Arquivo da categoria: Paleontologia

CAmpo de golfe e as antigas cavas de argila mostrando pegadas de Dinossauros e mamíferos, alem de restos de plantas.

No Mesozoico, jogando golf com Fred Flintstone

Estaria o blogueiro pirando? Golf? Mesozoico? Fred Flintstone?

Sim, desta o blogueiro viajou. Era no mês de junho. Estava um sol forte aquela hora da manhã, e eu estava caminhando por uma trilha que levava a estação de trem de Jefferson County, no estado americano do Colorado. Vez em quando passava alguém de bicicleta pela trilha. Foi quando eu vi a plaquinha indicando: Triceratops Trail. Será que eu ia encontrar com um feroz Triceratops na minha frente se eu seguisse aquele caminho? meio receoso, entrei.

CAmpo de golfe e as antigas cavas de argila mostrando pegadas de Dinossauros e mamíferos, alem de restos de plantas.Campo de golfe e as antigas cavas de argila mostrando pegadas de Dinossauros e mamíferos, alem de restos de plantas. Ao fundo o Morro da Mesa (Table mountains), onde estão os basaltos Terciários.

Quando entrei na trilha do Triceratops, a primeira coisa que eu vi foram algumas cavas, com uma vegetação secundaria crescendo de dentro delas. Todavia, eu havia visto algumas maquinas grandes enferrujando no meio do mato. Já nem dava pra reconhecer, mas eu estava entrando numa área antiga de mineração. No entanto,o que isso tinha a ver com o Triceratops?

ENTRANDO NA CAVA DE ARGILA

Soube pelos cartazes que tinham por ai que aquelas perigosas cavas que estava vendo, com vários metros de altura, eram antigas cavas de argila. Estas cavas foram exploradas pela Família Parfet, que produzia cerâmicas, tijolos e tubos de esgoto para todo o pais.  Primeiramente, uma foto num cartaz na entrada de uma destas cavas mostrava  patriarca George Parfet, sua esposa Mattie e seus seis filhos. Alem do mais, outras fotos antigas mostrava o febril trabalho de escavação realizado pela empresa dos Parfett.

Como o cartaz orgulhosamente descrevia, a mansão do governador, varias escolas publicas e a antigas sede do fórum do condado de Jefferson foram construídos com tijolos feitos aqui. Durante quase 70 anos, escavadeiras e draglines escavaram as argilas da formação Laramie para fazer objetos cerâmicos. Nesta hora, eu estava ali andando por entre o que sobrou desas cavas. Parte era um campo de golf, parte um museu geológico.

Placa na Cava de Argila, mostrando o Triceratops e as marcas deixadas pelo animal
PASSANDO PELO CAMPO DE GOLFE

A maior parte da área era tomada pelo campo de golfe, ocupando as partes mais baixas das antigas cavas de argila. Contudo, a parte do campo de golf não me interessava. Não me interessava aquela grama verdinha e rente. Não me interessava aqueles carrinhos com aqueles senhores de bermuda e camiseta polo. Todavia, com seus chapeuzinhos ridículos, eles passavam acelerados, e nos atropelavam indiferentes em busca de suas ignominiosas bolinhas. Senti o risco iminente de ser uma vitima do golf e me afastei daqueles maniacos.

Alem do mais, o mato ao redor estava cheio de bolinhas de golf, o que provava cabalmente a imperícia dos senhores de tênis e meias brancas. Contudo, lembrei-me de Fred Flintstone, um dos poucos jogadores de golfe pelo qual eu tinha alguma estima. Assim, pela primeira vez, senti alguma conexão ali. Golfe, Fred Flintstone, dinossauros: fui ver os bichinhos.

A GEOLOGIA DE GOLDEN: O COLORADO FRONT RANGE

A geologia de Golden é muito interessante. Durante o Mesozoico, aquela área era uma grande planície deltaica, cheia de pântanos, rios e lagos. Da mesma forma, nos rios, uma areia fina era depositada, formando barra de meandros. Por outro lado, nas planícies, uma fina argila branca ia se depositando. Camadas de turfa também eram comuns neste ambiente.  Além do mais, nesta área, num clima mais quente que hoje, tínhamos muitas palmeiras e muitas especies de animais.

Geologia de Golden, Colorado
Bloco-Diagrama mostrando a geologia de Golden simplificada. a área do Triceratops trail está no centro da foto, onde as camadas estão verticalizadas.

Mais para o fim do Cretáceo, este ambiente úmido e quente foi se alterando. Quando houve na região a transição do Mesozoico para a  Terciário, com a extinção dos dinossauros, a região já havia se tornado mais quente e seca. Finalmente, lavas basálticas aparecem já no paleoceno, indicando uma mudança na dinâmica da região.

Contudo, o desenvolvimento de grandes falhas geológicas, como a Zona de falha de Golden (Golden Fault) e a Falha da Margem da Bacia (Margin Basin fault), marcam a transição da região das Grandes Planícies com as Montanhas  Rochosas. Assim, por ação destas falhas, o terreno mais a oeste, predominantemente granítico, literalmente “cavalga” sobre as rochas Mesozoicas/Terciárias e termina por dobra-las. Desta forma, pequenos morrotes, formados por rochas mesozoicas e terciarias dobradas marcam a transição geográfica da montanha para a planície. É o chamado Colorado Front Range.

DINOSSAUROS SUBINDO PELAS PAREDES

Como dissemos antes, o Triceratops trail esta situado no contexto do  Colorado Front Range. Aqui, as camadas da formação Laramie, do Mesozoico, estão todas verticalizadas, por ação da Clay Pits fault, a falha local do sistema. Com isso, a sensação que temos é a de que os dinossauros estão subindo pelas paredes. No entanto, não foi isso que aconteceu. centenas de milhares de anos após terem vivido por ali é que as camadas nas quais deixaram seus rastos foram basculadas e verticalizadas.

marca de pegada de Tiranossauro
Pegada de Tiranossauro

Desta forma, a exposição das pegadas e das diversas marcas ficou muito facilitada. Ali, podemos ver pegadas gigantes do gigante tiranossauro. Também podemos ver as marcas das pegadas do Triceratops.

Da mesma forma, podemos ver também pegadas de pequenas aves e mamíferos. De modo similar, nas Clay Pits podemos ver os restos de folhas de palmeiras. Alem das palmeiras, podem ser encontradas sicômoros, nogueiras, um tipo de gengibre e um parente distante do abacate.

Esta vegetação, juntamente com a ocorrência comum de marcas de animais pequenos e grandes mostra uma região que, no Mesozoico era quente e talvez por isso, muito rica em vida.

UM OUTRO MUNDO É POSSÍVEL
marcas de palmeiras fósseis
Marcas de folhas de antigas palmeiras; As especies de pnatas indicam um clima muito mais quente que o de hoje na região.

No final do Mesozoico, durante o período Cretáceo, a América do Norte era coberta por um mar raso, com algumas porções mais elevadas. Provavelmente, estas porções elevadas eram pequenas ilhas, das quais a região de Golden era uma delas. Ao redor, uma serie de . Com o passar do tempo, o soerguimento das Montanhas Rochosas acabou por acabar com este mar raso. Neste período, estava provavelmente localizada em latitudes menores. Este era o ambiente perfeito para o desenvolvimento, nas partes mais úmidas, de uma fauna abundante e diversificada.

A medida em que que as placas tectônicas continuavam se movimentando, a região das montanhas rochosas começa a ser “empurrada” para o leste. De fato, esta movimentação deu origem as falhas que conformariam a estrutura da região de Golden, onde eu me encontro agora, olhando pegadas de dinossauros na parede. Afinal, ver pegadas de animais extintos na parede de uma cava de argila nos dá noção de que vivemos num planeta dinâmico e em perpetua transformação. Desta forma, ao contrario do que alguns pensam, nós humanos não somo s o suprassumo da criação. Isto é, supondo que tenha havido uma criação.

SAINDO DA CAVA

Desta forma, assim que saí da cava, comecei a pensar em quantas informações diferentes havia ali naquela pequena área. Contudo, será que as pessoas que passavam aqui e ali teriam noção disso? Será que os caras do golfe ali do lado, mesmo que somente perseguindo suas inúteis bolinhas, saberiam disso?

O tempo da vida humana é muito curto. Decerto, algum grego ou romano já falou sobre isso. o detalhe é que, por certo, não temos condições de enxergar estas grandes mudanças no decorrer de nossas vidas. Primeiramente, para enxergar isso, o senso comum não ajuda. os vestígios da natureza, por outro lado, são muito sutis e complexos. Ali, saindo da cava do Triceratops trail, me dei conta do quanto as Ciências da Terra nos ajudam a enxergar o mundo.

AJUDA FRED FLINTSTONE!!

Num mundo em que a Ciência encontra-se tão ameaçada, certamente o conjunto de evidencias como o que havia ali no Triceratops trail é muito relevante. Estavam expostas ali, a céu aberto, muitas discussões interessantes sobre o passado, o presente e o futuro de nosso Planeta. Por certo, a maior parte das pessoas não está nem ai pra essas coisas. Da mesma forma, o fato de Fred Flintstone conviver com dinossauros parece plausível para muita gente. Entretanto, como se sabe, o ser humano só conviveu com os dinossauros nos últimos duzentos anos. Somente quando começamos a entender que aqueles esqueletos estranhos não eram obra do acaso ou restos de gigantes é que eles começaram a habitar entre nos, em nossas ideias, em nossos  pensamentos.

Por tudo isso é que repito: a Ciência deve entrar mais na vida das pessoas. Independente de sua posição no mundo, o letramento cientifico é cada vez mais necessário para um numero cada vez maior de pessoas. Temos que fazer de cada esquina um museu da historia da terra. Podemos não ter em todos os lugares historias tão interessantes como a do Triceratops trail e seu mergulho de cabeça nos pântanos do Mesozoico.

