Somos Todos Africanos!

A Ciência tem dito há muito tempo que todos nós viemos da África. Mas um estudo da Universidade da Pensilvânia, liderado pela pesquisadora Sarah Tishkoff, publicado recentemente pela Science, anunciado em diversos veículos de comunicação, inclusive no Brasil (Folha de São Paulo e Revista Veja – edição 2112, por exemplo), e já um tanto badalado aqui na internet, joga mais luz sobre a origem do homem moderno.
Em estudos de diversidade genética dos vegetais, cultivados ou não, considera-se como centro de origem de determinada espécie o local do globo onde ela apresenta a maior diversidade genética. Foi exatamente isso que os pesquisadores do referido estudo fizeram. Identificaram na África o local onde se encontra a maior diversidade genética entre nossos irmãos. Fica numa região entre a Angola e a Namíbia.
Para a espécie humana, há outro fator importante que reforça os resultados genéticos. A afinidade linguística e cultural.
Assim sendo, o Jardim do Éden fica mais próximo dos brasileiros do que poderíamos imaginar. Angola e Namíbia são países banhados pelo Oceano Atlântico, logo ali na frente. Um grande contingente de africanos daquela região veio (foi trazido) para o Brasil nos tempos da Colônia. Mais que isso, a Ciência tem dito há muito tempo que todos nós somos descendentes dos africanos – europeus, caucasianos, asiáticos, esquimós, australianos, ameríndios, todos, indistintamente.
Eu, que sempre digo ser descendente “por afinidade” dos índios Botocudos e Malalis, tenho motivos para comemorar.
Saúde a todos!

A Savanização do Mundo: um ensaio

Por Elton Luiz Valente
Antes de ir ao assunto destas linhas, é importante lembrar que o Cerrado não é Savana. A Savana encontra-se na África, em condições de solo e clima diferentes daqueles do Cerrado. O Cerrado é um bioma exclusivo da América do Sul. As duas vegetações têm alguma semelhança fitofisionômica e a Savana foi descrita primeiro, daí diz-se que o Cerrado é uma vegetação savânica, ou seja, semelhante à savana, mas não igual.
Já publicamos aqui no Geófagos um texto onde se comenta, em linhas breves e gerais, a relação do homem com vegetações de natureza savânica, como o Cerrado.
O homem originou-se na África, em meio à Savana. Isso implica dizer que ele foi gerado, moldado, forjado, sofreu os processos da seleção natural e da evolução das espécies em meio à vegetação savânica. Portanto, quando ele se encontra em um ambiente destes é bem possível que sejam ativados instintos atávicos, provocando sensações ancestrais nos seus cinco (ou seis, ou mais) sentidos. É mais ou menos o mesmo efeito que faz o cheiro, o calor e a pulsação do colo da mãe em um moleque, ou outro filhote de mamífero qualquer.
O homem enxerga o ambiente savânico instintivamente, com todos os seus sentidos ativados, gostando do que vê e se sentindo muito bem ali – aqueles indivíduos urbanos, hi-tech, que têm horror a picada de insetos e otras cositas mas, são uma variedade que surgiu recentemente na espécie, correspondem ao “erro amostral” desta minha “análise livre”. Observem que Gorilas e Chimpanzés, nossos primos mais próximos, também não gostam da floresta, eles gostam da borda da floresta. Quem gosta do interior das florestas são os primatas com rabo, nossos primos mais distantes. O homem pode até conservar um pedaço de floresta numa encosta, num canto qualquer, mas ele não ama a floresta, ao contrário, o homem tem medo dela, lá ele se sente ameaçado, uma presa fácil. Diferente dos ambientes savânicos, que fazem parte da sua essência evolutiva. Fazer com que o homem ame ou pelo menos preserve as florestas não é tarefa fácil, mesmo mostrando os inúmeros benefícios que a conservação delas pode nos render.
Vejam que a primeira providência do colonizador é o desmatamento. Ele precisa de área para suas culturas e gosta muito daqueles campos imensos, savanizados, que ele próprio produz. O homem savanizou o globo terrestre. A savanização do mundo é sua obra máxima, natural, com um viés bíblico, profético. É o seu legado. Exceto por uma mancha de floresta amazônica aqui, umas coníferas ali (que estão sofrendo constante pressão de desmatamento), o restante do mundo, por onde o homem passou, já está savanizado. Some-se a isso a pressão econômica do agronegócio, que impulsiona o homem a agredir a própria Savana (o Cerrado que o diga), ou seja, por dinheiro ele é capaz de agredir o seu ambiente mais querido, “o seu lar primevo” – a ganância é outro traço marcante de nossa personalidade – Bingo! Não vai sobrar floresta no mundo. O homem vai desmatá-las todas. A degradação ambiental, as mudanças climáticas e outras questões direta- ou indiretamente vinculadas aos desmatamentos, se possível, só serão resolvidas depois, podem apostar!

