conhecimento ainda é limitado mesmo para compreender por completo o comportamento de organismos mais simples como bactérias e fungos unicelulares. Assim como o projeto genoma a biologia sintética também está rodeada por especulação e não podemos dizer onde estaremos em dez anos. Mas uma coisa é certa, aprendemos a ler agora estamos escrevendo código genético.
Referências
- The Promise and Perils of Synthetic Biology – Jonathan B. Tucker and Raymond A. Zilinskas
- Synthetic biology: from hype to impact – Timothy S. Gardner
- Five hard truths for synthetic biology – Roberta Kwok
- Initial impact of the sequencing of the human genome – Eric S. Lander
- http://web.mit.edu/newsoffice/2012/complex-biological-circuit-1007.html
SynbioBrasil na Campus Party 2013 e no Grok Podcast!
Autores Colaboradores: Cauã Westmann e João Molino
No dia 29 de janeiro fomos convidados para participar do evento Campus Party, no Parque Anhembi, SP, “o maior acontecimento tecnológico do mundo” segundo o site (discutiremos isso mais tarde…)! Criada há 16 anos na Espanha, ela atrai anualmente geeks, nerds, empreendedores, gamers, cientistas e muitos outros grupos criativos que se reúnem para acompanhar centenas de atividades sobre Inovação, Ciência, Cultura e Entretenimento Digital. O evento tem duração de 5 dias e um espaço para acampamento que reuniu cerca de 8.000 “campuseiros” em barracas.
Nosso grupo foi convidado para participar de uma apresentação na sessão da Galileu (sim, a mesma da revista!), apresentando a Biologia Sintética de forma sucinta e comparando-a com alguns aspectos operacionais da computação, buscando aproximar o público com a área. Os palestrantes foram o professor doutor da USP Carlos Hotta (IQ-USP) e o PhD em biotecnologia Mateus Schreiner Garcez Lopes (Brasken), dois grandes ponta de lança da Biologia Sintética no Brasil que fizeram um ótimo trabalho!
Bom, a apresentação ocorreu somente às 15h45min e como chegamos bem cedo, tivemos tempo suficiente para passear por muitos stands e apresentações no local. Grandes empresas patrocinaram o evento e marcaram sua presença por ali como Microsoft, Intel, IBM, Nvidia, Petrobrás, Vivo, Sebrae entre outras. Vimos centenas de computadores tunados, temáticos (veja a foto da CPU mafiosa) e com configurações de hardware extraordinariamente potentes; impressoras 3D e alas inteiras dedicadas a gamers. Entretanto, apesar dos 76 mil metros quadrados de área disponível do Parque Anhembi e do grande montante de investimentos envolvidos, o evento deixou muito a desejar…
Primeira grande pisada de bola: não havia uma rede de Wi-fi livre! É difícil de acreditar que um evento voltado para inovação e tecnologia não forneça conexões sem fio abertas. Pois bem, só estavam disponibilizados cabos para conectar o computador à rede, mas em uma era na qual tablets e outros portáteis são cada vez mais comuns, a ausência do Wi-fi prejudicou bastante nossas atividade e, principalmente, cobertura do evento! O Synbio Brasil que não pôde twittar nada durante o evento em decorrência disso. #chateado
Segundo, o espaço foi subutilizado. Grandes áreas eram destinadas a computadores que ficaram vazios na maior parte do tempo ou a grandes telões que mostravam apenas as expressões faciais de jogadores que competiam no evento. Além disso, muitos dos stands apresentavam pouquíssimo conteúdo, ocupando seu espaço com arcades, video-games, pinballs e máquinas de pegar bonequinhos de pelúcia. Até um enorme espaço reservado para um sorteio de automóvel havia ali.
Por último, houve certa desorganização operacional, principalmente no que tange à mobilidade do público dentro do Parque. Havia uma divisória entre os setores que apresentava seguranças e detectores de metais totalmente necessários, mas com apenas uma passagem estreita para quem ia e vinha em sentidos opostos, gerando grandes filas desnecessárias.
É claro que houve várias atividades legais, como a palestra do 2° homem a pisar na lua, o ex-astronauta Edwin Buzz Aldrin, e outros eventos com temas diversos sobre tecnologia, inovação e empreendedorismo e tudo isso foi muito válido. Muitas pessoas levaram suas ideias, produtos, computadores tunados, monitores triplos, jogos e programas e se beneficiaram muito da troca de experiências com os outros participantes. Ponto positivo novamente. Além disso, é importante ressaltar que ficamos apenas um dia no local e, por isso, opinamos sobre o que vimos apenas neste período de tempo, não conseguindo fazer um review sobre o evento como um todo.