CIÊNCIA, LAZER E BICICLETAS
Projeto Geobike
Logo do Projeto Geobike, do Prof Wagner Amaral: trilhas geológicas em Campinas

Da mesma forma, aqui em Campinas, temos o  Projeto  Geobike, mais uma boa ideia do professor Wagner Amaral, do Instituto de Geociências da Unicamp. Assim, apaixonado por Geologia e por sua querida Campinas, o professor Wagner leva os amantes da bicicleta a locais nos quais eles até já poderiam andar, mas cuja historia (natural) ignoravam. Que enriquecedor! Juntar esporte, lazer e Ciência foi uma boa sacada. Que tal na sequencia juntar Ciência e Arte, juntar Ciência com tudo?

Entretanto, no caso das Ciências da Terra e do ambiente, nós precisamos de mais e mais trilhas como estas, que nos levem ao passado da Terra. Trilhas que nos ajudem a pensar melhor nosso presente e projetar melhor nosso futuro.

Bora lá?

O ILUMINISMO E AS TRILHAS NO ALTO DO MORRO

(Este texto é dedicado a Gabriela Medero e Georges Goussetis)

No verão de 1776, Adam Ferguson (1723 – 1816) estava intrigado com algumas coisas que havia verificado ao andar pelo morro de Arthur´s Seat, em Edimburgo.

O morro Arthur´s Seat, em Edimburgo

Arthur´s Seat é uma pequena elevação urbana na parte leste de Edinburgo, próxima ao centro da cidade. As rochas que formam o topo do Arthur´s Seat são de composição basáltica, provenientes do resfriamento de uma antiga câmara magmática. No entanto,  embora essa história respire geologia, não é de basaltos que vamos falar aqui, e sim de Iluminismo.

Um trio de peso
Professor Adam Ferguson, Filosofo e historiador escocês

Adam Ferguson, filosofo e historiador escocês, adorava caminhar no Arthur´s Seat. Nestas caminhaadas deve ter tirado alguma inspiração para sua vasta obra. Nela, Ferguson mostrava seu apreço pelas sociedades tradicionais, como os clãs das Highlands, em contraste com os habitantes da cidades, que considerava mais “fracos. Entretanto, neste verão especifico, ao caminhar pelo Arthur´s Seat, Ferguson observou algumas manchas esbranquiçadas formando “trilhas” com formatos diferentes na vegetação do morro. Intrigado, Ferguson chamou alguns de seus amigos para verificarem o curioso fenômeno.

Os amigos chamados por Ferguson foram os medicos Joseph Black e James Hutton. O trio é um dos mais importantes do chamado Iluminismo EscocêsJoseph Black (1728 – 1799), como Ferguson, era professor da Universidade de Edimburgo, médico e um importante nome da química moderna. Foi ele quem descobriu o dióxido de carbono, em 1754. Entre seus feitos também se destacam a invenção de balanças de precisão e a descoberta do calor latente das substâncias.

Dr Joseph Black, um dos maiores nomes da Química no seculo XVIII

James Hutton (1723 – 1799), médico e cavalheiro escocês, por outro lado, é tido como um dos fundadores da geologia moderna. Tendo estudado medicina na Holanda, Hutton foi sobretudo um fazendeiro. De sua experiencia arando as terras das Lowlands escocesas, Hutton percebeu a relação que existia entre erosão, transporte e deposição de sedimentos.

Assim, Hutton estabeleceu claramente o conceito de ciclos de deposição e erosão, os quais formariam as rochas dos continentes e oceanos. Sua obra mais importante nos dias de hoje, Theory of the Earth, foi inicialmente lida por Joseph Black na Real Society of Edinburgh em 1785. Em 1797, após inúmeras revisões, ela foi finalmente publicada.

As “Trilhas” no Arthur´s Seat
O medico e Naturalista James Hutton, um dos pioneiros da geologia no seculo XVIII

Neste verão de 1776, entretanto, os três amigos estavam ainda pelo morro, verificando as marcas na vegetação, e interrogando diversas pessoas das redondezas. James Hutton, dois anos mais trade, escreveria um pequeno texto, publicado nos anais da Real Sociedade Cientifica de Edimburgo.  O texto se chama “Of certain Natural appearances of the ground of the Hill of Arthur´s Seat”.

Este texto, embora não tenha importância na obra de Hutton, é bastante interessante como um exercício de utilização do método científico. Nele, Hutton inicia a introdução com uma breve descrição do problema. Tratava-se de “trilhas” no morro, formada por plantas mortas e esbranquiçadas. De longe, parecia uma trilha, mas não estava relacionada com as trilhas dos caminhantes. Logo, teria outra origem, e que deveriam ser entendidas.

Ver, analisar, estudar

Por outro lado, as explicações de que tais marcas eram devidas a raios não pareceu suficiente. Hutton então, passa a descrever as marcas: elas ocorriam sobretudo nas partes mais altas do morro, e existiam marcas recentes e marcas mais antigas. As marcas mais recentes eram esbranquiçadas, enquanto as mais antigas eram enegrecidas, causadas pelo apodrecimento das plantas.

Assim, Hutton descreve que as marcas eram compridas, mas poderiam também ocorrer marcas com larguras similares aos comprimentos. As marcas eram paralelas umas às outras, e Hutton examinou algumas marcas de um verde intenso, crescendo junto com as marcas dos anos passados. Assim, lhe pareceu que estas marcas mais antigas eram agora cobertas pela vegetação nova, formando faixas de verde mais intenso.

Contudo, ao estabelecer tal sucessão, Hutton indaga: “quantas trilhas sucessivas poderiam ser detectadas pela observação de suas aparências?”. Depois de suas atentas observações no Arthur´s Seat, Hutton estabelece que “no mínimo” cinco sucessões de trilhas poderiam ser detectadas. Deveria haver mais, mas estas são as que se possui evidências concretas, afirma.

Insetos ou Raios?

Depois de descrever as trilhas, Hutton começa a discutir suas causas. Parece evidente que tal fenômeno ocorreu ali no mínimo, nos últimos oito ou nove anos. Embora muitos naturalistas tenham atribuído estes fenômenos aos trovões, Hutton observa que muitas das feições são formadas na primavera, quando não há tempestades elétricas na região. Também observa que as descargas tem direções variadas, o que contrasta com a similitude das trilhas, com sua disposição paralela umas as outras.

Hutton também considera a possibilidade da ação dos insetos na formação das trilhas. Da mesma forma, considera as possiblidades de colônias de insetos construírem as trilhas paralelas.  Mais uma vez, rejeita, com base nas suas observações, tal possiblidade.

Ao discutir estas possibilidades, Hutton observa: nos métodos de investigação do meio natural, é preciso muito cuidado ao considerar causas e efeitos e suas conexões: ambas as prováveis causas do fenômeno (eletricidades, insetos) estão longe de serem consideradas suficientes para uma adequada explicação do fenômeno.

Ciencia e Causalidade

Assim, Hutton termina o texto sem propor uma explicação para a trilhas de diferente coloração na vegetação do Arthur´s Seat.  Entretanto, é importante sua observação sobre a causalidade dos fenômenos. Quantas vezes atribuímos causas sem levarmos em conta uma correta leitura dos fenômenos? Quantas vezes saímos a dizer nossas verdades “cientificas” penduradas em interpretações parciais e (muitas vezes equivocadas) sobre as relações de causa e efeito dos fenômenos que estamos observando?

Contudo, podemos observar que o texto de Hutton tem uma estrutura parecida com nosso atuais papers: introdução, formulação do problema, descrição dos fenômenos, discussão das causas, conclusões.

Era um tempo de profundo questionamento. Intrigados, os três amigos andam pelo Arthur´s Seat procurando respostas. Estas respostas estão vinculadas a questões de causa e efeito (qual é o agente causador das “trilhas”?). No entanto, as respostas disponíveis não são suficientes. Não se pode ir adiante com estas observações. E fim. Encerra-se uma pesquisa, com dicas e questionamentos para os próximos, a subir nos ombros dos gigantes.

Ah, o Iluminismo!

Neste tempo de “autoproclamados” sábios, de terraplanismo social e de fake News, que falta que você faz…

Para saber mais:

Buchan, James. Capital of the mind. Birlinn, 2012.

Playfair, John. “Biographical account of the late Dr James Hutton, FRS Edin.” Earth and Environmental Science Transactions of the Royal Society of Edinburgh 88.S1 (1997): 39-99.

As duas mortes de Luzia

Oi! Quer saber meu nome? A minha tribo me chamava de Loo-dj-ahn. Mas isso foi há muito tempo atrás, antes mesmo de minha primeira morte. Hoje, pelo que sei, me chamam de Luzia. Acho que é como entendem meu nome. Como soa aos ouvidos das pessoas de hoje. Ou é uma coincidência. Sei lá.

O ENIGMA DA CAVERNA
Este é meu Cranio de verdade; atras, está como vocês imaginaram que eu fosse…

Desculpe se sou confusa, se meu raciocínio é meio falho. De fato, tenho problemas em entender o que é a verdade e o que não é. Sei, pelos relatos que escuto, que hoje vocês também estão com dificuldades de entender o que é verdade e o que é mentira. Escutei estes dias um termo que deixou confusa: Fake News, ou noticia falsa. Vocês acreditam em noticia falsa?

Eu vivi boa parte de minha primeira morte numa caverna. Onze mil anos, se minhas contas estiverem certas. Não sei se vocês sabem, mas quando se vive em cavernas a realidade é meio confusa. Não sabemos ao certo se as sombras que vemos são fantasia ou são realidade. Por muito tempo, achei que as sombras que víamos eram a verdade. Contudo, hoje, sei que eram somente projeções na parede da caverna. Soa meio confuso, mas é assim. É um enigma da caverna. Uma alegoria, como dizem alguns de vocês.

A MORTE DE LOO-DJ-AHN

De qualquer forma, meu nome é Loo-dj-ahn, e eu pertenço aos Humanos. Minha tribo representa os melhores caçadores de nosso lugar. Em nosso falar, humano é “Croovijz“. Por isso talvez vocês outros nos chamem de povos de Clovis. Mas, pensando bem,  pode ser também coincidência.

