Quem sou eu

Gráfico

O artigo de hoje ia ser só isso aí em cima mesmo, porque eu pensei: “já que não sei mais escrever, vou começar a desenhar minhas ideias”.

Mas enquanto eu estava finalizando os últimos detalhes, recebi a notícia de que o Professor Sandro Silva e Costa havia se suicidado e pensei que não seria apropriado publicar uma piada.

Logo em seguida, pensei que talvez conseguisse extrair alguma coisa útil das duas situações anti-sincronicamente emaranhadas.

O que leva uma pessoa a tirar a própria vida? O que poderia ser tão ruim assim?

Essa linha de pensamento é sempre a primeira e a mais perigosa, pois eu estou supondo que uma escolha, mas isso é uma falácia.

Uma pessoa neurologicamente prejudicada não enxerga alternativa. Não é questão de opção, apenas um adiantamento no inevitável décimo-terceiro da vida.

“Todos vamos morrer de todo jeito, então por que permanecer aturando uma coisa que eu não gosto?”

Isso é, para mim, ainda mais triste, pois não há apoio familiar ou terapia que resolva. Só remédio.

Muito.

Para o resto da vida.

Assim como não há psicoterapia anticonvulsiva pois não existe conversa que resolva falhas eletroencefálicas, o mesmo é verdade para desequilíbrios químicos no cérebro. Palavras são poderosas, mas não onipotentes.

Para aumentar a minha tristeza, do plano individual para o público, existem aqueles que ignorantemente condenam o sujeito por ser “fraco” ou as pessoas que o rodeiam por não “enxergarem os sinais”.

Depois que o diabo do cachorro morde é fácil lembrar que ele “latia de um jeito estranho”, né? Previsões são sempre excelentes quando surgem depois do fato.

Os últimos textos de Stephen Dedalus mostram “claramente” como ele estava prestes a cometer um ato terrível:

“Ontem cheguei ao fundo do poço. No começo do dia encarei o abismo por longos minutos, decidindo se dava um passo à frente ou não, depois vaguei o dia todo a pé sem rumo, sem lugar para ir e sem praticamente falar com qualquer pessoa, só para terminar o dia muito cansado.”

Claro como o dia, não?

Agora esse outro pedaço de texto, de outra pessoa, igualmente carregado de frustração:

“Pois bem, reitero o apelo: procura-se a felicidade. Eu não sei onde ela está, devo tê-la perdido em algum lugar, mas sei descrever bem sua aparência por ter convivido tanto tempo com ela.
Mas aparentemente agora ela é Isabeau para meu Navarre, desaparecendo quando eu acordo e retornando quando me recolho.”

O autor do trecho acima não só continua vivo como está, neste exato momento, escrevendo sobre ele mesmo na terceira pessoa.

Tristeza todo mundo tem vez por outra. Menininhas adolescentes que brigam com o namorado não ficam depressivas. Depressão, apesar da banalização do termo, é uma condição psiquiátrica séria.

Voltando ao gráfico do começo: talvez uma pessoa com depressão enxergue a vida com os parâmetros trocados, intrinsicamente dando mais valor à opinião alheia sobre si e julgando hipernegativamente tal opinião, criando um “o que eu penso de mim” na ponta direita. E se algo vale assim tão pouco, qual o motivo para permitir que esse algo continue ocupando espaço valioso no mundo?

Não creio que uma pessoa se torne depressiva da mesma forma que ninguém se torna homossexual. Não é uma escolha ou resultado de experiências, mas algo definido fisiologicamente no cérebro do indivíduo.

E isso é triste, muito triste.

Especialmente quando chega ao mais extremos dos pontos finais.

Espero que a falta dele seja sentida e que sua vida seja lembrada.

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