O grande ponto forte da Campus Party desse ano foi promover o contato de milhares de pessoas para trocarem informações e experiências sobre os mais diversos assuntos e esse é um caminho importante para o desenvolvimento educacional, cultural e tecnológico do país. No entanto, senti que esse diálogo tão enriquecedor foi bastante fraco quanto à relação entre o público e às empresas presentes.
Faltou algum elemento de coesão… A ideia de que os participantes seriam atraídos apenas por brindes e entretenimento eletrônico foi um grande equívoco. Lá não estavam consumidores da velha definição capitalista, mas sim, felizmente, consumidores de ideias, pessoas inquisitivas e cheias de novas perspectivas. E para atender às suas demandas a logística claramente precisa se atualizar. Mas palma, palma, não criemos caniço (Chapolin et al, 1973)! Não há evento melhor do que a Campus Party para promover essa atualização do sistema!
Desse modo, a experiência foi muito válida e esperamos estar lá novamente em 2014 com muitas novidades para ver e mostrar!
EDIT: Cheque aqui o vídeo da palestra no evento (Obrigado pelo link Mariana Fioravanti!):
[youtube_sc url=”http://www.youtube.com/watch?v=VSvin1OzzIU”]
GrokPodcast
Recentemente, também, eu, Pedro Medeiros, e Otto Heringer pudemos ter a chance de participar do Grok Podcast. A página, sob comando de Carlos Brando e Rafael Rosa Fu, traz podcasts relacionados a tecnologia, principalmente tecnologia da informação, com podcasts nos quais profissionais explicam e discutem um determinado tópico de sua especialidade em uma série de episódios.
O termo Grok tem um significa curioso. De acordo com a própria página ele é proveniente do livro “Um estranho em uma terra estranha”, de Robert Heinlein, e que dizer “Entender algo tão completa e profundamente que o observador e o objeto observado se tornam um só”, com certeza uma sensação da qual nós, estudiosos apaixonados de um tema, adoramos estar próximos(e um termo que, a partir de agora, passo a adotar)!
Tomei notícia do GrokPodcast ainda em meados de 2012, quando pesquisava assuntos relacionados ao Arduino e, por acaso, noticiei um capítulo cujo título era “Singularidade e Biologia Sintética”, na qual dois entusiastas conversavam sobre o tema. Entrei em contato e, depois de algum tempo e algum esforço técnico, gravamos os episódios.
Estas foram mais duas ações com o objetivo de divulgar e informar, gerando material de qualidade (assim espero, haha) em língua portuguesa, tarefa na qual nós do SynbioBrasil já nos dedicamos.
Abaixo vai o link do primeiro episódio do nosso podcast!
Aventuras em Biologia Sintética
Eu considero os quadrinhos como uma das formas mais interessantes de se narrar uma história. São também uma ótima forma de divulgar ciência de uma maneira didática e divertida.
Drew Endy um dos pais da biologia sintética (e do Registry of Parts), juntamente com Isadora Deese (ambos do MIT) elaboraram o quadrinho Adventures in Synthetic Biology. E tem mais: o quadrinho foi publicado no website da prestigiada revista Nature.
Confira Adventures in Synthetic Biology e aprenda de maneira didática o que são biobrick, PoPs, entre outros conceitos básicos.
Links possivelmente interessantes:
- Bastidores da produção do quadrinho
- The cartoon guide to genetics
- TED talk do Jorge Cham, criador do sensacional PhD Comics
Empreendedorismo, Inovação e Biologia Síntetica
A princípio, traçar um paralelo entre empreendedorismo e biologia sintética pode ser um pouco complicado, principalmente se pensarmos em complexidades de projetos e na falta de investimento em pesquisa que temos aqui no Brasil advinda da iniciativa privada.
A visão de não investir em pesquisa e inovação está se alterando e hoje grandes empresas já olham para as universidades como fontes de tesouros – geração de conhecimento e mão-de-obra especializada. Mas não são apenas as grandes empresas que podem se beneficiar desse crescimento da pesquisa. Universitários com boas ideias e atitudes empreendedoras estão mostrando que inovar é o primeiro grande passo para o sucesso. Com auxílio de incubadoras ou investidores muitos jovens das formações mais distintas levantam-se dos bancos das salas de aulas e laboratórios e assumem um novo posto: o de empresário.
