Papel da pesquisa científica na produção de hortaliças no Brasil
Na década de 70, a maior parte da produção de hortaliças do Brasil se concentrava na região Centro-Sul do país, principalmente nos climas mais amenos. A real tropicalização da produção de hortaliças ainda estava por vir. A adaptação das culturas nas diferentes regiões brasileiras, desde o Sul subtropical, passando pelo Nordeste semi-árido, até o Norte tropical quente e úmido, dependeu do acúmulo e aplicação de profundos conhecimentos de genética, fisiologia e ecologia dos cultivos, química, física e biologia dos solos. Atualmente o Brasil testemunha a expansão da produção de hortaliças em ambiente protegido, o que tem se tornado possível graças ao conhecimento, além do comportamento das plantas e do solo, da física do ambiente interno nesse tipo de estrutura.
O avanço da produção de hortaliças no Brasil tem sido resultado em grande parte da aplicação, no agroecossistema, de conhecimento gerado por estudos em ciências básicas. Um caso emblemático foi a expansão da agricultura brasileira para as extensas áreas de terras planas e mecanizáveis do Brasil Central conhecidas como Cerrado. Os solos dessas regiões são quase invariavelmente muito intemperizados, ácidos e com alta atividade de alumínio. Para agravar o desafio, estes solos são também pobres em cálcio, magnésio e fósforo. Embora a tortuosa vegetação do Cerrado fosse bem adaptada a este ambiente, para que a ocupação desta área pela agricultura fosse possível, foi necessário aprofundar o conhecimento da mineralogia e da química destes solos, o conhecimento do comportamento de sorção dos nutrientes e sua ação sobre a fisiologia vegetal. Posteriormente, foi preciso estudar maneiras de diminuir ou neutralizar a acidez dos solos e aumentar a atividade química do cálcio, do magnésio e, principalmente, do fósforo.
Os solos do Cerrado são intemperizados e pobres do ponto de vista nutricional porque essa região recebe anualmente uma grande quantidade de precipitação, associada a longos períodos de temperatura relativamente alta. A maior parte das hortaliças consumidas no Brasil é originária de regiões de clima temperado. Inicialmente essas espécies mostravam muito pouca adaptação às condições de clima e solo do Cerrado. É notável, por exemplo, o caso da cenoura. Até o início da década de 80 do século XX, essa espécie era tipicamente cultivada nas condições amenas de outono-inverno do centro-sul do país. Isso tornava a cultura escassa, seus preços eram elevados e a parcela da população que a consumia era pequena. Em 1981 a Embrapa Hortaliças lançou a cultivar Brasília, adaptada a temperaturas e pluviosidades elevadas e com alta resistência à doença conhecida como queima-das-folhas. O lançamento dessa cultivar permitiu a expansão do cultivo da cenoura a regiões tropicais como o Cerrado, o Nordeste e mesmo o Norte do Brasil.
O desenvolvimento de uma variedade como a Brasília exige a aplicação de uma gama enorme de conhecimentos. Em primeiro lugar é necessário um profundo conhecimento da fisiologia e da genética da espécie. De posse dessas informações, o agrônomo melhorista precisará dominar estatística e genética populacional. A resposta de uma espécie não dependerá apenas de sua genética, mas também da interação desta com o meio-ambiente. Sem conhecer ecologia e, principalmente, ecofisiologia das culturas, é quase impossível realizar um trabalho eficiente de melhoramento vegetal, principalmente quando se pretende adaptar uma espécie a condições de solo e clima diferentes daquelas onde a espécie se originou.
O melhoramento de plantas é na verdade uma seleção dirigida, na maior parte dos casos. Se o que se deseja é uma planta resistente a Ralstonia, deve-se expor uma população razoavelmente grande e variável ao patógeno e se selecionar, por um número x de gerações, aquelas plantas mais resistentes ou tolerantes, utilizando-se inclusive cruzamentos entre materiais com resistência ou tolerância diferenciada. Ao final do processo, espera-se ter uma linhagem ou linhagens com a característica desejada bem fixada para que se possa comercializá-la.
Um fator ecológico crucial limitando a adaptação de hortaliças e outras espécies de uso agrícola às condições tropicais é a ocorrência de microrganismos causadores de doenças e de artrópodes indesejados agindo como pragas. As condições de altas umidades e temperaturas em geral são muito propícias para aumentar a incidências de doenças e pragas agrícolas. O entendimento do comportamento desses organismos indesejáveis no cultivo em altas populações e sua interação com o agroecossistema é fundamental para o desenvolvimento de técnicas de controle dos mesmos e de adaptação das culturas a estes organismos. Ultimamente tem ganho importância também o estudo das interações entre diferentes microrganismos, entre microrganismos e artrópodes e entre diferentes artrópodes com o objetivo de avançar as técnicas de controle biológico de patógenos e pragas. Associando o conhecimento assim gerado com as informações sobre a genética das plantas cultivadas, é possível conduzir programas de melhoramento genético vegetal visando selecionar plantas mais tolerantes ou resistentes a doenças e pragas.
