Resenha – E Se?

“É provável que bifes sobrevivam ao romper a barreira do som. Se o bife estivesse só parcialmente congelado, ele iria se estilhaçar muito fácil. Contudo, se ele aterrissar na água, na lama ou em folhas, talvez fique ok.[1]

Plasma incandescente, petabits por segundo, gotas de chuva de um quilômetro de diâmetro, escala Richter negativa, cozimento gravitacional, quantos mortos existem no Facebook, o sinal UAU! e um secador de cabelos indestrutível. Este livro é, sem sombra de dúvidas, o meu filão.

Sem se manter numa mesma linha de raciocínio por mais de dois parágrafos, Randall Munroe, autor do sempre (estatisticamente) excelente XKCD, responde perguntas hipotéticas (e algumas aparentemente nem tanto) de seus leitores com um rigor científico encontrado apenas nas mais bem conceituadas instituições de publicação de webcomics. Afinal, apesar de ser roboticista, Randall é um cartunista humorista (ou “roboticisto”, “cartunisto” e “humoristo”, como o jornalisto Jô Soares acredita ser correto).

Foto do autor

Foto do autor

Um dos melhores capítulos é o que fala sobre o que aconteceria com a órbita terrestre se todas as pessoas se juntassem num mesmo lugar e pulassem ao mesmo tempo. E não digo isso porque o Scienceblogs é citado (é a matriz, afinal, mas está valendo) mas pela reviravolta épica que me pegou de surpresa. Pensamento lateral daqueles que caem para fora da página. E ainda me lembrou um texto épico meu.

Um livro extremamente divertido, fácil de ler (para mim foram três ou quatro horas de pura empolgação) e de acompanhar (as contas mais pesadas ele guarda para si e não “mostra o trabalho”, só dá a resposta). Divulgação científica de primeira com inúmeras piadinhas discretas espalhadas por todo lugar (incluindo no verso da folha de rosto que, quando trabalhei num jornal, chamavam de “serviço”) que certamente causarão gargalhadas em quem as encontrar dentre as 300 e poucas paginas.

Eu achei muito erro de tradução[2] e até alguns de gramática (e uns mistos, como muito uso de vírgula que sobrou do original mesmo não existindo em português). Mas não acho que a maioria das pessoas realize ou se incomode, com essas coisas.

e se

A minha cópia é da primeira edição e tem uma diagramação esquisita no inicio, onde um mapa com os oceanos do mundo esvaziados ficou praticamente sem África e Europa, que se perderam dentro da lombada. Mas, como sou gente boa, eis aqui o desenho original.

Em E Se?, lançado aqui pela Companhia das Letras, você também vai descobrir uma nova solução para a máxima do copo meio vazio, quanto custaria morrer num quebra-molas e, com a ajuda de girafas empilhadas, como uma criança de cinco anos pode destruir a lógica de um físico e a força de um arremessador profissional.

Minha cópia me foi enviada pela editora, mas é o tipo de livro que eu compraria sem hesitar. Recomendo fortemente para você que lê o 42. e não volta para casa com confusão mental. E, se você é fã do XKCD, nem sei porquê está lendo isto.

Ah, e para quem estiver lendo isto a tempo e precisar saber até sexta-feira:

Sweet.

———

[1] Intacto, no caso. Não ok para comer.

[2] Porém, preciso parabenizar o tradutor que teve a ideia de traduzir “flyover state” para “estado janelinha”. A melhor manobra tradução que vi desde que “blaster” virou “explosor” nos anos 70.

Alguém me explica que Merd, ops, Nerdologia foi esse?

Como venho me dedicando aos livros em detrimento aos podcasts, venho marcando a passagem das semanas pelas quintas-feiras. Mais especificamente pelo excelente Nerdologia, escrito e apresentado por Atila Iamarino (sim, aquele do Rainha Vermelha).

O videocast é patrocinado, via de regra, pela Nerdstore (autoexplicativo) e, vez por outra, por alguma outra empresa fora do conglomerado Jovem Nerd (do qual o Nerdologia faz parte), mas nunca deixando de ser algo relacionado ao mundo neo-nerd, como videogames, computadores, esportes de ação (hein?). Exceto este último.

O episódio mais recente me pegou de surpresa. E me pegou num lugar inesperado. E privado.

Logo no comecinho, na primeira aparição do patrocinador, surge a imagem abaixo:

Desconhecida por mim mas totalmente cromulente e inocente.

Desconhecida por mim mas totalmente cromulente e inocente.

Como a imagem aparece por menos de dois segundos na tela, li “hearing guardian” e achei que fosse algum tipo de protetor auricular. Sabe? Daquele que guard sua hearing? Pois. Não é.

No final, meio distraído (porque quando estou prestando atenção eu fecho o vídeo antes da propaganda começar), escuto uma voz diferente exclamando(sic): “Agora que você já sabe para que servem as suas células ciliadas, você pode exercitar as suas com o Hearing Guardian V1 da Biosom.”

Depois de recolher meu diploma do chão e recolocá-lo na parede, voltei para ouvir o resto. A propaganda alega que o produto Hearing Guardian V1 da empresa Biosom (sic) “é um software que ativa e movimenta as suas células ciliadas uma a uma, como se fosse um afinador de piano, deixando elas mais resistentes ao longo de sua vida”.

Eu até poderia discorrer sobre as propriedades fisiológicas dos estereocílios (o nome próprio das células que o software promete re-energizar reativar ressuscitar rejuvenescer exercitar) e fazer comparações do tipo “alegar que um programa pode exercitar as células do seu ouvido com estímulos sonoros é como tentar vender um massageador de períneo que promete deixar seus espermatozóides mais bronzeados, já que ambos prometem dar novas propriedades às celulas” ou ainda que dizer que isso vai deixar os estereocílios “mais resistentes ao longo da sua vida” é semelhante a propor que a pedra só é dura porque precisou aguentar, por anos a fio, as pancadas da água (que é mole pelo mesmo motivo, só que ao contrário).

Todavia, como sou formado apenas em engenharia de áudio, vou me ater aqui ao que vem escrito na fonte.

E sabe o que mais movimenta suas células ciliadas uma a uma? Barulho. Qualquer barulho. E isso para não falar nada sobre o fato de que elas não ficam isoladas, mas sim em feixes de várias ao mesmo tempo.

Um a um? Acho que Senhor Miyagi discordaria...

Um a um? Acho que Senhor Miyagi discordaria…

O locutor da propaganda diz, em seguida, que o software foi desenvolvido na Coréia do Sul e teve sua eficácia comprovada pelo Instituto Earlogic de Pesquisa da Coréia. Bom, a partir dessa informação impressionante de comprovação de eficácia, já posso passar para o site da empresa Biosom. Lá, me deparo com a temida seção “depoimentos” que todo pseudocientista adora, já que experiência pessoal é sempre mais importante que qualquer estudo bem feito com milhares de pessoas (agora, adivinha o que nunca tem nessas páginas? Um formulário de “escreva aqui o seu depoimento” ou algo semelhante). São oitenta depoimentos dos quais cinquenta e um (63,75%) agradecem à marca por uma melhora significativa do zumbido ou tinnitus. Mas isso só fica importante mais para a frente.

Em seguida, encontro a subseção “estudo“, onde se lê:

Vários estudos têm relatado que o condicionamento de som (ou seja, exposição prévia a sons de baixo nível) poderia proteger contra danos na capacidade auditiva causados por ruído traumático em um número de espécies de mamíferos, incluindo humanos.

Palavra-chave ali é “proteger”, correto? Como em português essa frase só existe nessa página e noutras apontando para ela (e não sei do que se trata coreano), catei em inglês até achar isto aqui:

“In addition to delaying progressive hearing loss, acoustic stimuli could also protect hearing ability against damage by traumatic noise. In particular, a method called forward sound conditioning (i.e., prior exposure to moderate levels of sound) has been shown to reduce noise-induced hearing impairment in a number of mammalian species, including humans.”