A biologia sintética surge como uma ferramenta muito interessante para aqueles que gostam de inovar e tem boas ideias. Apesar da aparente complexidade, os processos laboratórias estão cada dia mais baratos e “automatizados” permitindo que sejam desenvolvidos processos metabólicos em organismos como se desenvolve uma linha de produção numa empresa. Saber usar a maquinaria celular (enzimas, por exemplo) ao nosso favor pode ser a diferença entre processos químicos demorados e caros ou uma síntese biológica com baixo custo, alta produtividade, pureza e rapidez.
Muitas áreas diferentes podem se beneficiar do estudo da biologia molecular de forma automatizada e muitos exemplos da aplicação de microrganismos podem ser citadas: alimentos, combustíveis, fármacos até mesmo circuitos elétricos já receberam suas contribuições dos organismos geneticamente modificados. Apesar de pensar que a biologia sintética pode transformar o mundo, podemos começar transformando nossas vidas com ideias simples mas lucrativas, como fez o grupo vencedor do iGEM de 2012 que desenvolveu um detector para carne em decomposição e como fizemos ao desenvolver o plasmídeo plug and play e como pretendemos fazer agora em 2013 com os projetos que estamos começando a desenvolver.
Para ajudar a ilustrar, vou dar um exemplo, mas sem nome de pessoas ou compostos. (rs) O laboratório de um dos meus professores encontrou uma bactéria capaz de produzir uma substância antioxidante que acreditava-se ser produzida apenas por plantas. O custo de plantação, extração e purificação da substância é bastante alto e isso faz com que o valor de mercado dessa tal substância seja muito elevado. Identificar, isolar e manipular os genes responsáveis por essa propriedade tão única da bactéria e transferi-los para um organismo mais conhecido e manipulável, como a E.coli pode significar uma grande economia para produção, uma patente e um lucro gigantesco para aquele que conseguir produzir em um frasco num shaker quantidade similar do composto que é produzida por uma fazenda inteira.
E aí? Vamos ficar ricos com a Biologia Sintética? Não sei, mas essa já é uma boa ideia.
Neurobiologia Sintética
Esse post é parte da blogagem coletiva “interCiência“. O Amigo Oculto dos Blogs de Ciência Brasileiros! Algum blogueiro da primeira rodada escreveu esse post para o SynbioBrasil e eu escrevi um post para um dos blogs participantes (a lista dos blogs ficará disponível em breve no Raio-x). Através do estilo e tema (dentro do assunto Biologia Sintética) do post, quem você acha que escreveu esse presente que o SynbioBrasil ganhou!? Aliás, alguém suspeita de qual post fui eu que escrevi num dos blogs participantes!? Vejamos o que o nosso amigo secreto escreveu para o synbiobrasil, com vocês, o autor desconhecido!
Ao entrar na brincadeira proposta pelo InterCiência, não imaginava o quanto iria me interessar pela área estudada pelo meu blog parceiro. Como o blog trata de uma temática ainda pouco conhecida por mim, tive que, agindo como um bom cientista, estudar e pesquisar bastante para poder entender o que é essa tal Biologia Sintética e, com uma pitada da minha especialidade (Psicologia, Neuropsicologia e Psicobiologia), escrever um post que agradasse a todos e fizesse uma boa síntese dos nossos temas. E cada vez que lia mais sobre as possibilidades para essa ciência ia também me encantando com ela. E, sem amarras para o meu espírito imaginativo, escrevo para vocês sobre…
Neurobiologia Sintética:
A neurociência que realizará os sonhos da literatura de ficção científica!
As neurociências são as ciências que tem ocupado maior destaque na mídia nos últimos anos, avanços consideráveis sobre as nossas capacidades cognitivas e funcionamento cerebral a todo o momento surgem e provocam grande mobilização da mídia e mesmo do público em geral. Para entender o homem e suas nuances é preciso ir além das perguntas filosóficas e, com ciência, entender o funcionamento do órgão que gere todas as nossas funções mentais, corporais e mesmo aspectos subjetivos. Para adentrar neste mundo, apenas uma metodologia bem delineada não seria o suficiente, o entendimento do cérebro – esse órgão maravilhoso – precisa de muita tecnologia. A década de 90 – escolhida como a década do cérebro – trouxe uma infinidade de instrumentos que poderiam ser utilizados para esse entendimento e, com eles, ainda mais perguntas e possibilidades.
