O aquecimento não é o único problema ambiental relevante
Mais Uma Tese Defendida No Mundo!
Por Elton Luiz Valente
Senhores! Peço licença para anunciar que defendi na tarde de ontem (29/01/2009) minha tese de doutorado. Cujo título, sugerido pela banca, é: Relações solo-vegetação no Parque Nacional da Serra do Cipó, Espinhaço Meridional, Minas Gerais.
Embora a ciência, necessária, prime pela objetividade, peço, humildemente, que me permitam fazer uso de adverbialidades. Pois o fato posto de defesa da tese implica dizer que encerrei minha carreira oficial de estudante (stricto sensu). Relembrando e parafraseando Vladimir Maiakovski, eu digo: ‘não estou alegre, é certo, mas também por que razão haveria de ficar triste?’
Não estou alegre porque, imagino, a vida vai exigir que eu deixe de novo a Academia. E o meu retorno a Ela foi A-B-S-O-L-U-T-A-M-E-N-T-E gratificante. Em um curto período de tempo foram diversas mudanças para melhor (de rumo, de entendimento, de aspirações). Foram mudanças rápidas, graduais e consecutivas a cada disciplina ótima que eu fazia. Além dos amigos que adquiri no percurso desta empreitada. E agora devo perdê-los de alguma forma.
Um bom exemplo desses amigos, somos nós, Os Quatro Mosqueteiros do Geófagos! Porque, vocês sabem, Os Três Mosqueteiros eram na verdade quatro. Mas existem outros excelentes amigos adquiridos aqui, alguns deles ilustres blogueiros, como Marcus Locatelli. E alguns que perdemos definitivamente na seara de Deus, que sempre vem de alguma forma ceifar seus campos e realizar sua colheita… E assim temos de seguir em frente.
Por tudo isso não estou alegre. Mas não há razão para estar triste. Como diria Maiakovski: “As ameaças e as guerras, havemos de atravessá-las, rompê-las ao meio, cortando-as como uma quilha corta as ondas.”
Numa tentativa de reconhecimento à minha Comissão Orientadora, tanto de mestrado quanto de doutorado, bem como de alguns caríssimos amigos (consultores) que me socorreram em algumas encruzilhadas desse caminho, eu escolhi uma frase atribuída a Sir. Isaac Newton, na qual ele diz, com muita propriedade: If I have seen further it is by standing on the shoulders of Giants – Se enxerguei mais longe foi porque me apoiei nos ombros de Gigantes.
É isso meus caros! Até mais ver…!
Ciência do Solo: Muito além de uma Ciência Agrária.
Em recente discussão, nós, autores do Geófagos, decidimos por uma “volta à fazenda”, conforme proposto pelo Ítalo. Trocando em miúdos, resolvemos voltar o foco para nossa origem, a Ciência do Solo. Para selar essa volta, acredito eu, não há nada melhor que um texto que introduza o leitor ao assunto, mostrando o quão abrangente é essa ciência e que, ao contrário do que costumeiramente se vê e entende, ela abrange uma gama de assuntos que se estendem muito além das Ciências Agrárias.
Piaget diz que a multidisciplinaridade se faz presente quando “a solução de um problema torna necessário obter informação de duas ou mais ciências ou setores do conhecimento sem que as disciplinas envolvidas no processo sejam elas mesmas modificadas ou enriquecidas”. Pois bem, acredito que a ciência do solo se enquadra bem nesse conceito.
Foto de um perfil de solo – LATOSSOLO VERMELHO-AMARELO Distrófico húmico do Parque Nacional do Caparaó (MG)
Ao contrário da visão tradicional e da “neoclássica” de Ciência do Solo, acredito que ela possui sim uma multidisciplinaridade nata, bastante evidente em uma análise crítica bem fundamentada. Tal multidisciplinaridade fica também evidente quando recorre-se aos primórdios dela, quando Dokuchaev descreveu o solo como um corpo natural dinâmico, cuja dinâmica depende de uma interação de fatores como relevo, ação da biota, clima e tempo. Desses, alguns são fatores ativos, passivos e controladores que são representados, respectivamente, pela biota e clima, tempo e relevo.
