Seqüestro de carbono em solos tropicais II

Em solos tropicais profundos, submetidos a grande atividade bioturbadora (misturadora) da mesofauna (principalmente cupins e minhocas, mas também formigas e outros invertebrados), como os Latossolos, há presença de estoques de carbono consideráveis em profundidade, até mesmo com valores numericamente superiores aos estoques superficiais. No ambiente tropical não se podem considerar razoáveis estimativas de estoque de carbono que não contabilizem o que está armazenado subsuperficialmente nem adequadas ou eficientes estratégias de manejo de solos ou ecossistemas pensadas sem o levar em conta. Trata-se de uma promissora área de estudo, por serem ainda escassos os trabalhos contabilizando os estoques de carbono profundos em solos de regiões tropicais em escalas mais detalhadas, e ainda menos investigada a influência das práticas de manejo do solo sobre o compartimento. Saber-se quanto carbono se encontra acumulado no solo sem uma noção de sua estabilidade frente a mudanças ambientais traduz-se em conhecimento limitado. As perdas naturais de carbono orgânico do solo (COS) não são homogêneas, variando entre classes e regiões. Tanto a natureza da matéria orgânica do solo quanto as interações entre esta e o ambiente, quer seja no solo ou fora deste, influenciam sua estabilidade no solo. De particular importância são as interações com a matriz mineral, principalmente as argilas, que podem estabilizar a matéria orgânica no solo, dificultando sua perda na forma de CO2. Aliar as informações quanto ao carbono estocado com dados confiáveis sobre sua estabilidade torna mais factível estabelecer quais áreas são mais vulneráveis, auxiliar no planejamento de uso da terra e inclusive no estabelecimento, em áreas convertidas à agricultura, de valores padrões de perdas toleráveis de matéria orgânica do solo visando minimizar a perda de qualidade do solo.

Seqüestro de carbono em solos tropicais I

Na iminência de mudanças climáticas de controversa reversibilidade, a importância do conhecimento dos estoques de carbono em diferentes classes de solos está ligada à tentativa de avaliar o que poderá ser perdido no caso de mudanças no uso da terra com a adoção de práticas intensificadoras da decomposição ou mineralização da matéria orgânica ou de aumentos de temperatura como conseqüência das mudanças climáticas globais e, mais recentemente, o que isto pode representar em termos de serviços ambientais de estocagem de carbono pelos solos. As estimativas do que se encontra estocado na forma de carbono orgânico nos solos do mundo variam de 1500 a 2300 Pg (petagramas, um petagrama corresponde a um trilhão de quilogramas ou 1.000.000.000.000.000 de gramas), dependendo da profundidade considerada. Estima-se que de 1850 a 1998, mudanças no uso da terra (basicamente desmatamento para implantação da agricultura) tenham sido responsáveis pela emissão líquida de 136 ± 55 Pg de carbono para a atmosfera, tanto pela decomposição de restos vegetais quanto pela mineralização/oxidação da matéria orgânica do solo (MOS). Os estudos de avaliação de estoques de carbono (EC) em solos têm sido feitos com o objetivo de se conhecer o mais detalhadamente possível o tamanho do compartimento solo como armazenador de carbono, imprescindível no auxílio ao levantamento dos conteúdos de carbono orgânico seqüestrados nos ecossistemas terrestres, levando em conta que em escala geológica, as trocas de CO2 entre a atmosfera e os solos são rápidas. O conhecimento detalhado dos valores e da dinâmica deste carbono pode ajudar na determinação do comportamento de sumidouro ou fonte de dióxido de carbono, principal gás de efeito estufa, do solo. Não há ainda consenso quanto a isto nem conhecimento detalhado do papel particular das classes de solo, embora existam estimativas genéricas razoavelmente confiáveis do conteúdo de carbono estocado nos solos do mundo. Embora a situação esteja mudando rapidamente, houve até há pouco aceitação quase consensual de que os conteúdos de matéria orgânica do solo até os 20-30cm superficiais seriam responsáveis pela quase totalidade do carbono orgânico (CO) estocado neste compartimento. Uma série de trabalhos recentes, no entanto, tem demonstrado a reconsideração de que há conteúdos nada desprezíveis de carbono orgânico em camadas mais profundas do solo, demonstrando o quão estável é este carbono, por isso podendo vir a ser um reservatório potencialmente mais eficiente em seqüestrar CO2 por períodos de tempo mais longos do que fazem as camadas mais superficiais. (Continua)