Como não sou especialista na área da Biologia Sintética, as limitações técnicas não me impedem de imaginar maravilhas com o que os cientistas da área poderiam fazer quando relacionada com as ciências do cérebro. Criar um organismo de materiais que nos possibilitaria fazer de forma mais efetivas as tarefas diárias ao aumentar a nossa percepção e sensação, exacerbar as nossas capacidades mnemônicas, aumentar de forma inimaginável o processamento cognitivo e assim nos dar agilidade, inteligência e, com uma maior conectividade e plasticidade neural, aumentando e melhorando a psicomotricidade, reabilitação cognitiva e, bom, para ilustrar, nos tornando mais ou menos isso aqui:
Hum… Seria realmente ótimo ter um uniforme como o do Venom criado em laboratório a partir das técnicas da Biologia Sintética, ainda mais quando se retiraria a problemática da perda progressiva de sanidade proveniente da influência telepática-neural de um organismo alienígena, mas seria isso apenas uma viagem de um aficionado pela literatura de ficção científica?
Na verdade não. Já existe uma série de projetos se propondo a aperfeiçoar a ligação entre o cérebro e os outros sistemas do corpo, além da criação de sistemas neurais e tecnológicos que nos permitam ir além da capacidade do nosso frágil corpo.
E nesse quesito, um brasileiro é um dos nomes mais próximos de criar algo parecido com esta proposta.
Miguel Nicolelis é professor de Neurobiologia e Engenharia Biomédica e co-diretor do Centro de Neuroengenharia da Universidade de Duke e é atualmente o brasileiro mais próximo de ganhar um Nobel com suas pesquisas sobre a interface cérebro-máquina.
Com seus estudos, Nicolelis conseguiu mapear as ondas elétricas disparadas pelo cérebro, e assim, desenvolveu experimentos onde seus parceiros – como costuma chamar os animais que o ajudaram – podiam mover braços mecânicos apenas com o pensamento. A proposta de Nicolelis é que na abertura da Copa do Mundo do Brasil de 2014, o chute inicial seja dado por uma criança paraplégica, utilizando uma espécie de exoesqueleto.
Se a interface cérebro-máquina já está tão perto de ser desenvolvida, poderíamos olhar com esperança para a criação também de uma interface cérebro-organismo-sintético. E este passo, só seria possível de realizar com o empreendimento de esforços de neurocientistas dispostos a conhecer mais a Biologia Sintética.
Observando as possibilidades, consigo sonhar um pouco mais. Cérebros artificiais! A Neurobiologia Sintética poderia finalmente nos presentear com um cérebro totalmente artificial, digno dos melhores livros de Isaac Asimov, com todas as competências cognitivas necessárias para a premissa Cartesiana: Penso, logo existo. Personalidade, cognição, memória e consciência sendo moldada pelas mãos de cientistas e, posteriormente, se desenvolvendo em pleno relacionamento com o ambiente em que este cérebro fosse inserido, possibilitando não só um entendimento ainda maior do nosso funcionamento mental e aprendizagem, como abrindo portas para, quem sabe, investigações mais elegantes para os temas mais espinhos da ciência atual, como o Alzheimer, a Esquizofrenia ou o Autismo. Ou mesmo temas que não parecem tão complexos, mas ainda guardam dúvidas diversas a serem respondidas, como “Por que dormimos?” ou “Por que sonhamos?”.
Ainda que exista o medo do senso comum com as possibilidades de criação da Biologia Sintética – vemos isso observando as notícias relacionadas que saem na mídia quando tratam da área, normalmente utilizando termos como “Laboratórios Frakenstein” ou “Cientistas brincando de Deus” – isso não deveria ser um impedimento para os avanços tecnológicos e científicos. Muito pelo contrário, ensinar e apresentar à população as vantagens dos trabalhos na área se faz cada vez mais necessários, pois qualquer área da ciência que ainda esteja dando os seus primeiros passos – mesmo que grandiosos – enfrenta o ceticismo e temor do senso comum, para depois – caso tenha condições científicas reais e tangíveis – crescer e contribuir para a humanidade. Apenas consigo enxergar os empreendimentos da Biologia Sintética somados às Neurociências como um caminho de desenvolvimento grandioso para a humanidade.
E assim, como os escritores que escreviam um mundo tecnológico em prol da humanidade em suas ficções científicas, só nos resta sonhar. E como os profissionais dedicados ao conhecimento, fazer ciência.
Este texto é parte da primeira rodada do InterCiência, o intercâmbio de divulgação científica. Saiba mais e participe em: http://scienceblogs.com.br/raiox/2013/01/interciencia/
Referências:
EASEC. Biologia Sintética: Uma Introdução. 2011. www.easec.edu