A ciência do solo é uma Geociência, principalmente, quando do campo da Pedologia. Afinal, estudar um corpo formado ao longo de centenas ou milhares de anos não nos remete ao estudo do Tempo Geológico e das muitas modificações sofridas pela esferas terrestre ao longo de sua evolução? Estudar os depósitos minerais lateríticos não nos remete à Geologia Econômica? Existem processos sedimentares sem antes haver intemperismo e pedogênese? Enfim, as respostas são claras.
Ela também é uma Ciência Agrária. O exemplos mais claros são, sem dúvida, as interações solo-planta e suas consequências. É o aspecto que tem ficado mais evidente ao longo do tempo, principalmente, devido ao viés agrícola predominante ao longo de sua evolução. Esse já foi deixado subentendido por Heródoto, Teofrasto, Crescentius, etc… Essa íntima relação e a evolução da Ciência do Solo, como um todo, é que permite a exploração agrícola de terras antes consideradas inapatas ao uso agrícola, como o cerrado brasileiro, por exemplo.
Ciências básicas como Química, Física e Biologia também fornecem importantes ferramentas para a evolução desse jovem ramo da ciência. Outras não tão básicas, como a Mineralogia, por exemplo, também o fazem. O equilíbrio químico e as relações da macro, meso e microfauna do solo são bases para estudos do intemperismo e da pedogênese, sobretudo em regiões tropicais úmidas. A resistência mecânica das rochas é importante fator naquelas áridas e também nas geladas. A resistência de um solo aos processos erosivos está intimamente relacionada com suas características físicas e também com a mineralogia de suas argilas. A fertilidade ou toxicidade de um solo dependem não somente dos teores de nutrientes presentes, mas também de sua especiação. A mineralogia também está frequentemente ligada à maior ou menor disponibilidade de nutrientes, elementos e substâncias tóxicas. A qualidade e a quantidade de recursos hídricos subterrâneos também são fortemente dependentes da qualidade do solo, ou seja, do conjunto de fatores químicos, físicos, biológicos e mineralógicos dos solos.
Obviamente, esses exemplos não esgotam a multidisciplinaridade dessa ciência. Entretanto, eles representam bem como a Ciência do Solo vai muito além de uma Ciência Agrária. O viés agrícola foi sem dúvida o que deu sustentação ao crescimento desta como ciência, sua importância é inquestionável, mas a visão estritamente agrária dessa ciência não mais é a sua realidade.
A expansão e o amadurecimento da Ciência do Solo podem ser vistos em trabalhos recentes. Questões relacionadas à gênese, uso e a ocupação do solo têm sido atualmente reconhecidos como importantes vertentes econômicas, como importantes reservatórios e sequestradores de carbono, como fundamentais para a vida em ambientes hostis como Antártica (por exemplo, pelo transporte através de correntes marinhas do fósforo adsorvido em óxidos férricos Australianos), meio de suporte para crescimento de matérias primas energéticas, como as dos biocombustíveis, entre outras. Mas muito além disso, não tem-se perdido o foco de questões sempre presentes nas discussões, entre elas e, talvez a mais importante, a segurança alimentar (aqui incluídos aspectos qualitativos e quantitativos da produção de alimentos).
Carlos Pacheco
Mulheres na Ciência (e na chefia)
Tenho certeza que está próximo o tempo em que mulheres em posições proeminentes na Ciência serão um fato tão comum a não causarem mais surpresa. A Ciência do Solo, ramo do conhecimento a que se dedicam todos os autores do Geófagos, e a Embrapa assumem a vanguarda desta tendência. Acaba de assumir a chefia geral da Embrapa Solos, localizada no Rio de Janeiro, a pesquisadora Maria de Lourdes Mendonça Santos Brefin, engenheira agrônoma maranhense com doutorado em Pedologia e Geomática pela École Polytechnique Fédérale de Lausanne (Suíça). Doutora Maria de Lourdes é a primeira mulher a ocupar o cargo.
Nota de Rodapé (2)
Por Elton Luiz Valente
Recentemente publiquei aqui no Geófagos, em 14/12/2008, um texto no qual eu falava das decepções com alguns “ícones” de nossa história. Naquele texto, emiti minha opinião a respeito da conduta de Niemeyer na sua condição de “celebridade”. Pois bem, na penúltima edição da revista Veja, edição 2096 de 21/01/2009, saiu uma matéria interessante sobre Niemeyer e sua tentativa de “amenizar” a biografia de Stalin. Vale a pena conferir. A matéria está disponível em:
http://veja.abril.uol.com.br/210109/p_130.shtml.