Isso eu achei no ClinicalTrials.gov, uma base de dados de estudos clínicos em humanos do Instituto Nacional de Saúde americano. Esse estudo deveria comparar a diferença de percepção entre tons puros, antes e depois da estimulação sonora. Pena que, mesmo tendo sido completado dois anos atrás, ele nunca apresentou os resultados.

Um dos links na seção “Outros estudos sobre a tecnologia” é este, igualmente sem resultados publicados.

Ambos, prepare-se para a surpresa, patrocinados pela Earlogic Korea, Inc., tendo como investigadores principais Eunyee Kwak, Ph.D. e Earlogic Auditory Research Institute, empresa que o locutor diz ter comprovado a eficácia do software. Volto já para a Earlogic, calma.

Procurando mais especificamente pelo resultado do ^estudo^ (aspas irônicas) na página da Biosom vejo que na Internet inteira (ou na parte alcançada pelo Google, pelo menos), não há uma só menção (fora, claro, o site da marca) que relacionasse “13,51 dB” com “P= 0.00049” a um estudo sobre audição. Ou sequer a qualquer outra coisa senão o próprio texto.

Me interessando bastante o “vários” em “vários estudos têm relatado que o condicionamento de som poderia proteger contra danos na capacidade auditiva causados por ruído traumático”, fui atrás. Achei um bem interessante, este sim publicado (no Journal of Neurophysiology da American Physiological Society).

O teste mostrou que o condicionamento sonoro (em ratos, seis horas diárias) realmente melhora a resposta coclear. Exceto na faixa testada acima de 12kHz. Que é o que acontece com a idade, quando os agudos começam a morrer. Como se ela tivesse sido exposta a sons, como quem passou anos ouvindo (como os ratos que passaram seis horas diárias e consecutivas durante dez dias ouvindo o equivalente ao som de um liquidificador de 600W triturando cem gramas de gelo a uma distância de noventa e cinco centímetros, mais ou menos [1]).

O estudo acima diz que é possível melhorar (simplificando, porque a explicação toda envolve termos como “permanent threshold shift” e “high pass filter” que eu aprendi quando fui alfabetizado em inglês e estou com séria indisposição agora) a eficiência coclear. Sabe o que o estudo não diz? Aliás, sequer cita? Que essa macumba sonora cura tinnitus ou zumbido ou perda de audição. Que é no que os depoimentos do site se concentram.

Se eles dizem ter sido curados de seus zumbidos e a propaganda diz que a eficácia foi comprovada pela Earlogic, vamos agora para a Coréia do Sul (a boazinha da duas) conhecer de perto a empresa.

Procurando primeiro por Eunyee Kwak, Ph.D., vejo que ela é a diretora de pesquisa da Earlogic Corporation.

Investigadora principal da Earlogic Corporation.

Investigadora principal da Earlogic Corporation.

Na página da Biosom ela é constantemente associada a outro Kwak, Sangyeop. Este, descobri, é o fundador e presidente/CEO da Earlogic Corporation (link em PDF). Segundo seu currículo, Sangyeop não publica desde 2010.

Fuçando na publicações curriculares, tem o promissor “Hearing Improvement with Customized Sound Stimulation“, supostamente publicado na American Academy of Audiology. O problema é que a academia nunca ouviu falar desse trabalho.

Aliás, somente a Eartronic e sua irmã Earlogic (digo irmã porque o currículo Kwak está no fileadmin da primeira, mostrando que ele é dono da segunda) parecem saber dessa publicação.

Do também excitante Ameliorative Effect of Customized Sound Stimulation on Sensorinerual Hearing Loss, só achei o abstract na Association for Research in Otolaryngology. As demais supostas publicações do currículo são mais específicas da prática de otologia do que da de magia negr, ops, “condicionamento sonoro antecipado”.

Aprofundando-me mais ainda naquele(a) obscuro(a) fosso(a) de desinformação que é o site da Biosom, encontro a seção “curiosidades“, onde acho o trecho a seguir:

“O software foi baseado no nosso equipamento que se chama REVE 134 (…)”

O que é esse REVE 134? O produto vendido pela Earlogic, criado por Kwak.

Aliás, as passagens “Um aparelho auditivo auxilia os deficientes auditivos amplificando os sons externos. Ele não tem a função de uma terapia fundamental para perda auditiva” da Biosom e “According to the current hearing loss management, hearing aids is used to help hearing-impaired people hear better by amplifying external sounds.It is not a fundamental therapy for hearing loss and does not cure the damaged auditory hair cell.” da Earlogic são bem, digamos assim, traduzidas.

Na parte de “Perguntas frequentes -> Dúvidas sobre os efeitos do Hearing Guardian V1 -> Há provas da eficácia do software?”, podemos ler e confirmar o que o locutor da propaganda diz, que:

“(…) estudos do Instituto Earlogic de Pesquisas da Coréia do Sul e do Grupo de Pesquisa Tecnológica Adaptive Neuromodulation GmbH (ANM) da Alemanha comprovaram que a utilização da tecnologia adequadamente pode recuperar em até 10dB a audição perdida no prazo de duas semanas, podendo assim diminuir sintomas decorrentes da perda auditiva, como zumbido e dores de cabeça.”

O produto Hearing Guardian V1, que também responde por REVE 134, foi desenvolvido pela Earlogic, aquela lá do Doutor Quack – ops, Kwak (hoje estou especialmente disléxico, que diabos!), mesma empresa (ou “Instituto”, como eles anunciam) que ^provou a eficácia^ do próprio produto em ^vários estudos^ nunca publicados.

O método descrito no ^estudo^ do site da Biosom usa um certo tom “a um nível mínimo audível” (o que nós, detentores de um diploma basicamente inútil, chamamos de “limiar de audição”). Bem diferente do som de liquidificador do estudo realmente publicado! O ^estudo^ com 17 voluntários (!) publicado no site é uma tradução do “The Effect of Sound Stimulation on Pure-tone Hearing Threshold” que o ClinicalTrials.gov diz não ter sido completado (última atualização em 7 de setembro de 2011) enquanto a Eartronic (irmã da Earlogic) publica uma versão atualizada dia 7 de janeiro de 2011 (PDF). Huuum…

E todos, todos os estudos, reais ou não, sempre dizem que o treinamento sonoro melhora a percepção de alguns tons ou ajuda a proteger contra lesões traumáticas. Nenhum deles cita zumbido/tinnitus ou restauração de audição perdida. Essas alegações só aparecem nas propagandas, subrepticiamente sempre conectada a “vários estudos” ou “teve sua eficácia comprovada” usando testes que nunca disseram coisas do tipo. E isso é propaganda enganosa, desonestidade intelectual e falência moral.

Não posso dizer que me decepcionei com o Nerdologia, visto que seu conteúdo continua sendo muito bom, além do programa ser bem produzido. O que posso afirmar é que o locutor do anúncio não pode dizer que o software teve sua eficácia comprovada. Especialmente tendo o público-alvo que tem. Mais ainda quando um deslize desses pode sujar a reputação de um cientista de verdade. Mais especificamente quando se trata de um amigo meu.

Agora durma com esse barulho.

———

[1] Segundo meu decibelímetro e minha fita métrica.

Dez livros que marcaram a minha vida

Com muito tempo livre e sem ter algo mais construtivo para fazer, Rafael e Ana me incluiram numa corrente de Facebook. Com ainda mais tempo livre e com menos algos construtivos a fazer, eu aceitei o convite indicação intimação praga elo (porque é uma corrente, sacou? Hã? HÃ!?). Seguem as instruções.