PARA ESCLARECER ALGUNS FATOS

Por Elton Luiz Valente

Eu imaginava até há pouco que não haviam dúvidas, tanto para os nossos leitores mais assíduos, quanto para os leitores fortuitos, de que o Geófagos é uma página que tem como norte a Ciência e, entre outras coisas, defende a Teoria da Evolução de Sir. Charles Darwin como a explicação lógica, fundamentada em bases científicas, para explicar a vida na Terra. Mais que isso, consideramos também que Darwin é um marco na história da ciência e da humanidade.

Às vezes nossos artigos, principalmente os meus, são redigidos com uma boa dose de bom humor e ironia. O que pode ser percebido na maioria dos meus textos, inclusive nesse último, intitulado “O Vestibular do Juízo Final”.

Parece que alguns leitores não entenderam isso, ou pelo menos um, o que já é suficiente para justificar este esclarecimento. Referindo-se ao artigo mais recente, e confundindo tudo, o leitor me enviou ontem um e-mail com a seguinte afirmação:

“… infelizmente temos uma dicotomia insanável: sou ateu, não posso considerar textos ou deduções ou considerações que não tenham base lógica, comprováveis e acima de tudo, com evidências” (sic.).

Santa Maria Madalena! Meu Deus! São Charles Darwin! Alguém que “não pode considerar” determinados textos, quaisquer textos, é um fundamentalista de sua própria crença, seja ela qual for; mesmo a crença de que não existe Deus. Pois o fundamentalista não admite nenhuma forma de pensamento diversa da sua. Não admite nem mesmo conhecer os argumentos da parte contrária. É daí que nasceram todos os males da humanidade. Vale a pena repetir! É daí que nasceram todos os males da humanidade!

Quem quer defender uma causa com bases éticas, morais e científicas não pode abster-se de considerar os argumentos da outra parte. É o mínimo que se espera da conduta de adversários dignos. Até porque a crítica bem fundamentada é aquela que se espera vir de uma autoridade que detenha pleno conhecimento do objeto criticado. Senão ela não tem valor, torna-se vazia em si mesma.

A quem ainda não percebeu, o Geófagos defende a Teoria da Evolução, o Geófagos é Darwinista, mas nós não somos radicais. Ao contrário, nós defendemos o diálogo bem fundamentado, sem viés fundamentalista, sem radicalizar, sem fazer da ciência um dogma. Portanto não apoiamos, por exemplo, atitudes como a de Richard Dawkins na sua “cruzada” contra os Criacionistas, ainda que Dawkins seja um cientista brilhante, como o é.

O objetivo deste cronista que vos escreve não é jactar-se ateu, ou transformar Criacionistas em Evolucionistas, ou Religiosos em Ateus. Não! O que se quer é apenas falar de Ciência numa forma mais “palatável”, às vezes ironizando, às vezes brincando com temas bíblicos. E nesta área da religiosidade, mostrar, com argumentos racionais, plausíveis, com bom humor, que os seres humanos não são anjos decaídos e sim animais diferenciados em alguns aspectos (alguém já disse algo parecido com isso, não me lembro quem).

