Copenhagen: desafios para um novo protocolo de emissões

O Protocolo de Kyoto tinha data para começar e tem data para acabar. Baseado em dados de emissão de gases do efeito estufa da década de 1990, o protocolo nem de longe é o melhor que os países podem fazer para diminuir a concentração de gases do efeito estufa presente na atmosfera além do que, já está pelo menos 20 anos defasado (leia mais sobre o protocolo de Kyoto aqui). Como o protocolo tem data para expirar (2012) é natural que os países signatários estejam se preocupando com os termos do seu substituto. 

A COP-15, que acontece no final desse ano em Copenhagen, deve ser crucial para as negociações acerca de novos termos e deve ser capaz de definir parâmetros e novas estratégias para a confecção de um novo documento. Será que os países signatários vão conseguir chegar a um consenso? Será que os países desenvolvidos vão conseguir reduzir suas emissões? E, mais importante, será que os países ditos emergentes, como Brasil, Índia e China vão concordar em ter metas de redução?

Em busca de respostas, a Universidade de São Paulo, representada pelo Instituto de Estudos Avançados, promoveu nessa terça-feira uma conferência com o ministro da Energia e das Mudanças Climáticas do Reino Unido, Ed Miliband. Antes da apresentação do ministro, professores da universidade e importantes nomes dos estudos das mudanças climáticas no Brasil tiveram tempo para expor suas opiniões. Entre eles, o Prof. Dr. José Goldemberg, o Prof. Dr. Jacques Marcovitch e o Dr. Luiz Fernando Furlan. 

A questão energética

Goldemberg, como sempre e dentro de sua especialidade, discutiu um pouco sobre a questão energética. Entre outras coisas, lembrou os ouvintes de que é necessário pensar que a energia trouxe bem estar e um nível de vida sem precedentes na história, mas que isso não significa que ela não deva ser modernizada. 

Como medidas para os países desenvolvidos, citou investimentos na melhoria da eficiência energética e no desenvolvimento em tecnologia para fontes de energia limpas e renováveis. Já para os países em desenvolvimento, é preciso uma política pública eficiente, que possibilite o desenvolvimento social, tecnológico e econômico de modo a garantir a conservação do meio ambiente – começando certo, e não tendo que mudar tudo como está acontecendo com os países desenvolvidos. Para o Brasil, redução do desmatamento da Amazônia, reflorestamento e uso de energias renováveis.

Para fechar com chave de ouro, Goldemberg assinala que devemos parar de agir com baixo-estima e síndrome de coitados e assumir responsabilidade pelas mudanças climáticas – afirmação com a qual eu concordo em gênero, número e grau.

A economia dos empresários

Furlan, como representante dos empresários, discutiu um pouco sobre o investimentos em desenvolvimento limpo e em produtos mais ecológicos. Sem deixar de lado o desenvolvimento economico, frisou que o consumidor deve estar preparado para assumir parte dos custos desse investimento. Pagar mais caro por produtos mais limpos ou assumir responsabilidade pessoal sobre o desmatamento da Amazônia foram alguns dos exemplos citados.

Em resumo, para os empresários, os produtos ou serviços “verdes” tem que ser economicamente vantajosos para a indústria e para isso, as pessoas devem estar dispostas a colaborar.

Nesse sentido, o Prof. Marcovitch ressaltou que apenas 10% dos empresários estão dispostos a investir em soluções criativas para as mudanças climáticas. Porém, mesmo que atrasados, os outros 90% tendem a seguir as ações dos 10% criativos.

O ministro britânico

A palestra de Ed Miliband foi excepcional no sentido de que trouxe para discussões os pensamentos e as dúvidas que todos temos em relação as mudanças climáticas, ao nosso estilo de vida e desafios pessoais que devemos ter. Citou que pessoas de diferentes países e culturas, com diferentes estilos de vida devem que estar unidos para desafiar as consequências das mudanças climáticas. Citou que, mesmo com responsabilidades diferentes, todos devem estar conscientes de que a mudança depende de todos. 

Todo mundo deve se perguntar que tipo de vida quer levar, que tipo de economia quer ter daqui pra frente, sabendo que, dependendo da resposta, o custo pode ser nossa sobrevivência. Nesse sentido, mudanças estão ocorrendo e oportunidades estão surgindo.

Vários setores devem estar unidos para que cheguemos a uma situação favorável. Como projetamos nossas cidades, nossas casas, como pensamos em mobilidade, investimos em transporte público, tudo deve estar conectado. Por isso, a Inglaterra acaba de lançar um plano de transição para uma política e economia de baixo carbono. O “The UK Low Carbon Transition Plan” pode ser downloadeado e lido aqui.

