A terra e seu destino

Uma das coisas que mais me deixam feliz em escrever aqui é o amor que todos nós, geófagos, temos pelo solo. Acredito já ter expressado esta minha paixão (não! Paixão é passageira, amor é duradouro), corrijo, este meu amor pelo solo no meu primeiro post – O solo é a mãe de todas as coisas. Mas confesso que com o Manisfesto Geofágico do Elton, onde ele também expressa o que vai por dentro dele, a vontade voltou e a inspiração também.
Muitas vezes dou palestras sobre “Manejo do solo na produção agrícola”, ou temas afins, para estudantes de Agronomia e sempre começo com a pergunta: “O que é Solo?”. Os alunos, em geral, ficam meio perplexos com a aparente simplicidade e a falta de resposta a tal pergunta. E eu a faço justamente para que eles parem por alguns segundos e se lembrem que a terra está bem ali, aos nossos pés, e que, mesmo assim (talvez por isso mesmo) nos passa despercebida, seguindo seu destino de provedora. Da vez mais recente, um deles respondeu: “Sistema trifásico que sustenta a Vida” – resposta decorada das aulas de Solos, dada com uma frieza tão glacial que me entristeceu, e composta de duas partes: a primeira, mecanicista (sistema trifásico) e a segunda, poética (que sustenta a Vida). Ambas verdadeiras, mas confesso que é pela segunda que sou pega.
No ano passado, quando começou uma grande (elas são sempre grandes!) obra de anel viário perto do meu trabalho, algo me fez pensar sobre a terra e seu destino. Ela, a terra, estava disposta em enormes montes, esperando para ser jogada em caçambas de caminhões e ir cumprir a função de tapa-buracos (literalmente) em algum outro lugar… Há a terra que nasce para gerar o alimento que vai para as mesas continuar a Vida; há a terra que nasce para ser jogada num caminhão e tapar buracos que darão lugar a viadutos e anéis viários ou, ainda, para dar espaço a fundações de prédios onde morarão centenas de pessoas… Destinos mais nobres que outros? Não sei, é difícil julgar o que é nobre. Como disse Carlos Drummond de Andrade em A Verdade Dividida, cada um opta conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
A mensagem que quero deixar é que, qualquer que seja o destino da terra, é preciso traçá-lo com cuidado porque a terra é a pele do Planeta Terra – a Geoderma. Seja para o plantio e o cultivo do alimento que chega às nossas mesas, seja para dar lugar a obras da engenharia, nós traçamos seu destino… Mas só enquanto ela traça, maternalmente, o nosso.
PS: para os que quiserem ler A Verdade Dividida clicar aqui

Intemperismo de gente – um devaneio!

O intemperismo é um processo de formação do solo. Por ele as rochas se transformam em solo e por ele o solo envelhece. O intemperismo é um processo de formação de gente. Por ele as pessoas se transformam em pessoas melhores e envelhecem enquanto isso… ou envelhecem enquanto se transformam em pessoas melhores. Pelo intemperismo o solo se forma de baixo para cima. Pelo intemperismo as pessoas se formam de baixo para cima, mas as que sabem que assim estão sendo formadas são as que entrelaçam suas mãos com as mãos do tempo. Assim, se tornam suas amigas e se deixam intemperizar serenamente. Aprendem mais fácil a arte-ciência da vida – a suavidade de oferecer a cada coisa seu valor exato, sendo o exato definido por cada qual.
Nota: Peço licença para esse pequeno devaneio, arremedo de prosa e verso. Afinal, hoje é domingo!

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