Luz + Água + Solo = Vida Abundante

(Tocando em frente…)
A vida, como nós a conhecemos, embora detentora de princípios e processos complexos, muitos deles ainda pouco conhecidos, manifesta-se sob uma lógica muito simples, como a expressada pela “equação” título deste texto: Luz + Água + Solo = Vida Abundante.
Nascemos “pisando o solo”. Talvez por isso a humanidade o negligencie tanto. Em uma das muitas e impagáveis canções metafóricas do saudoso Raul Seixas há uma frase em que ele denuncia o que muita gente pensa: “… o chão é o lugar de cuspir” (está na canção “De Cabeça-Pra-Baixo”).
A humanidade tem “cuspido” bastante sobre o solo. No sentido estrito e no sentido lato. O solo e as coleções de água viraram nossos depositários escatológicos.
Como já disse, nascemos “pisando” o solo. A água foi, e ainda é, o primeiro e mais eficiente veículo que encontramos para “levar para longe de nós” os nossos dejetos e coisas indesejáveis, ou que perderam o valor.
A Ciência do Solo, talvez por herança, também padece desse “preconceito”. Há um texto no Geófagos tratando deste assunto. Se não o melhor, pelo menos um dos melhores textos já publicados aqui. É de autoria de nosso Guru Ítalo Rocha. O texto é este: Ciência… do solo? Não deixem de ler!
Voltando à “equação”:
1) Luz: (a) é a energia motriz da fotossíntese, nossa “fábrica de alimentos”; (b) mantém o planeta aquecido em temperaturas amenas, com grande quantidade de água líquida superficial.
2) Água: no estado líquido é o veículo fundamental da vida. É usada em todos os processos, reações e mecanismos de construção e desconstrução dos seres vivos.
3) Solo: (a) todos os seres vivos dependem do solo, direta- ou indiretamente; (b) permitiu que a vida alcançasse a sua maior variabilidade possível em todos os continentes e ecossistemas.
Vejam que, garantidas estas três coisas, luz, água e solo, temos tudo o que necessitamos para sobreviver, como espécime e como espécie. O resto é conforto, ganância e ilusão. Não necessariamente nesta ordem.
A humanidade e a civilização tiveram grandes saltos evolutivos, que possibilitaram a ocupação de todo o Globo Terrestre. Como resultado disso, podemos dizer que “hoje” temos uma vida boa, como nunca havíamos experimentado antes.
Mas, ao longo desse caminho nós nos perdemos, de forma imperdoável, acumulando “riquezas”, explorando a natureza de forma predatória e nos distraindo “buscando” entidades religiosas, místicas e mitológicas que não nos acrescentaram nada de pragmático. Tudo isso de forma irracional. O Sol, pelo menos, já teve seus dias de Divindade. A Terra também, nas culturas Celta e Grega. Mas só teremos, realmente, o direito de nos considerarmos civilizados, no dia em que todo ser humano entender e respeitar o Sol, a Água e o Solo como se estes fossem uma espécie de Santíssima Trindade, genitora dos filhos de Gaia, Geófagos por excelência.
Evidentemente, e por razões óbvias, não estou pregando aqui que essa Trindade se torne objeto de culto e adoração religiosa. É claro que não, ora pois, pois! Quero lembrar apenas que a vida é modesta em suas exigências. O quanto o Sol, a Água e o Solo merecem ser reconhecidos e respeitados por sua importância nesse processo. E o chão, enfim, deixe de ser um lugar de cuspir.

O Homem e o Planeta: a real dimensão de nossa grandeza, ou pequenitude!

