Alpiste cura diabetes!!! Só que não!!!!

Recebi de uma leitora preocupada uma apresentação de Power Point que alega que alpiste cura diabetes, pressão alta, artrite, gota, feiura, etc, etc.

Oi, Igor,

Estive a ver no seu site e Você sabe alguma coisa sobre esta história da alpista fazer bem aos diabetes? Estive a ver no seu site e não encontrei nada!

Abraços,

Patrícia Salgado

Minha regra geral é: se veio num arquivo .pps, provavelmente não é verdade. E tal possibilidade diminui progressivamente com a quantidade de cores e exclamações adicionadas.

Considerando que o primeiro quadro da apresentação lê “¡¡¡¡¡¡¡ALPISTE!!!!!!!!”, eu já eliminaria qualquer chance de credibilidade do texto. Mas vamos analisar de toda forma, eu me divirto com isso.

(Peço desculpas antecipadas por incluir ipsis literis o texto nojentamente escrito.)

Recentemente cientistas investigadores da Universidade Nacional Autônoma do México analisaram o grande poder alimentício do alpiste, devido aos grandes benefícios que acarreta às aves,

Óquêi. Para você, qual a primeira coisa que chama atenção aqui?

Para mim é a presença da palavra “aves”, que torna qualquer comparação com mamíferos, com uma diferença evolutiva de pelo menos 300 milhões de anos, totalmente irrelevante.

A segunda coisa é a presença do nome de uma universidade. Uma alegação testável!

Mexendo um pouco na página da dita cuja – unam.mx -, achei o seguinte:

Alpiste

Phalaris canariensis L.

Gramineae

(…)

Comentarios.

Planta introducida de la cual no se detectaron antecedentes de uso medicinal, ni estudios químicos o farmacológicos que corroboren su efectividad.

Ou, em bom português: “Planta introduzida (não-nativa) na qual não se detectou antecedentes de uso medicinal, nem estudos químicos ou farmacológicos que corroborem sua eficácia.”

Se você não é familiar com o “trombone triste”, clique neste link e ouça (são cinco segundos só).

Pois é. Na página da universidade citada logo no começo do spam é facilmente encontrado que não só não existem registros de uso medicinal tradicional como também não existem estudos que apoiem tal uso que não era feito. Que lindo.

Mas, mais sobre isso daqui a pouco. Continuando.

E depois de muitas experiências baseadas em método científico descobriram que o alpiste possui uma proteína incrívelmente poderosa, a qual tem seus aminoácidos estáveis o que induz a uma maior eficiência alimentícia no organismo.

Que proteína? Cadê o nome? Falou até em método científico mas não deu o nome da proteína?

Isoleucina, leucina, triptofano, lisina, metionina, fenilalanina, treonina e valina. Esses são os oito aminoácidos essenciais para a nossa vida. Não existe um mais eficiente que outro nem eles formam proteínas mais poderosas que outras. Por mais que palavrinhas safadas como (sic) “incrívelmente” estejam presentes no texto (como eu costumo dizer, quem acentua advérbios de modo não tem o mínimo de visão do futuro).

A parte que eu mais gosto do trecho acima é “maior eficiência alimentícia”. Visto que “alimentícia” significa “que serve para alimentar“, pode-se concluir que o autor do spam acha que nosso corpo é um restaurante. Que gracinha.

O alpiste é uma planta gramínea da família das poáceas, herbácea. É originária do Mediterrâneo, mas cultivada comercialmente em várias partes do mundo para usar a semente na alimentação de pássaros domésticos.

E daí? Como veremos mais adiante, alpiste seria uma panaceia (a cura de todos os males, agora sem acento!) e essas últimas informações acima de nada ajudam, nem como evidências nem como situador – pois se você não sabe o que é alpiste, saber de onde vem e a qual família pertence não vai ser de grande ajuda.

Palavrinhas safadas, novamente. Em nada ajudam e só servem para criar um ar de ^sabedoria^, incluindo no texto informações completamente inúteis porém com ar científico, chegado até a usar o termo “método científico” mais acima.

“Tirando leite do pau”, uma imagem irrelevante para o texto, em homenagem.