Mudanças climáticas e segurança nacional. I: O caso do semi-árido

Um assunto de certa urgência vem preocupando as cabeças pensantes no mundo: a humanidade, por meio dos governos nacionais, terão capacidade de lidar com catástrofes naturais resultantes das mudanças climáticas globais? Pensando em âmbito mais local, terá o Brasil algum tipo de planejamento para superar ou minimizar os efeitos destas ainda parcialmente hipotéticas catástrofes? A forma mais lógica de se avaliar o preparo brasileiro é considerar-se o que tem sido feito neste país para se enfrentar crises geradas por fenômenos naturais catastróficos. Para deixar bem claro o quão despreparado o Brasil se encontra frente a estes problemas, claro que o primeiro exemplo a ser citado é o dos episódios recorrentes e bastante previsíveis de seca na área semi-árida da região Nordeste brasileira. Ora, uma série de previsões sugerem que nos trópicos poderá haver uma extensa semi-aridificação advinda das mudanças climáticas. O Brasil tem no Nordeste um por assim dizer laboratório tanto para prever as condições futuras de partes de seu território quanto uma oportunidade desperdiçada de aplicar medidas de grande alcance para reverter os efeitos desta eventual semi-aridificação. Entretanto, age-se no Brasil, em relação às secas, como os usuários contumazes de maconha, que têm a memória de curto prazo e o raciocínio crítico severamente comprometidos. Os episódios de seca são vistos como eventos absolutamente novos e cuja previsão fora impraticável. As consequências desastrosas repetem-se a cada ciclo, comprometendo o desenvolvimento da região e dando a impressão aos habitantes que não há como se precaver nem conviver harmoniosamente com a seca. Se houver seriedade e entendimento entre vontade política, educação da população e aplicação eficaz de tecnologias existentes, há como conviver harmoniosamente com o deserto, como bem mostra Israel. Para mim parece claro que há técnicas e tecnologias já desenvolvidas que permitiriam a conviência razoavelmente tranquila com a estiagem longa. Mas não só isso. As coisas devem deixar de ser feitas com amadorismo, como se não houvesse história, como se toda pesquisa fosse a primeira, como se as instituições, principalmente governamentais, ocupadas com a região tivessem que começar a pensar nas soluções a partir do zero: há necessidade absoluta de continuidade e apartidarismo. É necessário mapear-se com o máximo de detalhes possível as áreas em que se prestam técnicas de coleta e manutenção de água, como barragens subterrâneas, que permitam a existência de uma pequena agricultura viável. Há que se informar que as áreas que se prestam a perímetros irrigados são mínimas e devem se localizar principalmente em áreas sobre material geológico sedimentar, mais poroso e cujas águas ofereceriam um menor risco de salinização e assim mesmo, fazer-se uma grande campanha, talvez usando até a lei, para que se usem técnicas de irrigação de alta eficiência e que minimizem as perdas, como o gotejamento. É necessário uma dose grande de realismo quanto a existência de áreas que simplesmente não se prestam à agricultura, nem mesmo a pequena e familiar, devido entre outras coisas ao alto coeficiente de variação da média pluviométrica, à pequena profundidade dos solos, localizadas quase sempre sobre material geológico cristalino, como granitos e gnaisses, cujas águas subterrâneas apresentam grande potencial de salinização se usadas para irrigação, inda mais quando associadas a solos pouco profundos. E, para mim talvez o mais importante, mudar o perfil da região, ganhar dinheiro produzindo ciência, transformar boa parte do semi-árido em um novo Vale do Silício, deixar para trás as histórias dramáticas de safras perdidas e animais mortos de sede. Tudo isso pode ser feito a partir da conscientização que a seca é para sempre, a região não se tornará úmida.  A se continuar no ritmo que se encontra, as coisas tendem a piorar: a extinção gradual e irresponsável da caatinga só tenderá a agravar a situação de calamidade.