É preciso respeitar todas as formas de entender o mundo. Elas só não podem virar dogmas, nem projetos políticos, nenhuma delas. É contra isso que se precisa lutar. A espiritualidade, a religiosidade, que são sentimentos entranhados na essência humana, deveriam ser usados apenas para fins pacíficos e lúdicos, nada mais. E que não existissem problemas em brincar com essas coisas.

Para finalizar, eu, particularmente, considero que Deus é apenas o efeito colateral da inteligência humana. Mas devo, no mínimo por questões éticas, respeitar aqueles que crêem na Santíssima Trindade, ou coisa parecida, desde que eles também respeitem a minha forma de enxergar o mundo e o universo. Mas para isso, eu não me abstenho de ler bons livros, a Bíblia inclusive, nem mesmo aqueles panfletos que “missionárias” e “missionários” eventualmente deixam em minha porta. Somos livres para discordar e criticar, mas é preciso ter conhecimento e bases argumentativas sólidas, racionais e éticas. Para tanto é preciso ler, TUDO, mesmo que você não concorde com nada. É o que eu recomendo para os nossos estimados leitores.

E não me abstenho de desejar um Feliz Natal a todos, indistintamente.

O Vestibular do Juízo Final

Por Elton Luiz Valente

No meu artigo anterior, fiz uma defesa do modo de vida Neolítico (e deveria ter recomendado também este post aqui, do Ítalo Rocha). No meu entusiasmo por reforçar essa defesa do Neolítico, admito que tenha cometido um possível equívoco. Eu afirmei que vamos todos pro buraco com nossa parafernália hi-tech, de uma tacada só, xeque-mate! E talvez não seja bem assim.

Digo isto porque, colocando a coisa dessa forma, eu estou subestimando os meus conterrâneos da Cabeceira do Rio São Mateus, do Jequitinhonha, do Sertão Nordestino, os Caboclos do Pantanal e da Região Amazônica. Essa gente, para usar uma expressão muito bacana de um amigo da pós-graduação, é uma “Galera Roots”. Não é qualquer pirotecnia do Criador em fúria que vai acabar com eles, não! Pois trata-se de um povo que sabe lidar com a natureza e com gente irascível, geniosa e estressada como o Onipotente quando se zanga. E ao que tudo indica, de acordo com os Profetas do Apocalipse e do Aquecimento Global, vêm dias difíceis por aí. O Criador está zangado e vai aprontar das suas, de novo.

Gosto muito dessa expressão “Roots”, não pelo que ela sugere de rusticidade, mas pelo que ela revela de apego à terra, de intimidade com o solo, com a natureza, com os ciclos da natureza, com o ecossistema. E isso vai fazer uma diferença danada “no dia do estrondo e do gemido”. Daí a minha retratação, pois as gentes dos nossos sertões estão habituadas com dificuldades, é o dia-a-dia delas, é a escola delas – a escola da vida. Leiam “Vidas Secas” de Graciliano Ramos; leiam “Grande Sertão: Veredas” de João Guimarães Rosa e vocês vão entender melhor do que eu estou falando.

Responda rápido, você saberia reconhecer no campo algumas espécies como Capiçoba, Jequeri, Lobrobô, Araruta, Caratinga e Jacatupé? Não? São vegetais nativos comestíveis e muito nutritivos, uns fornecem folhas, outros tubérculos. Você já comeu sementes de Cansanção, Indaiá, Coquinho-meloso e frutos de Maria-preta, Jataí, Jenipapo, Saborosa e Araçá? Não? Também são nativos e apresentam alto valor nutricional. Você sabe o que é um Jequi, Arapuca, Arataca, Mundéu e Esparrela? Vou lhe ajudar, estas cinco são Tecnologias Neolíticas, uma para capturar peixes e as outras para capturar animais silvestres. Você saberia construí-las? Não? Que pena!