PS. Ultimamente tenho refletido sobre a velhice. Se tivermos sorte (ou não), a maioria de nós vai enfrentá-la. “Em face dos últimos acontecimentos”, fiquei pensando… A velhice pode ser muito boa se o indivíduo deixar, por completo, de se comportar como o imbecil que foi na juventude.
Atrasado mas ainda em tempo: um pequeno manifesto contra o corte no orçamento do MCT!
Essa semana a ciência brasileira sofreu um duro golpe. Nada mais, nada menos que 18 % do orçamento elaborado pela União foram “foiçados” pelo congresso Nacional. Ainda não sentiu o drama? Isso equivale a cerca de 1,2 bilhões de reais. Isso mesmo, 1,2 bilhões de reais (comparado a países desnvolvidos isso é pouco, mas para a ciência brasileira…)! Esse valor é 10 % maior que toda a receita a agência financiadora estadual mais bem provida financeiramente do país, a Fapesp (Fundação de Amparo a Pesquisa de São Paulo), segundo publicou a Folha Online em sua edição do dia 22/01/2009.
O estapafúrdio ato foi elaborado pelo senador petista Delcídio Amaral (MS), aquele mesmo presidente da CPMI dos correios. Alguém poderia, por obséquio, avisar o senhor relator que, só os benefícios que ele pode receber mensalmente, pagam algo em torno de 5 bolsas de doutorado (cerca de R$ 1800,00). Se multiplicarmos os benefícios (veja que não estou falando de salários e sim de benefícios) de “vossas excelências” (que podem chegar a cerca de R$ 10000,00) pelo número de Deputados Federais e Senadores (513+27 = 540) chega-se à quantia de R$ 5400000,00. Dividindo isso pelos citados R$ 1800,00, chegaríamos a cerca de 3000 bolsas de doutorado mensais. Se cortes têm realmente que serem feitos, por que não começar com as mordomias de “nossos representantes”?
Acho que é desnecessário tecer comentários a respeito da relação custo-benefício de pagar-se bolsas de doutorado (ou mestrado) quando comparadas aos “mimos” pagos à vossas-excelências, né? Além disso, o Brasil segue no rumo oposto das grandes economias mundiais. Enquanto eles investem em ciência e tecnologia para sair da difícil situação, aqui corta-se verbas dessa mesma área.
Essa notícia me fez lembrar a “dark age” do intelectual sociólogo e de seu discípulo, ministro da educação Paulo Renato de Souza. Quem não se lembra da política de “arrochamento” adotada para com as Instituições Federais de Ensino? Bolsistas da época sabem bem do que estou falando, afinal de contas foram 8 anos de congelamento.
Ademais, será que teremos que voltar à era de peregrinação aos laboratórios em busca de reagentes e equimpamentos, a boa e velha “saga em busca do ácido clorídrico”? E os recém aprovados Institutos Nacionais de Tecnologia, como ficam? Será que, como disse o próprio ministro Sérgio Rezende, bolsistas realmente serão “demitidos”? São perguntas ainda sem resposta e que, dependem sobretudo, da força política do presidente Lula. Afinal, não é ele o ícone petista?
Espero, sinceramente, que as melhorias advindas da política para com a educação federal do atual governo e praticadas desde 2002 não sejam jogadas ralo abaixo agora. Pro-Unis, Reunis, reajustes salariais e de bolsas de nada adiantam sem verbas, infra-estrutura, equipamentos e matéria prima suficientes para condução dos trabalhos. O momento EXIGE pesado investimento em tecnologia. É hora do presidente honrar o seu discurso na WEC 2008 (World Engineers Convention), realizada em Brasília. “Esta crise internaciolnal obriga a todos nós, de forma profunda, a desenvolver uma capacidade imensa de melhor aproveitar os recursos e propor soluções. É momento da retomada do desenvolvimento”, foram as palavras de Lula. Em suma, o governo pretende investir em tecnologia e, para tal, deve articular-se politicamente para revogar a infeliz decisão do Congresso Nacional.
