Erudições
Disse Montaigne: “É perfeição absoluta e virtualmente divina saber desfrutar do nosso ser legitimamente. Buscamos outras condições porque não compreendemos o uso da nossa, e saímos de nós porque não sabemos o que está em nosso interior. Todavia, de nada adianta subirmos em pernas de pau , pois, mesmo sobre pernas de pau, temos de caminhar com nossas próprias pernas. E, no melhor e mais alto trono do mundo, sentamo-nos sobre nosso próprio traseiro” (Sobre a experiência). Relendo Bernardo “Pessoa” Soares, grifei: “Há uma erudição do conhecimento, que é propriamente o que se chama erudição, e há uma erudição do entendimento, que é o que se chama cultura. Mas há também uma erudição da sensibilidade, que nada tem a ver com a experiência da vida. A experiência da vida nada ensina, como a história nada informa. A verdadeira experiência consiste em restringir o contato com a realidade e aumentar a análise desse contato. Assim a sensibilidade se alarga e aprofunda, porque em nós está tudo; basta que o procuremos e o saibamos procurar” (Livro do Desassossego, vol.II). Cada vez mais abandono livros de filosofia pela metade. Não seriam suficientes Montaigne, Shakespeare, Pessoa e Machado de Assis?
P.S: Acho irretocável a definição de cultura como “erudição do entendimento”.
Discussão - 8 comentários
Amigo,A erudição do entendimento (e não do conhecimento) é a cultura...creio que se equivocou em seu "p.s."..Para a erudição do conhecimento é suficiente a lista de autores citados. Para a erudição do entendimento, leiamos sem parar...abração!
Caro Anônimo, obrigado pela correção. Sim, leiamos sem parar...
olá Amigo.a filosofia me parece sempre ponto, já a literatura me parece sempre interrogação!abs
Amigo,Por nada.Estive hoje relendo "Antologia Poética", quando acabei por novamente me impressionar com o "Poema Enjoadinho" do saudoso Mestre Poetinha.A sensação foi muito diferente. Reli o texto, mas agora na condição de pai.Abraço!Filhos... Filhos?Melhor não tê-los!Mas se não os temosComo sabê-lo?Se não os temosQue de consultaQuanto silêncioComo os queremos!Banho de marDiz que é um porrete...Cônjuge voaTranspõe o espaçoEngole águaFica salgadaSe iodificaDepois, que boaQue morenaçoQue a esposa fica!Resultado: filho.E então começaA aporrinhação:Cocô está brancoCocô está pretoBebe amoníacoComeu botão. Filhos? FilhosMelhor não tê-losNoites de insôniaCãs prematurasPrantos convulsosMeu Deus, salvai-o!Filhos são o demoMelhor não tê-los...Mas se não os temosComo sabê-los?Como saberQue maciezaNos seus cabelosQue cheiro mornoNa sua carneQue gosto doceNa sua boca!Chupam gileteBebem shampooAteiam fogoNo quarteirãoPorém, que coisaQue coisa loucaQue coisa lindaQue os filhos são!
Amigo,(Sísifo-)Martim, o personagem duma das + lindas escrituras de Clarice, "A Maçã no Escuro" buscou à exaustão o sentido da vida; mas na sua neura somente restou-lhe o vislumbre de um sentido, mas tão vago&distante; quanto uma maçã no escuro, totalmente fora do alcance de quem tem fome. E o coitado do Martim continua lá, morto de fome, na fazenda de dona Vitória. (e aquelas pessoas vestidas de uma empáfia são tão ingênuas!) O único sentido da vida é um vislumbre de uma maçã no escuro...Abraaaaaaaaaço! – Vamos, disse então aproximando-se incerto dos quatro homens pequenos e confusos. Vamos, disse. Porque eles deviam saber o que faziam. Eles certamente sabiam o que faziam. (...) Porque afinal não somos tão culpados, somos mais estúpidos que culpados. Com misericórdia também, pois. Em nome de Deus, espero que vocês saibam o que estão fazendo. Porque eu, meu filho, eu só tenho fome. E esse modo instável de pegar no escuro uma maçã – sem que ela caia.
Guinada "pessoistica"? Good...Rorty acha que a função da filosofia é explicar a literatura. Filosofia e Literatura: é mais legal degustar o vinho quando se presta atenção aos sabores...
A melhor literatura é aquela que faz pensar, como na filosofia. A melhor filosofia é aquela que dá prazer, como na literatura.
Caro Jonas, acredito que você acertou na mosca! A melhor filosofia é a que dá prazer.Abraço!