Ao contrário de outras culturas, nas quais o mais importante é a quantidade produzida, nas hortaliças a qualidade do produto é fundamental. Pouco importa uma grande produtividade de tomates fora do padrão exigido pelos consumidores. O desenvolvimento de novas cultivares não pode deixar de levar em consideração aspectos de qualidade do produto produzido, preferência dos consumidores, resistência ao transporte e vida de prateleira. São características aparentemente prosaicas mas cujo estudo demanda firme conhecimento em ciências básicas. No mercado brasileiro de tomates a preferência dos consumidores tem se voltado para as variedades do tipo cereja ou grape.
O mercado desse segmento é muito exigente, demandando frutos com pH ideal, firmeza, boa conservação pós-colheita, coloração vermelha intensa e teor de sólidos solúveis (Brix) elevado. De fato, a principal característica que propiciou a recente expansão de consumo do segmento cereja ou grape é o sabor adocicado (ou alto Brix). Os componentes mais importantes do Brix no tomate são os açúcares (glicose e frutose) e os ácidos orgânicos (ácido cítrico e ácido málico). Estudos recentes têm mostrado que o glutamato pode também contribuir para o Brix do tomate, sendo a relação glutamato/açúcares um importante componente de sabor do tomate. As variedades disponíveis no mercado apresentam grandes variações no teor de sólidos. Além do híbrido/cultivar utilizado, vários fatores ambientais e fatores associados com manejo da cultura podem levar a uma variação no valor de Brix. Por exemplo, podemos citar: temperatura diurna e noturna, precipitação pluviométrica (em cultivos de campo aberto), intensidade e severidade de doenças foliares e sistemas de adubação.
Regiões do Brasil onde a temperatura noturna cai rapidamente após o pôr-do-sol e se mantêm amenas (permitindo maior translocação de sólidos para os frutos) tendem a favorecer a produção de frutos com melhor Brix. O manejo inadequado da frequência, intensidade e período de irrigação também pode levar a uma redução do Brix. Em geral, irrigações muito intensas próximas da época da colheita reduzem o Brix. Por outro lado, a paralisação precoce da irrigação pode aumentar o Brix, mas pode também afetar negativamente a produtividade. Irrigação por gotejo aumenta a produtividade, mas, em geral reduz o Brix. Manter a relação nitrogênio/ potássio N:K (1:2), manter os frutos na planta até pleno amadurecimento, suplementação de cálcio em condições de temperaturas mais elevadas são outros exemplos de práticas que, aparentemente, apresentam efeitos positivos sobre o Brix.
A moderna produção de hortaliças deve encarar prementes desafios – mudanças climáticas, escassez de recursos naturais, população crescente, escassez de terras, poluição. Como forma de minimizar os impactos negativos das mudanças climáticas na produção agrícola, mecanismos adaptativos têm sido propostos. No melhoramento genético, a busca por variedades adaptadas aos estresses térmicos e hídricos, a maiores níveis de radiação, com maior albedo e mais eficientes na utilização de fertilizantes são alguns dos principais pontos discutidos. Outros mecanismos adaptativos, agora associados aos sistemas de produção, podem também surtir bons efeitos.
Um programa de agricultura de baixo uso de insumos deve antes de qualquer coisa procurar utilizar variedades comprovadamente mais eficientes no uso de nutrientes. Caso estes não existam ou não estejam disponíveis, deve-se criar programas de melhoramento que visem explicitamente o desenvolvimento de variedades menos exigentes e mais eficientes na utilização de nutrientes, mesmo que para isso seja necessária a utilização de técnicas de biotecnologia, caso se queira atingir altas produtividades. Esta seleção obrigatoriamente deverá ser feita expondo-se vários materiais a solos ou soluções nutritivas mais pobres em nutrientes e selecionando-se os materiais que se saiam melhor.
São muitos os presentes e futuros desafios na produção de hortaliças. Para enfrentar esses desafios o Brasil tem utilizado conhecimento científico básico e aplicado, gerado por instituições de pesquisa brasileiras e estrangeiras. Uma agricultura de sucesso precisa de agricultores bem preparados, de uma assistência técnica atuante e de pesquisadores em Ciências Agrárias e correlatas com rigorosa formação científica e dispondo de recursos e de uma estrutura institucional que incentive o fazer científico e a inovação.
Desafios futuros à produção de hortaliças no Brasil
A produção de hortaliças abrange cerca de uma centena de espécies que são cultivadas temporariamente. Em 2011, a área cultivada com hortaliças foi de 946 mil hectares com volume de produção estimado em 19,4 milhões de toneladas. Acredita-se que o setor gere 2,4 milhões de empregos diretos (3,5 empregos/ha), cujo valor estimado da mão-de-obra empregada é estimado em 1,6 bilhão de reais (ABCSEM, 2011). Entretanto, a produção de hortaliças no Brasil deverá enfrentar na próxima década desafios prementes, alguns dos quais ainda carecem de respostas satisfatórias de pesquisa.
A aprovação do novo Código Florestal impõe ao setor agrícola limitações principalmente de cunho territorial e demanda respostas da área de pesquisa vinculadas ao incremento da produtividade com sustentabilidade e melhoria da qualidade do produto final. A crescente conscientização da sociedade sobre questões ambientais e o incremento da demanda sobre o uso dos recursos naturais pelas cadeias produtivas de hortaliças, se constituirão em fatores norteadores das atividades de pesquisa na área agrícola, visando o desenvolvimento de sistemas convencionais ou agroecológicos de produção com rastreabilidade, mais sustentáveis, mais produtivos e mais eficientes no uso de insumos. Além disso, no Brasil os fatores conveniência, confiabilidade e saudabilidade, associados à qualidade do produto final, são reconhecidos por 34%, 23% e 21% dos consumidores brasileiros, respectivamente, como as principais tendências a serem buscadas.