Não me lembro ao certo como morri. Fui ficando doente, tinha dores de barriga, dor de cabeça, não conseguia mais acompanhar as mulheres. Entretanto, minha tribo tentou me curar com ervas e rezas. Meus olhos foram turvando, turvando, e depois não ouvi mais nada. Quando dei por mim eu já estava dentro da caverna, onde me sepultaram. Meu corpo foi coberto por tintas mágicas para avisar os espíritos ancestrais dos Humanos. No meu funeral, devem ter me virado para o norte, que era de onde haviam vindo nossos ancestrais.

Como já disse, minha primeira morte durou onze mil anos. Há uns poucos anos atrás, o que restou de mim foi encontrado por um povo estranho que tirava seu sustento de desencavar gente de seu tumulo ancestral. Mas, antes disso eu soube que um senhor chamado Peter Lund havia começado a explorar as grutas na nossa área. Ele retirou milhares de metros cúbicos de terra e achou milhares de ossos, de animais e de humanos, que ele remeteu para seu país natal, a Dinamarca.

NUM LUGAR CHAMADO MUSEU

Muitos outros foram resgatados por estes povos escavadores. Entretanto, dos humanos, os Croovijz, só eu. Dos outros povos que habitavam nossa região, como os Larga-ossos, os Bárbaros do sul e os Pega-peixe (esses eram os nomes que nós dávamos a eles), vários foram resgatados.

Fomos levados para um lugar escuro, muito longe da caverna onde me acharam. Lá, fomos iluminados, apalpados, medidos. Contudo, quando começaram a me chamar de Luzia, a principio achei que sabiam minha língua. Mas sabem nada. Falam muita bobagem sobre nós, tentam adivinhar o que éramos e o que fazíamos somente olhando nossos ossos e vendo os utensílios que fazíamos.

Depois, tentaram adivinhar como era meu rosto…erraram feio. Tentaram de novo…erraram de novo. Por que eles querem saber tanto do mim?

A MORTE DE LUZIA

No entanto, eu estava tranquila nesta minha nova vida. Pensavam que, como Luzia, estaria tranquila. Foi quando, numa noite dessas eu vi o fogo. Estava muito quente e podia-se escutar as madeiras do teto estalando. Muita fumaça na sala onde estávamos. Foi quando ouvimos um grande estrondo e o teto desabou. Essa foi minha segunda morte.

Esse lugar que vocês chamam Museu, pegando fogo…essa foi minha segunda morte!

Contudo, minha segunda morte foi mais curta. Cerca de um mês depois, eu comecei a ouvir barulhos, movimento acima de mim. Estavam escavando atrás de meus restos de novo? Que obsessão é esta?

Depois de um tempo, me acharam ali, soterrada sob as cinzas do incêndio. Nunca vi tanto alvoroço. Os caras que estavam escavando gritavam. Alguns choravam de alegria. Eu estava de volta.

O MUSEU E A TRIBO

Soube que o lugar onde estava tinha um nome de Museu. Era um prédio grande e bonito. Mas sempre ouvia falar de problemas. O povo que cuidava de mim sempre reclamava que o prédio estava em perigo. Perigo de quê? eu pensava: de um ataque de bárbaros inimigos? De grandes animais selvagens?

No entanto, parece que eles não tinham recebido muito recurso para manter o Museu. Faltavam recursos para o prédio ser seguro, para evitar incêndios. Depois, os chefes da tribo de vocês não estavam interessados nessa história de Museu. Ouvi que um dos chefes havia reclamado: “Já pegou fogo, quer que eu faça o quê?”.

Preciso dizer que achei esta fala típica de bárbaro, desses bem primitivos. Eles nunca assumem a responsabilidade do que fazem, como crianças grandes. Falam alguma coisa, depois voltam atrás. Querem deixar tudo confuso. Ou não sabem direito o que estão fazendo. Minha segunda morte tem a ver com essa confusão dentro da tribo que me resgatou da caverna.

A VIDA É CURTA…

Agora, estou esperando ser reconduzida à minha sala tranquila. Lá, dezenas de pessoas passavam admirando meu esqueleto e vendo o modelo de meu rosto. Contudo, eu sei que ele não é meu verdadeiro rosto. Eu também bem sei, no entanto, que nunca vão adivinhar como era o meu verdadeiro rosto. Mas eu sinto um certo orgulho deste rosto eu virei.

à direita, o paradigma antigo; à esquerda, o paradigma atual…vocês continuam errando…

Os barbaros que me desencavaram  dizem que sou um dos humanos mais antigos do país deles. Me admiram. Os bárbaros que cuidam de mim me tratam muito bem. Entretanto, os chefes da tribo deles, não ligam para ossos de gente. Ouvi dizer que eles gostam de uma coisa chamada dinheiro. Por esse tal de dinheiro brigam o tempo todo. Algumas vezes, se matam.

Contudo, não sei o que aconteceu com minha tribo. Sinto saudades deles. Mas ao mesmo tempo admiro esta tribo barbara que tanto empenho tem de cuidar de mim. Apesar dos chefes que eles escolhem para eles mesmos. Podem me chamar de Luzia. Loo-dj-ahn já morreu uma vez. Luzia, outra. Espero ainda durar mais um pouco, ver mais algumas coisas, aprender.

Mas o que se pode esperar mais de uma curta vida de onze mil e poucos anos?

 

PS – agradeço à Gustavo Teramatsu por me alertar sobre o novo paradigma do rosto de Luzia

O MUSEU, VOCÊ E EU

UMA TRAGEDIA ANUNCIADA

Todos estão chocados e boquiabertos com a tragédia do Museu Nacional. O incêndio, que durou somente algumas horas, destruiu um patrimônio que levou mais de 200 anos para ser juntado. Em termos do valor que se perdeu, como muitos disseram, não há como calcular. É como se perdêssemos a maior parte de nossa memória de uma vez, de maneira irrecuperável. Podemos usar os fragmentos, podemos começar tudo de novo a juntar mais memória. Mas a que se perdeu, se perdeu.

As chamas consumindo o valiosíssimo acervo do Museu Nacional no Rio

Outros ficam chocados com as condições do Museu. Soubemos, pela imprensa, que o Museu Nacional estava sem recursos. Estava sem condições de sobreviver, o que fazia de maneira precária. Só faltava, mesmo, um acidente para acontecer a tragédia. E e tragédia veio, em sua forma mais cruel, na forma de um incêndio. O incêndio do Museu Nacional é, sem sombra de dúvida, somente mais uma das tragédias anunciadas de nossa cultura.

OUTROS INCÊNDIOS

Outros ainda lembram de incêndios recentes que destruíram parte significativa de nosso patrimônio cultural: Museu da Língua Portuguesa (2015), Instituto Butantan (2010), Memorial da América Latina (2013) e Cinemateca (2016). Sem contar o incêndio do MAM em 1978, que destruiu boa parte de um acervo riquíssimo.

Os incêndios são fenômenos aleatórios. O que define nossa resiliência a eles é nossa capacidade de enfrenta-los. O mesmo fogo, num museu com estrutura, não passaria de uma queimadura leve, dessas vermelhidões de sol na pele. No entanto, nosso descaso e falta de preparo fazem com que qualquer fagulha cause uma tragédia de grandes proporções,

POR QUE OS MUSEUS PEGAM FOGO?

Segundo os especialistas, acidentes nestas instituições tem como causa deficiência orçamentária, infraestrutura precária e equipes de trabalho especializada com numero abaixo do numero ideal. Nossas instituições de uma forma ou de outra, sempre tem um ou mais desses problemas. Na Unicamp, só para dar um exemplo, tivemos, uma grande discussão recente sobre estes temas. Embora algumas soluções provisórias tenham sido alcançadas, a maior parte delas continua sem solução.

Mas o que me deixa mais triste não é a aparente falta de visão dos governantes, O que me deixa mais triste é saber que a falta de visão dos governantes reflete um quadro ainda mais sombrio: vivemos numa sociedade inculta e que não vê um valor na cultura. Por isso, nossos museus são poucos, precários e vazios.

O INCÊNDIO E A REVOLTA

A nossa população não cobra dos governantes cuidado com a memória. Os motivos são os mais diversos, e é claro que a falta de cultura não é um projeto dos explorados, mas dos exploradores. Mas é importante salientar que somos sim, por ação ou omissão, um povo que, por falta de cultura, não se importa em fazer dela um valor. Este círculo vicioso faz com que nossa rica cultura se perca, se esvazie, se deteriore. Ou se queime.

A pesquisadora Aparecida Vilaça escreveu que, ao ver o esqueleto do museu destruído pelas chamas, ela viu a imagem de alguém se imolando, ou seja, alguém que coloca fogo no próprio corpo em protesto. Uma revolta por tantos anos de maus tratos e descaso. As imagens que circularam eram cruéis, mostrando as cenas de desolação causadas pelo fogo.

Quem sabe se a imolação do Museu Nacional faça com que nossa visão sobre os museus, os institutos de pesquisa e arte sejam mais valorizados. Que as pessoas tenham por hábito visitar Museus, Exposições e Centros de Cultura. E que esse hábito possa fazer com que a população cobre de nossos governantes o respeito que nossa Cultura merece.

OS POLÍTICOS NÃO TEM VISÃO?

Vi também que poucos candidatos à presidência tem um programa de cultura. Existem candidatos que afirmaram que a tragédia “agride a identidade nacional” e disse também que “é dever resgatar o compromisso de zelar permanentemente” pela preservação do patrimônio. Mas, quando foi governo, este mesmo candidato deixou estas instituições à míngua.

Outro candidato ainda, quer relegar a Cultura ao status de Secretaria em seu governo. Não se pode acusar este candidato, aliás bem posicionado nas pesquisas, de incoerente. Em seu programa, realmente, ele não faz qualquer referência à Cultura. Na certa, se alguém falar a ele sobre Cultura, ele puxa o revólver…

A TRAGEDIA DA NOSSA CULTURA

Estes políticos dizem essas leviandades porque nós os autorizamos. Nós não nos importamos, sejamos francos. Nós não valorizamos a nossa própria cultura. Por isso, pense sobre o que você e eu estamos fazendo com a Cultura em nosso país. Pense no quanto você defende isso como uma política, como uma ação efetiva. E pense o quanto nós cobramos de nossos governantes ações efetivas a este respeito. E faça. Façamos.