Sinto muito em lhe informar, mas você não será aprovado no Vestibular do Juízo Final. Não vai receber o passaporte para integrar a tripulação da Nova Arca de Noé que, muito provavelmente, vai navegar em águas muitíssimo turbulentas e sobreviver ao Armagedon, para a glória do Todo Poderoso. Pois você não é Roots. Você é da espécie Homo sapiens urbanus da variedade hi-tech, e só os Neolíticos terão alguma chance. Só os Roots sobreviverão.

No dia em que a Grandiosa Babilônia ruir (Apocalipse: 18), todos serão chamados. Só os Roots serão escolhidos (Geófagos: 12-2008). Que o Senhor seja louvado! Amém!

Ninguém vai nos convencer, nem mesmo o clima!

Por Elton Luiz Valente

O Período Neolítico, que teve seu início há cerca de 10.000 anos, é aquele em que o homem deixa sua vida nômade, de caçadores-coletores, para fixar-se em aldeias. Isso foi possível com o domínio da agricultura, da domesticação de animais e uma série de outras conquistas que permitiram o sedentarismo.

Embora o homem nunca tenha deixado de ser guerreiro (nesse sentido George W. Bush é pré-histórico), no Neolítico a vida era bem melhor que antes. A alimentação era mais farta e de melhor qualidade, havia excedentes agrícolas, o que permitiu ao homem (e à mulher) dedicar tempo a outras atividades mais lúdicas, como as artes. Isso culminou na invenção da escrita. Nesse momento, com a invenção da escrita, o homem deixa a pré-história para ingressar na história, na Era do Bronze, do Ferro e etc. Daí pra frente todo mundo conhece o enredo desse tango do argentino doido.

E o final deste tango é o óbvio. Podem usar a equação que quiserem, não há crescimento econômico que se equalize com sustentabilidade. São coisas diametralmente opostas e pronto! Crescimento econômico, que todos os países (e políticos) almejam e defendem, é sinônimo, ipsis litteris, de drenagem dos recursos naturais. Sustentabilidade, se é que ela possa existir na presença do Homo sapiens, é exatamente o oposto.

Então voltemos ao Neolítico. Ali está um modo de vida que eu, particularmente, admiro muito (meu sonho dourado de Engenheiro Agrônomo é ter um sítio, uma fazenda – sou filho de agricultor). O modo de vida Neolítico é tranqüilo, sem muitos excessos, sem muitos impactos ambientais.

Mas a sina do homem é ser hi-tech. É ter um carrão de combustão interna, de preferência com a descarga furada para roncar mais grosso; é ter iPod (não, agora é iPhone 3G), laptop, celular, TV de plasma, LCD, DVD, home theater (nem sei se é assim que se escreve essa p….) e o escambau … e um shopping center logo ali na esquina. Ou seja, todo mundo quer um modo de vida norte-americano, de alto consumo.

Pergunte nos fóruns internacionais, pós-Kyoto, onde se discutem essencialmente as questões do aquecimento global e seus derivativos, se eles estão dispostos a retornar ao Neolítico. Pergunte nas ruas, ao militante panfletista do ambientalismo se ele se dispõe a adotar um modo de vida Neolítico. Eu me arrisco a adivinhar a resposta deles. É NÃO!

Todos querem ser hi-tech, com o padrão de consumo norte-americano, ninguém quer retroceder. E talvez seja exatamente esta uma das poucas chances que teremos: retroceder ao Neolítico e fazer controle de natalidade.

Mas todos queremos ser hi-tech, ê vida boa! Já pensou? Da caverna ao Blue-Ray Full HD, quem diria! Ninguém vai conseguir nos convencer do contrário, nem mesmo o clima. Às favas com o Ministério da Saúde! Se é pra morrer, morreremos cheirando fumaça de óleo diesel, plugados na Web, hi-tech, e dane-se! Resultado? A Terra vai se livrar de nós num sacolejo. Pá-Pum! Um só estrondo, um só gemido e tchau!

