Neuroplasticidade (2)

Ivan Petrovich Pavlov

Retomando o post anterior. Norman Doidge atua como psiquiatra clínico. Cada vez mais o seu consultório é invadido por indivíduos jovens com problemas na esfera sexual, notadamente disfunção erétil – o nome politicamente correto para impotência. Em comum, todos esses pacientes são viciados em “web pornografia”. A última década, em virtude da internet, propiciou uma radical mudança na oferta de material pornográfico. Há fotos e vídeos gratuitos para todos os gostos e perversões. O modelo prévio, de nus frontais que outrora escandalizaram as sociedades ocidentais, faz Hugh Hefner parecer uma ingênua e pueril criatura. O problema todo começa quando o viciado em pornografia passa a gastar oito horas por dia navegando, perdendo valiosas horas de sono em busca desse material e privando-se do convívio social. Além disso, frustra-se, pois não encontra na parceira sexual – namorada ou mulher – todo aquele “desempenho” artificial das protagonistas da web. Mas onde entra a neuroplasticidade nessa história toda? É muito simples. Diante de seu monitor, assistindo a vídeos ou vendo fotos, o “porno-adicto” tem o seu cérebro invadido por enormes quantidades de dopamina cada vez que se masturba. A dopamina, substância química que atua como potente neurotransmissor e que sabidamente desempenha relevante papel nos sistemas de recompensa cerebral , reforça esse tipo de comportamento por meio da modificação da circuitaria neuronal. Pronto: o estrago está feito. Cada vez que esse comportamento se repete, a circuitaria se torna mais alicerçada no cérebro e estabelece um novo padrão de desejos e fantasias sexuais que é somente possível de ser obtido no mundo virtual. O tratamento, que funciona em boa parte dos casos, consiste em evitar o comportamento e cortar o ciclo vicioso. Com o passar do tempo, plasticamente, a circuitaria neuronal se modifica e volta a entrar nos eixos. Nós, animais condicionados. Pavlovianamente!

Neuroplasticidade (1)

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Norman Doidge é psiquiatra e neurocientista. Natural de Toronto, ele trabalha no Laboratório de Pesquisas e Treinamento em Psicanálise na Universidade de Columbia, Nova York. Elogiado por nomes como Oliver Sacks e V.S. Ramachandran, Doidge disponibilizou, em forma de livro – The Brain that Changes Itself -, quase todas as informações científicas que estão mudando, definitivamente, a visão do cérebro como órgão sem capacidade de modificação. De forma clara e acessível, a leitura da magistral compilação de Doidge descreve, dentre outros, os experimentos de Edward Taub, que demonstrou a capacidade de intensa recuperação da habilidade motora após lesão do sistema nervoso. O experimento de Taub foi simples. Ele lesou os nervos responsáveis pela sensibilidade e movimentação do braço direito de macacos ao mesmo tempo que amarrava o braço esquerdo, saudável, impossibilitando a sua utilização. Após algum tempo de observação, Taub notou que os símios passaram a movimentar e utilizar o braço direito, lesado. “(…) I realized that I had been seeing the monkeys using their limbs for several weeks, and I hadn’t verbalized it because I wasn’t expecting it”, disse um inicialmente incrédulo Taub. Para mim, o ponto alto do livro foi o capítulo intitulado “Acquiring Tastes and Loves”, que descreve a mudança de comportamento dos indivíduos na era da pornografia maciça oferecida pela internet. Mas irei deixar esse assunto para o próximo post. Resumidamente, se você quiser fazer novas sinapses em seu cérebro plástico e, assim, garantir-lhe maior longevidade, as dicas são as seguintes: aprenda um novo idioma; aprenda a tocar um instrumento musical; estude novos assuntos; faça dança de salão. Está se achando velho? As dicas valem para indivíduos de qualquer idade, dos 10 aos 100 anos.

Ler para sobreviver

A última edição da revista piauí traz um ensaio magistral escrito por M. Vargas Llosa. Intitulado “Em defesa do romance”, o texto ressalta a imprescindibilidade da leitura ficcional. É ela que molda o nosso pensar, que aprimora o nosso sentir e que aguça o nosso entendimento. Não há empatia sem literatura. Não há amor além do sexo. “Não é exagero afirmar que um casal que haja lido Garcilaso, Petrarca, Góngora e Baudelaire ama e usufrui mais do que outro, de analfabetos semi-idiotizados pelas séries de televisão. Em um mundo iletrado, o amor e a fruição não poderiam ser diferenciados daqueles que satisfazem os animais, não iriam além da mera satisfação dos instintos elementares: copular e devorar.” Segundo Llosa, é a literatura que nos fornece a consciência de que o mundo se acha “mal-acabado” e, por isso mesmo, “poderia ser melhor.” Ler é perscrutar o escuro de nossa alma, é sacudir idéias e alinhavá-las com o justo sentido. É apreender o mundo de maneira mais refinada. Sem Rabelais, por exemplo, diz Llosa, diríamos “pessoas de apetite descomunal e de excessos desmedidos” e não apenas “pantagruélico”. Exemplos se sucedem de maneira quase infinita. A incitação à leitura deve ser a plataforma de qualquer política educacional sensata. Caso contrário, o único futuro social possível será muito pior que a mais trágica previsão orwelliana.

Kurt Masur


Em minhas andanças pela Alemanha, enquanto caminhava pelas ruas de Colônia, avistei o maestro Kurt Masur, que, distraidamente, puxava uma pequena mala com rodinhas. Me aproximei dele e apresentei-me. Simpático e afetuoso, me fez uma série de perguntas após eu lhe dizer que havia assitido às suas apresentações em Campos do Jordão e na Sala São Paulo. Me disse que havia se apresentado em Colônia no dia anterior e que se apresentaria em Dusseldorf naquela mesma noite. A sétima sinfonia de Shostakovich seria a peça a ser regida. Estava a caminho da estação de trem. Sem seguranças. Sem qualquer uma das exigências comuns feitas por qualquer astro pop. Despedimo-nos com um abraço.

A era das celebridades é algo espantoso. Indivíduos com a inteligência de meia ostra são alçados ao status de comentarista político, líder espiritual, crítico musical, ídolo teen. As celebridades-molusco ganham centenas de milhares de “seguidores” em instrumentos como o twitter. Há, então, a emergência patológica de relevância em fatos tão insignificantes que não teriam lugar nem como último assunto do almoço familiar de domingo.

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