Soluções para problemas insolúveis I

A pesquisa científica nos últimos anos tem tentado dar soluções técnicas a um problema que se agrava: prover qualidade de vida a uma população humana crescente sem agredir demasiadamente o ambiente. Em minha área de especialização posso dar um exemplo real deste tipo de preocupação. Com o consenso em torno das mudanças climáticas globais, a pesquisa tem sido direcionada para alternativas de se diminuir ou desacelerar a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera, principalmente o CO2 (dióxido de carbono) por meio do seqüestro de carbono, que é a retirada deste gás da atmosfera, através da fotossíntese dos vegetais superiores e o acúmulo estável deste carbono tanto na vegetação quanto na matéria orgânica do solo, que provem da decomposição incompleta do material vegetal que cai ao solo bem como da neossíntese de substâncias orgânicas mediada por microrganismos e minerais do solo. Ao mesmo tempo, a Ciência do Solo tem sido desafiada a desenvolver técnicas de manejo dos solos que possibilitem produzir alimentos, sustentavelmente, para bilhões de pessoas, perto estamos dos 10 bilhões. Ora, o pressuposto de que estes dois desafios sejam igualmente factíveis pode ser falso: talvez não seja possível uma solução técnica para ao mesmo tempo melhorar a qualidade de vida de uma população crescente e manter, ou também melhorar, as condições ambientais do mundo. Tenho dúvidas profundas acerca disto. É necessário que a classe intelectual, e não só a que possui conhecimentos técnico-científicos, perca o temor de fazer perguntas essenciais e de expor sugestões antipáticas. Este medo é um vício político, e o mundo não precisa mais de políticos, precisa de cientistas. Se alguém quiser salvar o mundo, não pode se prender a sugestões simpáticas. Consideremos o caso da agricultura. Como anteriormente discutido, os fatores de solo e clima que levam ao acúmulo de matéria orgânica nos solos geralmente são aqueles limitantes à agricultura. Esquece-se ou meramente desconhece-se que a disponibilização de nutrientes e outros benefícios da matéria orgânica para os vegetais ocorre devido à decomposição parcial do material orgânico. Seqüestrar carbono, no entanto, é tentar paralizar a decomposição o mais eficientemente possível. Combinar técnicas de manejo que maximizem produção agrícola e teores de matéria orgânica nos solos não é tarefa tão simples como alguns pesquisadores querem fazer crer. Uma saída seria separar bem as áreas destinadas à agricultura e ao seqüestro de carbono, mas o crescimento populacional e das atividades não agrícolas, como expansão da área urbana, indisponibilizam definitivamente solos com potencial agrícola. A própria cidade de Viçosa, a partir de onde escrevo, está sobre solos de várzea que seriam bastante produtivos. Sobram aqui então os morros para os agricultores. E os topos de morros, hoje utilizados para pastagens, são áreas que se prestariam bem ao seqüestro de carbono. Penso que enquanto o problema do tamanho da população humana não for seriamente considerado, as soluções técnicas que permitirão à humanidade ter um futuro serão paliativos ilusórios. Em um próximo post continuarei esta discussão. 