Da mesma forma, vá a museus, visite exposições. Participe de atividades de crowfunding cultural. Valorize quem trabalha com a Cultura. Valorize-se.

Ou queime, inapelavelmente, como todos nós brasileiros nos queimamos, nas chamas da Quinta da Boa Vista.

Não há segunda chance para um povo sem memória.

As glossopetras dão com a língua nos dentes

Olá! Nós somos as glossopetras!

um selfie de glossopetras, mostrando como algumas de nós são bem grandinhas…

Somos fósseis pequenos, de milímetros a decímetros de tamanho. Somos encontrados em abundância nas melhores camadas sedimentares próximas de você. No entanto, somos mais comuns em alguns lugares específicos do mar Mediterrâneo, de onde somos extraídas

em grande quantidade. Um dos lugares mais famosos de ocorrência de glossopetras é a Ilha de Malta.

O nome glossopetra é um nome greco-romano. Reparem: glossós, ou língua, é uma palavra grega. Língua em latim é língua mesmo. E petra é pedra em latim, como até as pedras sabem. Glossopetra, portanto, é um nome greco-romano, que significa Língua de Pedra. Porque parecíamos com pequenas línguas.

Nós somos conhecidas em praticamente todas as línguas e culturas do Velho Mundo.

AMULETOS PARA “SOLTAR” A LÍNGUA…

Para os romanos, nós, as línguas de pedra, éramos amuletos importantes. Segundo se acreditava, nós poderíamos fazer “desatar” a língua das pessoas. Poderíamos também fazer com que as pessoas confessassem os crimes os mais secretos. Da mesma forma, nos usavam também para tornar as pessoas mais subornáveis e colaborativas. Por outro lado, era tamanho nosso poder que alguns romanos mais desabusados usavam nós glossopetras para seduzir pessoas castas para os atos mais inconfessáveis!

No entanto, sábios com Plínio, o Velho, eram mais céticos. Segundo Plínio, os mágicos diziam que as glossopetras caiam dos céus durante os eclipses da Lua. Já imaginaram, uma chuva noturna de pequenas linguinhas de pedra? No entanto, segundo Plínio, isso parecia não ser verdade.  Assim como ele também não compartilhava a crença antiga que as glossopetras acalmavam os ventos.

Monddrache, o Dragão da Lua. Gravura antiga atribuídas pelo astrólogo, nigromante e alquimista Agripa de Netesheim

Além disso, algumas glossopetras maiores  (ver figura acima) eram também chamadas de línguas de dragão. Tinham cerca de dez centímetros de comprimento ou mais. Existia uma lenda, que vinha do cultura nórdica, que atribuía a diminuição da Lua em alguns momentos de seu ciclo à ação de um dragão, o Monddrache, o Dragão da Lua. Essas glossopetras maiores, quase da palma de uma mão humana,  eram chamados de Dentes do Dragão da Lua (Zähne der Monddrache).

SÃO PAULO E AS GLOSSOPETRAS
Selo comemorativo do naufrágio de São Paulo na ilha de Malta. Depois desse naufrágio, nós glossopetras passamos a símbolos do cristianismo…

Na ilha de Malta, onde somos abundantes, há a lenda de que São Paulo, ao naufragar na ilha, teria sido picado por uma víbora. O Santo não se fez de rogado, e atirou a serpente ao fogo. Como resultado, todos os dentes e olhos das cobras de Malta foram petrificados. Por isso, em alguns lugares, somos também chamadas de línguas de serpente. As serpentes que hoje existem na ilha de Malta não são venenosas, confirmando assim, empiricamente, a ação milagrosa do apostolo. Essa lenda também aparece na Irlanda, com São Patrício. Aqui nós já comentamos sobre Santa Hilda de Whithby e os amonites.

Há uma outra lenda, muito posterior, dizendo que São Paulo transformou a sua própria língua em pedra, com numerosas propriedades medicinais. Por outro lado, os cavaleiros Normandos, que conquistaram Malta em 1090 AD, logo se aproveitaram dessa lenda e logo vendiam para toda a Europa as famosas (e milagrosas!) línguas de São Paulo. Com muito lucro, diga-se.

UM PODEROSO ANTÍDOTO CONTRA QUASE TUDO
Natterbaum, ou “arvore das serpentes”, peça em prata sobredourada representando a genealogia de Cristo. Esta peça era usada como proteção para venenos. No centro em cima há uma enorme Língua de Dragão.

Existiram, também, diversas as aplicações medicinais das glossopetras. Durante a Idade Média, acreditava-se que nós, glossopetras, éramos poderosos antivenenos. Poderíamos detectar a presença de veneno mudando de cor ao sermos mergulhadas numa taça de vinho. Desta forma, éramos usadas como contraveneno de cobra, para acelerar o parto e como poderoso talismã na proteção contra bruxarias.

Durante a Renascença, o geografo holandês De Laet (1581-1649) enviou algumas glossopetras para serem usadas para males bucais. Entre os usos registrados estão a dor de dentes e para aliviar as dores da dentição em crianças.

Os usos das glossopetras como medicamento foi muito difundido. A “Terra de São Paulo” , como era conhecido o material contendo as glossopetras maltesas, era comercializada como remédio até fins do século XIX. Um vasto mercado, como diríamos hoje. No entanto, a ocorrência de falsificações levou muitos governos desde o século XVII a realizar verificações e autuações em materiais tidos como Terra de São Paulo.

Nós, glossopetras, poderíamos contar muitas mais histórias e lendas, meninxs.

DENTES DE TUBARÃO?

No entanto, temos que confessar uma coisa: somos, na realidade, dentes de tubarão. Sim, dentes de tubarão. Boa parte de nós glossopetras somos simplesmente dentes de tubarões lamniformes. Contudo, as maiores glossopetras são provenientes do gigantesco Charcharodon megalodon, uma espécie extinta de um tubarão gigante que viveu entre o Mioceno até o fim do Plioceno (para vocês humanos que não tem noção de tempo, significa um período entre 23,3 até 3,3 milhões de anos atrás).

Uma estimativa do tamanho provável do Charcharodon megalodon (cinza e vermelho) com o tubarão Baleia, o tubarão Branco e um ser humano;

Como foi que mudou a ideia de que nós éramos pedras singulares com poderes mágicos e medicinais e nos tornamos meramente dentes de grandes bestas pré-históricas? Esta discussão, por mais simples que pareça, está na base da moderna Geologia.

BRINCADEIRAS DA NATUREZA

vocês podem não acreditar, mas nem sempre os fósseis foram aceitos como hoje: restos de organismos preservados por algum processo. Durante o Renascimento, a utilização de alguns conceitos aristotélicos, como a petrificação, levou alguns  sábios a aceitar que os fosseis poderiam ser objetos gerados espontaneamente nas rochas. Seriam as “virtudes plasticas” defendidas, entre outros, pelo sabio veneziano Girolamo Fracastoro (1476-1553). Seriam meras “brincadeiras da natureza”.

Outros sábios, entretanto, achavam que os animais e plantas petrificados eram realmente restos de organismos. Entre estes estavam, por exemplo, o famoso medico modenesi Gabrielle Falllopio (1523-1562).  Mas quais organismos seriam esses? existiriam realmente ou eram seres já extintos? Isso levava a uma outra questão: se os seres eram extintos, era sinal que eram seres imperfeitos? Deus, por acaso, fazia coisas imperfeitas? Essa era a grande discussão das ciências naturais nestes período.

FABIO COLLONA E AS GLOSSOPETRAS
o sabio neapolitano Fabio Collona (1567-1640), autor de importante estudo sobre nós, glossopetras!

Nós, as glossopetras, estivemos ativas neste debate. Um dos trabalhos mais imortantes sobre nós foi realizado pelo naturalista napolitano Fabio Collona (1567 – 1640), da Academia dei Lincei (dos linces, animal que enxerga mais longe) e amigo de Galileu. Collona estabeleceu que eramos restos de organismos. Para isso, ele calcinou algumas de nós (ui!) e viu que éramos formadas por matéria orgânica. Por outro lado, a terra que nos envolvia não tinha a mesma origem. Logo, segundo Collona, as glossopetras eram restos orgânicos.

a semelhança com os dentes de tubarão também chamou a atenção de Collona. Assm, ele sugeriu que pudessemos representar restos de antigos tubarões, e não pedras magicas ou antivenenos. Mas era necessário mais algum debate para poder afirmar isso com segurança.

NICOLAU STENO E OS DENTES DE TUBARÃO

Foi Nicolau Steno quem estabeleceu a relação dos tubarões com as glossópetras. Para

tubarão glossopetras
Cabeça de tubarão estudada por Steno e as glossopetras

tanto, ele estudou a carcaça de um tubarão capturado ao longo da costa de Livorno em 1666 e confirmou a semelhança entre as glossopetras e os dentes dos tubarões. Para isso, Steno usou de suas habilidades como anatomista e fez uma comparação usando o método da anatomia forense. Assim, tim-tim por tim-tim, ele explicou as semelhanças entre as duas.  Desta forma, ficou bem claro, para bons e maus entendedores, que as glossopetras eram dentes de tubarão.

Contudo, a polêmica ainda durou mais alguns anos. Somente em meados do seculo XVIII é que os fósseis foram aceitos como restos de organismos e tomaram o sentido que tem hoje. Para tanto, nós, glossopetras, tivemos um papel fundamental.

COM A LÍNGUA NOS DENTES

Assim sendo, hoje nós não somos mais fósseis, e sim uma parte deles. Desta forma, não somos mais tão importantes e procuradas como no passado, empobrecendo talvez alguns mineradores. Contudo,  nós somo muito orgulhosas de nossa participação. De fato, nossa presença nestes debates serviu para que os fósseis fossem reconhecidos como hoje são. Mais que isso, houve uma mudança na maneira como as pessoas enxergavam as camadas de rocha.