Existe um provérbio onde se diz que não há soluções fáceis para problemas difíceis. Corroborando o velho provérbio, encontramos obstáculos praticamente intransponíveis para a equalização das questões ambientais, sociais e econômicas da civilização. Primeiro porque, como já afirmei aqui no Geófagos, crescimento econômico não se harmoniza com sustentabilidade ambiental, são coisas diametralmente opostas, uma só vai em detrimento da outra. Além disso, o maior dos problemas encontra-se no próprio homem, pois há princípios humanos que são imutáveis, daí o grande sucesso universal das Tragédias Gregas.
Responda rápido: qual é a espécie que melhor representa o Planeta Terra?
Se as respostas a esta pergunta fossem registradas, eu me arrisco a dizer que por maioria esmagadora de votos a vencedora seria a espécie humana. Digo mais, dificilmente alguém questionaria a pergunta, argumentando que ela foi mal formulada, porque uma só espécie não é suficiente para representar a Terra, ou a Biosfera.
Sabem o que é isso? Desculpem a franqueza, mas chama-se Megalomania, Arrogância, Pretensão, Egocentrismo e Estupidez. A razão disso, Darwin explica muito mais que Freud. Faz parte da natureza humana achar-se como tal, isso foi importante em um passado muito remoto.
Agora nós estamos na onda de “destruir” e “salvar” o planeta. É mais um enredo de epopéia maniqueísta megalomaníaca que nos propomos. Vez em quando a humanidade, desde que ela assim se compreende, é assaltada por um delírio coletivo desta natureza, respaldado por quase nada de ciência e tudo de sensacionalismo, quando não misticismo e outros sentimentos ungidos na fonte alucinógena da espiritualidade. E lá vamos nós outra vez, nestes tempos de aquecimento global.
O modelo de agricultura que se pratica hoje, as agressões aos solos, à cobertura vegetal, aos rios, lagos e oceanos são maiores e mais comprometedores do futuro do que “as emissões de gases” simplesmente. Estes estragos remontam ao Holoceno, desde que o homem deixou de ser uma espécie com um número limitado de indivíduos, relativamente integrada ao ecossistema, e tornou-se uma espécie cosmopolita, inventora de tecnologias. Foi bom para a espécie e muito ruim para a superfície do planeta. A atmosfera entrou nessa dança há pouco mais de um século, ou dois. Mas uma chaminé de usina soltando fumaça a todo vapor e um engarrafamento de automóveis, caminhões e ônibus produzem um enorme efeito na fotografia, e na tela.
O homem certamente é responsável por uma parcela no atual aumento da temperatura global. E o vilão dessa história não é só as emissões diretas e indiretas de gases, como querem muitos. Um bom exemplo são as mudanças no albedo (relação entre a luz recebida e refletida) da superfície terrestre, causadas pelas atividades humanas, que certamente têm alguma relação com o aumento da temperatura global. Mas, ao que tudo indica, ninguém quer saber deste assunto, muito menos do fato de que a Terra á capaz de aquecer-se e resfriar-se sozinha. A “razão do evento” tem de estar no fato de que “somos nós os protagonistas”!(?).
De qualquer forma, o homem faz parte desta equação, mas estamos superestimando “nossa variável” porque somos uns megalomaníacos incorrigíveis (sem contar o apoio dos espertalhões). Temos certeza de que somos o supra-sumo da criação(?), temos Deus(?) a nosso favor(?), somos capazes de salvar o planeta(?) ou acabar com ele de vez(?). Somos capazes de mudar o clima global com a nossa presença(?). Somos capazes de empurrar, chutar o planeta para uma era de aquecimento(?), que será seguida de uma glaciação(?). Quanta pretensão a nossa! Na verdade, somos o nosso maior problema. Nós não oferecemos nenhuma ameaça grave à existência deste Planeta. Somos ameaça grave, gravíssima, sim, à nossa própria existência. E quando se diz “salvar o planeta”, entenda-se “salvar a nós mesmos” com a maior dose de egocentrismo possível, pois nós nos consideramos como o próprio planeta. Comparando com a idade geológica da Terra e da grande maioria das espécies, ou a classe dos mamíferos, nossa espécie chegou aqui há pouquíssimo tempo, no último minuto, e queremos ser “os donos da bola” e estabelecer as regras do jogo.
E isso vai continuar assim, pelo menos enquanto a Terra não “se aborrecer” com a nossa presença e não nos transformar em fósseis de dentes arreganhados feito os Dinossauros. Vejam que para isso basta UM ÚNICO “sacolejo”. E nós crentes que a ameaçamos – provocação é diferente de ameaça – Ela, sim, ao mesmo tempo que nos oferece as condições básicas de sobrevivência, nos oferece também diversas possibilidades, potencialíssimas, de acabar com a nossa raça.
Se fôssemos mais humildes, mais racionais e menos fantasiosos, talvez pudéssemos divisar a verdadeira dimensão de nossa pequenitude, respeitar, de verdade, os ciclos da Natureza, viver melhor e, quem sabe, ser “grandes” de verdade, e até arriscar uma proposta menos sombria em relação ao nosso futuro.

No Divã do Geófagos: o Geófagos também é terapia!