Recentemente, tem-se verificado um aumento da renda per capita, com consequente migração de parte da população das classes mais baixas para a classe média. O incremento de renda e de nível educacional da população urbana brasileira tem criado um perceptível aumento na demanda por alimentos mais saudáveis. A percepção de que o consumo de hortaliças está ligado a um estilo de vida mais saudável põe esse grupo de espécies agrícolas em posição privilegiada, tendo-se ainda em vista que há muito espaço para expansão de produção, já que o consumo médio de hortaliças no Brasil ainda é baixo, segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE (Anuário de Hortaliças 2013). A população de renda mais baixa é ainda a que menos consome hortaliças, com um consumo médio anual em torno de 19 kg/pessoa.
Por serem ricas em compostos bioativos, o consumo de hortaliças pode ainda auxiliar na melhoria do perfil nutricional da população brasileira. O consumo de hortaliças pode auxiliar na mudança de paradigma tão necessário em todo o globo terrestre: da cura para a prevenção de doenças. Apesar da associação com estilos de vida mais saudáveis, subsiste a preocupação da sociedade com o excesso de uso de agroquímicos na produção convencional de hortaliças, bem como para fertilizantes e água. Já são observados significativos conflitos pelo uso da água em importantes centros de produção de hortaliças no Sudeste e no Sul do país, principais regiões produtoras nacionais. Além da quantidade, a qualidade da água utilizada na agricultura é questão de grande importância na produção de hortaliças, inclusive na pós-colheita, tendo em vista que boa parte dos produtos olerícolas é consumida fresca.
O uso intensivo de fertilizantes pela olericultura e a grande dependência em importações desses insumos evidenciam o lado vulnerável da agricultura brasileira, fazendo com que o desenvolvimento de sistemas e práticas que aumentem a eficiência do uso de nutrientes seja uma questão crucial para a sustentabilidade econômica do setor. O incremento de renda média dos brasileiros, a legislação trabalhista vigente e a competição por parte de outras atividades econômicas tem tornado a mão de obra agrícola mais escassa e cara, criando desafios inéditos à produção e à pesquisa agrícolas brasileiras e a demanda por soluções inovadoras vinculadas à automação. No que diz respeito às mudanças climáticas, as projeções apontam para um aumento da temperatura média em todas as regiões brasileiras até o fim do século XXI. Projeta-se uma nova dinâmica do regime pluviométrico, tendendo, de modo geral, à maior concentração nos períodos chuvosos e maior escassez nos períodos secos.
Esse cenário pode alterar o comportamento de pragas e doenças, aumentando a importância de algumas e reduzindo de outras, bem como modificar a geografia de produção e sistemas de cultivo de diversas olerícolas, sendo o uso de ambientes protegidos uma das alternativas de controle para algumas espécies. Quanto às ameaças fitossanitárias, o Brasil encontra-se sob grande pressão no momento e deve permanecer assim nos anos vindouros. Segundo estimativas de especialistas da própria Embrapa, existem mais de 150 pragas e doenças prestes a entrar no território brasileiro. O aparecimento de ameaças potenciais às hortaliças, como por exemplo, a Helicoverpa armigera, lagarta polífaga identificada recentemente, que tem surpreendido produtores e pesquisadores pelo seu poder de destruição, causando prejuízos principalmente às lavouras de milho, soja e algodão, confere uma ameaça constante as diferentes hortaliças produzidas. Há ainda que se ressaltar os graves problemas causados pela mosca branca em diversas cadeias produtivas, como o feijão e o tomate, sendo que nesta última tem sido o vetor de viroses que ocasionaram prejuízos significativos nos últimos anos.
A pesquisa científica nessa área deverá certamente priorizar algumas áreas e ações estratégicas, visando tornar o setor, no Brasil, mais competitivo, aumentar o consumo interno de hortaliças e, futuramente, almejar mercados externos. Consigo vislumbrar algumas dessas prioridades:
• Expansão da base técnico-científica e avanço na fronteira do conhecimento, em temas como mudanças climáticas, mitigação de riscos ambientais e biológicos, meio ambiente, alimentos, nutrição e saúde, nanotecnologia, biologia avançada, automação e olericultura de precisão;
• desenvolvimento de sistemas produtivos mais sustentáveis, levando-se em consideração o zoneamento de risco climático e a elaboração de planos de manejo viáveis, visando o controle de pragas e doenças emergentes, decorrentes de mudanças climáticas;
• geração de tecnologias para sistemas orgânicos e/ou vinculadas à produção integrada de hortaliças, bem como o aprimoramento de normas e mecanismos de garantia de qualidade em culturas com suporte fitossanitário insuficiente (minor crops);
• desenvolvimento de fontes alternativas de insumos agrícolas e de tecnologias que maximizem a eficiência do uso da água e a qualidade do produto final;
• intensificação de pesquisa e geração de soluções em cultivo protegido de hortaliças para áreas urbanas e peri-urbanas;
•parcerias entre instituições dos setores público ou privado visando a automação de processos agropecuários e mecanização para pequenas áreas agrícolas;
• consolidação de estudos relacionados com Agricultura de Baixo Carbono – Programa ABC) em hortaliças;
• ações de pesquisa em genética e melhoramento de hortaliças, com foco no desenvolvimento de variedades e híbridos produtivos com maiores teores de compostos funcionais, resistência às principais doenças, maior eficiência de uso de água e fertilizantes, melhor qualidade sensorial e adaptados à temperaturas mais elevadas;
• redução de perdas pós-colheita de hortaliças, agregação de valor e conveniência às matérias-primas e desenvolvimento de práticas e processos agropecuários que contribuam para a manutenção da qualidade das hortaliças após a colheita;
• intensificação de atividades de PD&I ligadas à avaliação de compostos com propriedade funcional das hortaliças;
• desenvolvimento de novas tecnologias, produtos e processos para a produção e a industrialização de alimentos seguros e nutritivos.