Assim, o que era só brincadeira da natureza passou a significar também testemunhos da história terrestre. O grande livro da natureza podia afinal ser lido. A história da natureza, com o tempo, passou a ser maior que a história humana. Por um lado, a história natural pode ser lida em milhões e mesmo bilhões de anos. Por outro lado, outras preocupações vinculadas com esta historia natural passaram a ocupar o centro da vida das pessoas.

Entretanto, questões como evolução das espécies, mudanças climáticas, grandes extinções, etc só fazem sentido num tempo longo. E estão nas agendas das pessoas e dos governos de hoje. Contudo, nada disso seria possível sem entender que pequenas linguinhas encontradas nas rochas possam ser dentes de tubarões.

Nada mal, não?

PARA SABER MAIS:

Hsu, K.T., 2009. The path to Steno’s synthesis on the animal origin of glossopetraeThe Revolution in Geology from the Renaissance to the Enlightenment. Geological Society of America, Boulder, CO, Memoirs203, pp.93-106.

Rosenberg, G.D. ed., 2009. The Revolution in Geology from the Renaissance to the Enlightenment (Vol. 203). Geological Society of America.

O problema não é o 13, é o 14! O mito do Carbono 14 na Paleontologia

Há quem diga que o treze é um número da sorte. E há também aqueles que não gostam das sextas-feiras 13… 

Mas como professora de paleontologia já há alguns anos eu tenho dificuldades com o 14. Na verdade, com o Carbono 14 (C14).

Em algum momento da vida de vocês, meus queridos alunos e/ou leitores, alguém lhes falou sobre ele. E eu não sei bem os motivos da mídia e de alguns livros de conteúdo básico sobre geociências enfocarem a datação por carbono 14 como sendo a resolução de todos os problemas na vida de um paleontólogo; mas, claro, essa técnica não é tudo isso.

A simplificação que normalmente vejo nos textos sobre o assunto passa uma ideia errada de como a datação de materiais fósseis realmente funciona.

Mas vamos começar do início…

Datação de quê? Idade do organismo ou há quanto tempo ele viveu/morreu?

Para obtermos a idade de algum material, necessitamos de alguma técnica que meça a quantidade de anos que aquele material tem, ou que nos indique uma idade aproximada do material em questão. Com isso eu quero dizer o seguinte: se um organismo viveu durante 30 anos, no período Triássico (250-200 M.a.), a idade que iremos obter com algum método de datação é a idade triássica. A idade do organismo (se era jovem, adulto ou idoso) também pode ser obtida, de forma aproximada, com nossos conhecimentos sobre o desenvolvimento ontogenético do grupo ao qual aquele organismos pertence; mas não é sobre isso que iremos tratar aqui, ok?

O que é necessário para datar?

O método Carbono 14 necessita de matéria orgânica para ser utilizado.

Os fósseis, como nós já falamos por aqui no blog, nada mais são que restos ou vestígios de vida pretérita transformados (em algum grau) em rocha (litificados). Existem, sim, casos onde há preservação de material orgânico original. Mas na maioria das vezes, esse material é perdido no processo de litificação. Então, na maioria das vezes, não há Carbono para ser datado nos fósseis.

Quais as premissas da técnica?

Toda técnica utilizada pelos cientistas segue algumas premissas e possui alguns limites.

Uma das premissas é que o material tenha Carbono, como falamos antes. Então, se quisermos saber a idade de uma rocha (que não tenha C), o método de C14 não pode ser aplicado.

Isótopos são elementos químicos (isto é, têm prótons, nêutrons e elétrons) que possuem número atômico igual (número de prótons) mas um número de massa diferente (média ponderada das massas dos isótopos, isto é prótons + nêutrons). No caso da Carbono, encontramos na natureza vários isótopos, e os mais comuns são C12, C13 e o famoso C14. A abundância natural desses isótopos é diferente, sendo o C12 o mais estável e mais comum dentre todos. Sendo o mais comum (e também por outros motivos) os organismos utilizam-se mais do C12. No entanto, o C14, apesar de raro, também é incorporado pelos organismos.

O C12 com 6 prótons e 6 neutrons. Fonte.

O C14 não é tão comum quanto o 12 basicamente por dois motivos: porque ele se forma na alta atmosfera pela ação de raios cósmicos e descargas elétricas em nitrogênios (eventos aleatórios), e porque o C14 é um isótopo instável de Carbono, isto é, ele se transforma em nitrogênio novamente, para alcançar sua estabilidade. Esse fenômeno é muito bem explicado no vídeo que coloquei nas referências deste texto.

No princípio do desenvolvimento da técnica de C14, uma premissa importante para o estudo era que a formação do C14, apesar de rara,  seria constante para os últimos séculos. Hoje sabe-se que houve variação e uma tabela já foi construída para adequação das análises.

O quadro abaixo mostra os diversos isótopos de Carbono e a duração de suas meias-vidas na natureza ( em segundos “s” ou minutos “m”. Fonte):

Simb % natural Massa Meia vida
9C 0 9,0310 0,127 s
10C 0 10,0169 19,3 s
11C 0 11,0114 20,3 m
12C 98,93 12,0000 Estável
13C 1,07 13,0034 Estável
14C 0 14,0032 5715 a
15C 0 15,0106 2,45 s
16C 0 16,0147 0,75 s
17C 0 17.0226 0,19 s

Como o C14 chega a fazer parte da matéria de um carnívoro?

As plantas, por meio de fotossíntese, utilizam os CO2 produzidos pelas descargas elétricas e impactos de raios cósmicos nos N; seguindo a cadeia alimentar, os animais que predam plantas, incorporam esse C instável, e por conseguinte, o C14 chega aos carnívoros que predam estes herbívoros.

Todo paleontólogo usa esta técnica?

Nem todo o paleontólogo sabe dizer a idade exata (em números absolutos) do material com que trabalha. Eu, por exemplo, nunca datei absolutamente nenhum fóssil com que já trabalhei. O C14 é usado para datar materiais de até 50 ou 60 mil anos. Eu trabalho com fósseis de 400 milhões de anos!

O limite do método se dá por um viés analítico. Como o C14 é muito raro em proporção na matéria a ser analisada, após 10 decaimentos suas porcentagens são tão pequenas que ele fica quase impossível de ser detectado. Após 10 decaimentos o material tem cerca de 50 mil anos, uma vez que a meia-vida do C14 tem 5.730 anos.

Como se conta o C14?

O primeiro a realizar a contagem de C14 foi o pesquisador Libby, utilizando um contador Geiger. Ao se desintegrar, um C14 emite uma partícula beta; essa partícula é detectada pelo referido equipamento. Ao colocarmos 1 grama de C atual (de algum ser vivo), temos 13,6 contagens por minuto. Sabendo disso, usamos da matemática para saber quanto 1g de alguma amostra fóssil pode indicar em termos de idade. Se a contagem for de 6,8, significa que uma meia vida já passou, isto é, o organismo em questão morreu há 5.730 anos. Outras técnicas mais recentes e precisas já foram desenvolvidas, utilizando, por exemplo, a contagem dos átomos em si e comparando-se suas proporções. Mais detalhes sobre isso podem ser lidos aqui.

É fato que a maioria das pessoas, quando questionada sobre datação, lembra do C14. Mas veja, para o estudo paleontológico de materiais mais antigos que 50 mil anos, a técnica não pode ser utilizada! Lembrando que o planeta tem 4,5 G.a., o C14 não é o principal método de datação em paleonto…! Outros métodos são muito mais comuns, como a datação relativa das camadas e também as datações absolutas de rochas ígneas + datação relativa das camadas de rochas sedimentares.

Como datar absolutamente uma camada?

Quando temos rochas ígneas, podemos usar métodos de datação como Rubídio-Estrôncio, Chumbo-Chumbo, Urânio-Chumbo, Potássio-Argônio, entre outros. Neste caso, esses elementos químicos instáveis foram formados  quando houve a geração dos minerais que compõem as rochas, por isso, assim que eles solidificam, seu decaimento inicia e a contagem do tempo através das suas meias-vidas pode ser obtida. Cada relação isótopo-pai/isótopo-filho tem uma longa série de intermediários que se formam e possibilitam a datação absoluta. 

E agora... você já sabe quais métodos mais usamos?
Por isso o C14 não é uma técnica utilizada em materiais mais antigos que 50 mil anos, e portanto, não é muito utilizado em Paleontologia. Observe, portanto, a imagem abaixo e me diga o que poderia ser melhorado nela?!

 

decaimento radioativo do C14
Ilustração que mostra o decaimento radioativo do C14… mas que induz as pessoas a achar que é possível datar um fóssil de dinossauro com C14. Fonte.

 

Referências

http://www.deboni.he.com.br/dic/quim1_006.htm

https://manualdaquimica.uol.com.br/quimica-geral/isotopos.htm

http://www.seara.ufc.br/donafifi/datacao/datacao5.htm

Um outro post nosso sobre o tempo geológico, pode ser lido aqui.

O sólido dentro do sólido: Nicolau Steno, o cientista que virou santo

Nicolau Steno
Retrato de Nicolau Steno, pintado em Florença

Nicolau Steno foi um dos homenageados no Congresso Internacional de Geologia de 2004, realizado em Firenze. Lá, os cientistas inauguraram uma placa, onde faziam menção às suas imorredouras contribuições para a Mineralogia, a Paleontologia e a Estratigrafia. Boa parte delas havia sido realizada no tempo que que Nicolau Steno morou ali, na Toscana.

No entanto, alguns anos antes, em 1988, o Papa João Paulo II o proclamou como “bem-aventurado Nicolau Steno”. Sabemos que, quando morreu, Nicolau Steno era um bispo católico, que trabalhava no norte da Alemanha. Seus últimos anos lhe deram aura de Santo. E quase santo ele é. Hoje ele é um Beato e a festa litúrgica em seu nome ocorre no dia de sua morte, em 5 de dezembro.