Consiste em fazer uma lista com os 10 livros (ficção ou não-ficção) que tenham me marcado. A ideia não é gastar muito tempo, nem pensar muito. Não precisam ser grandes obras, apenas que tenham sido importantes pra mim. Eu tenho que marcar 10 amigos que vão gostar da brincadeira. E eles me incluírem quando fizerem suas listas para que eu possa ver a lista deles e conferir boas dicas.

O parágrafo acima está em Comic Sans porque é um trecho copiado. Eu jamais começaria uma frase com “consiste em”. O “e eles me incluírem” também não é da minha safra. Mas se vocês passaram mais que dois minutos no Facebook ultimamente sabem do que se trata. Então vamos aos livros:

1) Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa – Aurélio Buarque de Hollanda Ferreira. Não somente para consulta. Eu o li de capa a capa e esse exercício em inutilidade foi bom para o desenvolvimento do meu pedantismo.

O primeiro Aurélio

Eu já lia Aurélio antes de virar Aurélio.

2) Bíblia Sagrada, Nova Versão Internacional – vários. Esta versão em especial é importante porque foi escrita por gente que sabe “tu” e “vós” saiu de voga há muito e que palavreado rebuscado é apenas uma forma de arrebanhar a massa ignorante que mal sabe escrever o nome direito, quanto mais conjugar verbos irregulares em segunda pessoa ou entender que está sendo ameaçado por um aproveitador da ingenuidade alheia. Também lida de capa a capa, me fez entender o sentido da palavra “hipocrisia” e descobrir que muito “religioso de verdade” jamais leu uma só linha do que tanto gosta de impor aos outros.

A seção de fantasia da minha biblioteca

A seção de fantasia da minha biblioteca.

3) Cândido – Voltaire. Me ensinou que otimista só se lasca. E que se você for bonzinho vai se lascar mais ainda.

4) Breve História de Quase Tudo – Bill Bryson. Num dia frio e solitário, numa biblioteca centenária de um país muito, muito distante, este livro reacendeu minha paixão por aprender – coisa que o Sistema Formal de Ensino (SiFodE) me havia estripado anos antes. O universo (ou natureza) é uma coisa massa. Ultramassa. Quem acha que não, ou nunca chegou a ser apresentado ao conceito, ou não gosta de pensar.

Nota-se que ele já foi bem amado. Tem muita informação já ultrapassada, mas continua sendo excelente.

Nota-se que ele já foi bem amado. Tem muita informação já ultrapassada, mas continua sendo excelente.

5) O Médico e O Monstro – Robert Louis Stevenson. Quando li este, ainda criança, notei como somos ruins em traduzir títulos. E quando digo “ruim”, uso no sentido de “aquele que gosta de fazer ruindade”, porque “Strange Case of Dr Jekyll and Mr Hyde” não chocaria ninguém.

6) Coleção Descobrir – Editora Globo. Competiu bravamente contra o já mencionado SiFodE pela dominação da área da curiosidade no meu cérebro[1]. Perdeu, no entanto. Mas ainda guardo boas lembranças (apesar das instruções para montar uma “armadilha para fantasmas” que vieram em um dos fascículos).

Stevenson, Conan Doyle e King. LeCarre apareceu de gaiato na foto.

Stevenson, Conan Doyle e King. LeCarre apareceu de gaiato na foto.

7) The Meaning of Liff – Douglas Adams. Mais um dicionário, desta vez escrito por Douglas Adams. Fui ameaçado de expulsão da biblioteca supracitada se não conseguisse controlar minhas convulsões gargalháticas. Sofri dores abdominais por uma semana por causa do livro.

8) Dicionário Filosófico – Voltaire novamente. Terceiro dicionário. Poderia roubar e incluir um quarto, o Dicionário do Diabo, de Ambrose Bierce, mas este é bem parecido com aquele, o Filosófico sendo melhor. Me ajudou a entender que sarcasmo, ironia, desconfiança e chacota são armas mais poderosas que dogmas ou ameaças termodinamicamente impossíveis na criação de caráter.

Foto tirada em frente à biblioteca anteriormente aludida

Foto tirada em frente à biblioteca anteriormente aludida.

9) O Cão dos Baskervilles – Arthur Conan Doyle. Olá, ceticismo. Tudo bem? Meu nome é Igor Santos, prazer conhecê-lo.

10) O Homem que Confundiu Sua Mulher com um Chapéu – Oliver Sacks. Ninguém é normal mas ninguém demonstra saber disso. Apenas alguns não conseguem esconder.

Oliver Sacks, mais um médico que sabe escrever.

Oliver Sacks, mais um médico que sabe escrever.

Quase entrou na lista: Uma Breve História do Tempo, de Hawking; Deus Não É Grande, de Hitchens; Deus, um Delirio, de Dawkins; uma coleção de contos de Lovecraft; Quatro Estações, de Stephen King; WWZ, de Max Brooks; A Vida na Terra, de Attenborough; um livro de Chico Anísio com o mais negro dos humores (Telefone Amarelo, talvez?), e a trilogia da distopia: 1984, Admirável Mundo Novo e Fahrenheit 451.

Melhores que a Escolinha do Professor Estereótipo.

Melhores que a Escolinha do Professor Estereótipo.


Ateus malditos! Por que precisam escrever tão bem?

Ateus malditos! Por que precisam escrever tão bem?

Só não entraram na lista porque não têm nome, autor ou editora: minhas apostilas de música.

Não entraram porque não são exatamente livros mas deveriam fazer parte da lista: Enciclopédia Koogan Larousse, blogs de ciência, meus livros de culinária, a revista Scientifc American (que, por incrível que pareça, foi minha porta de entrada no mundo dos podcasts), o roteiro do último episódio jamais produzido de Caverna do Dragão, a coleção de cromos do chocolate Surpresa, os rótulos das coisas, encartes de discos, uma enciclopédia/dicionário (mais um) da história da música (não encontro, devo ter perdido), a Constituição Federal, também lida na íntegra, e uma coleção da Reader’s Digest chamada Faça Você Mesmo.

Já lia DIY antes de virar sigla.

Já lia DIY antes de virar sigla.

Não entrou porque não lembro do nome: um de antropologia, que me fez perceber que somos todos macacos; um de histórias das religiões, que me fez perceber que somos todos macacos; um tratado filosófico, que me fez perceber que somos todos macacos metidos, e; um pdf de psicologia. Mas aí eu já sabia que somos todos macacos.

Alguns macacos são mais metidos a besta que outros.

Alguns macacos são mais metidos que outros.

Mas o livro que me marcou mais profundamente foi um de Lair Ribeiro que continha um CD que, fato desconhecido por mim, tende a explodir quando queimado.

Menção honrosa: A Divina Comédia. Primeiro livro que não consegui ler todo. Me ajudou a entender a bossalidade, especialmente daqueles que dizem tê-lo lido mas que sabem apenas da existência dos nove círculos do inferno, de Beatriz e Virgílio.

O "-pedia" em "Wikipedia".

O “-pedia” em “Wikipedia”.

Leiam também a lista da minha mulher e entendam porque me casei.

E a sua lista, como seria?

———

[1] Eu sei que isso não existe, mas o SiFodE quis me ensinar o contrário.

Alpiste cura diabetes!!! Só que não!!!!

Recebi de uma leitora preocupada uma apresentação de Power Point que alega que alpiste cura diabetes, pressão alta, artrite, gota, feiura, etc, etc.

Oi, Igor,

Estive a ver no seu site e Você sabe alguma coisa sobre esta história da alpista fazer bem aos diabetes? Estive a ver no seu site e não encontrei nada!

Abraços,

Patrícia Salgado

Minha regra geral é: se veio num arquivo .pps, provavelmente não é verdade. E tal possibilidade diminui progressivamente com a quantidade de cores e exclamações adicionadas.