Nosso amigo Manuel, que muito nos honra com sua presença constante no Geófagos, muito apropriadamente qualificou de “peregrinação” as minhas andanças dos últimos tempos. Já fiz outras peregrinações além destas últimas. Sinto-me razoavelmente qualificado para falar deste assunto.
Tenho visto, entre colegas e professores das universidades, pessoas que desconhecem a realidade do Brasil, desconhecem as carências, as dificuldades que os brasileiros mais humildes enfrentam. Podem até ter alguma informação a respeito, mas não esbarraram com isso na prática. Existe um importante Brasil rico, de que falei no texto passado, mas existe outro, o Brasil carente, que conheço e reconheço ao longo de minha vida.
No início de minha pós-graduação eu assistia a um excelente seminário de um grande amigo nosso, pessoa muitíssimo cara ao Geófagos. Ele falava sobre os fitólitos, assunto interessante, curioso e de grande relevância acadêmica em diversas áreas. Uma “autoridade” do Departamento de Solos da UFV questionou-o sobre a “aplicação social prática” de seu estudo. Eu esperei impacientemente que alguém da platéia lhe desse (à “autoridade”) uma resposta à altura. Havia gente gabaritada para isso lá. Eu era um “calouro” ali naquele momento. Não me manifestei, embora todos os Anjos e Demônios que me acompanham me impelissem para isso. Eu tinha, e tenho, a dizer àquela “autoridade” que ela nos apontasse uma, apenas uma “aplicação social prática” da Teoria da Relatividade, da Teoria da Evolução, entre outros tantos exemplos, como o Raio Laser, que quando foi inventado dizia-se que era uma solução sem problema (isso é histórico). Nada pode pautar a Ciência, exceto a ética, mesmo assim, em alguns poucos casos onde isso se faz necessário. A Ciência pode, e deve, colaborar nas questões sociais, mas quem tem o dever de resolvê-las é a administração pública, é o setor político-administrativo, são os Três Poderes da República no Brasil.
Estou tecendo este comentário porque estive com estes dois Brasis nesta minha atual peregrinação. Mas esta não é a primeira vez que os encontro. Minha biografia e meu currículo lattes mostram e confirmam isso.
Recomendo aos amigos, colegas e aos simpatizantes do Geófagos, que não percam a oportunidade de conhecer o Brasil. Aproveitem uma de suas férias e viajem de ônibus pelo Brasil afora, não fica caro. Repito, não pode ser de avião ou automóvel, é preciso viajar de ônibus, preferencialmente nos mais humildes, de localidades distantes, para encontrar e reconhecer o Brasil de que falo.
No meu retorno de Jataí, em Goiás, para Viçosa, viajei no Gontijo 11240, linha de Porto Velho a Mantena. Recomendo também o Expresso Linhares, de Jaboticatubas, na Serra do Cipó, ou a Viação Araguarina de Goiás. Tais viagens serão muito proveitosas se forem realizadas como complemento ao melhor dos exercícios, que é trabalhar com Extensão Rural em municípios com menos de 10.000 habitantes.
A peregrinação voluntária, em busca de sabedoria, pode nos ajudar muito. Pode ajudar a ponderar nossas atitudes pessoais e ponderar o exercício de nossa vida profissional. Mas tenha cuidado. O seu “Caminho de Santiago de Compostela” só terá validade se você estiver atento ao que busca. Senão você pode sair de lá pior do que quando entrou!

O Auto da Barca do Inferno: Uma Referência

Por Elton Luiz Valente

No próximo dia 12 comemora-se o bicentenário de nascimento de “Tio Charles” (Darwin) e 150 anos da publicação de sua grande obra A Origem Das Espécies. Para a Comunidade Geofágica, esta é uma data festiva e de altíssima relevância histórica, principalmente para a História da Ciência.

Estive neste fim de semana em Belo Horizonte. Não resisti à tentação de assistir ao filme O Dia Em Que a Terra Parou, uma adaptação rasa (para não dizer plana, com ligeira inclinação para o ralo) do original de 1951, que já não era lá grande coisa, mas pelo menos tinha a Guerra Fria como trunfo (o enredo da canção homônima de Raul Seixas é muito mais plausível).

Ora direis, e daí? O que tem a ver uma coisa com a outra? Darwin, o filme, O Auto da Barca do Inferno (de Gil Vicente) e os propósitos primevos do Geófagos? Vamos lá!

O “quase misterioso” Gil Vicente encenou O Auto da Barca do Inferno pela primeira vez em 1517, em Lisboa, Portugal. A peça é uma crítica impecável às organizações sociais humanas. Uma obra prima. Portanto, Gil Vicente é considerado o fundador da moderna dramaturgia em língua portuguesa. A peça é uma alegoria dramática do julgamento das almas. Há duas barcas à espera: uma, a que vai levar a maior parte dos julgados, é guiada pelo próprio Diabo, a outra é guiada por um Anjo. Entre os “réus” há figuras “ilustres” da sociedade. Ou seja, figuras tacanhas, cuja “relevância” está em promover os vícios que corroem a humanidade.