Hortaliças e inflação
As hortaliças têm sido acusadas de contribuírem para o aumento da inflação, em grande parte devido à sazonalidade de oferta e de preços ao longo do ano, ou seja, por grandes variações nos preços dependendo da quantidade de oferta dos produtos hortícolas de acordo com as estações. Isso parece acontecer particularmente com as espécies tomate, cebola, batata, cenoura e alface. Essas espécies não são produzidas em todas as regiões do Brasil em todas as épocas do ano. Na verdade, boa parte das hortaliças que em geral consumimos são originalmente de climas temperados ou frios e ainda não estão bem adaptadas a condições realmente tropicais, quentes e úmidas. Por uma série de razões, ainda não se consegue produzir satisfatoriamente tomate, cenoura e batata na região Amazônica, por exemplo.
Até o início da década de 80 do século XX, as variedades de cenoura plantadas no Brasil eram exclusivamente variedades chamadas “de inverno”, as quais produziam exclusivamente no Sul do país. Com o desenvolvimento e lançamento da variedade Brasília, primeira variedade de cenoura dita “de verão”, resistente a condições mais quentes, esta olerícola deixou de ser uma espécie raramente vista nas mesas e nos pratos brasileiros, houve um decréscimo nas variações sazonais de oferta da mesma e os preços também deixaram de variar tanto. Aliás, a tropicalização de várias espécies agrícolas é uma das causas do sucesso da agricultura brasileira. O que poderia ser feito para diminuir o impacto da variação sazonal? Do ponto de vista técnico, tenho algumas ideias, que gostaria de explorar aqui.
Em primeiro lugar, acredito que o que foi feito para a cenoura deveria ser feito, se possível, também para outras culturas. A tropicalização de espécies agrícolas não é uma tarefa fácil e não se limita a inserir tolerância a altas temperaturas. Junto com altas temperatura e umidades vêm as doenças, principalmente fúngicas e bacterianas. Para hortaliças, não há possibilidade de tropicalização sem resistência ou pelo menos tolerância a doenças. Um grande desafio para a produção de solanáceas, como tomate e pimentão, na região Norte do Brasil, é a presença praticamente ubíqua de uma bactéria, a Ralstonia solanacearum, que causa a murcha bacteriana, nos solos daquela região.
O sucesso do cultivo não se limita à disponibilidade e à escolha de cultivares adequadas. Todo o sistema de produção deve estar adaptado às condições climáticas, de solo e mesmo culturais regionais. Há algum tempo presenciei um agricultor de Manaus que adquirira estufas israelenses e tentava produzir alface dentro das mesmas. A temperatura média certamente superava o conforto térmico da espécie e as plantas de alface rapidamente pendoavam, mesmo as de variedades com alguma adaptação ao calor.
Embora no exemplo anterior a escolha de estruturas protegidas não tenha sido adequada, não há dúvidas de que a garantia de disponibilidade mais homogênea de hortaliças ao longo do ano passa pela adoção mais ampla do cultivo em ambiente protegido. Aliás, uma das razões por que se migra para a agricultura protegida é a possibilidade de se produzir quando e onde normalmente não seria possível. Ainda há lacunas no conhecimento e na disponibilidade de tecnologias de controle ambiental para uma maior disseminação do cultivo protegido em regiões tropicais como boa parte do Brasil, mas já há equipes trabalhando intensamente no assunto.
A concentração da agricultura protegida ao redor de centros urbanos, maiores consumidores de hortaliças, torna possível a aproximação dos centros produtores e dos centros consumidores, diminuindo as perdas devidas ao transporte inadequado de longas distâncias. As perdas pós-colheitas certamente têm um papel importante na oferta de hortaliças e consequentemente nos preços. Para algumas espécies, no Brasil, as perdas após a colheita chegam a 40%, por uma série de razões. Ainda na fazenda há perdas, principalmente por armazenamento inadequado – poucas são as propriedades com casas de embalagem (packing houses) ou estruturas de refrigeração. O próprio padrão exigido dos produtos é causa de perdas em alguns casos. Estima-se, por exemplo, que pelo menos 20% da cenoura produzida na região do Alto Paranaíba, em Minas Gerais, perdem-se no campo simplesmente porque não exibem o padrão de tamanho e grossura exigidos pelo mercado.