Carlos Pacheco
Um desafio – Parte final: Aquecimento global antropogênico ou não? Uma questão ainda sem resposta.
Por motivos pessoais e profissionais precisei me afastar do Geófagos nos últimos dias. O tempo foi bom pois pude aprofundar um pouco mais nas questões referentes ao aquecimento global antropogênico. Os estudos foram bem proveitosos, entretanto, as conclusões que tirei foram um tanto quanto desanimadoras. Além de ver novamente o documentário que deu origem a essa série de posts, pude ler o “A fraude do esfeito estufa” de Kurt G. Bluchel, alguns artigos e também alguns capítulos de livros textos sobre Geologia e Climatologia. Resolvi encerrar logo esse assunto. Colocarei aqui minhas opiniões sobre argumentos de ambos os lados, favoráveis e contra a teoria.
Para início de conversa os links do documentário são esse, esse, esse, esse, esse, esse e esse. Estou colocando somente os links do vídeo por dois motivos, quais sejam: (1) para não sobrecarregar o post e; (2) porque fui alertado sobre os riscos de inserir vídeos produzidos por grandes canais sem autorização dos mesmos.
Confesso que alguns dados me impressionaram. Deixando de lado algumas convicções pessoais e assumindo verdadeiros os dados apresentados nas fontes consultadas, observei claramente a forte influência da forçante natural no aquecimento global. Observando as curvas de CO2 x temperatura e Atividade Solar x temperatura, exibidas no documentário, isso fica evidente. As segundas se correlacionam de maneira muito mais satisfatória do que as primeiras. Essas curvas, mostradas na figura 1, exibem dados relativos ao último século. A curva com dados simulados dos últimos 600000 anos, como pode ser visto na terceira parte do documentário, também apresenta uma boa correlação.
Figura 1: Curvas CO2 x temperatura e Atividade solar x temperatura.
O argumento que fenômenos de aquecimento e resfriamento globais estão constantemente ocorrendo também é verdadeiro. A suposta entrada do globo em uma era natural de aquecimento também o é. Observe na figura 2 que o comportamento do clima ao longo do tempo geológico é cíclico e está relacionado à formação e desagregação de supercontinentes. O período de separação e amalgamação é quente, enquanto que períodos de junção e de estabilidade do supercontinente são marcados por eras glaciais. O final dos períodos quentes são acompanhados de uma queda brusca na temperatura e uma mini-glaciação e posterior elevação da temperatura durante um curto período de tempo. As causas desse comportamento ainda são desconhecidas e antecedem a era glacial propriamente dita (um elevado período de frio intenso). Caso o clima esteja seguindo seu curso normal, de acordo com o modelo proposto pelo geólogo australiano J. J. Veevers, estamos na ascenção, quase inicial, da curva que representa uma era interglacial quente. Esse período quente, segundo previsões, deve durar alguns milhares ou dezenas de milhares de anos. A nova era glacial é esperada para algo por volta de oitenta milhões de anos. É importante frisar que cada ciclo dura aproximadamente 400 milhões de anos e, a figura 2, refere-se aos três últimos ciclos correspondentes aos supercontinentes Rodínia (1 bilhão de anos), Pannótia (600 milhões de anos) e Pangea (250 milhões de anos), conforme mostrado na figura 3.
Figura 2: Modelo proposto por Veevers para explicar a variação climática ao longo dos últimos 1,1 bilhão de anos. Fonte: Decifrando a Terra.
Figura 3: Três últimos supercontinentes ao longo da evolução do planeta. Fonte: Decifrando a Terra.
Por outro lado, parece-me que os adeptos ao aquecimento global não antropogênico por vezes “esquecem” que o clima é resultado da combinação de diversos fatores e não apenas da atividade solar ou de outros fatores isolados. Além de variações na atividade solar, a composição da atmosfera (gases estufa por exemplo), alterações nas posição e níveis de continentes e oceanos, níveis dos mares e causas extra-terrenas, entre outros, também influem sobremaneira. Por exemplo, de nada adianta um elevado aporte de radiação de onda curta solar se não houver gases estufa suficientes para reter as radiações longas (infravermelhas) refletidas pela superfície do planeta.