Quanto ao filme O Dia Em Que a Terra Parou (em ambas as versões), a humanidade é, ela própria, retratada como o seu maior inimigo. Em tempos de “aquecimento global”, esse argumento (citando Erich Remark) não traz ‘nada de novo no front’. Já discutimos no Geófagos que a Terra não precisa de ninguém para “salvá-la”, ela se salva sozinha, sempre foi assim, ela é auto-regulável. Nós é que precisamos nos salvar de nós mesmos.

Darwin nos deu, senão a maior, pelo menos uma das maiores contribuições neste sentido. Mas o homem tem um problema freudiano com a evolução. O homem se recusa a aceitar que não é “a obra máxima” da criação de Deus, menos ainda da Natureza. Note-se que para ser a obra máxima da criação precisa-se de um criador, de uma figura patriarcal, que se encaixe perfeitamente em um universo de dimensões imagináveis, que esteja ao alcance de nossa compreensão demasiadamente humana, urdido em um enredo de epopéia maniqueísta. Como “constante de ajuste”, encaixa-se nessa equação a hipocrisia (pois todos têm necessidades forjadas na evolução das espécies e muitas destas necessidades são conflitantes com as “determinações do criador”).

Daí, Tio Charles, cujas armas são argumentos embasados na razão, na lucidez e no bom senso, não tem como lutar, muito menos vencer, essa batalha que é travada no terreno das freudianidades humanas. Se fossem superados esses vícios freudianos e essas ilusões, talvez pudéssemos, quem sabe, chegar ao super-homem de Nietzsche.

Platão tentou nos tirar da caverna uma vez. Darwin, com toda sua sabedoria, humildade e boa vontade nos deu uma enorme contribuição neste sentido. Nenhum teve êxito. Ou seja, enquanto isso vamos nos apertando, nos acotovelando na ante-sala da Barca do Inferno. Pois ninguém vai nos salvar de nós mesmos. É uma empreitada inglória, de teor quixotesco, tentar salvar quem não quer ser salvo.

 

A esperança, a ilusão e os atrasos da humanidade

Por Elton Luiz Valente

Nota: O título destas linhas poderia muito bem ser Um Pouco de Semântica (o que diz respeito ao significado dos signos, das palavras), ou Para Falar de Semântica e Advérbios (de que, segundo Reinaldo Azevedo, Umberto Eco tanto gostava em O Nome da Rosa), mas eu prefiro este título que foi usado porque ele é imperativo. Alguém pode observar que esperança e ilusão não são advérbios, muito pelo contrário, são substantivos. Correto! Mas são palavras muito ligadas “ao modo” como a humanidade conduz as coisas. E o modo é a seara dos advérbios. Por isso, talvez, Umberto Eco gostasse tanto deles. É na subjetividade (adverbial) que se desvenda a essência da humanidade.

Enfim! Existem algumas coisas da essência humana que tornam este mundo pior. Eu as considero como subprodutos, ou efeitos colaterais da inteligência humana. Um exemplo? A ilusão! Ilusão somada à esperança é então um veneno. A ilusão de que existe vida após a morte e um paraíso a ser conquistado, e regido por Deus, já rendeu muitas epopéias homéricas, a grande maioria delas sanguinárias, com guerras, destruições, martírios, caça às bruxas, execuções sumárias e genocídios.

A esperança, sozinha, é muitas vezes benéfica. Exemplos? Para ficar apenas naqueles assistidos por minha geração: tínhamos a esperança de ver o Muro de Berlim ruir. Ruiu! Ou seja, na queda o Comunismo (histórico) foi junto. Não tínhamos a ilusão de que o mundo seria maravilhoso depois da queda do muro, não! O mundo, por assim dizer, apenas voltaria à sua “pulsação” normal, à sua “velocidade de cruzeiro”. O muro era apenas um obstáculo (sobretudo simbólico, adverbial), um efeito retardador.

Antes disso, muitos acreditaram (olha aí a ilusão) que o Comunismo pudesse deixar o mundo mais justo e igualitário. Inclusive combatiam as religiões, tratando-as como “ilusões burguesas” (no Brasil produziu-se uma excrescência híbrida chamada Teologia da Libertação). Enfim! Na seqüência surgiram ditadores comunistas iguais ou muito piores do que os outros. Para explicar de outro modo, observem um detalhe: a esperança quando acaba se dá, geralmente, sob um processo brando, às vezes nostálgico. A ilusão quando acaba, é em razão de um processo traumático, ou desencadeia um processo traumático. Pois a esperança não é definitiva, ao contrário, é diplomática, maleável. A ilusão é definitiva, e tem efeito psicotrópico, opiáceo. A esperança pode ser praticada sozinha, sem ser “assaltada” pela ilusão. O verbo acreditar, usado no início deste parágrafo, é o oposto, está a um passo da ilusão, principalmente quando conjugado no presente do indicativo, aí a receita é quase infalível. Por isso Tomé, o apóstolo, precisa ser respeitado, porque era um sábio e não um incrédulo simplesmente.

