Quem disse que animais não gostam de fogos de artifício?
Numa matéria (porcamente mal escrita, preciso avisar) publicada em 8 deste, o jornal sorocabano Cruzeiro do Sul informa do banimento (nem tanto, é apenas uma notícia já velha, retificando uma notícia errada do dia anterior, de que a prefeitura local deixou oficialmente de se valer) de fogos de artifício alegando o bem-estar dos animais.
Em setembro do ano passado, o portal G1 publicou algo semelhante mas mais especificamente voltado para a proibição, em municípios do Tocantins, durante a campanha eleitoral devido ao risco de incêndios. No entanto, a matéria também cita desconforto em animais.
Mas será que os fogos de artifício (rojões, foguetes, bombas, traques, bichas, bujões, peidos-de-véa e demais variantes regionais) realmente, causam desconforto em animais? Ou, como alega o Cruzeiro do Sul (sic): “[A]ssustam as aves e outros animais que mudam o comportamento, alterando a rotina”?
Será que os animais se importam tanto assim? Quer dizer, alguns deles até se importem, mas o que eu noto durante a época junina (que vai do Dia de Santo Antônio até o Dia de São Pedro e não sei se isso se aplica a outras regiões não-nordestinas) é que a queima indiscriminada e desnecessária de imensos volumes de madeira por indivíduos despreparados para lidar com possíveis consequências é uma prática comum, conhecida e incentivada (sem falar nada da “brincadeira” infantil de pular a fogueira já perto do fim da festa, quando todos os adultos já estão devidamente quentãozados e ainda menos capazes de intervir e/ou socorrer) e que continua firme e forte, sendo levada adiante geração após geração pela mesma subespécie de animais cuja rotina é justamente a de criar um ambiente sujo tanto auditiva quanto atmosfericamente (visto que não adquiriram evolutivamente[1] capacidade cognitiva adequada para identificar quando estão incomodando) e cujo comportamento subumano continua inalterado há milênios. Pois não há nada melhor que uma celebração europeia pagã (a chegada do verão, representada pelo solstício), reforçada pelo uso de dispositivos orientais para o afastamento de maus espíritos (fogos barulhentos e coloridos) e abastecida por rituais indígenas pré-colombianos (o alto consumo de milho, representando a fartura do nosso solstício de inverno), para reacender a paixão dos católicos pelas fogueiras e manter queimando a certeza prepotente de que o que eles fazem é sagrado e blindado a críticas ou reclamações.
Pessoas que enchem a boca e estufam o peito ao declarar que o Brasil é o maior país católico do mundo[2] são as mesmas que estão agora segurando a calcinha/cueca nos dentes de ódio de mim (e seriamente pensando num bom uso para as fogueiras acima mencionadas). Ora, se ateus deveriam trabalhar no natal (ou hoje, que por algum motivo que me escapa foi feriado para mim e para toda a Justiça do RN), então por que católicos quereriam negar a origem 100% católica desse espetáculo medieval de adoração à destruição primitiva, irracional e inconsequente que tem seu maior palco precisamente nas áreas mais atrasadas (socialmente) do país mais atrasado (culturalmente)? Aliás; qual outra razão existiria para justificar tal comportamento? Ao que tudo indica, o homo erectus foi extinto ainda no médio paleolítico!
Uma coisa, porém, não posso negar: admiro grandemente essa confluência multicultural de religiões naturais e sobrenaturais europeias com pitadas do misticismo oriental e rituais incas/maias. Se ao menos tivessem tido tempo para evoluir um pouco essa mentalidade mágica que, apesar de claramente proibir a adoração de ídolos e outras divindades, abre vastas exceções para estátuas, folhetos, templos e comemorações à memória de sub-deuses e seus poderes santificados que, sob encomenda, fazem desde uma pessoa se pré-apaixonar por outra premonitoriamente através de uma faca enfiada numa bananeira ou gotas de cera quente pingando numa bacia até abrir as portas de um pós-vida que, não obstante ser eterno, não é infinitamente sem graça e entediante.
Então, até talvez os animais silvestres e de estimação (como bem frisou o G1) sejam perturbados pelas luzes, pelo barulho e pela fumaça junina, mas creio convictamente que, aos animais que fazem uso dos explosivos (sob os auspícios de uma justificativa hermeticamente neolítica), a queima de fogos e sua eventual cota extra de poluição visual, sonora e atmosférica faça até bem.
Ah! E por falar nisso: vá doar sangue. Você tem mais do que precisa e esta época do ano é ideal para alguma criança perder um dedo ou um olho ou pelo menos parte da pele.
———
[1] Que são animais é indiscutível, mas não posso dizer que tal conjunto de características é uma espécie de retardo pois precisaria supor que criaturas desse tipo teriam um potencial refinado que lhes foi negado por alguma circunstância. Eles são realmente prejudicados ontogenicamente, desevoluídos e retrógrados.
[2] Noção duplamente errada, tanto absoluta quanto percentualmente, visto que 100% da população do Vaticano é católica e o fato do México ter mais ou menos cinco milhões a mais de católicos na população geral que nós. Ufa! Menos uma vergonha para este país de quinta.