Perdas pós-colheita são um problema extremamente complexo. As causas das perdas, não apenas de hortaliças, são várias. Perde-se nas propriedades, perde-se no transporte em estradas de má qualidade, em caminhões sem refrigeração, com acondicionamento inadequado. Perde-se quando o produtor “tomba” ou transfere seu produto de suas caixas, não raro de madeira, para as caixas de comerciantes nas centrais de abastecimento, onde as hortaliças via de regra permanecem sem refrigeração até irem para os supermercados, onde igualmente se perde pelo empilhamento excessivo nas prateleiras, que continuam sem refrigeração.
Enfim, há muito o que se fazer, em termos de pesquisa, mas principalmente em termos de transferência de tecnologia e de subsídios públicos. Vários atores devem conversar harmoniosamente – Ministérios da Fazenda, da Agricultura, do Desenvolvimento Agrário, do Planejamento, instituições de pesquisa e de extensão rural, agências de fomento. O setor de produção de hortaliças se ressente da ausência de estatísticas confiáveis e atualizadas – dados econômicos, mas também geográficos e de produção, para que se possa planejar racionalmente a produção.
Produção de tomate Cereja ou Grape sob cultivo protegido: manejo cultural e genética varietal
Introdução
O cultivo protegido de tomate “cereja” ou “grape” em solos apresenta uma série de especificidades que o diferenciam muito do cultivo em campo aberto. Uma das principais diferenças é que sob cultivo protegido há pouca ou nenhuma contribuição de água de chuva. A água que entra no sistema provém quase que unicamente da irrigação, muitas vezes feita de forma localizada, como gotejamento, por exemplo. Como as doses de adubo são normalmente altas, há uma tendência de acúmulo de sais em superfície, aumentando a condutividade elétrica da solução do solo. Na verdade, independentemente das condições de solo e clima, a salinização de solos sob cultivo protegido é quase inevitável. Além dos problemas de toxidez, o excesso de salinidade pode trazer problemas físicos, biológicos e nutricionais.
Corrigindo a salinização
A correção dos problemas advindos da salinização é difícil e onerosa. Em geral, para se corrigir a salinidade em solos cultivados sob ambiente protegido é necessário aplicar lâminas de irrigação em excesso (com água de boa qualidade) para que os nutrientes sejam lavados e levados para longe do sistema radicular, processo que se chama de lixiviação. Para que essa técnica seja realmente eficiente, a irrigação em excesso deveria estar associada a um sistema de drenagem. Muitas vezes não há disponibilidade de água em quantidade nem qualidade suficiente para que isto possa ser feito; mesmo que haja a possibilidade, não há garantia de que o problema não venha a se repetir posteriormente. Além disso, cria-se o problema de disposição deste resíduo salino, caso não haja um sistema que permita o reuso da água. A dificuldade de descarte desta água residual de fertirrigação foi uma das causas para a massiva adoção do cultivo em substrato na Holanda, por exemplo.
Vantagem dos substratos
A condutividade elétrica da solução do solo é geralmente mais alta do que a condutividade elétrica da água de irrigação. Isso se deve à dificuldade em se lixiviar os nutrientes do solo (já que as argilas retêm boa parte deles) e ainda a características físicas como a tortuosidade e a estreiteza dos poros do solo. Por outro lado, a maior parte dos substratos utilizados no cultivo sem solo permite uma rápida lixiviação e um melhor controle da condutividade elétrica da solução nutritiva. Assim, a condutividade elétrica da zona das raízes no cultivo em substrato pode ser mais baixa e facilmente controlável do que no solo, sob condições de irrigação semelhantes, diminuindo muito o risco por problemas de salinização.
Manejo de doenças em solo versus substrato
No cultivo em solo sob cultivo protegido, há uma resistência (e muitas vezes falta de opções) por parte dos agricultores em estabelecer sistemas de rotação de culturas. Dessa forma, corre-se o risco de acúmulo de doenças de solo. As condições de cultivo protegido favorecem alguns patógenos fúngicos (especialmente raças de Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici), bacterianos (especialmente Ralstonia solanacearum) e os nematóides-das-galhas (espécies do gênero Meloidogyne). No caso do cultivo em substrato o manejo dessas doenças fica mais facilitado. Apenas a troca periódica do substrato usado já pode eliminar uma grande parte desses problemas. Alguns produtores preferem não repetir o uso do mesmo substrato por mais de um cultivo, entre outras coisas visando evitar o aparecimento de doenças, especialmente alguns oomicetos (Pythium e Phytophtora).
Características e variedades adequadas para o segmento cereja ou grape
O mercado desse segmento é muito exigente, demandando frutos com pH ideal, firmeza, boa conservação pós-colheita, coloração vermelha intensa e teor de sólidos solúveis (Brix) elevado. De fato, a principal característica que propiciou a recente expansão de consumo do segmento cereja ou grape é o sabor adocicado (ou alto Brix). Os componentes mais importantes do Brix no tomate são os açúcares (glicose e frutose) e os ácidos orgânicos (ácido cítrico e ácido málico). Estudos recentes têm mostrado que o glutamato pode também contribuir para o Brix do tomate, sendo a relação glutamato/açúcares um importante componente de sabor do tomate. As variedades disponíveis no mercado apresentam grandes variações no teor de sólidos. Portanto, na hora de escolher as variedades de tomate, os produtores do segmento cereja ou grape devem prestar atenção nessa característica, além de outros aspectos agronômicos incluindo adaptação as condições de cultivo protegido, produtividade e resistência às doenças e pragas. Variedades ou porta-enxertos com resistência a todas as raças de Fusarium e aos nematóides-das-galhas e com tolerância a Ralstonia já se encontram disponíveis no mercado.