Uma das teclas na qual se insiste em bater faz referência a uma anotação feita no Protocolo de Kyoto e da qual o Brasil tem imensa participação durante as negociações lá entre 1994 e 1997 – as responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Quer dizer que, os países desenvolvidos são os principais responsáveis pela concentração atual de gases do efeito estufa na atmosfera e tem que ter maior participação na divisão do “bolo” das medidas anti-emissões. Sobre esse assunto, Ed Miliband ressaltou que, em menos de 20 anos, a maior parte das emissões de gases do efeito estufa devem estar vindo de países em desenvolvimento. Isso chama para a discussão a posição de países emergentes durante a COP-15.

Para terminar Ed Miliband ressalta que a falta de liderança dos políticos não deve ser desculpa para uma falta de atitude e liderança entre as pessoas e que os jovens, que vão sentir por mais tempo as consequências das mudanças climáticas, devem estar ainda mais esperançosos com nossas possibilidades de mudanças.

Ed Miliband também falou um pouco sobre questões mais específicas do Brasil, como os biocombustíveis e a relação do mercado consumidor com as novas diretrizes de baixo carbono. Mais sobre esses temas no www.twitter.com/paulabio.

EUA e as ciências das mudanças climáticas

Já falei aqui sobre o Protocolo de Kyoto, mas valem alguns lembretes:
1) O Protocolo é um acordo de cavalheiros que diz: “Vamos diminuir nossas emissões de gases do efeito estufa.”
     Aí, você de casa se pergunta: “E se alguém não cumprir o acordo?”.
     E eu te respondo: “Fica por isso mesmo. Ninguém é multado, nem ganha um chapeuzinho de burro e fica de castigo no canto da sala. Talvez – mas isso é uma característica que ainda pode ser renegociada – o país que não atingir suas metas fica devendo para o próximo protocolo.”
2) O Protocolon de Kyoto entrou em vigor em 2005 e vale até 2012.
3) O Protocolo de Kyoto não é ratificado pelos EUA. Os Estados Unidos tem uma das maiores emissões de gases do efeito estufa per capita do planeta, que em 2004 era equivalente a 20,4 toneladas de carbono equivalente (em um ano). Para se ter uma idéia, no mesmo ano, cada brasileiro era responsável por emitir 1,8 toneladas de carbono equivalente.
Pois bem. Os EUA não parecem se preocupar muito com as mudanças climáticas – ou, na verdade, parecem se preocupar muito com a sua economia, visto que reduzir emissões de gases do efeito estufa custa caro (há que se investir em tecnologias limpas, trocar as antigas em grandes indústrias, optar por energia limpa, optar por comércio justo e tantas outras coisas que, custam dinheiro).
Mas, quando se trata de querer ser O MELHOR em determinada coisa, os caras não querem nem saber. Por exemplo – hoje fiquei horas (isto mesmo, horas) tentando procurar a referência original para o relatório citado neste artigo.
O artigo é assustador, fala sobre o aumento muito mais acelerado de derretimento de calotas polares, elevação do nível do mar e secas prolongadas no sudoeste dos EUA do que o aumento previsto anteriormente. Critica, ainda, as projeções conservadoras que vêm sendo feitas e alerta para a falta de conhecimento que temos sobre os riscos potenciais que as sociedades humanas poderão sofrem com os riscos de mudanças climáticas abruptas.  
Aí, como detesto quando alguém dá uma notícia destas sem citar fontes (porque cobram isso de mim quando blogo), fui atrás dos originais. E nestas que eu passei horas. Primeiro, fui até a AGU (American Geophysical Union). Fiquei lá, encontrei o programa do Meeting onde esse relatório foi lido, encontrei o cara que leu, mas nada do artigo. Aí fui no Google. E, depois de passear pelo ScienceDaily, pelo Oregon State University e pelo EurekAlert!, finalmente cheguei no U.S. Climate Change Science Program (vejam bem: é o SCIENCE PROGRAM, não o POLICES PROGRAM, ou o ECONOMIC PLAN, ou qualquer similar).
E lá, me deparei com nada mais, nada menos que quatro livros (todos on line), com algo que promete ser mais completo que os relatórios do IPCC. Os livros tratam de: 
+ Trends in emissions of ozone-depleting substances, ozone layer recovery, and implications for ultraviolet radiation exposure 
Decision support experiments and evaluations using seasonal to interannual forecasts and observational data
Reanalysis of Historical Climate Data for Key Atmospheric Features: Implications for Attribution of Causes of Observed Change
E, finalmente, o relatório que eu estava buscando, de, nada mais nada menos que, 459 páginas.
Abrupt Climate Change.
Acho que vou demorar um tempo pra ler esses documentos, então, se sua curiosidade for maior do que a minha, esteja à vontade.
P.S. Mas que os caras são muito sacanas em não destinarem um centavo para políticas públicas de mitigação ou estudos de vulnerabilidade mas gastarem fortunas com um estudo que já está praticamente pronto (e que foi provavelmente feito com os mesmos grupos de cientistas), isso eu acho que é.
Bora, Obama, assinar esse Protocolo e parar com #mimimi?
P.S.2 – E depois dizem que blogar é fácil. Ou pior, vêm aqui e levam o post para um blog chupim… Humph!