O alpiste é uma das sementes mais poderosas da Terra;

É o He-Man do mundo vegetal.

sua capacidade de recarga enzimática é imensa e seu conteúdo proteico é ainda maior. Um copo de leite enzimático de alpiste Tem mais proteína que dois ou três kilos de carne mas com aminoácidos estáveis, isto é, que viajam de uma maneira segura e indestrutível até o nosso organismo.

Bem, vamos ver a alegação acerca da proteína. Segundo uma medição neste link (em PDF) da PUC do Rio Grande do Sul, 100 gramas de “carne bovina magra, assada” contêm 30,4g de proteína total.

De acordo com a tabela nuticional (em PDF) da Comissão de Desenvolvimento de Alpiste de Saskatchewan (pois é, também me surpreendi), cem gramas de alpiste contam com 21,67g de proteína.

Usando uma recente descoberta da Universidade de Desde Sempre chamada “regra de três”, concluo que dois ou três quilos de carne equivaleriam a um copo de alpiste, desde que esse copo comportasse, respectivamente, pelo menos 2,8 e 4,2 quilos de alpiste puro, sem água. É MUITO ALPISTE!!!

Eu não sei o que o autor considera “recarga enzimática”, mas qualquer enzima que o alpiste contenha vai ser demolido com força pelo nosso ácido estomacal (mas sobre ácidos lá embaixo). Quanto ao trecho “aminoácidos estáveis, isto é, que viajam de uma maneira segura e indestrutível até o nosso organismo” eu só consigo pensar que ele está a cantar as virtudes da casca do alpiste, que não deixa o grão se desintegrar. Mas aquele “isto é” ali me deixa um pouco desconfortável, visto que aquela não é a definição de “aminoácido estável”.

Veja bem, os aminoácidos são naturalmente estáveis, sendo os ácidos alifáticos os mais estáveis de todos, incluindo dois (glicina e alanina) que produzimos naturalmente, sem a necessidade de comermos ração de passarinho.

Mais palavrinhas safadas.

As enzimas que o alpiste proporciona têm um imenso poder para desinflamar nossos órgãos, especialmente o fígado, os rins e o pâncreas, o que torna o alpiste um fabuloso regenerador pancreático, isto é, acaba com a diabete em poucas semanas,

Você entendeu o que essa frase aí quis dizer? Vou traduzir usando analogias automotivas para deixar mais claro: “a cor da gasolina tem um imenso poder para limpar os filtros do condicionador de ar, especialmente os que resfriam o para-brisas e o desembaçador do vidro traseiro, o que torna a cor marrom um fabuloso regenerador aéreo, ou seja, seus dentes vão ficar mais branco em uma semana”.

Ficou mais claro agora? O autor deu um pequeno salto de “viram que alpiste é bom para pássaros” usando o tradicional “eu não sei ler tabelas nutricionais” e chegou milagrosamente em “só não ganhei ainda o Nobel de Medicina porque sou muito modesto”.

Fora que “regenerador pancreático” me soa muito parecido com “capacitor de fluxo”. Mas aí é só implicância minha, porque eu só gosto de coisas que fazem sentido.

Ai, ai… Tem muito mais ainda.

elimina também a cirrose ao aumentar o controle de hepatócitos do fígado e de passagem, claro, o desinflama,

Sabe o que elimina cirrose? Transplante. Cirrose é, literalmente, uma cicatriz no fígado. O tecido do órgão é substituído por uma cicatriz, da mesma forma que acontece no queixo de menino que não sabe brincar. Se você já levou pontos alguma vez, sabe que essa marca jamais vai ser eliminada pelo aumento do controle do num-sei-o-que, seja lá o que isso signifique.

E inflamação no fígado não é cirrose, é hepatite. Sujeito aí faltou à primeira aula de fisiopatologia.

recarrega os rins de enzimas, favorecendo uma saudável diurese que elimina o excesso de líquidos no corpo,

Minha resposta:

“O crime é uma doença… tipo cirrose ou hepatite (não sei a diferença). Minhas balas de alpiste são a cura (quando eu recarrego os rins, que são as pistolas).”

por isso o alpiste é um lutador incansável contra a hipertensão…

Hein!? Como foi que chegou aí? Acho que a minha cópia veio com algumas páginas coladas.