Quem era, afinal, Nicolau Steno? O cientista ou o beato?

NIELS STENSEN, O SOBREVIVENTE

Nicolau Steno é uma latinização de seu nome dinamarquês, Niels Stensen. O pequeno Niels nasceu e foi batizado em Copenhagen em 1638. Era o filho do ourives que prestava serviços para o rei Cristiano IV da Dinamarca. O pequeno Niels, que era muito doente a ponto de não poder brincar com as outras crianças, cresceu numa família fervorosamente luterana. Na falta dos brinquedos, brincava com os objetos de ourives de seu pai.

O pequeno Niels, no entanto, era mais forte do que se supunha. Na escola que frequentou, mais de duzentas crianças morreram entre 1654-1655 por causa de uma peste. Contudo, Niels Stensen sobreviveu. E tomou interesse por estudar os corpos humanos. Seu interesse era a Anatomia.

A Anatomia era uma febre (!) na época. Aulas de Anatomia eram disputadas ferozmente pelos acadêmicos. Tudo fervilhava de curiosidade de conhecer melhor o corpo humano.  Aos 19 anos, Niels Stensen entrou para a universidade de Copenhagen, para estudar medicina. Em seus estudos acadêmicos, revelou-se um promissor anatomista. E Copenhagen começou a ficar pequena para seu talento.

NICOLAU STENO, ANATOMISTA

A partir daí, Niels Stensen passou a viajar. E nunca mais parou. Inicialmente, esteve em várias cidades da Europa, estudando anatomia. Em Amsterdam estudou com Gerard Blasius, que estava estudando o sistema linfático. Da mesma forma, em Amsterdam, Stensen também conheceu o filosofo e polidor de lentes Baruch de Spinoza. O que será que eles devem ter conversado?

O jovem estudante Niels Stensen era apaixonado pela filosofia de René Descartes. No entanto, mais tarde, ele renegou a teoria cartesiana. Muito cedo, Steno percebeu algumas contradições na obra do mestre. Descartes, por exemplo, afirmou que a glândula pineal era a sede da alma humana. Steno, com base em suas observações, mostrou que Descartes estava errado.

Steno descobriu, entre outras coisas, que existe um duto que leva saliva até a boca, os dutos parotídeos ou dutos de steno. Por outro lado, Steno descobriu também que o coração era um músculo. E que os cálculos eram pedras que se formam por acúmulo nos órgãos. Descobertas notáveis, por certo.

O CARTESIANO ANTI-DESCARTES

Um a um, Steno acabou por desmentir diversos postulados anatômicos de Descartes. Com o tempo, tornou-se violentamente anti-cartesiano, negando qualquer relação de suas descobertas com o pensamento do filosofo francês. Não obstante, com o perdão do trocadilho, pode-se dizer que Steno não descartou Descartes.

Efetivamente, ao apreciar a obra de Steno, percebe-se o quão cartesiano ele era.  Quando se vê o mundo de idéias construído por Steno, o que se vê é um universo mecanicista, tipicamente cartesiano. Por outro lado, neste universo stenoniano,  a matéria sólida e particulada se movimentava segundo leis físicas determinadas, como um grande mecanismo.  Logo, tudo se movia no universo de Steno de acordo com a filosofia de Descartes.

A “REPÚBLICA DAS LETRAS”

Em suas viagens Steno acabou por conhecer o seu conterrâneo Ole Borch, importante anatomista da época e um sábio relacionado com as Academias de Ciência que então surgiam. Esse movimento de acadêmicos de vários países em constante comunicação formaram o que se chamou de “República das Letras“.  Era o embrião do moderno sistema de academias e periódicos científicos que se formava. Não por acaso, muitos periódicos modernos ainda ostentam em seu nome a palavra “Letter“. Pois não eram mais que isso: cartas enviadas para as diferentes associações cientificas, que eram lidas nas sessões ordinárias destas academias e discutidas por seus membros.

Todavia, uma vez que Ole Borch, como membro destacado da Republica das Letras,  tinha muitas ligações com a Royal Society de Londres. Foi através de Borch que Steno teve contato com a teoria atomística de Robert Boyle. Esta foi outra das grandes inspirações de Steno. Por meio da leitura de Boyle e sua obra, Steno começa a se interessar por uma Ciência que ainda não existia, a Geologia. Foi neste ponto de sua carreira que ele foi convidado por Ferdinando II, Grão-Duque da Toscana, a ser o anatomista da corte. Em Firenze, sua vida iria mudar. De novo.

Lá, Nicolau Steno vai desfrutar do ambiente da Corte e, principalmente, dos sábios reunidos na “Academia Del Cimento“. Essa academia, fundada pelos Médici, reunia alguns dos mais importantes pensadores italianos da época. Steno torna-se amigo de Marcello Malpigui, Vicenzo Viviani, Francesco Redi, entre outros.

 PEDRAS EM FORMA DE LÍNGUA

Em 1666, um tubarão foi pescado na costa de Livorno. A cabeça deste tubarão foi enviada à Firenze para que Steno pudesse disseca-lo. Steno notou que os dentes do tubarão eram muito parecidos com as glossopetras. Estas glossopetras, as “Línguas de pedra”, eram fósseis muito comuns no mediterrâneo. Eram conhecidas desde os tempos romanos. Havia muito tempo que Outros sábios haviam reivindicado que as glossopetras eram dentes de tubarão. Entre eles, destaca-se Fábio Colonna. no entanto, a pericia anatômica de steno foi muito importante para que estes objetos fossem reconhecidos como restos de animais, ou no sentido moderno, fósseis.

tubarão glossopetras
Cabeça de tubarão estudada por Steno e as glossopetras

Em seguida, Nicolau Steno, de anatomista, passou a naturalista. Fez diversas viagens pela Toscana, onde juntou material para escrever sua grande obra. Aparentemente,  essa obra seria muito grande. Tão grande que Steno começou a escrever o principio, ou o “pródromo”. E assim surgiu uma das grandes obras da Ciência moderna.

PRÓDROMO DE UM SOLIDO CONTIDO EM OUTRO SOLIDO

No Pródromo, Steno procura explicar que haviam varias formas distintas de sólidos contidos nas rochas. Alguns destes sólidos eram fragmentos que eram depositados junto com as rochas, como os fósseis. Um sólido dentro de um solido. Assim ele justificava a existência de diversos materiais parecidos com organismos vivos encontrados nas rochas. como , por exemplo, as glossópetras.

Por outro lado , haviam substancias que cresciam no interior das rochas, os cristais. Steno propôs que os cristais de uma mesma especie teriam o mesmo ângulo entre as faces. E que os cristais poderiam crescer dentro das rochas. Um sólido, um outro sólido, dentro de outro solido. Com esta proposição, a moderna mineralogia começa a existir.

Além disso, Steno também propôs uma evolução geológica para as rochas da região da Toscana. Segundo se pode ler no pródromo, as rochas sofriam erosões internas, com intensos abatimentos de blocos. estes blocos abatidos eram ocupados por outras rochas, mais novas e assim por diante. Com isso, ele explicou diversas sucessões estratigráficas, alem de enunciar o principio de superposição de camadas que hoje leva o seu nome.

Steno
Assim Steno explicou os ciclos sedimentares que ele observou nos arredores de Firenze
PADRE STENO ? BISPO STENO?

No entanto, uma outra mudança se operava com Nicolau Steno. Influenciado por seus amigos da academia Del Cimento, Steno acabou por se converter ao catolicismo em 1671. Mais do que isso: praticamente abandonou seus estudos de Anatomia e Geologia e passou a dedicar-se aos estudos teológicos. Assim, em 1675 ordenou-se padre católico e em 1677, bispo.

Nicolau Steno, vestido como Bispo Católico

Movido pela religiosidade, no entanto, Steno devotou cada vez mais tempo para sua fé. Sua energia e seu entusiasmo o levaram a ser evangelizador católico no norte da Alemanha, uma terra ferrenhamente protestante. E foi isso que Steno foi em seus últimos anos de vida. Desta forma, andando de cidade em cidade, tentando converter as pessoas ao catolicismo romano, Steno empregou todas as suas forças. Adquiriu fama de santo.

UM MÁRTIR CATÓLICO

Steno trabalhou inicialmente em Hanover, onde conheceu Leibniz, de quem se tornou amigo. Depois, foi para a cidade de Schwerin. Lá, em meio hostil, Steno trabalhou incansavelmente. Contudo, sua saúde começou a fraquejar. Muito doente, acamado, Steno morreu em 5 de dezembro de 1686 cercado por seus paroquianos.

Sua fama de evangelizador foi intensa. Desta forma, o caráter de sua conversão do luteranismo para o catolicismo de um sábio destes porte o transformou num herói católico. por conta de um processo de beatificação que durou mais de 50 anos recolhendo provas, Steno foi beatificado pelo para João Paulo II em 1988.

BEATO  OU CIENTISTA?

A vida de Nicolau Steno, entretanto, nos deu mostras do intenso ambiente intelectual do

seculo XVII. Como filosofo natural (a palavra cientista ainda não existia), Steno fez algumas afirmações interessantes e duradouras. Contudo, haviam ainda um grande caminho pela frente. Nada do que disse ou escreveu mudou instantaneamente a historia da Ciência ou da humanidade. Por um lado, muitos filósofos naturais continuaram a obra de Steno, e foram elaborando as bases da nova Ciência que só foi surgir, afinal, no seculo XIX, a Geologia.

Por outro lado, Steno e sua conversão, sua vida de Beato, foram exemplos para muitas pessoas que tinham preocupações religiosas. Não foi à toa que seu processo de beatificação foi levado a efeito no século XX, um século tão esmagadoramente dominado pela Ciência. Como que para provar para nós todos que mesmo um grande cientista pode ter preocupações de natureza religiosa.