Considerando que o primeiro quadro da apresentação lê “¡¡¡¡¡¡¡ALPISTE!!!!!!!!”, eu já eliminaria qualquer chance de credibilidade do texto. Mas vamos analisar de toda forma, eu me divirto com isso.

(Peço desculpas antecipadas por incluir ipsis literis o texto nojentamente escrito.)

Recentemente cientistas investigadores da Universidade Nacional Autônoma do México analisaram o grande poder alimentício do alpiste, devido aos grandes benefícios que acarreta às aves,

Óquêi. Para você, qual a primeira coisa que chama atenção aqui?

Para mim é a presença da palavra “aves”, que torna qualquer comparação com mamíferos, com uma diferença evolutiva de pelo menos 300 milhões de anos, totalmente irrelevante.

A segunda coisa é a presença do nome de uma universidade. Uma alegação testável!

Mexendo um pouco na página da dita cuja – unam.mx -, achei o seguinte:

Alpiste

Phalaris canariensis L.

Gramineae

(…)

Comentarios.

Planta introducida de la cual no se detectaron antecedentes de uso medicinal, ni estudios químicos o farmacológicos que corroboren su efectividad.

Ou, em bom português: “Planta introduzida (não-nativa) na qual não se detectou antecedentes de uso medicinal, nem estudos químicos ou farmacológicos que corroborem sua eficácia.”

Se você não é familiar com o “trombone triste”, clique neste link e ouça (são cinco segundos só).

Pois é. Na página da universidade citada logo no começo do spam é facilmente encontrado que não só não existem registros de uso medicinal tradicional como também não existem estudos que apoiem tal uso que não era feito. Que lindo.

Mas, mais sobre isso daqui a pouco. Continuando.

E depois de muitas experiências baseadas em método científico descobriram que o alpiste possui uma proteína incrívelmente poderosa, a qual tem seus aminoácidos estáveis o que induz a uma maior eficiência alimentícia no organismo.

Que proteína? Cadê o nome? Falou até em método científico mas não deu o nome da proteína?

Isoleucina, leucina, triptofano, lisina, metionina, fenilalanina, treonina e valina. Esses são os oito aminoácidos essenciais para a nossa vida. Não existe um mais eficiente que outro nem eles formam proteínas mais poderosas que outras. Por mais que palavrinhas safadas como (sic) “incrívelmente” estejam presentes no texto (como eu costumo dizer, quem acentua advérbios de modo não tem o mínimo de visão do futuro).

A parte que eu mais gosto do trecho acima é “maior eficiência alimentícia”. Visto que “alimentícia” significa “que serve para alimentar“, pode-se concluir que o autor do spam acha que nosso corpo é um restaurante. Que gracinha.

O alpiste é uma planta gramínea da família das poáceas, herbácea. É originária do Mediterrâneo, mas cultivada comercialmente em várias partes do mundo para usar a semente na alimentação de pássaros domésticos.

E daí? Como veremos mais adiante, alpiste seria uma panaceia (a cura de todos os males, agora sem acento!) e essas últimas informações acima de nada ajudam, nem como evidências nem como situador – pois se você não sabe o que é alpiste, saber de onde vem e a qual família pertence não vai ser de grande ajuda.

Palavrinhas safadas, novamente. Em nada ajudam e só servem para criar um ar de ^sabedoria^, incluindo no texto informações completamente inúteis porém com ar científico, chegado até a usar o termo “método científico” mais acima.

“Tirando leite do pau”, uma imagem irrelevante para o texto, em homenagem.

O alpiste é uma das sementes mais poderosas da Terra;

É o He-Man do mundo vegetal.

sua capacidade de recarga enzimática é imensa e seu conteúdo proteico é ainda maior. Um copo de leite enzimático de alpiste Tem mais proteína que dois ou três kilos de carne mas com aminoácidos estáveis, isto é, que viajam de uma maneira segura e indestrutível até o nosso organismo.

Bem, vamos ver a alegação acerca da proteína. Segundo uma medição neste link (em PDF) da PUC do Rio Grande do Sul, 100 gramas de “carne bovina magra, assada” contêm 30,4g de proteína total.

De acordo com a tabela nuticional (em PDF) da Comissão de Desenvolvimento de Alpiste de Saskatchewan (pois é, também me surpreendi), cem gramas de alpiste contam com 21,67g de proteína.

Usando uma recente descoberta da Universidade de Desde Sempre chamada “regra de três”, concluo que dois ou três quilos de carne equivaleriam a um copo de alpiste, desde que esse copo comportasse, respectivamente, pelo menos 2,8 e 4,2 quilos de alpiste puro, sem água. É MUITO ALPISTE!!!

Eu não sei o que o autor considera “recarga enzimática”, mas qualquer enzima que o alpiste contenha vai ser demolido com força pelo nosso ácido estomacal (mas sobre ácidos lá embaixo). Quanto ao trecho “aminoácidos estáveis, isto é, que viajam de uma maneira segura e indestrutível até o nosso organismo” eu só consigo pensar que ele está a cantar as virtudes da casca do alpiste, que não deixa o grão se desintegrar. Mas aquele “isto é” ali me deixa um pouco desconfortável, visto que aquela não é a definição de “aminoácido estável”.

Veja bem, os aminoácidos são naturalmente estáveis, sendo os ácidos alifáticos os mais estáveis de todos, incluindo dois (glicina e alanina) que produzimos naturalmente, sem a necessidade de comermos ração de passarinho.

Mais palavrinhas safadas.

As enzimas que o alpiste proporciona têm um imenso poder para desinflamar nossos órgãos, especialmente o fígado, os rins e o pâncreas, o que torna o alpiste um fabuloso regenerador pancreático, isto é, acaba com a diabete em poucas semanas,

Você entendeu o que essa frase aí quis dizer? Vou traduzir usando analogias automotivas para deixar mais claro: “a cor da gasolina tem um imenso poder para limpar os filtros do condicionador de ar, especialmente os que resfriam o para-brisas e o desembaçador do vidro traseiro, o que torna a cor marrom um fabuloso regenerador aéreo, ou seja, seus dentes vão ficar mais branco em uma semana”.

Ficou mais claro agora? O autor deu um pequeno salto de “viram que alpiste é bom para pássaros” usando o tradicional “eu não sei ler tabelas nutricionais” e chegou milagrosamente em “só não ganhei ainda o Nobel de Medicina porque sou muito modesto”.

Fora que “regenerador pancreático” me soa muito parecido com “capacitor de fluxo”. Mas aí é só implicância minha, porque eu só gosto de coisas que fazem sentido.

Ai, ai… Tem muito mais ainda.

elimina também a cirrose ao aumentar o controle de hepatócitos do fígado e de passagem, claro, o desinflama,

Sabe o que elimina cirrose? Transplante. Cirrose é, literalmente, uma cicatriz no fígado. O tecido do órgão é substituído por uma cicatriz, da mesma forma que acontece no queixo de menino que não sabe brincar. Se você já levou pontos alguma vez, sabe que essa marca jamais vai ser eliminada pelo aumento do controle do num-sei-o-que, seja lá o que isso signifique.

E inflamação no fígado não é cirrose, é hepatite. Sujeito aí faltou à primeira aula de fisiopatologia.

recarrega os rins de enzimas, favorecendo uma saudável diurese que elimina o excesso de líquidos no corpo,

Minha resposta:

“O crime é uma doença… tipo cirrose ou hepatite (não sei a diferença). Minhas balas de alpiste são a cura (quando eu recarrego os rins, que são as pistolas).”

por isso o alpiste é um lutador incansável contra a hipertensão…

Hein!? Como foi que chegou aí? Acho que a minha cópia veio com algumas páginas coladas.

é uma maravilha, por conter a enzima lipasa que elimina rapidamente a gordura do organismo, seja nas veias, nas artérias, ou simplesmente dos depósitos de gordura, por isto é um importante remédio contra a obesidade

Não, não contém.