é uma maravilha, por conter a enzima lipasa que elimina rapidamente a gordura do organismo, seja nas veias, nas artérias, ou simplesmente dos depósitos de gordura, por isto é um importante remédio contra a obesidade

Não, não contém.

Próxima!

e gera grandes e potentes resultados como promotor de corte e tonicidade muscular.

Mesmo que tivesse, não geraria. Como não tem, não gera dobrado.

E eu que não quero um negócio promovendo “corte muscular” em mim. Já me bastam as facas daqui de casa.

Indicado para hipercolesterinemia e prevenção da arteriosclerose;

Indicado por quem? Pelo pps? Porque pela Medicina não é.

diurético: útil em situações nas quais se requer um aumento da diurese, tais como infecções genito-urinárias (cistite),

Cistite é uma inflamação na bexiga (é também uma inflamação da bexiga, oxe). Não sei como é no autor, mas meus genitais ficam um pouco mais para fora.

E agora, com vocês, uma lista de doenças!

hiperazotemia (abundância de sustâncias nitrogenadas no sangue), hiperuricemia, gota, hipertensão arterial, edemas, sobrepeso acompanhado de retenção de líquidos, gastrite e ulcus (úlcera, sobretudo úlcera do estômago).

TA DA! [muitas palmas]

O que mais gosto da lista, além do fato da aparente falta de necessidade em listar coisas aleatórias e desconexas, é o uso da palavra ulcus, latim para úlcera.

É demulcente (emoliente, relaxa e abranda as partes inflamadas).

Mas é para cabelos secos ou oleosos?

Nas Canárias além de aperitivo é considerado um bom remédio para os males da urina, pedras, rins e bexiga, e refrescante para os calores.

Você não odeia quando sua urina adoece? E quantas vezes nós não saímos no meio da noite em busca de uma farmácia aberta para comprarmos remédios para pedras? Eu não gosto de ver pedras sofrerem, sempre achei de mal gosto o começo de Super-Homem IV, que mostra Lex Luthor quebrando pedras a marretadas.

Pelo menos é “refrescante para os calores”. Todos eles.

Também é utilizado externamente para eczemas.

Essa parte é interessante (não só pela imagem que acompanha, que pode facilmente ser um recorte de uma imagem pornográfica de uma desbarrigada sensualizando) porque fala de uso externo e, em seguida, ensina o modo de consumo – via oral.

Como consumi-lo: apenas deixar de molho cinco colheres de alpiste à noite e pela manhã eliminar a água em que ficou de molho, por as cinco colheres de alpiste embebido no liquidificador, enchê-lo com água pura e bater,

ENCHER O LIQUIDIFICADOR? Que receita fabulosa! Quanta atenção aos detalhes!

Naquela mesma página da universidade mexicana, onde tem dizendo que nunca se encontrou prova de eficácia, em um link que citei lá em cima, encontrei isso aqui:

Etnobotánica y antropología.

La presión alta, en el Distrito Federal, se trata entre otras muchas formas como sigue: se prepara un cocimiento con los frutos, se cuela y se toma como agua de tiempo sin endulzar, solamente por una semana.

Traduzindo: a forma tradicional de consumir alpiste é cozendo-o, coando-o e consumindo-o somente por uma semana. Para tratar pressão alta.

Uai!? E tem que tomar depois de cozinhar? Não era só deixar de molho? E cadê a diabetes? Cadê? Cadê diabetes?

E o que o autor do spam quer? Matar todos nós de super dosagem? Porque no único lugar onde ele cita o tempo do ^tratamento^ ele fala em “semanas”.

Bah. Tem mais.

o resultado será um leite bem espumoso de suave sabor que é basicamente uma injeção a favor da saúde máxima e da forma desejável do corpo, toma-se um copo grande em jejum e outro bem antes de dormir.

Quando eu escrevi esse outro texto, minha intenção era fazer uma paródia justamente de spams desse nível; textos escritos por alguém que mal sabe separar parágrafos, sem revisão e sem senso de ridículo (ou de responsabilidade, mas eu ainda prefiro aplicar a Navalha de Hanlon).

Uma injeção a favor da saúde máxima e da forma desejável do corpo. É tudo o que eu quero agora.

É claro que se você quiser tomá-la nas refeições ajuda muitíssimo, no entanto, nunca deve faltar em jejum pela manhã e antes de dormir.