Outro exemplo, mais contemporâneo ainda: muitos acreditaram (a ilusão de novo) que o Partido dos Trabalhadores (PT) fosse resgatar a Ética e a Moralidade “como nunca antes na história desse país“. O que se viu foi um escárnio despudorado, público e notório, como nunca antes na história deste país, inclusive com lances absurdos, inacreditáveis, de uma promiscuidade nojenta e autofágica entre os Três Poderes da República. Leiam A Revolução dos Bichos, de George Orwell, está tudo lá! E olha que o original do livro foi publicado na Inglaterra em 1945.

Uma questão de hoje: Os EUA, e o mundo, tinham a esperança (I have a dream, M. L. King, 1963), de ver um negro na Casa Branca. Ele chegou! O problema é que junto dessa esperança vem a ilusão de que tudo vá mudar para melhor. Ilusão!

Outra esperança umbilicalmente unida e ungida na ilusão é a de que um dia haverá paz no Oriente Médio. Para se vislumbrar uma remotíssima possibilidade (o que é uma utopia das grandes) seria preciso de início restaurar o mapa do Oriente Médio, restaurar as fronteiras anteriores ao domínio franco-britânico do acordo Sykes-Picot (1916), ou seja, o mapa do Império Otomano. Fazer com que judeus e palestinos esqueçam essa bobagem de cada um ter um país próprio, assim como o povo do sul do Brasil esqueceu a República dos Pampas, e convivam, numa adversidade branda e respeitosa, como paulistas e sulistas. Sabe a probabilidade de acontecer isso? É nula! O porquê eu já disse no início deste parágrafo. A esperança ungida na ilusão!

Quero dizer, com essa história toda, que a humanidade é refém de suas próprias crenças e ilusões. Dando pouco valor à lucidez e à racionalidade (ferramentas da ciência). E estas, podem sim, fazer par com a esperança em alguns momentos. E são elas, a lucidez e a racionalidade, que poderiam nos tirar da Caverna (de Platão). Poderiam, mas não podem! Não podem porque a ilusão não deixa!

Nota de Rodapé

Por Elton Luiz Valente

Uma das principais regras para um bom colunista, ou cronista, é não fazer previsões e vaticínios. Tendo em vista que não me considero um bom cronista, vou fazer uma previsão que, para alguns, não é previsão, é apenas o óbvio.

Já afirmei aqui no Geófagos o que penso sobre a eleição de Barack Obama. Ele assume seu governo na próxima semana, toma posse do dia 20, se não me engano. Sabe o que vai mudar? Nada! Tudo vai continuar na mesma toada de sempre. Sabe por quê? É simples. Porque políticos são políticos! Não importa a origem, a etnia, o partido, o credo, o contexto histórico. Não importa nada. A lógica que os move é só uma. E eles valsam no ritmo da orquestra. Ora, direis: e o povo? Eu vos direi, no entanto: depois da eleição o povo é só o povo!

A Extinção, a Ressurreição e o Oriente Médio

Por Elton Luiz Valente

Recentemente vi uma excelente matéria na TV sobre animais extintos. Alguns sabidamente extintos com a colaboração direta do homem, como o Dodô (Raphus cucullatus). O repórter perguntou sobre a possibilidade de “ressurreição” de algumas destas espécies. A pesquisadora entrevistada argumentou que não fazia sentido ressuscitar espécies extintas, mesmo aquelas extintas pela ação do homem, uma vez que, entre outras coisas, os ambientes onde elas viviam estão atualmente bastante modificados e, na maioria dos casos, a própria natureza já havia criado as condições para a extinção.

É bom que se diga que a extinção de espécies é uma regra da natureza, está longe de ser uma exceção. Mais cedo ou mais tarde todas as espécies, ou pelo menos a maioria delas, serão extintas, por morte ou modificações genéticas, dando lugar a novas espécies. O próprio Dodô era descendente de pombos migratórios que se instalaram em algumas ilhas da costa leste africana. Particularmente acredito que a ciência ressuscitará uma ou outra espécie, como o Mamute, para fins de conhecimento científico e, é claro, brincar de Deus. Afinal, são desafios dessa magnitude que movem a humanidade.

