Corpos Sem Almas
Fonte: Project Syndicate
Autor: Paul Bloom
Tradução: Rodrigo Véras e André Rabelo
O principal estudioso da inteligência artificial do mundo, uma vez descreveu as pessoas como máquinas feitas de carne. Isso capta muito bem o consenso nas áreas de psicologia e neurociência, que nos diz que nossas vidas mentais são produtos dos nossos cérebros físicos, e que esses cérebros são moldados não por um criador divino, mas pelo processo cego de seleção natural.
Mas, com exceção de uma pequena minoria de filósofos e cientistas, ninguém leva essa visão a sério. É ofensiva. Ela viola as doutrinas de toda religião e entra em conflito com o senso comum. Nós não sentimos, afinal, que somos apenas corpos materiais, pura carne. Ao contrário, ocupamos nossos corpos. Nós os possuímos. Somos espontaneamente atraídos para a visão defendida por René Descartes: Nós nascemos naturalmente dualistas, assim, vemos corpos e almas de forma separada.
Esse dualismo tem consequências significativas para a forma como pensamos, agimos e sentimos. O filósofo Peter Singer discute a noção de um círculo moral – o círculo de coisas que são importantes para nós, que têm um significado moral. Este círculo pode ser muito pequeno, incluindo apenas os seus parentes e aqueles com os quais você interage diariamente, ou pode ser muito amplo, incluindo todos os seres humanos, mas também fetos, animais, plantas e até mesmo o próprio planeta terra. Para a maioria de nós, o círculo é de tamanho médio, e destrinchar seus limites precisos – Será que inclui as células-tronco, por exemplo? – pode ser uma fonte de angústia e conflitos. Continue lendo…
Negacionismo
“O sono da razão produz monstros” (el sueño de la razón produce monstruos) é o título que acompanha a obra ao lado, de Francisco Goya, onde um homem adormece e é assombrado por “monstros” da noite. Goya foi um defensor do iluminismo e satirizou a sociedade de sua época na série de gravuras “Los Caprichos“.
A sociedade da época de Goya guarda muita semelhança com a sociedade em que vivemos, ainda impregnada pela superstição, pela religião, pelo misticismo e pela antipatia à razão.
Avançamos muito desde o século XVIII nesse sentido, tempos onde uma mulher seria queimada viva se alguém a denunciasse como bruxa – mesmo que não existissem provas – e um homem poderiar ser torturado até a morte se duvidasse de algum dogma religioso.
Ao longo do século passado houve uma tendência, principalmente nos círculos filosóficos mas na população de um modo geral, de se negar evidências e tentar demonstrar que não havia consenso sobre vários conhecimentos estabelecidos. A crítica que visava invalidar a razão e relativizar tudo ad infinitum ficou conhecida como o negacionismo. Continue lendo…
A Nova Ciência da Moralidade
“Algo radicalmente novo está no ar: novos meios de entender os sistemas físicos, novos meios de pensar sobre o pensamento que questionam muitas das nossas suposições. Uma biologia da mente realista, avanços na biologia evolucionista, física, tecnologia da informação, genética, neurobiologia, psicologia, engenharia, a química dos materiais: todas essas são perguntas de importância crítica em relação ao que significa ser um humano.
Pela primeira vez, temos as ferramentas e a vontade para nos empreendermos no estudo científico da natureza humana”(tradução minha). Esse é o texto traduzido que abre a página da web sobre a conferência organizada pela Edge, na qual vários cientistas discutiram a nova ciência da moralidade. Continue lendo…
Bebês têm noções de moralidade?!
Muito se discute hoje em uma área de pesquisa da psicologia chamada de Moral Psychology (Psicologia da Moral) sobre os aspectos genéticos e culturais envolvidos no desenvolvimento do julgamento moral e das noções de certo e errado que nós temos sobre os nossos e os comportamentos dos outros.
Por muito tempo uma idéia dominante foi a de que esses padrões de moralidade só podem existir através de um aprendizado formal, alguns chegando até a afirmar que só através de uma educação religiosa isso é possível e que sem a religião nós seríamos selvagens, violentos e desumanos.
A despeito das nações mais desenvolvidas hoje em dia serem as menos religiosas (e.g. Suécia, Noruega, Dinamarca), como descreve Phil Zuckerman em seu livro Society Without God, esse argumento ainda vêm sendo usado, até mesmo pelo pobre papa Bento XVI, em várias declarações infelizes recentemente, apontando o dedo para novos inimigos (ateus) na tentativa de mostrar a importância da igreja no mundo e tirar o foco da atenção nos casos de abuso sexual que há muito tempo a igreja vêm abafando nos seus bastidores (aonde está essa moralidade tão imponente que a educação religiosa oferece nesses padres abusadores de criancinhas?).
Um artigo publicado em 2007 na Nature, uma das revistas científicas mais importantes no mundo e de maior impacto, traz dados sobre a “avaliação” de comportamentos sociais por parte de bebês de 10 e 6 meses de idade. Os resultados indicaram que ao observar uma interação entre um boneco que ajudava o outro a subir uma montanha e um boneco que atrapalhava o outro a subir uma montanha, mais de 90% dos bebês escolheram o boneco que ajudava o outro a subir a montanha. Mais precisamente, 14 dos 16 bebês de 10 meses de idade e 12 dos 12 bebês de 6 meses de idade escolhiam o boneco que havia ajudado o outro na interação que o bebê tinha assistido. Continue lendo…