Se ajuda muitíssimo, por que a recomendação inicial já não é “se entupa desse caldo amargo e seboso o dia inteiro” desde o começo? QUEM VOCÊ ESTÁ TENTANDO MATAR, SEU SPAMMEIRO SEM CORAÇÃO??

Nunca acrescente nem fruta nem açúcar, isto está proibido

Pausa para citar uma frase do único filósofo sério e único profeta real, Aleister Crowley: “fazes o que queres, pois tudo é da Lei”.

Continuando:

Nunca acrescente nem fruta nem açúcar, isto está proibido pois o açúcar refinado é um veneno que mata as enzimas e tudo que é bom dos alimentos, já que é muito ácido e nada vivo sobrevive na acidez do açúcar refinado.

Amigão, enzimas não são vivas, frutas não contêm açúcar refinado nem este é veneno, nem ácido.

A frase é tão filhadaputa que é até difícil contar quantas coisas estão erradas. Por exemplo, se frutas tivessem um veneno que mata “tudo que é bom dos alimentos”, por que então seria uma das coisas mais recomendadas por médicos e nutricionistas?

E dizer que açúcar refinado, que é 100% sucrose, não pode é o mesmo que dizer que sucrose não pode, não é?

Volte ali na tabela da associação saskatchewense e procure (terceira tabela do lado esquerdo) por “sucrose”. Já adianto: é quase 70% do total de açúcares no alpiste.

Quanto à acidez, é sabido que esta é medida pela quantidade de H+ ou OH- que uma solução apresenta.

Aquela palavra novamente: “solução”. Açúcar, até onde eu lembre, não é uma solução, portanto, não pode ser ácido (ou básico, ou qualquer outra coisa – é como tentar medir a temperatura de um som).

Até em soluções a glucose praticamente não doa nenhum íon (numa solução a 10%, menos de uma em cem mil moléculas perde um H) e, devido a isso, não altera o pH de coisa nenhuma.

De quando em vez, eu preparo um refrigerante de gengibre (que eu chamo “gengibrerante”) aqui em casa e um dos ingredientes principais é açúcar. Outro que não pode faltar é fermento biológico, cujos organismos são os responsáveis por peidar gás carbônico na minha bebida, numa prova viva de que açúcar não mata. Ou será que só mata o que não é vivo?

Falando em ácidos, o do estômago é bem forte, beirando o pH 1 (quanto menor o pH, mais ácida a solução). O “ácido” inexistente do açúcar “mata” as coisas boas do alpiste mas o real, inexorável e intransponível ácido clorídrico não?

Eu achei também em alguns lugares (não muito confiáveis, mas é sempre bom usar fogo contra fogo) que alpiste contém ácidos salicílico e oxálico. Mas não, esses ácidos são do bem, só o que mata é o ácido imaginário do açúcar.

Consumir leite de alpiste é uma injeção ou vacina bem forte contra a diabete e qualquer enfermidade gerada por níveis ácidos do corpo,

Esse sujeito (ou sujeita, para ser justo – algumas mulheres conseguem ser burras assim também) iguala “injeção” a “vacina”. Daí você tira o nível intelectual da pessoa. Confunde um método mecânico de inserção de material com remédio.

Outra coisa: diabetes não é “gerada por níveis ácidos do corpo”. Uma coisa que cure um precisaria de muito malabarismo fisiológico e farmacoquímico para curar outro.

portanto, é necessário consumir pelo menos dois ou três copos de leite de alpiste diários para assegurar uma figura delgada e um corpo bem sadio, que, claro, conduza a uma mente sã.

Quando for usar a locução “pelo menos”, tenha um valor mínimo bem definido. E se o mínimo forem três copos, diga logo no começo que são três e não “um em jejum e outro antes de dormir”, porque isso contabiliza dois. E se beber alpiste conduz a uma mente sã, acho que o autor está se abstendo do leitinho.

E você notou que tudo isso, toda essa enrolada e invenção, depois de tantas imagens, tantas cores, tantos remetentes bloqueados e tantas falsas promessas, eis que surge a intenção real do autor? Ele odeia gordos e acha que ser magro e ter a “figura delgada” é a única forma aceitável para um ser humano e a única maneira de ter “um corpo bem sadio” (não sabia que ser sadio vinha em graduações).