Mas a discussão sobre o fato de não fazer sentido ressuscitar espécies extintas é um argumento bastante plausível e interessante. É fácil imaginar os distúrbios ambientais causados pela reintrodução de animais extintos, uma vez que a natureza já selou os seus destinos e, além disso, as relações ecológicas e as condições ambientais dos seus locais de origem não são mais as mesmas. Como é recorrente nessa minha cabeça inquieta, fico buscando paralelos entre a dinâmica da natureza e o processo evolutivo das civilizações. Ora, direis: isso é tolice, no mínimo maluquice de um cronista amador! Eu vos direi, no entanto: mirem-se no exemplo do Oriente Médio! Observem que “os distúrbios” naquela região se agravaram muito desde que o Império Ocidental fincou ali sua bandeira em 1948, data da “ressurreição oficial” do Estado de Israel!

Vejam que a natureza dinâmica dos fatos históricos já havia extinguido o Estado Judeu desde priscas eras, que remontam os tempos bíblicos, tempos em que o Dodô nem sonhava com sua extinção, ocorrida há cerca 400 anos, em decorrência da chegada dos portugueses à costa leste da África.

O fato é que “ressuscitaram” o Estado Hebreu, a Nação de Davi. Vejam no que deu. As novas relações que surgiram daí provocaram profundos distúrbios em uma “ordem local” que já era frágil por natureza, que se equilibrava sob tensão na insustentável leveza geopolítica do Oriente Médio. E eis que ressurge o Estado de Israel, com toda a parafernália hi-tech-neobélica do Império Ocidental, invertendo os papéis entre Davi e Golias. Todos sabem que Israel só se mantém como estado porque recebe uma avalanche de recursos econômicos e políticos vindos do ocidente. Daí pra frente todo mundo conhece o enredo desse xaxado do cangaceiro doido. No sítio geográfico onde estão fincados os pilares do Estado Judeu, ele está rodeado de adversários, para não dizer inimigos ou predadores, prontos para dar o bote, o golpe final, o xeque-mate, ao primeiro descuido.

Não sei se é possível tirar daí alguma lição, mas que é uma boa referência ninguém há de negar.

PARA ESCLARECER ALGUNS FATOS

Por Elton Luiz Valente

Eu imaginava até há pouco que não haviam dúvidas, tanto para os nossos leitores mais assíduos, quanto para os leitores fortuitos, de que o Geófagos é uma página que tem como norte a Ciência e, entre outras coisas, defende a Teoria da Evolução de Sir. Charles Darwin como a explicação lógica, fundamentada em bases científicas, para explicar a vida na Terra. Mais que isso, consideramos também que Darwin é um marco na história da ciência e da humanidade.

Às vezes nossos artigos, principalmente os meus, são redigidos com uma boa dose de bom humor e ironia. O que pode ser percebido na maioria dos meus textos, inclusive nesse último, intitulado “O Vestibular do Juízo Final”.

Parece que alguns leitores não entenderam isso, ou pelo menos um, o que já é suficiente para justificar este esclarecimento. Referindo-se ao artigo mais recente, e confundindo tudo, o leitor me enviou ontem um e-mail com a seguinte afirmação:

“… infelizmente temos uma dicotomia insanável: sou ateu, não posso considerar textos ou deduções ou considerações que não tenham base lógica, comprováveis e acima de tudo, com evidências” (sic.).

Santa Maria Madalena! Meu Deus! São Charles Darwin! Alguém que “não pode considerar” determinados textos, quaisquer textos, é um fundamentalista de sua própria crença, seja ela qual for; mesmo a crença de que não existe Deus. Pois o fundamentalista não admite nenhuma forma de pensamento diversa da sua. Não admite nem mesmo conhecer os argumentos da parte contrária. É daí que nasceram todos os males da humanidade. Vale a pena repetir! É daí que nasceram todos os males da humanidade!

Quem quer defender uma causa com bases éticas, morais e científicas não pode abster-se de considerar os argumentos da outra parte. É o mínimo que se espera da conduta de adversários dignos. Até porque a crítica bem fundamentada é aquela que se espera vir de uma autoridade que detenha pleno conhecimento do objeto criticado. Senão ela não tem valor, torna-se vazia em si mesma.

A quem ainda não percebeu, o Geófagos defende a Teoria da Evolução, o Geófagos é Darwinista, mas nós não somos radicais. Ao contrário, nós defendemos o diálogo bem fundamentado, sem viés fundamentalista, sem radicalizar, sem fazer da ciência um dogma. Portanto não apoiamos, por exemplo, atitudes como a de Richard Dawkins na sua “cruzada” contra os Criacionistas, ainda que Dawkins seja um cientista brilhante, como o é.