Judeus nos sertões

Em minha adolescência, a curiosidade natural pelas origens, conjugada com a leitura entusiasmada da Pedra do Reino, de Ariano Suassuna, levaram-me a pesquisar a genealogia da minha família junto a parentes mais velhos do sertão paraibano. A genealogia, junto com a heráldica, tornou-se por um bom tempo um hobby muito querido, a que dediquei muitas horas boas. O doutorado infelizmente interropmpeu isto, mas ficou o interesse.
Em minha pesquisas mais de uma vez encontrei referência à presença de cristãos-novos, ou marranos, na ascendência de muitas famílias sertanejas, inclusive a minha. Estes cristãos-novos eram judeus portugueses e espanhóis, sefaraditas, convertidos à força no início da idade moderna na Península Ibérica. Muitos, apesar da conversão superficial, mantinham em segredo práticas da antiga religião e eram chamados de judaizantes. Com a colonização das Américas, muitos fugiram para cá e uma quantidade expressiva parece ter se deslocado o mais para o interior possível, procurando os sertões, terras onde a mão firme da Inquisição dificilmente alcançaria. Apesar de o catolicismo se ter tornado a religião da maioria dos descendentes destes judeus conversos, uma quantidade notável de rituais de origem claramente judaica persistiu em muitas comunidades sertanejas.
Depois de ler em um jornal que um rabino americano identificara costumes claramente judeus em um lugarejo no extremo oeste do Rio Grande do Norte, a fotógrafa Elaine Eiger e a jornalista Luize Valente tiveram a idéia de fazer um documentário sobre as práticas judaicas mantidas por diversas famílias do sertão nordestino. Surgiu daí o interessantíssimo “A Estrela Oculta do Sertão“. Li esta semana um artigo na revista Smithsonian, “The ‘Secret Jews’ of San Luis Valley”, que me mostrou algo óbvio e em que no entanto nunca tinha pensado muito: a presença de descendentes de judeus sefarditas em todo lugar onde houve colonização ibérica e a possibilidade de se comprovar geneticamente o que talvez não passasse de lendas ou tradições mal contadas.
Uma equipe de médicos americanos, discutindo sobre a incidência incomum de um tipo agressivo de câncer de mama em mulheres de origem hispânica do sul do estado do Colorado, na fronteira com o Novo México. Ao contactar uma oncologista de Nova Iorque, Ruth Oratz, pedindo conselhos sobre o caso, ela disse de forma enfática “Estas pessoas são judias, não tenho dúvidas”. Este tipo de câncer é causado por uma mutação observada quase que exclusivamente em descendentes de judeus do centro e leste da Europa. Claro, estas mulheres são hoje católicas, mas sua genética denuncia que são descendentes de cristãos novos que procuraram o sertão dos Estados Unidos. Por sorte, a Inquisição não dispunha da tecnologia de screening genético.

Centenário de Josué de Castro

O pernambucano Josué de Castro, falecido em Paris em 1973, completaria hoje cem anos de idade. Apesar de médico por formação, a contibuição intelectual de Josué de Castro se estende para as áreas de antropologia, geografia, nutrição, sociologia… Grande estudioso do fenômeno da fome, seu livro mais conhecido talvez seja “Geografia da Fome“, de 1946, em que analisa profundamente o problema da fome no Brasil. Segundo o próprio Castro, sua atenção para o fenômeno da fome foi despertada observando a ação humana nos mangues e alagados do Recife. É um clássico brasileiro, extremamente atual, mas parece que meio esquecido pela geração mais nova. Fica aqui esta pequena homenagem dos Geófagos.
Ítalo M. R. Guedes