Outras afirmações, como a temperatura deveria ser mais alta na alta troposfera do que na baixa troposfera entram em conflito com colocações dos próprios cientistas entrevistados. Eles criticam o IPCC por basear seus relatórios na simulação por modelos. Mas essas afirmações também são baseadas em modelagem. Logo, por uma questão de coerência, ela não deveria ser levada em consideração por eles.
Quanto ao CO2 aumentando posteriormente à temperatura, é uma questão válida, mas não fundamental. Em uma rápida corrida de olho nos gráficos, observei alguns períodos cuja temperatura eleva-se antes dos níveis de CO2 e outros que esses últimos antecedem a temperatura. É uma questão óbvia, uma vez que são fenômenos intimamente interligados. Por exemplo, um aumento na temperatura significa menor difusão de CO2 no grande reservatório dele, os mares. Consequentemente, maiores teores de CO2 serão liberados para a atmosfera. Além disso, também maiores níveis de decomposição de matéria orgânica podem ser alcançados, elevando o aporte atmosférico de dióxido de carbono. Já o efeito estufa, eleva a temperatura por meio da maior absorção de raios infravermelhos por gases estufa.
Já algumas outras afirmações dos não adeptos à teoria podem ser classificadas, minimamente, como esdrúxulas. Imaginem que pérolas como o elevado aporte de CO2 pode ser a solução para a fome mundial pois favorece a fotossíntese ou não haverá extinção de espécies devido ao aquecimento global e sim, favorecimento das mesmas, foram encontradas por mim durante a pesquisa. Fato é que, se as condições permanecerem ótimas, a fotossíntese realmente é favorecida por incrementos nos níveis de CO2. No entanto, o processo é mais complexo que isso e dependente de outros fatores. Por exemplo, quando pensamos em produção vegetal para fins agrícolas, também devemos lembrar da necessidade de nutrientes, disponibilidade hídrica, controle de pragas, entre outras. E grande parte dessas questões estão ligadas ao clima, portanto, tem que se considerar também quais as mudanças deido ao aumento dos níveis de gases estufa. Quanto à não existência de extinção de espécies, é melhor nem comentar.
Por outro lado, os defensores do aquecimento global antropogênico devem ser menos dogmáticos. Tratar quem critica a teoria como se fossem pecadores julgados por tribunais de inquisição católicos só trará malefícios à ciência. A discussão é saudável e, quase sempre, leva a conhecimentos mais avançados do que os iniciais. Filosoficamente, é plenamente possível que o efeito estufa realmente leve a significativas elevações das temperaturas médias mundiais, com as significativas mudanças por ele provocado. Entretanto, não acredito que tenhamos dados significativos para provar a real significância de tal efeito. O que é evidente, pois nos outros ciclos climáticos ao longo do tempo geológico não tinhamos o fator homem para verificarmos sua parcela de culpa. Modelos são sim falhos e refletem os dados de entrada, isso é óbvio. Antes de utilizar-se modelos de previsão, é necessário ter dados suficientes para suportá-los e calibra-los. Ou seja, a discussão deve continuar para esclarecer quais os efeitos da ação antrópica sobre o clima e, mais que isso, qual a intensidade dos fenômenos que virão.
Entretanto, acredito que a discussão pura e simples, sem ações prévias, é perda de tempo. O consenso quanto ao aquecimento global e seus efeitos existe. Veja que eu disse consenso quanto ao aquecimento global, não especificando a origem do mesmo. O que não há é um consenso sobre a origem desse aquecimento, se é antrópica ou natural. Acredito na combinação de ambos. Admitindo o consenso, não seria mais óbvio reduzir a vulnerabilidade da população aos efeitos advindos das mudanças climáticas e, ao mesmo tempo, discutir-se a origem e intensidade dos fenômenos que virão? Além disso, a discussão, se as emissões são ou não antropogênicas, principalmente levando-a para sentidos duvidosos como a defesa da sociedade industrial, é desnecessária. Afinal, se ainda não tem-se uma conclusão concreta sobre a participação dos “gases estufa” sobre o aquecimento do planeta, já tem-se informações suficientes sobre aspectos toxicológicos relacionados à poluição atmosféricas. Não obstante, invocar aspectos como a pobreza dos países africanos para justificar a continuidade dos meios de produção atuais me parece uma falta de ética e de humanidade tremenda. Não foi durante a própria sociedade industrial que as desigualdades mundiais aumentaram? Pergunte a um etíope, queniano ou somaliano comum se o século de desenvolvimento industrial trouxe benefícios. A resposta nem precisa ser dada.