O nome disso é GORDISMO. Sabe quem mais odiava gordos? Hitler.

Mas que figura delgada! Você deve se entupir de alpiste, não é? Hitler ama você.

Mas ainda me pergunto, será que esse suco do alpiste também cura o câncer de esôfago que sua casca pode causar? SERÁ?

Não, não cura. Assim como também não cura diabetes nem cirrose nem nada alegado no spam. Deixe o alpiste para os passarinhos e vamos comemorar num churrasco.

Finalizo esta análise com o recado final do próprio spammeiro: Compartilhe.

P.S. Não resisti, precisava colocar esse gif.

Balas de alpiste recarregando seu mijo!

Outros spams destruídos:

Como reconhecer um spam;

Spam dos batons com chumbo;

Spam do camarão e da vitamina C;

Spam dos absorvente internos que causam câncer;

Spam do benzeno em condicionadores de ar de automóveis;

Spam da Doença de Chagas em feijão;

Spam sazonal da gripe suína;

A falsa cura do câncer desmentida mais rapidamente que eu já vi.

Profissões do futuro – psicanálise de sistemas

Psicanalista de sistemas: profissional cuja função principal é analisar personalidades e identificá-las como um transtorno mental específico; responsável por planejar e coletar informações junto aos usuários, a fim de implantar o número de sessões computacionais por semana; desenvolve tratamentos a partir da psicanálise de coleta de informações, estudando fluxos de consciência e necessidades de regressões para propor alterações de personalidade virtuais, e elabora terapias; implanta memórias e mantém sugestões, observando deficiência, racionalidade e solução de problemas psicológicos e eletrônicos; elabora manuais de comportamento de máquinas.

“Estou compilando sua personalidade”

A psicanálise de sistemas é a atividade que tem como finalidade a realização de sessões de terapia/compilação a fim de encontrar o melhor caminho racional para que a informação possa ser rotulada e executada. Os psicanalistas de sistemas estudam os diversos sistemas existentes entre a infância (tabula rasa – templates), personalidade (instinto animal – libraries), sincronicidade (não-causal – conflitos de sistema) e o tratamento final (psicoterapêutico – execução).

“Todo diagnóstico deve ser livre!”

Os profissionais da área são preparados e treinados em procedimentos operacionais padronizados, dotados de conhecimentos do transtorno e tratamento, descrevendo softwares (id), que são executados em hardwares (ego) operados por usuários (superego).

A partir de então a psicanálise de sistemas é uma profissão cujas responsabilidades concentram-se na análise dos arquétipos computacionais e na administração do inconsciente coletivo da Nuvem.

Os comportamentos e personalidades dos usuários e sistemas são desenvolvidos a partir de soluções que serão padronizadas e transcritas da forma que o paciente possa ser diagnosticado enquanto o programa roda ao fundo.

“Você precisa reiniciar suas preconcepções.”

Assim como existe um número de pai-nossos e ave-marias relacionado para cada pecado, para cada tipo transtorno existe um número de semanas de sessões.

Símbolos e termos musicais – uma simplificação didática

Dia desses minha mãe me ligou perguntando o que exatamente significava a expressão carreira solo, quando em referência a um músico e, como me é pouco característico, eu entendi rapidamente o motivo da dúvida. Vamos lá (respirem fundo agora).

Solo, em português, significa: “Porção de superfície terrestre; Revestimento sobre o qual se anda; Parte superficial da terra que se pode cultivar ou onde podem crescer plantas; Terreno”.

Já em italiano, a lingua franca da música (de onde obtemos a própria expressão “lingua franca”), solo é a palavra que designa “sozinho”. Logo, em música, “carreira solo” não diz respeito a um deslocamento em velocidade sobre uma superfície mas a uma escolha profissional solitária, em contraponto a uma “carreira coletiva”. Ou seja, o sujeito tocava/cantava numa banda, saiu e passou a se apresentar sob seu próprio nome.

Então, torna-se completamente entendível que surjam dúvidas caso não se esteja familiarizado com as raízes latinas dos termos musicais.

É bom, no entanto, notar que apesar da maior parte dos termos usados em música formal serem derivados do italiano, há exceções quando em português, que é em espanhol, e quando em inglês, que é em francês. Como é o caso do símbolo acima; clave e clef, respectivamente.