Próxima!

e gera grandes e potentes resultados como promotor de corte e tonicidade muscular.

Mesmo que tivesse, não geraria. Como não tem, não gera dobrado.

E eu que não quero um negócio promovendo “corte muscular” em mim. Já me bastam as facas daqui de casa.

Indicado para hipercolesterinemia e prevenção da arteriosclerose;

Indicado por quem? Pelo pps? Porque pela Medicina não é.

diurético: útil em situações nas quais se requer um aumento da diurese, tais como infecções genito-urinárias (cistite),

Cistite é uma inflamação na bexiga (é também uma inflamação da bexiga, oxe). Não sei como é no autor, mas meus genitais ficam um pouco mais para fora.

E agora, com vocês, uma lista de doenças!

hiperazotemia (abundância de sustâncias nitrogenadas no sangue), hiperuricemia, gota, hipertensão arterial, edemas, sobrepeso acompanhado de retenção de líquidos, gastrite e ulcus (úlcera, sobretudo úlcera do estômago).

TA DA! [muitas palmas]

O que mais gosto da lista, além do fato da aparente falta de necessidade em listar coisas aleatórias e desconexas, é o uso da palavra ulcus, latim para úlcera.

É demulcente (emoliente, relaxa e abranda as partes inflamadas).

Mas é para cabelos secos ou oleosos?

Nas Canárias além de aperitivo é considerado um bom remédio para os males da urina, pedras, rins e bexiga, e refrescante para os calores.

Você não odeia quando sua urina adoece? E quantas vezes nós não saímos no meio da noite em busca de uma farmácia aberta para comprarmos remédios para pedras? Eu não gosto de ver pedras sofrerem, sempre achei de mal gosto o começo de Super-Homem IV, que mostra Lex Luthor quebrando pedras a marretadas.

Pelo menos é “refrescante para os calores”. Todos eles.

Também é utilizado externamente para eczemas.

Essa parte é interessante (não só pela imagem que acompanha, que pode facilmente ser um recorte de uma imagem pornográfica de uma desbarrigada sensualizando) porque fala de uso externo e, em seguida, ensina o modo de consumo – via oral.

Como consumi-lo: apenas deixar de molho cinco colheres de alpiste à noite e pela manhã eliminar a água em que ficou de molho, por as cinco colheres de alpiste embebido no liquidificador, enchê-lo com água pura e bater,

ENCHER O LIQUIDIFICADOR? Que receita fabulosa! Quanta atenção aos detalhes!

Naquela mesma página da universidade mexicana, onde tem dizendo que nunca se encontrou prova de eficácia, em um link que citei lá em cima, encontrei isso aqui:

Etnobotánica y antropología.

La presión alta, en el Distrito Federal, se trata entre otras muchas formas como sigue: se prepara un cocimiento con los frutos, se cuela y se toma como agua de tiempo sin endulzar, solamente por una semana.

Traduzindo: a forma tradicional de consumir alpiste é cozendo-o, coando-o e consumindo-o somente por uma semana. Para tratar pressão alta.

Uai!? E tem que tomar depois de cozinhar? Não era só deixar de molho? E cadê a diabetes? Cadê? Cadê diabetes?

E o que o autor do spam quer? Matar todos nós de super dosagem? Porque no único lugar onde ele cita o tempo do ^tratamento^ ele fala em “semanas”.

Bah. Tem mais.

o resultado será um leite bem espumoso de suave sabor que é basicamente uma injeção a favor da saúde máxima e da forma desejável do corpo, toma-se um copo grande em jejum e outro bem antes de dormir.

Quando eu escrevi esse outro texto, minha intenção era fazer uma paródia justamente de spams desse nível; textos escritos por alguém que mal sabe separar parágrafos, sem revisão e sem senso de ridículo (ou de responsabilidade, mas eu ainda prefiro aplicar a Navalha de Hanlon).

Uma injeção a favor da saúde máxima e da forma desejável do corpo. É tudo o que eu quero agora.

É claro que se você quiser tomá-la nas refeições ajuda muitíssimo, no entanto, nunca deve faltar em jejum pela manhã e antes de dormir.

Se ajuda muitíssimo, por que a recomendação inicial já não é “se entupa desse caldo amargo e seboso o dia inteiro” desde o começo? QUEM VOCÊ ESTÁ TENTANDO MATAR, SEU SPAMMEIRO SEM CORAÇÃO??

Nunca acrescente nem fruta nem açúcar, isto está proibido

Pausa para citar uma frase do único filósofo sério e único profeta real, Aleister Crowley: “fazes o que queres, pois tudo é da Lei”.

Continuando:

Nunca acrescente nem fruta nem açúcar, isto está proibido pois o açúcar refinado é um veneno que mata as enzimas e tudo que é bom dos alimentos, já que é muito ácido e nada vivo sobrevive na acidez do açúcar refinado.

Amigão, enzimas não são vivas, frutas não contêm açúcar refinado nem este é veneno, nem ácido.

A frase é tão filhadaputa que é até difícil contar quantas coisas estão erradas. Por exemplo, se frutas tivessem um veneno que mata “tudo que é bom dos alimentos”, por que então seria uma das coisas mais recomendadas por médicos e nutricionistas?

E dizer que açúcar refinado, que é 100% sucrose, não pode é o mesmo que dizer que sucrose não pode, não é?

Volte ali na tabela da associação saskatchewense e procure (terceira tabela do lado esquerdo) por “sucrose”. Já adianto: é quase 70% do total de açúcares no alpiste.

Quanto à acidez, é sabido que esta é medida pela quantidade de H+ ou OH- que uma solução apresenta.

Aquela palavra novamente: “solução”. Açúcar, até onde eu lembre, não é uma solução, portanto, não pode ser ácido (ou básico, ou qualquer outra coisa – é como tentar medir a temperatura de um som).

Até em soluções a glucose praticamente não doa nenhum íon (numa solução a 10%, menos de uma em cem mil moléculas perde um H) e, devido a isso, não altera o pH de coisa nenhuma.

De quando em vez, eu preparo um refrigerante de gengibre (que eu chamo “gengibrerante”) aqui em casa e um dos ingredientes principais é açúcar. Outro que não pode faltar é fermento biológico, cujos organismos são os responsáveis por peidar gás carbônico na minha bebida, numa prova viva de que açúcar não mata. Ou será que só mata o que não é vivo?

Falando em ácidos, o do estômago é bem forte, beirando o pH 1 (quanto menor o pH, mais ácida a solução). O “ácido” inexistente do açúcar “mata” as coisas boas do alpiste mas o real, inexorável e intransponível ácido clorídrico não?

Eu achei também em alguns lugares (não muito confiáveis, mas é sempre bom usar fogo contra fogo) que alpiste contém ácidos salicílico e oxálico. Mas não, esses ácidos são do bem, só o que mata é o ácido imaginário do açúcar.

Consumir leite de alpiste é uma injeção ou vacina bem forte contra a diabete e qualquer enfermidade gerada por níveis ácidos do corpo,

Esse sujeito (ou sujeita, para ser justo – algumas mulheres conseguem ser burras assim também) iguala “injeção” a “vacina”. Daí você tira o nível intelectual da pessoa. Confunde um método mecânico de inserção de material com remédio.

Outra coisa: diabetes não é “gerada por níveis ácidos do corpo”. Uma coisa que cure um precisaria de muito malabarismo fisiológico e farmacoquímico para curar outro.

portanto, é necessário consumir pelo menos dois ou três copos de leite de alpiste diários para assegurar uma figura delgada e um corpo bem sadio, que, claro, conduza a uma mente sã.

Quando for usar a locução “pelo menos”, tenha um valor mínimo bem definido. E se o mínimo forem três copos, diga logo no começo que são três e não “um em jejum e outro antes de dormir”, porque isso contabiliza dois. E se beber alpiste conduz a uma mente sã, acho que o autor está se abstendo do leitinho.