Pero Vaz de Caminha, a Heterose, a Evolução e a Raça Brasileira: Um Ensaio

Por Elton Luiz Valente
Senhores, isto não é uma hipótese, muito menos uma tese, nem contestação, talvez uma constatação e apenas um ensaio, uma digressão para aproveitar o restinho das férias.
Nestes tempos politicamente corretos, mas de idéias vazias e interesses torpes, uma expressão que traz a palavra “raça”, no que se refere às populações humanas, deve causar algum frisson, tanto entre os bem intencionados quanto entre os hipócritas. Digo já! Sou contrário às “cotas raciais” ou qualquer outra coisa do gênero. Na sua tentativa de juntar pela força da lei, as cotas segregam e eu sou a favor da mistura livre, da beleza da miscigenação. Nesse quesito, a História Brasileira é quase uma fábula, e nem é necessário citar Darcy Ribeiro, Gilberto Freyre ou Sérgio Buarque de Holanda, renomados estudiosos da Brasilidade. Mas sobre a fábula, o médico, antropólogo, etnólogo, professor, ensaísta, poeta e primeiro radialista do Brasil, Roquette-Pinto, disse certa vez: “Martius demonstrou que a história do Brasil seria fábula ou romance se lhe faltassem as bases da etnografia regional, e da etnografia geral“.
Então vamos à História e aos fatos. Aqueles europeus caucasianos, ou judeus, ou outros quaisquer, segregacionistas, endogâmicos, principalmente os mais ricos, os da “nobreza”, da Europa, Estados Unidos, África do Sul (do apartheid calvinista), Austrália e etc., que por razões segregacionistas diversas como econômicas, religiosas ou de puro preconceito, praticavam e ainda praticam a endogamia, produziram como resultado aquela gente com muito peito e pouca bunda, para ficar só no fenótipo.
Por outro lado, aquele europeu que veio para o Brasil, sem pendor ou pudor segregacionista e com muita necessidade, e se deslumbrou com nossas índias nuas e com as pretinhas africanas cheias de charme, produziu no seu afã um choque genético racial, uma heterose, um vigor híbrido, um verdadeiro avanço no sentido da evolução humana, tanto Darwinista quanto sócio-cultural ou etnogenética, em todos os sentidos. Eis a Mulher Brasileira, com peito, bunda, brilho, inteligência e etc. Ou alguém aí não conhece a Juliana Paes?
Estes europeus, dados à miscigenação, vieram já no primeiro contingente da Esquadra de Cabral que aportou nestas terras. Aqueles dois grumetes que fugiram e os dois degredados que aqui foram deixados certamente estão entre eles e, de quebra, inauguraram a raça brasileira. Mas o ilustre da Esquadra é outro, chama-se Pero Vaz de Caminha. Há um trecho de sua famosa Carta – que a hipocrisia da Igreja Católica cortou de nossos livros de história – em que ele descreve, com maestria e deslumbramento, a anatomia pubiana de nossas índias. Vou transcrevê-lo daqui a pouco. Salomão, quando comparado a Pero Vaz de Caminha, perde de longe com o seu pretenso Cântico dos Cânticos. O poema de Salomão é uma tentativa de sedução fracassada de um bode velho. O trecho da carta de Caminha é o deslumbramento de um artista diante do novo, do inusitado e do belo.
E não sejamos machistas. A coisa aconteceu também, ou principalmente, do ponto de vista das mulheres. Muitas das Damas da Corte e muitas das mulheres dos senhores de engenho, barões e coronéis se deixaram seduzir pelos índios e pelos negros africanos.
Vide o caso (com trocadilho e em todos os sentidos) de Ceci e Peri – a nobre portuguesa e o índio guarani – Ficção? José de Alencar sabia das coisas! E tem mais. As índias e africanas também se deixaram seduzir por aqueles branquelas europeus. Na região leste de Minas Gerais tem uma história emblemática, em que a filha do Cacique de uma tribo dos Aymorés, Lorena, se apaixonou por um colonizador português. Diante da proibição veemente do Cacique, que era contra o romance, ela pulou de um despenhadeiro, na face escarpada de um paredão de granito que hoje recebe seu nome, Pedra Lorena, na cidade mineira de Aimorés. Triste e sublime amor. Qualquer semelhança com Romeu e Julieta ou Ceci e Peri, ou Iracema, terá sido mera coincidência.