Fatores ambientais que podem afetar o Brix em tomates
Além do híbrido/cultivar utilizado, vários fatores ambientais e fatores associados com manejo da cultura podem levar a uma variação no valor de Brix. Por exemplo, podemos citar: temperatura diurna e noturna, precipitação pluviométrica (em cultivos de campo aberto), intensidade e severidade de doenças foliares e sistemas de adubação. Regiões do Brasil onde a temperatura noturna cai rapidamente após o pôr-do-sol e se mantêm amenas (permitindo maior translocação de sólidos para os frutos) tendem a favorecer a produção de frutos com melhor Brix. O manejo inadequado da freqüência, intensidade e período de irrigação também pode levar a uma redução do Brix. Em geral, irrigações muito intensas próximas da época da colheita reduzem o Brix. Por outro lado, a paralisação precoce da irrigação pode aumentar o Brix, mas pode também afetar negativamente a produtividade. Irrigação por gotejo aumenta a produtividade, mas, em geral reduz o Brix. Manter a relação nitrogênio/ potássio N:K (1:2), manter os frutos na planta até pleno amadurecimento, suplementação de cálcio em condições de temperaturas mais elevadas são outros exemplos de práticas que, aparentemente, apresentam efeitos positivos sobre o Brix. No entanto, mais estudos são necessários para quantificar e validar o efeito benéfico destas práticas.
Ítalo M. R. Guedes
Leonardo S. Boiteux
O que Steve Jobs teria a dizer sobre uma variedade de hortaliça?
Recentemente eu e um colega conversávamos sobre uma variedade de hortaliça muito promissora com que trabalhávamos mas que mostrara uma maior susceptibilidade à deficiência de cálcio que outras sendo desenvolvidas. O cálcio faz parte da composição de pectatos de cálcio os quais auxiliam na resistência estrutural da parede celular, a qual confere firmeza ao tecido vegetal. Esse problema era de tal monta que, sob determinadas condições, o fruto chegava a rachar antes de colhido, tornando-o imprestável para o mercado.
Discutindo possíveis estratégias para minimizar ou evitar o problema, meu colega fez a sensata sugestão de determinarmos a quantidade a mais de cálcio que essa variedade precisava para os frutos não racharem e recomendarmos aos produtores que suplementassem a adubação com aplicações extras do nutriente no início da frutificação. Sem dúvida, esta seria a solução mais simples…para nós, pesquisadores.
À medida que o país se urbaniza e a renda média da população aumenta, a mão de obra no campo escasseia de forma assustadora e torna-se mais cara, em muitos casos representando a maior fatia nos custos da produção agrícola. Duas ou três aplicações suplementares de adubo podem representar a diferença no custo de produção que levarão o produtor a escolher uma outra variedade talvez não tão produtiva mas que não exija este gasto extra de mão de obra por não apresentar esta menos eficiência no uso de cálcio.
Para mim, a melhor solução (e eu me inspiro escancaradamente na visão de Steve Jobs) seria ter mais trabalho no processo de melhoramento, tentando corrigir, por meio de cruzamentos direcionados e seleção, esta menor eficiência na aquisição ou no uso de cálcio e lançando um produto mais pronto e certamente mais competitivo por vir a realmente facilitar a vida do produtor.
Baixo uso de fertilizantes e o melhoramento de plantas
A agricultura dita convencional tem muitas vezes utilizado grandes quantidades de insumos, principalmente fertilizantes ou adubos, visando sustentar as altas produtividades almejadas pela agricultura industrial. Ralmente, não há dúvida de que um dos requisitos para se alcançar altas produtividades são quantidades consideráveis de nutrientes. Por outro lado, boa parte destes fertilizantes vêm de fontes não renováveis, como os fosfatos e o cloreto de potássio. A uréia, para piorar, é produzida com o uso de combustíveis fósseis.
Além da questão da insustentabilidade de uma agricultura grande consumidora de fertilizantes não renováveis, há o quase sempre presente problema do uso excessivo de adubos e a consequente poluição ambiental e alguns problemas de saúde humana. Este último problema, como insistimos em afirmar, poderia ser grandemente minimizado se as adubações fossem baseadas nas reais necessidades das plantas principalmente na análise química do solo.
Por tudo isto e ainda por questões de segurança alimentar em países que não detêm grandes jazidas de minérios usados na fabricação de fertilizantes, grande ênfase tem sido dada à pesquisa e à adoção de práticas agrícolas que minimizem o uso de insumos externos à propriedade. Em geral, o foco é na utilização da reciclagem de nutrientes, com grande utilização de adubos orgânicos, de preferência os gerados na propriedade. A idéia é excelente, inclusive por tentar mimetizar o que ocorre naturalmente nos ecossistemas.