E você notou que tudo isso, toda essa enrolada e invenção, depois de tantas imagens, tantas cores, tantos remetentes bloqueados e tantas falsas promessas, eis que surge a intenção real do autor? Ele odeia gordos e acha que ser magro e ter a “figura delgada” é a única forma aceitável para um ser humano e a única maneira de ter “um corpo bem sadio” (não sabia que ser sadio vinha em graduações).

O nome disso é GORDISMO. Sabe quem mais odiava gordos? Hitler.

Mas que figura delgada! Você deve se entupir de alpiste, não é? Hitler ama você.

Mas ainda me pergunto, será que esse suco do alpiste também cura o câncer de esôfago que sua casca pode causar? SERÁ?

Não, não cura. Assim como também não cura diabetes nem cirrose nem nada alegado no spam. Deixe o alpiste para os passarinhos e vamos comemorar num churrasco.

Finalizo esta análise com o recado final do próprio spammeiro: Compartilhe.

P.S. Não resisti, precisava colocar esse gif.

Balas de alpiste recarregando seu mijo!

Outros spams destruídos:

Como reconhecer um spam;

Spam dos batons com chumbo;

Spam do camarão e da vitamina C;

Spam dos absorvente internos que causam câncer;

Spam do benzeno em condicionadores de ar de automóveis;

Spam da Doença de Chagas em feijão;

Spam sazonal da gripe suína;

A falsa cura do câncer desmentida mais rapidamente que eu já vi.

Algumas palavras de Asimov

Durante uma entrevista sobre os rumos da educação, Asimov foi perguntado sobre sua própria busca de conhecimento e se ele achava que os outros também tinham o mesmo ímpeto que ele.

Abaixo (intercalado com encorajamentos do entrevistador Bill Moyers, em itálico), transcrevo um trecho que acho bastante esclarecedor.

“Eu gostaria de pensar que as pessoas, se oferecida a chance de aprender os fatos e aumentar seu conhecimento do universo, não buscariam tão avidamente o misticismo.

“Eu me pergunto quantas pessoas escolhem essas coisas místicas e sem sentido simplesmente porque elas precisam escolher alguma coisa e aquilo é a única alternativa disponível.”

Por que o misticismo incomoda você?

“A mesma coisa que me incomoda no misticismo é o que me incomoda em vigaristas e falsários. Não me parece correto vender ações falsas para uma pessoa e obter dinheiro com isso. E é isso que os místicos fazem. Eles vendem conhecimento falso para as pessoas e ganham dinheiro com isso. Mesmo se alguém se sentir bem com esse tipo de conhecimento; eu consigo facilmente imaginar que uma pessoa que realmente acredita em astrologia sentirá uma sensação de segurança porque sabe que hoje é um dia ruim e, por isso, ficará em casa. Mas mesmo assim, um cara que comprou ações falsas pode olhar para elas bonitinhas e reluzentes, escritas num pergaminho com letras douradas e tudo mais, e desde que não precise usá-las ele se sente rico olhando para aquilo. Mas isso não é desculpa, o que ele tem ainda são ações falsas.

“E o que uma pessoa que compra misticismo tem ainda é conhecimento falso. E isso me incomoda.”

E qual é o conhecimento real?

“Nós não podemos ter absoluta certeza. A Ciência não anuncia verdades absolutas. Ciência é um mecanismo, uma forma de tentar melhorar seu conhecimento de natureza. É um sistema para testar suas idéias, comparando-as com o universo, e ver se elas estão certas. E isso funciona não só para os aspectos mais comuns da Ciência como para tudo da vida. Eu penso que as pessoas gostariam de saber que o que elas sabem é realmente como o universo é, ou ao menos o mais próximo possível disso.”

BÔNUS

Outro trecho da entrevista, anterior ao supracitado:

Aprender excita você?

“Sim! Eu acho que na verdade é o processo de expandir a si mesmo, de saber que agora existe mais um pedacinho do universo que é do seu conhecimento e sobre o qual você pode pensar e entender.

“Me parece que quando for hora de morrer – e isso vai acontecer a todos nós, haverá um certo prazer em pensar que você utilizou bem a sua vida, que você aprendeu o máximo que podia, adquiriu para si o máximo possível sobre o universo; e gostou.

“Existe apenas este universo e existe apenas esta vida para tentar entendê-lo. E, apesar de ser inconcebível que qualquer pessoa consiga entender mais do que a menor parte dele, você pode fazer pelo menos isso.

“Que tragédia deixar a vida passar e não aproveitar nada dela.”

Por que comemos coisas doces após as refeições?

Porque é gostoso.

Resenha – Por Que as Pessoas Acreditam em Coisas Estranhas

– Pode ser que seja uma mulher…

– Ora essa, e o que mais podia ser?

– Há mais coisas entre o céu e a terra… Se é uma mulher, por onde é que ela entra?

– Não sei.

– Pois é. Nem eu. Mas se for outra coisa… Ora, qual, para um prático homem de negócios no fim do século dezenove, essa espécie de conversa é um tanto ridícula.

Ele parou por aí, mas eu vi que o assunto o preocupava mais do que ele queria dar a parecer. A todas as velhas histórias de fantasmas de Thorpe Place, uma nova se estava acrescentando bem sob os nossos olhos.

No conto “A caixa de charão” (The Jappaned Box – 1899), dois personagens discutem acerca de uma voz feminina que surge sem explicação num quarto trancado onde ninguém é visto entrar ou sair.

Notem que a incredulidade expressa acima por um dos interlocutores é acompanhada de uma auto-recriminação, visto que “essa espécie de conversa é um tanto ridícula” já “no fim do século dezenove“. E por que pessoas práticas acreditam em coisas estranhas?

O conto citado acima foi escrito pelo criador do detetive que é (discutivelmente) o símbolo máximo do ceticismo, Sherlock Holmes. E mesmo assim, Arthur Conan Doyle, que tanto pregava a racionalidade em seus escritos, acreditava em fadas. Então, por que pessoas inteligentes acreditam em coisas estranhas?

Michael Shermer descreve casos, discute estudos, apresenta evidências e nos transporta para dentro da mente das pessoas que acreditam; tanto em coisas “comuns”, quanto em coisas “estranhas” (ou seja, todos nós).

Com uma bibliografia impressionante (quase vinte páginas só de referências), este livro, dividido em capítulos auto-contidos, é prazeroso e divertido de ler. Pelo menos para o verdadeiro cético, já que muitos conceitos e pré concepções são desafiados e demonstrados à luz da evidência científica, fazendo dele um volume bastante revelador em alguns pontos, que certamente são bem interessantes para os céticos de carteirinha (mas sinta-se à vontade para duvidar desta minha afirmação).

Eu notei alguns erros de tradução (como o uso de “desvio” em lugar do mais comum “viés” e o mais literal e confuso “sistema de endereçamento público” quando um simples “caixa de som” resolveria) e uma certa desatualização (como quanto ao consenso do início da vida na Terra), culpa da demora do lançamento nacional, quase dez anos depois da edição revisada e quase quinze depois do lançamento original.

Fora algumas besteiras que meu pedantismo não deixa passar, todo o livro se mantém fresco e revigorante.

Por que o fenômeno de “caça às bruxas” ocorre mesmo frente à impossibilidade das alegações? Como uma filosofia que prega o racionalismo e a individualidade absoluta se desvirtua e se transforma num movimento com aspectos de seita (onde discutem-se até se homicídio é justificável em casos de desrespeito ao líder)? Por que pessoas inteligentes defendem, com todos os seus recursos, ideias absurdas e apoiam a negação pura e simplesmente insustentável de fatos científicos e históricos, como a evolução e o holocausto nazista?

