O causo das obras da Marginal Tietê

O post passado, sobre as árvores da Marginal do Tietê que estão sendo derrubadas para a ampliação da via, causou alvoroço nos comentários e trouxe outros aspectos da polêmica obra.

Veja, dizer que as árvores do Tietê não são empecilho para que a obra
aconteça (porque vão ser transplantadas, substituídas e um parque linear está no projeto) não quer dizer que a obra deva ser feita ou vá trazer soluções para o caos do trânsito na cidade. A obra tem problemas
muito maiores do que as árvores que hoje ocupam a Marginal, mas não são
as árvores que poderiam barrar a construção ou até mesmo, não são elas que seriam um bom jeito de unir a população em torno do
problema.

O problema gira em torno de um imenso nó da cidade de São Paulo, já discutido no post anterior e referendado por alguns colegas do Twitter: o trânsito. O trânsito, que não é só exclusividade da cidade de São Paulo mas de todos os centros urbanos de grande adensamento populacional, nasceu há muito tempo. Muito mesmo. Antes de qualquer um desses prefeitos, governadores e presidentes em quem nós, mais jovens, tenhamos sonhado em votar. O problema do trânsito é derivado de uma política pública de adoção dos automóveis como meios de transporte e da gasolina, derivada do petróleo como nosso meio de energia para movimentar esses automóveis. Foi uma escolha política, que beneficiava algumas relações comerciais e algumas relações pessoais e sociais.

Fato é: eu vejo duas escolhas para a resolução de um problema de trânsito – uma solução rápida, barata e que a curto prazo não vai mais funcionar, e uma lenta, gradual, com investimento alto em diversos setores, que deve funcionar a longo prazo.

A primeira é fácil! Usa-se o espaço disponível (que já é pouco e elimina o canteiro central), faz-se túneis, viadutos, pontes, outro andar de marginal, sei lá! Qualquer solução que busque aumentar a área para aumentar o fluxo de carros. Essa alternativa funciona por um tempo: tempo suficiente para outros carros invadirem as ruas, a frota aumentar, e tudo ficar insuportável de novo – que parece ser a saída adotada pela prefeitura e governo do Estado de São Paulo.

A segunda é muito mais difícil. Requer educação da população, investimento em transporte público de qualidade e em ciclovias, alternativas inteligentes para o transporte de suprimentos para a cidade, principalmente os atualmente feitos por caminhões, soluções para períodos de feriados e férias, ALÉM DE obras que facilitem o transporte de carros nos dias de semana.

Para a segunda escolha, não bastam investimentos em dinheiro, mas investimentos no social, no ambiental e no econômico, que permeiem outros setores que não só o de transportes. A logística da cidade deveria ser realinhada como um todo, para permitir um fluxo mais eficiente de abastecimento e de transporte de resíduos. As pessoas deveriam ter a disposição um transporte público de qualidade, com pontualidade e preços justos, que servisse toda a cidade com eficiência. As ruas e avenidas deveriam ser pensadas de modo a permitir um fluxo rápido para quem usa transportes públicos e também para permitir o uso de bicicletas. Projetos específicos para facilitar o escoamento de pessoas em períodos de férias e feriados deveriam ser estudados e implementados. 

Mesmo com um imenso investimento financeiro por parte do governo, nada disso seria útil se as pessoas que ocupam a cidade não forem educadas para usar transporte público sem preconceitos, para pensarem duas vezes antes de tirarem seus automóveis de casa e andarem a pé ou de bicicleta, para se educarem para o trânsito defensivo e não ofensivo.

Para isso, também é necessário investimento na área de segurança. E, nesse sentido, talvez fossem necessários menos investimentos na área de saúde. E a qualidade de vida de todos aumentaria muito.

Sinto que sonhei… E você? Acha que isso é possível, ou só fazendo uma nova São Paulo?

O causo das árvores da Marginal Tietê

Até onde vale a pena “brincar” com a natureza em detrimento do progresso? 

Com essa pergunta, do @interney, lá no Twitter, é que eu tiro o pó desse teclado, as aranhas desse mouse e recomeço a blogar.

A pergunta do Sr. Edney era um chamado para a leitura de um post do Cris Dias, sobre as obras na marginal do Tietê. Para a construção de 23 Km de extensão de cada um dos lados da via, além de novas pontes e viadutos (aqui), o canteiro central, que abriga hoje cerca de 4589 árvores adultas, deixará de existir. Dessas árvores, 935 serão transplantadas. As demais, algumas já condenadas, outras não, serão ou estão sendo derrubadas (aqui e aqui).

Minha discussão sobre esse assunto começou lá no twitter. Eu escrevi “dizer que as árvores da marginal são “natureza” é discutível.” E é mesmo. As árvores da marginal estão bem longe de ser um exemplo de mata ciliar, que é um tipo de mata original da várzea de rios. Aliás, o rio também não é mais o mesmo faz tempo. Assim como o Pinheiros, do qual já escrevi um pouco aqui, perdeu seus meandros ao longo dos anos, e foi perdendo cada vez mais a mata original, dando lugar não só a marginal, mas também a prédios comerciais e residenciais. 

Rio_tiete.jpg

Fonte da fotografia: Wikipedia

Dizer que as árvores da marginal são sumidouros de carbono também não é verdade. Árvores adultas retêm uma quantidade mínima de carbono. Árvores jovens, das que estão sendo prometidas pelo governo em substituição as que serão cortadas agora, essas sim podem contribuir para a diminuição da concentração de gás carbônico (mas só um pouquinho… 15 mil árvores retêm apenas algumas toneladas de carbono e não podem ser responsabilizadas por nada em termos de aquecimento global).

Uma questão interessante dessa história toda é a permeabilidade da via. Fato é que uma área de asfalto não absorve nada de água de chuva. A troca da área de gramado e árvores para maior área asfaltada, sem dúvida trará problemas de permeabilização de água. Mas acredito que já existam técnicas na engenharia civil capazes de auxiliar o escoamento de água (a verificar).

Agora, há uma outra coisa interessante nessa história. Fiz ainda a pouco uma perguntinha no Twitter: View image

Qual é, na sua opinião, o maior problema da cidade de São Paulo, hoje em dia?

Tive até agora 10 respostas. Nove delas, relacionadas à transporte: uma sobre ônibus fretado (@clauchowi), dois sobre transporte público (@carloshotta e @nelas) e seis sobre trânsito e mobilidade urbana (@djmisscloud, @UREU, @dbonis, @robertaavila, @docouto, @Joao_Gil). Também tive uma resposta sobre desigualdade social e miséria (@kekageorgino). 

Qualquer obra que permita maior fluxo de carros, menos congestionamento e maior mobilidade podem ajudar e muito, não só o bem-estar das pessoas que usam as marginais, como o meio ambiente. Menos trânsito = menos tempo de carros ligados = menos emissão de poluentes. Dizer que as obras da marginal não vão ajudar em nada é precipitado. Dizer que é melhor manter o canteiro central em detrimento da melhoria do fluxo de veículos, é um pouco duvidoso.

Restam duas dúvidas. A primeira sobre o paisagismo da área: vai ficar só concreto e asfalto ou vai sobrar verde para alegrar os olhos do paulistano? A segunda: até onde vale a pena brincar com a natureza em busca do progresso?