Psicanálise (2)

Nunca recebi tantos e-mails como após o post anterior. Em virtude disso, talvez, estive afastado deste blog por tempo maior que o habitual. A leitora Eliana Teixeira, muito sensata em suas ponderações, acredita que a psicanálise sempre acrescentará um algo a mais, além de toda a cultura que um indivíduo possa carregar. Diz Eliana: Embora aprecie bons livros e tenha bem uns três bons amigos, me submeto à psicanálise. É verdade que, e já tive o enorme prazer de viver a experiência, um psicanalista erudito pode ser um enorme diferencial. Por puro deleite. Mas o fato é que o processo psicanalítico não é um embate intelectual; o que é realmente necessário é que a formação do profissional permita a ele vislumbrar em nossa alma o que ainda não quisemos ou não pudemos perceber. E neste caso, por mais que já tenhamos lido em algum lugar a grande verdade que pode ser a cura daquele nosso mal, só o bom profissional vai nos levar a nos abrirmos para receber, apreender, a tal verdade. Já o leitor José Eugênio acredita que a psicanálise só é útil quando o analisado possui um mínimo de cultura. Psicanálise para analfabetos ou um pouco melhor que isso é inútil. A cultura é pré-requisito para que haja aproveitamento do momento psicanalítico. É ela que estabelece relações de simetria, analogia e escancara as portas da razão para o entendimento. E o que digo eu? Depois de muito pensar, acredito que seja hora de procurar por um bom profissional. Mea culpa. Mea maxima culpa.

Psicanálise

A embriaguez de Noé, Michelangelo, Teto da Capela Sistina

Então voltei para casa e escrevi:
Meia-noite. A chuva castiga a janela. Não era meia-noite.
Não chovia.
Beckett, Molloy

Nunca fui submetido ao processo psicanalítico. Contrariando os especialistas, acho que não é para todo o mundo. Vendida como uma espécie de panacéia para os males mentais do espectro neurótico, a psicanálise tornou-se um engodo, um objeto de consumo com grifes caras e tudo o mais. Prefere-se o conselho oracular do analista às evidências que se escancaram aos olhos do analisado – isso sem levar em conta a precária formação cultural e humanística de grande parte dos ditos terapeutas. Se é para aumentar a chance de sucesso do tratamento, há de existir uma clara assimetria entre a cultura do terapeuta – a maior possível – e aquela que habita a mente do analisado. Há alternativas ao tratamento padrão habitual. Um bom amigo, por exemplo. O francês Michel de Montaigne, muito antes de Freud & Cia., submeteu-se, involuntariamente, ao processo psicanalítico por meio de conversas com o seu amigo Étienne de La Boétie. Um bom livro. Ler é uma forma de produzir entendimento. A boa leitura nos faz enxergar as similitudes e as diferenças de sentimentos e de reações entre o leitor e a personagem, e, ao fazê-lo, é catártica. Um bom espetáculo. As tragédias encenadas pelos gregos, desde Sófocles e Ésquilo, e que chegaram até nós, ensinaram-nos a projetar e a apaziguar as nossas angústias e os nossos temores. Não foi sem querer que Freud se valeu do estudo da mitologia clássica na elaboração de sua teoria – basta citar Édipo. Agora, se você não tem tempo para um bom amigo, um bom livro e uma boa tragédia, a psicanálise pode ser o seu caso.

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