Algumas das pistas que Shermer nos dá para respondermos a essas (e outras) perguntas tão difíceis são: gratificação imediata; simplicidade, e; moralidade e sentido. Ou seja, algumas vezes, crer em absurdos é mais reconfortante, mais fácil e ainda transfere a responsabilidade para algo maior.

Teorias conspiratórias, seitas, religiosismo (e até livros de auto-ajuda) podem ser criaturas de simples falhas de pensamento crítico (como seria o caso das fadas de Conan Doyle, que não escapa de ser mencionado no último capítulo).

Dedicado a Carl Sagan, com prefácio de Stephen Jay Gould e com inúmeras referências a Martin Gardner, “Por Que as Pessoas Acreditam em Coisas Estranhas” tem um público certo que, sem dúvida, vai se identificar com as palavras do editor da revista Skeptic, Michael Shermer (e de Pope, Hume, Eddington, Malinowski, Randi, Pinker e outros tantos citados).

Excelente livro que irá residir ao lado do meu Mundo Assombrado Pelo Demônios (assim que a reforma aqui em casa acabar) por sua capacidade em ser, ao mesmo tempo, tanto uma leitura introdutória quanto de aprofundamento. Se você se interessa pela maquinaria do pensamento humano e gosta de ter seu próprio status quo interno desafiado, eu o recomendo fortemente.

Agora, vamos para o sorteio

Kentaro, editor do Ceticismo Aberto, está sorteando um volume entre todos que responderem à pergunta abaixo:

Participem. E, para a maioria que não ganhar, o livro pode ser adquirido diretamente pela página da editora.

“Bebida amarga torna as pessoas mais críticas, mostra estudo” <= Não, não mostra.

Numa “matéria” (aspas irônicas) sobre um “estudo” (elas aqui novamente), a Folha.com dá uma aula de como jornalismo é feito atualmente: ctrl+c -> Google Translate -> ctrl+v.

Sem sequer a menor das críticas, o tradutor da Folha fez exatamente o que sua função exige, que é traduzir coisas. Pronto.

Com a diferença de que não se deu ao trabalho de incluir nem o nome do chefe do trabalho (Kendall Eskine) nem o nome da universidade que produziu tal primor de pesquisa (visto que “City University of New York” não é o mesmo que “Universidade da Cidade de Nova York”, a não ser que o jornal também traduza Cambridge e Oxford como “as universidades da Ponte de Came e Vau do Boi“).

A matéria foi capa do caderno Ciência e, como tal, deveria ter sido tratado com pelo menos uma nesguinha de ceticismo. Mas não, é bem mais fácil traduzir o que a New Scientist (adeus, qualidade) diz e deixar por isso mesmo.
Capa do caderno de ciência da Folha.com

A primeira linha já reforça o título, com: “O gosto amargo de uma bebida pode alterar o julgamento moral, fazendo com que as pessoas se tornem mais críticas.

É? E quem disse?

Aí vem a primeira bomba: “Esse é o resultado de uma pesquisa realizada com 57 voluntários (…)”

Cinquenta e sete voluntários? Que amostra imensa!

AAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHH!

Já pode morrer?

Minha frase favorita do artigo: “(…) o grupo teve que analisar cenas como a de um homem comendo um cachorro morto (…)”. <= WTF!?

Mas não, não era necrozoofilia. Era apenas um lanche mesmo.

Só não sei se isso melhora ou piora o ocorrido.

A tradução continua peba e a necessidade de destruição não se mostra instantânea, até que chegamos no “curioso” dado que “surgiu” e que “mostrou que os partidários conservadores são mais afetados pelo gosto amargo, e consequentemente suas críticas, do que os liberais.

É. Foi. Porque conservadores são naturalmente menos críticos que os liberais, não é?

NÃO! NÃO É!

E morrer agora, já pode?

Confundir causa e efeito é coisa de auto-hemoterapeuta. Esse tipo de falácia não deveria ter vez numa publicação que se propõe a divulgar Ciências.

Agora, meus amigos (porque em momentos de desespero, todos se tornam amigos), preparem-se para a maior conjectura já presumida numa matéria (notem a presença das Aspas Triplas do Repúdio) “””científica“””: “Embora o mecanismo entre paladar e comportamento não seja totalmente claro (…)”.

Não seja totalmente claro? Não seja totalmente claro?? E essa ████ existe??

Acho mais produtivo primeiro demonstrar que o mecanismo existe antes de insinuar a suposição de que já é um fenômeno bem estabelecido. É como dizer “embora o mecanismo entre florais de Bach e peidos de unicórnios não seja totalmente claro…”

Mas calma, ainda tem um restinho pegajoso no fundo desse copo marrom de Danone azedo das trevas. Vamos raspar com a colher (sic, sic, mil vezes sic).

[O]s pesquisadores da Universidade da Cidade de Nova York (EUA) que desenvolveram o estudo se perguntam se um júri deveria evitar o consumo de líquidos amargos antes de um julgamento ou se a preferência de determinados alimentos influenciam nos ideias políticos dos indivíduos.

Não tenho resquício homeopático de dúvida de que pesquisadores desse calibre realmente se perguntem coisas desse tipo.

Me lembra Homer Simpson, em referência a donuts, se perguntando se há algo que elas não consigam fazer.

Folha, por favor, melhore.

A veia da minha testa agradece.
veia da testa

Heurística em uma simples lição

A grosso modo, dá-se o nome “heurística” ao processo de busca da verdade por intuição ou experiência.

Simplificando ainda mais: heurística é um “atalho mental” que nós usamos para chegar rapidamente a uma conclusão de maneira que esta esteja o mais perto possível da “verdade”, porém nem sempre com êxito.

Um exemplo interessante, vindo da Universidade da Pensilvânia, nos diz que temos uma tendência a estimar o peso das pessoas de acordo com suas larguras, independente da altura dos indivíduos. Via de regra, o mais gordo é o mais pesado (esse é o atalho mental), no entanto, um baixinho gordinho pode pesar bem menos que um gigante esbelto, apesar disso (em acordo com a nossa experiência) ser mais raro.

Mas esse mesmo erro de conceito (e uma certa incapacidade de adicionar muitas coisas ao mesmo tempo) nos faz achar que várias pequenas porções de um alimento fornecem menos calorias que uma só porção grande, mesmo quando o pedaço maior é, de fato, menor que a soma dos pedaços menores (em outras palavras, achamos que um bife de 300g tem mais calorias que um bife de 500g cortado em vinte pedacinhos porque somos ruins de conta), o que nos faz comer, sem culpa, um pacote de 200g inteiro de Fandangos Eco enquanto torcemos nosso nariz dietético para uma batata assada de 150g.

Heurística nos faz chegar a conclusões que estão mais ou menos certas no menor tempo possível. Evolutivamente isso faz sentido, já que não é tão vantajoso ficar muito tempo ponderando se aquilo é mesmo um tigre dente-de-sabre.

Dessa maneira, podemos ver as fotos a seguir e dar valores diferentes ao que é, basicamente, a mesma coisa. Notem:

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bebe fofinho com chapéu de pele

A reação comum à foto acima é: “Ooommmm, que fofinho, o bebezinho com um chapéu de pele”.

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garota fofinha com chapéu de furão

Temos aqui uma reação parecida, mas o conjunto já não é tão fofo assim porque o bicho ainda está vivo e, potencialmente, pode machucar a garotinha. Existe uma reserva maior, caracterizada por um “om” menor e menos efusivo e por pausas de tensão entre as frases: “Oomm, que linda… fazendo o furão de chapéu…”

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sujeito bizarro com chapéu de pele

Aqui, novamente, exatamente a mesma coisa, porém agora se trata de um adulto. Já sem expressões de fofura, lemos a foto como: “Hum…” e evitamos contato visual enquanto atravessamos para o outro lado da rua.

