“Nossa, preciso de endorfina… Vou para a academia”, digo antes de ir malhar. Tem gente que rebate afirmando que faço academia para manter a boa forma. Também. Mas, sério, comecei a praticar atividade física, este ano, para liberar endorfina – uma substância produzida pelo nosso corpo que gera bem estar e prazer.
Poderia conseguir endorfina de outras maneiras, como comendo um delicioso chocolate. Aí entra um probleminha. Comer dá prazer. Porém, se engordarmos, ficamos triste. Então, eu como chocolate e malho. Assim, garanto “duas” doses de endorfina e, ainda por cima, combato as malditas gorduras localizadas. Engraçado que, quanto mais faço atividades físicas, mais sinto falta quando não vou para a academia…
Uma nova pesquisa do Centro de Estudo em Psicobiologia do Exercício da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), identificou que 28% dos atletas brasileiros profissionais ou recreacionistas são viciados na prática de exercícios.
Assim como viciados em outras coisas – como álcool, cigarro e drogas em geral -, os dependentes de exercícios apresentam crises de abstinência quando privados da prática. Para o estudo, foram analisados os comportamentos de 400 atletas brasileiros. Sendo que 200 deles são de elite, possuem reconhecimento internacional em diversas modalidades como futebol, vôlei, judô e ginástica olímpica. Os outros 200, praticantes amadores.
Por meio de questionários e de observação, os cientistas perceberam que cerca de 30% dos voluntários apresentavam um comportamento excessivo que caracteriza o distúrbio. “A pessoa é considerada viciada quando a prática interfere no desenvolvimento de outras atividades, sejam elas profissionais, sociais, familiares ou psicológicas”, explica o pesquisador Vladimir Modolo.
Entre os que apresentaram a dependência, há incidência de indivíduos que sofrem de transtornos de imagem corporal como anorexia – transtorno alimentar pela busca implacável da magreza – ou vigorexia – excesso de preocupação com o crescimento dos músculos.
Nesses casos, as motivações femininas para praticar exercício estão associadas à depressão e à preocupação com a imagem corporal, enquanto os homens apresentam fatores como afirmação social e excesso de competitividade. Aliás, o número de atletas profissionais e amadores viciados em exercícios é proporcional.
Embora a prática de exercícios físicos seja recomendada, a dependência e o excesso são prejudiciais à saúde e à qualidade de vida. “A pessoa pode chegar a um estágio de overtrainning, uma síndrome neuroendócrina que resulta em modificações fisiológicas e/ou psicológicas. Às vezes, o atleta treina mesmo impedido por uma lesão ou uma fratura grave. O dependente também tem níveis altos de ansiedade ou crises de depressão”, explica Modolo. “O que deveria ser positivo, se torna negativo, caso executado de forma exagerada”, completa.
Outro elemento que impacta negativamente o viciado é a substituição de atividades do cotidiano pelo treinamento físico. “Há casos de pessoas que perdem compromissos profissionais para ir treinar. Temos o exemplo de um pai que deixou de ir à formatura de pré-escola da filha porque era no mesmo horário de seus treinamentos. Uma pessoa viciada é incapaz de modificar ou deixar de fazer um treino”, conta Hanna Karen Antunes, coordenadora da pesquisa.
O tratamento recomendado para os viciados em esportes é o mesmo para pessoas com vícios variados. A ideia é retomar o equilíbrio e o controle sobre a atividade. Veja os principais indícios de que o exercício se tornou um vício: estreitamento de repertório, preocupação excessiva com o corpo ou alimentação; perda de interesse social por causa do treino; opção de treinar mesmo com ambiente desfavorável; comportamento compulsivo.
Conheça os sintomas psicológicos de um viciado em exercício: aumento da ansiedade, crises de depressão, irritabilidade, diminuição do tempo de sono, diminuição do vigor. Sintomas fisiológicos: aumento da fadiga, baixa do sistema imunológico, alterações hormonais, aumento da tolerância – necessidade de mais sessões de treino para obter o mesmo resultado – e crises de abstinência. Se esse é seu caso, procure um médico.
Eu, por enquanto, não troco um bom bate-papo em família ou com amigos pela minha academia. Boa sexta!