O objetivo deste cronista que vos escreve não é jactar-se ateu, ou transformar Criacionistas em Evolucionistas, ou Religiosos em Ateus. Não! O que se quer é apenas falar de Ciência numa forma mais “palatável”, às vezes ironizando, às vezes brincando com temas bíblicos. E nesta área da religiosidade, mostrar, com argumentos racionais, plausíveis, com bom humor, que os seres humanos não são anjos decaídos e sim animais diferenciados em alguns aspectos (alguém já disse algo parecido com isso, não me lembro quem).

É preciso respeitar todas as formas de entender o mundo. Elas só não podem virar dogmas, nem projetos políticos, nenhuma delas. É contra isso que se precisa lutar. A espiritualidade, a religiosidade, que são sentimentos entranhados na essência humana, deveriam ser usados apenas para fins pacíficos e lúdicos, nada mais. E que não existissem problemas em brincar com essas coisas.

Para finalizar, eu, particularmente, considero que Deus é apenas o efeito colateral da inteligência humana. Mas devo, no mínimo por questões éticas, respeitar aqueles que crêem na Santíssima Trindade, ou coisa parecida, desde que eles também respeitem a minha forma de enxergar o mundo e o universo. Mas para isso, eu não me abstenho de ler bons livros, a Bíblia inclusive, nem mesmo aqueles panfletos que “missionárias” e “missionários” eventualmente deixam em minha porta. Somos livres para discordar e criticar, mas é preciso ter conhecimento e bases argumentativas sólidas, racionais e éticas. Para tanto é preciso ler, TUDO, mesmo que você não concorde com nada. É o que eu recomendo para os nossos estimados leitores.

E não me abstenho de desejar um Feliz Natal a todos, indistintamente.

Ninguém vai nos convencer, nem mesmo o clima!

Por Elton Luiz Valente

O Período Neolítico, que teve seu início há cerca de 10.000 anos, é aquele em que o homem deixa sua vida nômade, de caçadores-coletores, para fixar-se em aldeias. Isso foi possível com o domínio da agricultura, da domesticação de animais e uma série de outras conquistas que permitiram o sedentarismo.

Embora o homem nunca tenha deixado de ser guerreiro (nesse sentido George W. Bush é pré-histórico), no Neolítico a vida era bem melhor que antes. A alimentação era mais farta e de melhor qualidade, havia excedentes agrícolas, o que permitiu ao homem (e à mulher) dedicar tempo a outras atividades mais lúdicas, como as artes. Isso culminou na invenção da escrita. Nesse momento, com a invenção da escrita, o homem deixa a pré-história para ingressar na história, na Era do Bronze, do Ferro e etc. Daí pra frente todo mundo conhece o enredo desse tango do argentino doido.

E o final deste tango é o óbvio. Podem usar a equação que quiserem, não há crescimento econômico que se equalize com sustentabilidade. São coisas diametralmente opostas e pronto! Crescimento econômico, que todos os países (e políticos) almejam e defendem, é sinônimo, ipsis litteris, de drenagem dos recursos naturais. Sustentabilidade, se é que ela possa existir na presença do Homo sapiens, é exatamente o oposto.

Então voltemos ao Neolítico. Ali está um modo de vida que eu, particularmente, admiro muito (meu sonho dourado de Engenheiro Agrônomo é ter um sítio, uma fazenda – sou filho de agricultor). O modo de vida Neolítico é tranqüilo, sem muitos excessos, sem muitos impactos ambientais.

Mas a sina do homem é ser hi-tech. É ter um carrão de combustão interna, de preferência com a descarga furada para roncar mais grosso; é ter iPod (não, agora é iPhone 3G), laptop, celular, TV de plasma, LCD, DVD, home theater (nem sei se é assim que se escreve essa p….) e o escambau … e um shopping center logo ali na esquina. Ou seja, todo mundo quer um modo de vida norte-americano, de alto consumo.

Pergunte nos fóruns internacionais, pós-Kyoto, onde se discutem essencialmente as questões do aquecimento global e seus derivativos, se eles estão dispostos a retornar ao Neolítico. Pergunte nas ruas, ao militante panfletista do ambientalismo se ele se dispõe a adotar um modo de vida Neolítico. Eu me arrisco a adivinhar a resposta deles. É NÃO!

Todos querem ser hi-tech, com o padrão de consumo norte-americano, ninguém quer retroceder. E talvez seja exatamente esta uma das poucas chances que teremos: retroceder ao Neolítico e fazer controle de natalidade.