Sem dúvida, o método cartesiano do experimento e da dúvida foi o grande marco na vida de Steno. A dúvida fez com que ele fosse cada vez mais rigoroso em suas observações e seus experimentos, do lado cientifico. Entretanto, do lado religioso, a dúvida fez com ele ele perdesse sua fé e se iniciasse numa outra, numa fé nova. E isso não é trivial.

Santo ou cientista, contraditório e paradoxal, Nicolau Steno foi um baita ser humano.

para saber mais:

Yamada, T., 2009. Hooke–Steno relations reconsidered: Reassessing the roles of  Ole Borch and Robert Boyle. The revolution in geology from the renaissance to the enlightenment203, p.107.

Vai, G.B., 2009. The Scientific Revolution and Nicholas Steno’s twofold conversion. The Revolution in Geology from the Renaissance to the Enlightenment203, p.187.

ARANHAS, ESCORPIÕES, BARATAS PRÓXIMOS DO INFINITO E TAMBÉM DE UMA CHINELADA!

Existem informações que escutamos numa palestra e nunca mais esquecemos. Um tempo atrás estava eu participando do Congresso de Paleontologia, assistindo as exposições orais, e entre elas uma me chamou particularmente a atenção. Se tratava da apresentação de um colega paleontólogo que estuda fósseis de insetos e ele falou que se nós víssemos uma barata do Carbonífero andando por aí agora …teria chinelada na hora…ou seja, elas eram muito semelhantes as atuais e com certeza ainda existirão por um longo tempo. Quando pensamos em fósseis, não imaginamos nem de longe a diversidade deles, na verdade até se poderia falar que os dinossauros são a ponta do iceberg, e com certeza, existiam muitas baratas e outros insetos, além de aranhas e escorpiões, durante o tempo dos dinossauros.

Exemplares de Trigonotarbida do Devoniano silicificados, Rhynie Chert, Escossia, UK

Os primeiros animais a pisar fora d’água, há uns 420 Ma, foram parentes próximos dos escorpiões e aranhas. Os mais antigos registros desses primeiros habitantes do continente foram os Trigonotarbida, similares com aracnídeos, mas de uma ordem hoje desaparecida. O que permitiu a esses ancestrais dos escorpiões e aranhas sobrevir no meio seco foi o fato de terem apêndices motores (“pernas”) e de poderem respirar oxigênio diretamente da atmosfera, duas características ou pré-adaptações fundamentais para sobreviver fora da água… A partir desse momento começou a se diversificar o enorme grupo dos insetos, que hoje representa o grupo mais exitoso dos animais do planeta Terra, com uma diversidade “próxima do infinito”. Já no Carbonífero, uns 50 milhões de anos depois, os registros fósseis mostram que os insetos foram maiores em tamanho do que os de hoje em dia (como as libélulas e baratas). São conhecidos, por exemplo, fósseis de libélulas de 50 cm e baratas, bom… dá para imaginar …. Mas por que será que eram tão grandes naquela época? Uma coisa que se sabe é que durante o Carbonífero a atmosfera continha muito mais oxigênio do que hoje em dia. Para explicar como uma maior quantidade de O2 influenciou o tamanho dos insetos, há duas hipóteses: uma diz que com mais oxigênio o metabolismo dos insetos poderia suprir corpos maiores; e a outra, que seria uma defesa da fase larval contra o possível envenenamento por excesso de oxigênio. Baratas com mais de 100 exemplares coletados, denominadas como Anthracoblattina mendesi Pinto & Sedor, foram recentemente encontradas no município de Mafra, Estado de Santa Catarina, em camadas de rochas do Grupo Itararé (Permiano). Baratas semelhantes a estas também foram comuns na América do Norte no mesmo período.

Reprodução 3D de um Trigobotarbida devoniano coletado no Rhynie Chert, Escossia, UK . Barra de Escala = 1cm

Embora no Carbonífero existam registros diferentes de insetos voadores, esses ainda não conseguiam dobrar as assas como as borboletas e pernilongos, que vieram a surgir posteriormente, durante a Era Mesozoica.

Enfim, o registro fóssil de insetos é muito rico e variado. Inclusive sabemos do enorme número deles não só por seus fósseis corporais e ecdises (trocas do exoesqueleto, conhecido popularmente como “muda”) se não também por seus icnofósseis, como mordidas em folhas, galhas, minas, fezes etc. muitas vezes observadas em folhas, frutos e troncos. No Brasil, um dos locais com uma enorme quantidade de registros de insetos é a Chapada do Araripe, que fica nos estados do Ceará, Pernambuco e Piauí, onde existem fosseis de abelhas, moscas etc. além dos muito conhecidos fósseis de vertebrados e plantas que datam de mais ou menos 110 milhões de anos atrás, no período conhecido como Cretáceo. Construções associadas com insetos sociais já foram descritas para o estado de Minas Gerais, em solos fósseis (ou paleossolos) da Formação Marília, com idade entre 100 e 72 milhões de anos atrás. Pertinho de Campinas, na Bacia de Taubaté (datada de aproximadamente 50 milhões de anos atrás) também podem ser encontrados fósseis de insetos, mas desta vez, apenas dos vestígios (icnofósseis) que eles deixaram em folhas de angiospermas, e como tem muitos icnofósseis mesmo, essas folhas deviam ser muito gostosas! No Estado de Minas Gerais, na bacia de Fonseca, que tem idade semelhante à da Bacia Taubaté, foram registrados mais de 48 espécimes de insetos das ordens Hemíptera, Coleóptera, Díptera, Hymenóptera, Isóptera, entre outros, que demostram a riqueza de insetos que habitavam a região naquela época.

Outra forma de preservação de insetos dependendo, é claro, do seu tamanho, é no âmbar. Eu já vi abelhas, pernilongos, borboletas e outros insetos mumificados até com as asas abertas dentro de âmbar, dando a impressão de que a qualquer momento bateriam as asas.

Voltando aos escorpiões, os mais antigos que se conhecem datam de 435 Milhões de anos atrás, e já eram bastante assustadores com a sua cauda característica terminada em ferrão. Agora, chinelos fósseis ainda não foram encontrados… logo podemos deduzir que os dinossauros não conseguiam se livrar facilmente das baratas e outros insetos que voavam ao seu redor.

 

Referências para consulta

Nascimento, D.L.; Batezelli, A.; Ladeira, F.S.B. 2017. First record of lobed trace fossils in Brazil’s Upper Cretaceous paleosols: Rhizoliths or evidence of insects and their social behavior? JOURNAL OF SOUTH AMERICAN EARTH SCIENCES, v. 79, p. 364-376.

Ricetti, J. H. Z.; Schneider,  J.W.; Iannuzzi, .R.;  Weinschütz, L.C. 2016. Anthracoblattina mendesi Pinto et Sedor (blattodea, phyloblattidae): the most completely preserved South American Palaeozoic Cockroach I.  Rev. bras. paleontol. 19(2):181-194. doi: 10.4072/rbp.2016.2.03

Raoni de Castro Barbosa. 2010. Tafonomia dos Insetos Fósseis da Bacia de Fonseca, Eoceno Paleógeno de Minas Gerais. Trabalho de Conclusão de Curso. (Graduação em Ciências biológicas) – Universidade Estadual da Paraíba. Orientador: Prof. Dr. Marcio Mendes.

Coleções de Fósseis de A a Z (de Aldrovandi à Zabini)

Quem nunca trouxe para casa uma pedra bonita no bolso que atire a primeira pedra.

Museu do Palazzo Poggi, Bolonha, mostrando a coleção de História Natural montada por Ulisse Aldrovandi

O hábito de “catar pedrinhas” é tão antigo quanto a humanidade. Nossos ancestrais adoravam carregar pedras bonitas que encontravam pelos motivos os mais diversos: por que era bonita, por que tinha uma forma familiar, por que tinha uma forma estranha…o fato é que as pedras nos atraem.

Entretanto, se as “pedrinhas” tiverem um formato conhecido, parecendo um animal ou planta, melhor ainda. Desta forma, ficamos ainda mas fascinados por elas. Ficamos olhando, sentindo na mão suas texturas, seus formatos, vendo seus brilhos conforme as olhamos contra a luz. Por vezes, levamos a rocha ou o mineral ou o fóssil para o quarto, colocamos na prateleira. Ao acordar, olhamos novamente fascinados. No entanto, isso não vai ficar por aí.

Uma nova coleção tem início.

As coleções de fósseis

Com o tempo, o hábito de colecionar estes objetos fascinantes foi se tornando cada vez mais sofisticado. Por outro lado, as coleções foram ficando cada vez maiores e mais volumosas. Não cabiam mais em simples gavetas e prateleiras. Ao final do século XVI o sábio italiano Ulisse Aldrovandi (1522-1605) foi o curador de uma destas grandes coleções, que então envolviam espécies animais, vegetais e minerais.

o Filosofo Natural Ulisse Aldrovandi (1522-1605), o criador da palavra Geologia e um dos maiores Sábios de seu tempo.

Em síntese, Aldrovandi tinha uma grande coleção de Historia Natural. Tinha animais, vegetais e “o reino mineral”, envolvendo o que hoje chamamos de rochas, minerais e fósseis. As gavetas nas quais guardava os espécimes não eram como hoje, separados por tipos de rochas, por minerais e por fósseis. Era tudo misturado, mesmo porque não se tinham claros os processos pelos quais uma rocha se formava.

Naquele tempo, tais coleções eram chamadas de “coleções de fósseis”. O conceito de fóssil durante o Renascimento era muito diferente do conceito moderno, conforme já tratamos aqui. A palavra fóssil vem do latim “fodere”, que significa escavar. Fóssil era tudo que pudéssemos escavar, retirar da terra. Tudo que era retirado da terra era fóssil. Solo, pedra, mineral, rocha, fóssil (no sentido moderno).

O Museum Mettalicum

Assim, Aldrovandi publicou um catálogo de sua exposição de fósseis. O catalogo era tão imenso, o “Museum Metallicum” (folheie suas páginas aqui), que só foi terminado muitos anos depois da morte de Aldrovandi, em 1648, por seu discípulo Batholomeu Ambrosinus. Nele, Aldrovandi e Ambrosinus mandaram fazer xilogravuras detalhadas, mostrando as espécies de sua coleção.