Uma faceta nem sempre levada em consideração quando se propõe a adoção de práticas agrícolas com baixo uso de fertilizantes é a daptabilidade das variedades mais comuns das espécies cultivadas a este tipo de manejo. Nos últimos três anos tive a chance de participar de equipes multidisciplinares envolvidas no melhoramento de várias espécies de hortaliças. Um fato que observei diversas vezes e que tem me preocupado muito é a condução de programas de melhoramento sobre solos muito enriquecidos de nutrientes. Tenho discutido esse problema com meus colegas melhoristas e venho tentado elaborar melhor o problema.
O melhoramento de plantas é na verdade uma seleção dirigida, na maior parte dos casos. Se o que se deseja é uma planta resistente a Ralstonia, deve-se expor uma população razoavelmente grande e variável ao patógeno e se selecionar, por um número x de gerações, aquelas plantas mais resistentes ou tolerantes, utilizando-se inclusive cruzamentos entre materiais com resistência ou tolerância diferenciada. Ao final do processo, espera-se ter uma linhagem ou linhagens com a característica desejada bem fixada para que se possa comercializá-la.
No meu ponto de vista, se se conduz um programa de melhoramento sobre solos contendo altas concentrações de nutrientes, ainda que inadvertidamente, está se selecionando um material com altas necessidades de nutrientes, como dizemos na área de nutrição vegetal, materiais com níveis críticos altos. A utilização de um material com este tipo de característica em uma agricultura de baixo insumos é garantia quase certa de insucesso ou, no mínimo, de resultados aquém do esperado.
Estas variedades não foram selecionadas para ser eficientes no uso de nutrientes – pelo contrário, foram selecionadas para responder ao uso de altas doses. Para os que gostam de denunciar a Revolução Verde, isto é feito de caso pensado para beneficiar as empresas produtoras de fertilizantes. Em minha curta experiência, penso que isto é feito pela pequena participação de especialistas em fertilidade do solo e nutrição de plantas nas equipes de melhoramento.
Acredito que um programa de agricultura de baixo uso de insumos deve antes de qualquer coisa procurar utilizar variedades que sejam sabidamente mais eficientes no uso de nutrientes. Caso estes não existam ou não estejam disponíveis, deve-se criar programas de melhoramento que visem explicitamente o desenvolvimento de variedades menos exigentes e mais eficientes na utilização de nutrientes, mesmo que para isso seja necessária a utilização de técnicas de biotecnologia, caso se queira atingir altas produtividades. Esta seleção obrigatoriamente deverá ser feita expondo-se vários materiais a solos ou soluções nutritivas mais pobres em nutrientes e selecionando-se os materiais que se saiam melhor.
Um gigantesco laboratório agroclimatológico
O problema das mudanças climáticas globais não me parece ser de simples resolução como querem fazer acreditar certos “pensadores” armados com um manual de agricultura orgânica numa mão e um livro de Fritjof Capra na outra. Não nego que a agricultura orgânica e o misticismo possam vir a contribuir com a resolução, mas a interação entre mudanças climáticas e produção agrícola definitivamente não é uma questão simples resolvível em uma manhã cheia de palavras de ordem e frases vazias e emotivas.
A agricultura sem dúvida desempenhou um papel considerável na criação das condições climáticas atuais e futuras e ainda desempenha papel preponderante, por exemplo no Brasil, onde juntamente com o desmatamento supera as emissões de gases de efeito estufa dos outros setores da economia.
Ao mesmo tempo, a agricultura é certamente o setor mais afetado pelo clima e pelas condições atmosféricas – o crescimento vegetal, e consequentemente a produção agrícola, só é possível pela absorção do dióxido de carbono da atmosfera e por sua combinação com a água em grande parte proveniente das chuvas, intermediada pela energia da luz solar. Chama-se a isso fotossíntese. O agronegócio é movido pelo ar, pela água e pelo sol (e seu maquinário por combustíveis fósseis, ainda). As mudanças climáticas alteram as proporções de sol, ar e água e sua distribuição e com isso podem afetar de forma dramática a agricultura, apesar do que querem fazer crer determinados setores retrógados ligados à atividade agrícola.
Os possíveis cenários climáticos futuros não serão necessariamente “algo novo sob o sol”, condições nunca antes observadas. Haverá provavelmente mudanças locais de clima, redistribuições, como sub-tropicalização de regiões temperadas, a savanização de áreas florestadas úmidas, semi-aridificação de savanas, aridifição de zonas semi-áridas… Mas há hoje savanas, caatingas e desertos a partir dos quais uma região pode aprender com as soluções de outra.
O Brasil é um país continental com grande variedade climática e ecológica, e ainda agroecológica. Pode-se e se deve utilizar esta variedade como laboratório gigantesco na tentativa de se prever e, se possível, prevenir-se situações catastróficas futuras que comprometam a segurança alimentar do país. Darei exemplos didáticos.
Há indícios de que, dependendo da evolução das alterações climáticas, pelo menos parte da Amazônia poderá savanizar-se, processo denominado “Amazon Dieback”, tornando-se parecida com os atuais Cerrados. Da mesma forma, parte do Cerrado poderá se tornar mais seco, vindo talvez a se assemelhar com a região semi-árida do Nordeste brasileiro. Pode-se então aprender muito com o Cerrado e a Caatinga, mas apenas se o Cerrado não for destruído para produzir soja e a Caatinga não for dizimada para produzir um deserto.