Mas todos queremos ser hi-tech, ê vida boa! Já pensou? Da caverna ao Blue-Ray Full HD, quem diria! Ninguém vai conseguir nos convencer do contrário, nem mesmo o clima. Às favas com o Ministério da Saúde! Se é pra morrer, morreremos cheirando fumaça de óleo diesel, plugados na Web, hi-tech, e dane-se! Resultado? A Terra vai se livrar de nós num sacolejo. Pá-Pum! Um só estrondo, um só gemido e tchau!

Com licença Geófagos! Um Desabafo.

Por Elton Luiz Valente

Alguém já disse que toda geração é refém de seu tempo. Eu, declaradamente, sou um desses. O contexto histórico de minha geração me acompanha feito uma sombra, ora me resguardando, como uma castanheira ao sol; ora me assombrando feito fantasmas nefastos. Digo isso porque os protagonistas das manchetes de minha geração estão registrados no núcleo duro da minha memória. De uns poucos tenho saudosas lembranças e referências. De muitos tenho tristes decepções.

Tenho críticas sérias a muitas figuras “ilustres” deste universo brasileiro com “muita estrela e pouca constelação” (como já dizia o saudoso Raul Seixas). Entre eles estão ícones nacionais e internacionais que não viveram em meu tempo, mas deixaram reflexos duradouros na história, quando não nas nossas vidas.

Evidentemente, minhas principais inquietações têm como alvo figuras contemporâneas, na pele de músicos, compositores (Chico Buarque, por exemplo), poetas, artistas plásticos, jogadores de futebol (Pelé, por exemplo), cineastas, novelistas, atores e atrizes com seus personagens de cinema e televisão, papas, políticos… e Oscar Niemeyer.

Se alguém tem curiosidade em saber por que resolvi falar do Niemeyer, é porque vi recentemente uma matéria sobre ele na televisão, com muitos elogios, endeusamentos e NENHUMA CRÍTICA, como é de praxe nesse Brasilzinho hipócrita de muita politicagem e raríssimos estadistas – históricos – porque no presente não há nenhum.

Tenho a honra de dizer que nunca fui comunista. Fui simpatizante do Comunismo na minha juventude pré-universitária, mas desconfiei muito cedo de que aquilo era uma roubada e saí fora. Só para tecer um paralelo, não conheço a biografia do Senador Cristovam Buarque, mas além de sua campanha veemente pela educação, um outro episódio protagonizado por ele merece crédito e respeito. Foi quando destamparam a panela do mensalão. Ele, na tribuna, rasgou sua filiação do PT, dizendo que não tinha condições morais de permanecer naquele partido. É o mínimo que se pode esperar dos homens públicos.

Niemeyer nunca deixou de ser um comunista fervoroso. Talvez isso revele muito do homem por trás do mito – aliás, faço aqui uma observação: eu nunca vi um comunista rico dividir sua fortuna com os pobres. Entre os capitalistas há quem tenha feito isso, existem alguns famosos como Henry Ford, Rockefeller e, mais recentemente, Bill Gates, que pelo menos prometeu.

Antes que alguém proteste, não estou querendo dizer que os capitalistas são bonzinhos e os comunistas são maus, “comedores de criancinhas”. Aliás, gosto muito da biografia de comunistas do naipe de Jesus Cristo e Mahatma Gandhi…

Há uma crítica muito pertinente às obras de Niemeyer, de que elas priorizam as formas, sem um mínimo de consideração pelo conforto dos usuários. Talvez isso revele muito do comunista por trás do homem.

Vivemos tempos desonrosos em todo o mundo, mas especialmente na América Latina, onde VELHAS EXCRESCÊNCIAS POLÍTICAS DA HISTÓRIA ainda encontram ouvidos e palanques. No Brasil, além de encontrá-las nas nossas Universidades Públicas, podemos vê-las por aí lépidas e faceiras, sob muitas siglas e neo-ísmos, e o que é pior, muitas vezes agregadas aos Três Poderes que, em síntese, deveriam zelar pela integridade física e moral desta nação. Mas não é isso o que assistimos. E eles estão aí, perto de você, perto de nós, fazendo as mesmas lambanças de sempre, como na obra “A Revolução dos Bichos” (Animal Farm), do brilhante e impagável George Orwell.

O grego, não me lembro se Aquiles ou Sócrates, que não temia a morte, mas temia a desonra, ficaria horrorizado.

P.S. Ninguém deveria passar pela vida sem ler “A Revolução dos Bichos”.

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