Mas para a felicidade geral da nação, são muitas as histórias menos trágicas e mais libertadoras, como o famoso casamento de João Ramalho com Bartyra, filha do Cacique Tibiriçá, para horror de Padre Anchieta e seu séqüito de jesuítas do Planalto de Piratininga (São Paulo), pois João Ramalho, além de ter muitos filhos com outras índias, era um homem casado, cuja família ficara em Portugal.
Ainda no século XVI, os calvinistas (intolerantes e radicais extremados), cujas aventuras fracassaram por aqui, espalharam boatos de toda sorte na Europa, principalmente na França, apimentando-os com a nudez de nossas índias, para detratar o ilustre Nicolas Durand de Villegagnon, famoso Cavaleiro de Malta, Diplomata e Almirante francês que fundou a lendária França Antártica no Brasil. A França Antártica foi uma colônia francesa instalada no Rio de Janeiro por Villegagnon entre 1555 e 1567, e teve até uma capital na Baía de Guanabara, denominada Henriville em homenagem a Henrique III da França. Consta que a confusão armada pelos calvinistas envolveu até a belíssima Jacy, filha do temido e respeitado Cacique Cunhambebe, da tribo Tupinambá, amigo e colaborador de Villegagnon, com o qual redigiu um dicionário Tupi-Francês. E a França Antártica se perdeu, mais por conflitos internos e desentendimentos entre os próprios calvinistas, que aqui estiveram a convite Villegagnon, do que propriamente pela resistência portuguesa. Ou seja, fracassaram porque não souberam lidar com a liberdade que a natureza lhes proporcionava aqui.
E não vamos nos esquecer de Chica da Silva (ou Xica da Silva, como queiram), que é em si o resultado da preta no branco, e que encantou de forma arrebatadora o famoso contratador João Fernandes de Oliveira, nada menos do que o então mais poderoso e mais rico cidadão destas plagas. E a mulata se tornou A Rainha de Diamantina (Arraial do Tijuco) no século XVIII.
Se estas são as histórias dos famosos, dos nobres e as filhas dos caciques que, portanto, foram dignas de registros históricos, imagine-se o que não fez a peãozada, a plebe, e as não menos graciosas índias, negras e mulatas menos famosas, ou seja, o povão, principalmente os que aqui chegaram nos primeiros anos da colonização, como aqueles dois grumetes foragidos da Esquadra de Cabral, dos quais nem se sabe o nome, mas que escaparam de uma existência de horror e sevícias (sendo eles os seviciados) para viver a liberdade plena sob a glória e sobre as filhas de Tupã.
Então, para finalizar, voltemos à Carta de Caminha, onde ele descreve as índias de Pindorama. Este trecho da Carta deveria fazer parte da letra do Hino Nacional Brasileiro, de tão revelador que é. Primeiro porque Caminha demonstra conhecer bem o assunto, quando compara a anatomia feminina entre nossas índias e as damas de Portugal. Segundo, por sua segurança em tratar deste assunto com o Rei de Portugal e ainda dizer que as daqui são mais formosas do que as de lá. Terceiro, se Caminha com todo o domínio da matéria ficou deslumbrado com nossas índias, imagine quem ainda não tinha visto uma mulher completamente nua, ao vivo, e se deparou com uma Cunhã-Porã nas praias brasileiras. É impossível não misturar as raças.
Eis o trecho da Carta:
“…Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem novinhas e gentis, com cabelos muito pretos e compridos pelas costas; e suas vergonhas, tão altas e tão cerradinhas e tão limpas de cabeleiras que, de as nós muito bem olharmos, não se envergonhavam.” “…E uma daquelas moças era tão tingida de baixo a cima, e certo era tão bem feita e tão redondinha, e sua vergonha tão graciosa que a muitas mulheres de nossa terra, vendo-lhe tais feições envergonhara, por não terem as suas como ela…
E fim de papo!

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