Estes dois biomas podem ser utilíssimos como fontes de espécies e de genes para uma agricultura mais adaptada às novas condições climáticas, em que espécies e variedades cultivadas mais resistentes à falta d’água, ao calor, à pobreza de nutrientes, às doenças serão indispensáveis. E não falo em possibilidade remota. Um dos grandes problemas da produção de hortaliças atualmente são as doenças do solo, e se agravando. Espécies da família das Solanáceas, como os tomates, têm sido gravemente afetadas, por exemplo, por uma bactéria causadora de murcha com potencial de comprometer muito negativamente a produção, a temida Ralstonia solanacearum.
Pois bem, um dos campos mais promissores atuais de pesquisa visando o controle desta doença tem utilizado plantas não domesticadas do gênero Solanum, conhecidas como jurubebas, como porta-enxertos de tomate devido a sua resistência à bactéria. Nada impede que futuramente os genes mesmos das jurubebas sejam transferidos às espécies cultivadas susceptíveis ou, mais remotamente, que seja feito algum trabalho de domestificação das próprias jurubebas. Aliás, o Cerrado e as Caatingas são fontes destas espécies. Enquanto estiverem de pé.
Ernesto Paterniani, 1928-2009
“Faleceu em Piracicaba, SP, aos 81 anos, o pesquisador Ernesto Paterniani. Em 1988, recebeu do CNPq uma das mais importantes premiações do país, o Prêmio Álvaro Alberto para a Ciência e Tecnologia, instituído em 1981 em reconhecimento e estímulo a cientistas brasileiros que venham prestando relevante contribuição nos campos da ciência e tecnologia.
Em 1º de junho deste ano, recebeu o Prêmio Fundação Conrado Wessel (FCW) 2008 de Ciência Aplicada pela sua extraordinária contribuição ao desenvolvimento agrícola e nutricional do país, propiciando por meio de intensa pesquisa a melhoria das variedades do milho cultivadas hoje no Brasil.
Ernesto Paterniani é filho de José Paterniani, que chegou ao Brasil com seis meses de idade da região de Veneza e de Almerinda De Vita, uma jovem napolitana que chegou ao Brasil com 20 anos de idade. Nasceu em 1928 no bairro do Bom Retiro em São Paulo, na rua Anhaia 185, onde a parteira precisou chegar em barco devido às freqüentes inundações do rio Tietê, naquela época.
Com um ano de idade, a família transferiu-se para Piracicaba, onde Ernesto realizou os cursos: primário, ginasial, colegial e superior, este na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), formando-se Engenheiro Agrônomo em 1950. Em 1951, com bolsa da Fundação Rockefeller passou um ano no Programa Agrícola Mexicano, precursor do CIMMYT. Em 1957/58 com bolsa da Fundação Rockefeller, passou seis meses na Universidade de Nebraska e seis meses na Universidade de Iowa, trabalhando sempre com melhoramento de milho.
Exerceu atividades de docência e pesquisa no Departamento de Genética da Esalq, de 1952 a 1983, quando se aposentou.
Paterniani foi responsável pelo Banco de Germoplasma de Milho, tendo efetuado viagens de coleta visitando agricultores, reservas indígenas e países adjacentes do Brasil. Suas pesquisas foram dirigidas para a identificação e avaliação de raças de milho e métodos de melhoramento de populações, tendo desenvolvido inúmeras variedades melhoradas: Piramex, Centralmex, Pérola Piracicaba, Esalq-VF-1, Esalq-VD-2, Piranão VF-1, Piranão VD-2, Esalq VD-2 waxy, entre outras.
Desenvolveu novos métodos eficientes de melhoramento de milho, destacando-se: seleção entre e dentro de famílias de meios irmãos (CropScience 7:212), seleção recíproca recorrente com famílias de meios irmãos (Maydica, 22:141), seleção recorrente com famílias de meios irmãos e plantas prolíficas (Maydica, 23:209), seleção massal para prolificidade com controle em ambos os sexos (Maydica, 23:29), avliou o efeito do tamanho do pendão do milho na produtividade de grãos (Maydica, 26:85 e XI Congress Eucarpia, 31:04). Conduziu pesquisas visando a obtenção de milho sacarino com alto teor de açúcar, no colmo (Maydica, 25:185).
Em 1962 e 1963 exerceu o cargo de Professor Titular na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Claro para ministrar os cursos de Genética e de Evolução, atendendo ao convite do Prof. W.E. Kerr para substituí-lo por ter assumido a Diretoria Científica da Fapesp.
Em decorrência do curso de Evolução, determinou a distância efetiva de dispersão do pólen de milho no campo (Euphytica, 23:129) e conduziu seleção para isolamento reprodutivo entre duas populações de milho (Evolution, 23:534), pesquisa que se tornou clássica nos cursos de Evolução de vários países.
Paterniani desenvolveu atividades administrativas na Esalq, como Chefe do Departamento de Genética, Diretor do Instituto de Genética, Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Genética e Melhoramento de Plantas, Presidente da Comissão de Pós-Graduação e membro de várias comissões.
Contratado pelo IICA como consultor da Embrapa de 1983 a 1986, Membro do TAC (Technical Advisory Committee), do CGIAR (Consultative Group on International Agricultural Research) de 1987 a 1990.”
(Assessoria de Comunicação do CNPq)