Agora para aqueles que ainda duvidam da capacidade da vida em ocasionar grandes mudanças no planeta, sugiro estudarem um pouco o tempo geológico e as mudanças ao longo dele. Por exemplo, a modificação proporcionada pela fotossíntese, transformando uma atmosfera tipicamente redutora em outra fortemente oxidante e as consequências de tudo isso. O oxigênio é, inclusive, tido por alguns autores como o primeiro grande poluente devido às mudanças que ele proporcionou e às extinções ocorridas. E do surgimento da fotossíntese já se foram 2,7 bilhões de anos. Sugiro também ver o tempo geológico em um ano, proposto por Gradstein & Ogg (1996) e exibido em sua versão “aportuguesada” no livro Decifrando a Terra, de Teixeira et al. (2003). Para ter-se idéia da magnitude das mudanças proporcionadas pela sociedade, se transportarmos os acontecimentos ao longo do tempo geológico, toda a sociedade industrial cabe no último segundo do fictício ano.
Enfim, independente da origem devemos combater aspectos que tornam a sociedade atual mais vulneráveis aos efeitos do aquecimento global. A discussão deve continuar e ser levada em termos científicos e não na defesa de interesses, sejam eles ambientalistas ou industriais.
Carlos Pacheco
Estou voltando
Leitores e amigos, não pensem que os abandonei. Como alguns devem lembrar, deixei o pós-doutorado em Recife para assumir o cargo de pesquisador na Embrapa Hortaliças, em Brasília-DF. Estou neste complicado período inicial, ainda sem casa, embora pretenda resolver isto esta semana mesmo, familiarizando-me com o ambiente, com as pessoas e com o emprego. De toda forma, creio que fiz um bom negócio. Pretendo voltar a escrever regularmente o mais breve possível – por enquanto ainda estou sem computador, então fica difícil. O Elton Valente e o Carlos Pacheco, no entanto, tem feito um ótimo trabalho aqui no Geófagos, mantendo a regularidade na postagem e postando excelentes textos, pelo que fico mais tranquilo. Um bom 2009 para nós todos.
A esperança, a ilusão e os atrasos da humanidade
Por Elton Luiz Valente
Nota: O título destas linhas poderia muito bem ser Um Pouco de Semântica (o que diz respeito ao significado dos signos, das palavras), ou Para Falar de Semântica e Advérbios (de que, segundo Reinaldo Azevedo, Umberto Eco tanto gostava em O Nome da Rosa), mas eu prefiro este título que foi usado porque ele é imperativo. Alguém pode observar que esperança e ilusão não são advérbios, muito pelo contrário, são substantivos. Correto! Mas são palavras muito ligadas “ao modo” como a humanidade conduz as coisas. E o modo é a seara dos advérbios. Por isso, talvez, Umberto Eco gostasse tanto deles. É na subjetividade (adverbial) que se desvenda a essência da humanidade.
Enfim! Existem algumas coisas da essência humana que tornam este mundo pior. Eu as considero como subprodutos, ou efeitos colaterais da inteligência humana. Um exemplo? A ilusão! Ilusão somada à esperança é então um veneno. A ilusão de que existe vida após a morte e um paraíso a ser conquistado, e regido por Deus, já rendeu muitas epopéias homéricas, a grande maioria delas sanguinárias, com guerras, destruições, martírios, caça às bruxas, execuções sumárias e genocídios.
A esperança, sozinha, é muitas vezes benéfica. Exemplos? Para ficar apenas naqueles assistidos por minha geração: tínhamos a esperança de ver o Muro de Berlim ruir. Ruiu! Ou seja, na queda o Comunismo (histórico) foi junto. Não tínhamos a ilusão de que o mundo seria maravilhoso depois da queda do muro, não! O mundo, por assim dizer, apenas voltaria à sua “pulsação” normal, à sua “velocidade de cruzeiro”. O muro era apenas um obstáculo (sobretudo simbólico, adverbial), um efeito retardador.