Outro bom exemplo é a notação que chamamos de “semínima”, uma aglutinação do italiano semiminima, ou “metade de uma mínima” (que, por ter metade, já não é mais tão mínima), que em inglês tem duas versões: quarter note, ou “quarto de nota”, designando a metade de uma metade de uma nota que chamamos de semibreve, ou metade de uma breve, que é a nota mais longa possível (fazendo de “quarter note” o quarto de uma nota que não é a maior), e; crotchet, derivado do francês crochet (de onde tiramos “crochê”, artesanato têxtil semelhante à renda), que utiliza o termo noire (preta) para a mesma nota, enquanto reserva croche para metade daquela.

A nossa mínima (duas vezes uma semínima, metade de uma semibreve e um quarto de uma breve), é conhecida em francês por blanche, ou “branca”. Então, uma branca equivale a duas pretas. No entanto, a pausa de uma branca é uma semipausa (demi-pause), um termo descritivo denotando metade de uma pausa de ronde, ou “redonda”. A pausa da preta, por outro lado, é denominada soupir, ou “suspiro”. Existe ainda o “meio suspiro” (demi-soupir), que é a pausa do croche, de onde deriva o nosso “colcheia”, enquanto a mesma nota em italiano é chamada de croma, ou “tremida”, devido, talvez, à possibilidade de uso em mudanças rápidas e curtas, que emulam um tipo de vibração. O que não deve ser confundido com tremolo, que designa vibração de alternância de amplitude e não cromática.

círculos das quintas – o SI da escala cromática

Aliás, a palavra “cromática”, como em “escala cromática”, apesar de ser tão derivada do Latim quanto croma, não diz respeito a cores, mas ao sistema temperado, que não deriva de tempero no sentido de condimento, mas de temperamento, no sentido de harmonia, pois a escala cromática organiza e divide as notas em conjuntos harmônicos chamados oitavas, que não devem ser confundidas com as semínimas, que correspondem a oitavos das breves, nem com as eighth notes (literalmente, “oitavos de nota”), que são as nossas colcheias e as cromas dos italianos. É interessante também ressaltar que o “harmônico” dos conjuntos acima descritos é diferente do “harmônico” das ondas que formam as notas em si, sendo este definido como “sub-frequências do sinal compostas por múltiplos inteiros da fundamental”.

O caso mais confuso, todavia, é o da nossa breve, que, como já aludido, é a nota que menos pode ser descrita como sendo breve.

Na língua original (para todos os fins e efeitos, italiano é a base da língua musical original), ela é conhecida por breve porque era, em tempos medievais, realmente a mais breve das notas, sendo precedida pela longa (duas breves) e pela maxima (ou duplex longa, equivalente a duas longas). Atualmente, por outro lado, as maiores foram extintas das notações musicais deixando-as com tal designação completamente equivocada. Mas isso só é válido em português e italiano (e no russo, que mantém a grafia antiga, Бревис).

duas semínimas

Em espanhol, ela se chama cuadrada, para se diferenciar de sua metade (nossa semibreve) chamada redonda. Ambos, como a maioria das notações em espanhol, derivados do francês, onde a palavra carreé, ademais, é também um sinônimo de “praça”.

Em inglês, a nota de maior valor nominal é a whole note, ou “nota inteira” que é, na verdade, metade da maior nota possível, que passou a ser chamada double whole note, ou “dobro da nota inteira”.

Concluindo: em notação musical geral, deve-se usar um substantivo em italiano.
A não ser quando uma língua como português usa um termo em espanhol ou em inglês é usado o mesmo que em francês.
Ou então quando se usa um adjetivo denotando a cor da nota. Menos quando se fala em escala cromática. Ou quando em italiano, onde croma é sinônimo de vibração, de onde vem o português “colcheia”, que já deriva de francês mas que é diferente da vibração tremolo.
É também aceitável utilizar referências ao formato ou subdivisão aritmética das notas, dependendo do idioma, menos no caso de “oitava”, que não é nem a metade de 1/4 nem o formato do dígito 8, mas uma subdivisão cíclica do sistema temperado, mas nunca condimentado, apenas harmônico, mas não matematicamente, apenas agradavelmente.

Dá para notar o motivo da dúvida, não é?

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