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velhote bizarro com chapéu de raposa

Mesmíssima situação, mas agora evitamos contato visual com a raposa morta e temos um: “Credo, que velho macabro!”

A próxima foto pode ser bastante perturbadora para alguns. Por favor, exerçam discrição ao contemplá-la.

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Continue lendo…

Chau. Vou passear no lado negro e não sei se volto.

Eis que estava eu a pensar se ainda valia a pena permanecer por aqui quando tive uma burrifania que me fez resolver descer do púlpito erigido sobre a plataforma elevada acima da passagem de nível onde repousa o pódio sobre o qual se encontra a base do meu pedestal de marfim e ouro e pensar mais a respeito dos motivos alheios para coisas além da minha compreensão.

Foi então que senti o gostinho do lado negro.

Percebam:

Gêmeos univitelinos são geneticamente idênticos; dois organismos derivados de um mesmo encontro gamético fruto do amor entre duas pessoas. Ou estupro.

Por que então cada uma dessas pessoas tem uma personalidade diferente? Do par, um é geralmente mais calmo e passivo enquanto o outro é mais agitado e controlador.

Desde a concepção, tudo no desenvolvimento dessas duas pessoas é exatamente igual.

Exceto duas coisas: posicionamento intrauterino e o momento do nascimento.

Considerando que nosso primeiro lar é o ventre de nossas mães (cada um na sua, senão dá confusão) e que este, do nosso ponto de vista fetal, é imóvel, podemos estender a metáfora e tratar o berço primário da nossa criação como uma casa, pois apesar desta também estar em constante movimento relativo a milhões de outras coisas no Universo, está absolutamente impávida em relação ao que realmente nos importa: nosso CEP.

Uma das inúmeras “tradições milenares” (há controvérsias aqui quanto à longevidade da técnica adiante nominada) que conseguiu sobreviver às pressões seletivas socio-temporais foi o Feng Shui, que nos ensina que devemos tratar nossa habitação como a caverna de um dragão, e que para finalmente conseguirmos viver confortavelmente devemos pensar em como o supracitado mítico réptil alado se sentiria ao passear distraidamente por nossos quartos e banheiros.

A organização estética dos aposentos agradaria, segundo tal filosofia, não só aos olhos como também à alma, nos fazendo viver melhor.

Um irmão que tenha passado a maior parte do seu citomerismo embrionário num nódulo indetectável de energias domiciliarmente negativas gerado pela proximidade maior do fígado (o órgão filtrador de tudo que há de ruim no corpo da progenitora, quem sabe até incluindo as tais “energias” de efeito cumulativo e não-metabolizável) vai crescer psiquicamente mais retraído e tímido, com medo do mundo onde foi gerado.

A não ser que seja mais descontraído e relaxado, num corajoso gesto de desafio contra seu desenvolvimento oprimido.

Bom, de toda forma essa disposição relativa não é algo testável ou previsível. Mas existe, não existe?
E essa existência não é tautológica e ontologicamente prova de sua própria existência? Eu me pergunto…

Agora, deixando as coordenadas histéricas de lado, vamos ao parto:

Por mais que o intervalo de tempo entre o nascimento de um e de outro dos gêmeos seja pequeno, jamais será igual a zero. O exponencial avanço tecnológico dos nossos aparelhos de mensuração temporal prova isso com mais e mais precisão a cada dia (ou attossegundo).

Logo, isso abre caminho para uma hipótese (ou teoria, como queiram, pois a prostituição do vocabulário pelos cafetões ideológicos não conhece limites) que responsabilize o horário do acontecimento natalício como definidor do caráter pessoal.

E qual melhor marcador de tempo que o homem pré-medieval conhecia senão os astros?

Daí, um pequeno salto intelectual torna perfeitamente cromulente e aceitável a suposição da criação de uma relação causal entre a posição de pontos de luz na abóboda celeste e os maneirismos de um indivíduo qualquer em situações sociais. A Astrologia deve estar certa, eu concluo.

Isto é, desde que a facção escolhida seja a adequada.

Por que não? É tão bom quanto qualquer outro sistema, haja visto que não sabemos ainda o que define “personalidade”.

Por que não, então, usar o momento em que nascemos como padrão?

Para aceitar esse ato de fé nem precisamos definir “nascimento” também, especialmente considerando o quão complicado isso seria. Qual parte da criança precisa transpor o umbral materno para que ela possa ser considerada nascida de fato?

Vamos manter a impossibilidade de atos simultâneos para corpos diferentes enquanto consideramos dogmaticamente um recém-nascido como um ponto adimensional. Acreditar é bem mais fácil.

E já que estamos nessa, vamos abraçar também tudo que eu venho combatendo há tanto tempo.
(Tempo esse que foi completamente estruído, deixo aqui registrado.)

Como explicar inteligentemente o efeito placebo que ocorre não só em humanos adultos como também em bebês e cavalos sem poder cognitivo de enganarem a si mesmos? Por que não chamar isso de “homeopatia”?

Talvez os praticantes de Reiki não gostem muito, contudo poderíamos usar também “alinhamento de energias”, “manipulação de meridianos”, “efeitos quânticos macroscópicos” dentre várias outras denominações, pois foi justamente para isso que Deus inventou a classe gramatical dos sinônimos. Vamos todos dar as mãos e usá-los.

Quem sabe esse toque não seja também terapêutico e milagroso?

É tão mais fácil assim. Aceitar. Simplesmente aceitar.

Explicações são tão demoradas e complexas. Fé é sempre o melhor caminho.

Ou pelo menos o de menor resistência para nossos elétrons mentais. Uma espécie de “aterramento intelectual”.

Qual razão teríamos para complicar o mundo quando ele tem dado certo até agora?

Por mais argumentum a posteriori que tenham sido os últimos dez mil anos, o fato irrefutável de nós estarmos aqui, eu escrevendo e você lendo, prova que o mundo funciona.

Método científico? Pensamento crítico? Racionalidade? Ceticismo? Às favas com todos eles.

Se Ugh, nosso ancestral testudo, tivesse parado para raciocinar, medir e tentar entender o comportamento do felino dentuço que o perseguia à toda velocidade, não estaríamos aqui, repassando à frente, para a próxima geração, nossos medos originais de fábrica e já pré-instalados nem forçando as pobrezinhas das nossas crianças a tomar decisões que afetarão suas vidas enquanto eles não têm capacidade sequer de entender o que significa “futuro”.

É impossível ensinar alguém a pensar.

Aliás, até agora tem sido impossível entender como alguém pensa, já que ainda não inventaram um medidor de ideias.

Então, se pode existir um pensamento inexplicável em mentes separadas, como provar que telepatia também não existe e que é apenas um pensamento compartilhado pelo Sub-Etha através de um processo sensormático?

Quem me garante com 100% de certeza que Medicina e Farmacologia funcionam e que Biologia, Física e Química estão 100% corretas o tempo todo?

Homeopatas, padres, acupunturistas, rabdomantes, hippies, vendedores de cristais e água ozonizada, terapeutas do esparadrapo, cartomantes, videntes, usuários de Mac, veganos, cromoterapeutas e demais crentes têm absoluta confiança em seus tratamentos/estilos de vida e me garantem sem qualquer margem de erro que estão completa e irremediavelmente corretos em suas asserções e escolhas de seus objetos de adoração venerável.

Qual dos dois parece mais tentador? A incerteza hesitante ou a certeza categórica?

Devo admitir; depois que os olhos se adaptam ao obscurantismo e o nariz se acostuma com o cheiro da decadência, o lado negro não parece tão ruim.

Até a volta.

Se houver uma.

P.S. Todavia, como ainda não tenho um tumor intratável no meu lobo parietal nem sofri lobotomia frontal total, sei que Autohemoterapia não funciona.

Nem no Mundo Mágico da Loucura Absoluta a AHT funcionaria.

Limites existem até para os delírios mais insanos.

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