Antes disso, muitos acreditaram (olha aí a ilusão) que o Comunismo pudesse deixar o mundo mais justo e igualitário. Inclusive combatiam as religiões, tratando-as como “ilusões burguesas” (no Brasil produziu-se uma excrescência híbrida chamada Teologia da Libertação). Enfim! Na seqüência surgiram ditadores comunistas iguais ou muito piores do que os outros. Para explicar de outro modo, observem um detalhe: a esperança quando acaba se dá, geralmente, sob um processo brando, às vezes nostálgico. A ilusão quando acaba, é em razão de um processo traumático, ou desencadeia um processo traumático. Pois a esperança não é definitiva, ao contrário, é diplomática, maleável. A ilusão é definitiva, e tem efeito psicotrópico, opiáceo. A esperança pode ser praticada sozinha, sem ser “assaltada” pela ilusão. O verbo acreditar, usado no início deste parágrafo, é o oposto, está a um passo da ilusão, principalmente quando conjugado no presente do indicativo, aí a receita é quase infalível. Por isso Tomé, o apóstolo, precisa ser respeitado, porque era um sábio e não um incrédulo simplesmente.
Outro exemplo, mais contemporâneo ainda: muitos acreditaram (a ilusão de novo) que o Partido dos Trabalhadores (PT) fosse resgatar a Ética e a Moralidade “como nunca antes na história desse país“. O que se viu foi um escárnio despudorado, público e notório, como nunca antes na história deste país, inclusive com lances absurdos, inacreditáveis, de uma promiscuidade nojenta e autofágica entre os Três Poderes da República. Leiam A Revolução dos Bichos, de George Orwell, está tudo lá! E olha que o original do livro foi publicado na Inglaterra em 1945.
Uma questão de hoje: Os EUA, e o mundo, tinham a esperança (I have a dream, M. L. King, 1963), de ver um negro na Casa Branca. Ele chegou! O problema é que junto dessa esperança vem a ilusão de que tudo vá mudar para melhor. Ilusão!
Outra esperança umbilicalmente unida e ungida na ilusão é a de que um dia haverá paz no Oriente Médio. Para se vislumbrar uma remotíssima possibilidade (o que é uma utopia das grandes) seria preciso de início restaurar o mapa do Oriente Médio, restaurar as fronteiras anteriores ao domínio franco-britânico do acordo Sykes-Picot (1916), ou seja, o mapa do Império Otomano. Fazer com que judeus e palestinos esqueçam essa bobagem de cada um ter um país próprio, assim como o povo do sul do Brasil esqueceu a República dos Pampas, e convivam, numa adversidade branda e respeitosa, como paulistas e sulistas. Sabe a probabilidade de acontecer isso? É nula! O porquê eu já disse no início deste parágrafo. A esperança ungida na ilusão!
Quero dizer, com essa história toda, que a humanidade é refém de suas próprias crenças e ilusões. Dando pouco valor à lucidez e à racionalidade (ferramentas da ciência). E estas, podem sim, fazer par com a esperança em alguns momentos. E são elas, a lucidez e a racionalidade, que poderiam nos tirar da Caverna (de Platão). Poderiam, mas não podem! Não podem porque a ilusão não deixa!
Nota de Rodapé
Por Elton Luiz Valente
Uma das principais regras para um bom colunista, ou cronista, é não fazer previsões e vaticínios. Tendo em vista que não me considero um bom cronista, vou fazer uma previsão que, para alguns, não é previsão, é apenas o óbvio.
Já afirmei aqui no Geófagos o que penso sobre a eleição de Barack Obama. Ele assume seu governo na próxima semana, toma posse do dia 20, se não me engano. Sabe o que vai mudar? Nada! Tudo vai continuar na mesma toada de sempre. Sabe por quê? É simples. Porque políticos são políticos! Não importa a origem, a etnia, o partido, o credo, o contexto histórico. Não importa nada. A lógica que os move é só uma. E eles valsam no ritmo da orquestra. Ora, direis: e o povo? Eu vos direi, no entanto: depois da eleição o povo é só o povo!