Frontispício do grande catalogo Museum Metalicum, elaborado por Ulisse Aldrovandi e seu discípulo Ambrosinus.

Em primeiro lugar, através de seu estudo, podemos ter uma ideia da concepção de mundo de Aldrovandi. Por outro lado, os critérios utilizados na sua coleção baseavam-se, como os de hoje, na visão de mundo do colecionador. Para nós, alguns destes critérios podem parecer estranhos ou mesmo não-científicos. No entanto, sabemos que Aldrovandi, se não era um moderno cientista – essa palavra só foi inventada dois séculos depois, no século XIX – era um sábio, um Filósofo Natural dos mais importantes.

Aldrovandi e a Geologia

Foi Aldrovandi, inclusive, quem inventou a palavra “geologia”, num livro que publicou em 1603. Em sua definição, geologia seria o estudo de objetos aflorantes e enterrados– os fósseis. O uso mais recente da palavra geologia, próximo do que utilizamos hoje, foi utilizada a partir do final do seculo XVIII.

Em síntese, o conceito de rochas e minerais mudou. Minerais são substâncias orgânicas ou inorgânicas naturais, com composição química definida e propriedades físicas que refletem a sua estrutura interna. Desta forma, um cristal de halita (sal gema ou sal de cozinha) tem as mesmas propriedades que as moléculas de NaCl. Por outro lado, rochas são definidas como agregados de minerais.

Cristais de Halita, ou sal gema, ou sal de cozinha. Os cristais refletem a estruturação das moléculas de NaCl presentes em sua composição.

Fósseis, no sentido moderno, são restos ou marcas  de organismos preservados por inúmeros processos de litificação. Alguns processos foram discutidos aqui no blog, tanto pela professora Frésia quanto pela professora Carolina. para uma discussão mais abrangente veja aqui.

Dinossauros no IG?

Nesta semana abriu uma exposição sobre dinossauros no Instituto de Geociências da Unicamp. Chama-se “Dinossauros (?) no IG” e vai até setembro no saguão principal de nosso novo prédio, na rua Carlos Gomes, 250, no campus de Barão Geraldo em Campinas.

A exposição tem a Curadoria da professora Carolina Zabini, nossa companheira de blog. Carolina, que é bióloga de formação e paleontóloga de carreira e coração e blogueira nas horas vagas(!), montou uma exposição muito interessante, que discute vários aspectos destes ainda estranhos monstros.

Detalhe da Exposição Dinossauros no IG, montada por Carolina Zabini

Desta forma, com uma linguagem ágil e muitas caricaturas engraçadas, feitas de maneira competente pelo Claudinei Fernandes de Oliveira, ela aborda diversos aspectos dos dinossauros: seus hábitos, seus diferentes tipos, as suas linhagens evolutivas. Tudo isso é contado pelas caricaturas e por miniaturas muito realistas e bem-feitas, construídas pelo prof. Luiz Anelli, do IG-USP.

Os Dinossauros no espelho humano

Por fim, uma das partes mais interessantes, ao menos para mim, é a parte em que são apresentadas miniaturas de dinossauros mais antigas (!), feitas nos anos 60. Elas mostram seres reptilianos grotescos e bizarros, como quando eu era menino aprendi que eram os grandes dinossauros . Contudo, de lá para cá, aprendemos também que eles podiam ser coloridos, e que muitos deles usavam penas!

Sim, nossa concepção de dinossauros muda conforme nossa visão deles, que muda com os avanços da ciência. Da mesma forma,  muda também com nossa visão de nós mesmos. Nos inícios da paleontologia, no século XIX, os dinossauros eram representados como grandes e ferozes bestas. De lá até o “Baby” de Família Dinossauro, muita coisa mudou. Mudaram os dinossauros e mudamos nós.

Um monstruoso Pteranodon em réplica dos anos 60; a foto, também monstruosa, é deste blogueiro…

Desta forma, vimos que as coleções de fosseis mudaram muito, de A à Z. De Aldrovandi a Zabini. No início, eram meros catálogos, separando os espécimes segundo critérios os mais diversos. Hoje, as exposições tem conceito, linguagem e são cuidadosamente construídas para públicos específicos.

No entanto, uma coisa não mudou: nosso estranho e esquisito hábito de colecionar objetos do mundo natural.

PARA SABER MAIS:

Duroselle-Melish, C., & Lines, D. A. (2015). The library of Ulisse Aldrovandi († 1605): acquiring and organizing books in sixteenth-century Bologna. The Library16(2), 133-161.

Ogilvie, B. W. (2008). The science of describing: Natural history in Renaissance Europe. University of Chicago Press.

Os répteis do passado… todos dinossauros?

Quando se fala em dinossauro, ou melhor, em paleontologia, qual imagem vem a sua cabeça?

Veja se pensou em alguma destas associações/imagens:

Paleontologia e o Indiana Jones

O Paleontólogo Ross (do seriado Friends)

Baby (da família dinossauros)

Piteco e Horácio (da Turma da Mônica)

Godzilla

Jurassic Park e derivados

E se você tem menos de 30 anos...

Barney the purple dinosaur

Já falamos aqui que a paleontologia é a ciência que estuda a vida pretérita. E essa vida está registrada na forma de fósseis, certo? Então a paleontologia estuda os fósseis.

E os dinossauros?

Posso dizer que essas 3 palavras (paleontologia, fósseis e dinos) normalmente caminham juntas no imaginário popular.

Para a maioria das pessoas os dinossauros são bichos gigantes, “verdes” e com dentes afiados, que caminhavam, voavam e nadavam; isso tudo num passado muito, muito distante. Será isso mesmo?

Montei um questionário bem simples, para entender seu conhecimento sobre fósseis e dinos. Quer participar? Clique aqui antes de continuar a ler o texto.

Se você já respondeu as perguntas, deve ter percebido que:

  • Alguns termos como “fósseis”, “rochas”, “minerais”, e “dinossauros” podem causar certa confusão; vamos aos conceitos:
    • Minerais são compostos sólidos homogêneos e com uma composição química conhecida. Devem apresentar um arranjo ordenado de seus átomos.
    • Rochas são conjuntos de mineras e podem ter origem vulcânica, sedimentar ou metamórfica. As que apresentam fósseis são normalmente sedimentares.
    • Fósseis são restos ou vestígios de atividade de vida com mais de 11.000 anos. Normalmente preservados em rochas, mas também ocorrem no gelo, âmbar, cinzas vulcânicas…
    • E os dinos!

Talvez você tenha ficado em dúvida ao escolher algumas das imagens que representam dinos. Todos os organismos representados ali estão extintos. Mas isso não significa que todos fazem parte do grupo Dinosauria.

Não é porque se assemelham a répteis que são dinossauros (apesar do termo “Dinosauria” significar lagarto terrível).

Não é porque os bichos das imagens têm penas que não são dinos. No caso de apresentarem pelagem, tudo bem, aí não são dinos mesmo; são mamíferos.

Dinos viveram muito antes do gênero Homo surgir. No mínimo, 63 milhões de anos antes.

Bom, acho que já deu para perceber que nem tudo que é grande, “verde”, com dentes afiados e esteja representado no registro fóssil, é dinossauro.

O Rafael já falou um pouco sobre a organização do grupo Dinosauria em outro post. Basicamente a postura deles é que os faz um grupo distinto dos demais répteis que conviviam com eles.

Quais demais répteis existiam então, você pode estar se perguntando…? os voadores, como os pterossauros, os nadadores, como os ictiossauros, mosassauros, plesiossauros….(e nenhum deles faz parte do grupo Dinosauria). Apesar de terem convivido, predado, competido com eles por espaços, presas e muito mais. Então eles compartilharam o tempo e espaço juntos, mas isso não faz com que todos sejam pertencentes ao mesmo grupo. É só olhar para a diversidade de hoje para entender o que estou dizendo. Nem todos os animais que vivem hoje são mamíferos. Temos répteis, aves, anfíbios, peixes… vivendo ao mesmo tempo (coexistindo), no nosso planeta.

E para completar este post, é com satisfação que convido todos vocês a virem ao IG da UNICAMP para aprenderem um pouco mais sobre esse tema. Trouxemos do IG da USP uma exposição com pequenos bonecos de dinossauros e outros organismos, para explicar a todos um pouco do que estudamos na paleontologia e para compartilhar perguntas divertidas sobre esses animais tão peculiares.

A exposição “Dinossauros (?) no IG” fica aberta de 5 de abril até 30 de setembro, no IG, Instituto de Geociências, a UNICAMP. Para grupos ou pessoas que queiram visitas guiadas, é necessário agendamento. Os horários de funcionamento serão das 9h às 17h de segunda à sexta. Nos dias 7 e 8 de abril (sábado e domingo) estaremos recebendo o público também. Como esta exposição foi realizada em parceria como o Museu Exploratório de Ciências da UNICAMP, eles trarão atividades como oficinas de escavação de fósseis; e a Casa do Lago, ao lado do IG, trará atividades culturais concomitantes na manhã do dia 8.

A exposição foi pensada para todos. Queremos ver vocês aqui, adquirindo conhecimento científico no lugar onde ele é produzido!

Aproveito este espaço para agradecer!
- ao Prof. Luiz E. Anelli e seu amigo Alexandre Honório Dionisio dos Santos pelo empréstimo dos materiais que compõem essa exposição;
- a toda equipe do Museu Exploratório de Ciências da UNICAMP, sem a qual não teria conseguido organizar o evento;
- à empresa Tesla concursos de engenharia que patrocina o evento;
- ao Biólogo Rafael A. Ribeiro, meu orientando de Mestrado, por todo auxílio e paciência em todas as etapas deste projeto!
- a todos os amigos próximos...
:*

Mais informações sobre a exposição no facebook,

Ou na agenda de eventos da UNICAMP.

Telefone para agendamento da visita guiada:19 3521-1727.