Materialismo cristão e o fim do mundo

Em minha opinião, há poucas pessoas tão materialistas como o devoto cristão, presidente dos Estados Unidos da América do Norte, o Sr. George Walker Bush. Ontem saiu um editorial na Nature criticando veementemente a desastrosa atuação do administrador da EPA, a agência de proteção ambiental americana, o toxicologista Stephen Johnson, que vem agindo de forma claramente harmoniosa com o que pensa o Bush, desrespeitando as leis, a ciência e a integridade ambiental do país. Um mais ingênuo poderia perguntar “Mas como, ele não é o protetor do ambiente?” Não, como deixa bem claro o editorialista da Nature “The Bush administration has always shown more zeal in protecting business interests than the environment”, ou em português claro, a administração Bush tem sempre zelado mais pela proteção dos interesses comerciais do que pelo meio ambiente. E digo mais, provavelmente sem um mínimo resquício de remorso. Por quê? Entre outras coisas, porque eles têm a bênção divina para quaisquer de suas ações. Não pode haver nada mais hipocritamente materialista que isso. Entre outras coisas, o Johnson vetou tentativas de vários estados americanos de limitarem a emissão de gases de efeito estufa em seus territórios, principalmente de automóveis, utilizando em suas justificativas dados, por exemplo, da associação de fabicantes de automóveis. Que imparcialidade! Mas a hipocrisia não é privilégio de Bush et allii. Nosso país se vangloria abundantemente das conquistas da agricultura altamente tecnificada nos chapadões do Planalto Central e outros com um mínimo de comentários sobre o inclemente extermínio do cerrado, aliás, já não ouvi eu mesmo da boca de um pesquisador da Embrapa que a implantação da agricultura e derrubada do cerrado era uma melhoria no ambiente, já que os solos deixavam de ser inférteis?. Reclama-se dos rigores da seca no Nordeste, mas poucos se dão conta que a caatinga está rapidamente sumindo, que a própria capacidade natural de regeneração deste ecossistema em alguns lugares já está mais do que gravemente comprometida. Em todo o mundo se comenta da futura falta de água mas pouquíssimos, veramente pouquíssimos fazem algo para reverter esta previsão quase certa. Já fui ridicularizado muitas vezes por sugerir a conhecidos que desligassem o chuveiro enquanto se ensaboavam, que urinassem um certo número de vezes antes de ativar a descarga. E continuamos a ser muito bons cristãos. Preparemo-nos então para enfrentar o fim do mundo próximo.    

Cemitério geológico de carbono

Com as constantes preocupações em diminuir ou neutralizar as emissões de CO2 (dióxido de carbono, principal gás causador do efeito estufa) ou descobrir alternativas que reduzam sua concetração na atmosfera, idéias miraculosas têm sido propostas. Desde espelhos para refletir os radiações solares até “aspersão” de anions sulfato (SO42-) na atmosfera (apesar de esta aspersão ter o potencial de causar o problema das chuvas ácidas resultante da combinação do SO42- e do vapor d’água, como disse um dos cientistas responsáveis pela proposta “não se pode fazer omelete sem quebrar os ovos”). Porém alternativas mais simples e de caráter não sensacionalista estão sempre batendo à nossa porta. Há mais de duas décadas as empresas exploradoras de petróleo utilizam a técnica de injeção de CO2 em alguns de seus poços para retirar os últimos resquícios de petróleo do subsolo. Porém, como a emissão de CO2 a partir da queima de combustíveis fósseis figura-se entre os principais “alvos” a serem combatidos quando se trata de mudanças climaticas globais, essa tecnica ganhou uma nova função- sequestrar ou melhor enterrar carbono. Conforme estimativas do IPCC, Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima, será necessário sumir com mais de 25 bilhões de toneladas de CO2 até o ano de 2050 e tal tecnologia tem o potencial de contribuir com pelo menos 21 % desse valor durante esse período. Tal fato, nos induz a pensar no potencial do Brasil de se tornar um grande “cemitério” geológico de carbono. Para se ter uma idéia, conforme estimativas de João Marcelo Ketzer coordenador do Cepac (Centro de Excelência em Pesquisa sobre Armazenamento de Carbono), o Brasil, sozinho, tem capacidade para estocar o equivalente ao que o planeta emite em 80 anos. Áreas usadas na exração de carvão mineral e os aquiferos salinos, cuja água é impropria para o consumo, também poderiam servir como região de estoque. Pensando nessas possibilidades, a PETROBRAS inicia a partir desse ano testes de injeção de carbono em larga escala na Bacia de Santos (sob o mar) e na Bahia (em terra), com estimativas de antingir um patamar de até 10 milhões toneladas por ano até 2014. Se a meta for atingida, será um dos maiores projetos de seqüestro geológico do mundo. Hoje, em grande escala, existem apenas três Se a meta for atingida, será um dos maiores projetos de seqüestro geológico do mundo escreveu Eduardo Geraque para o jornal folha de São Paulo. As principais limitações da tecnologia ficam a cargo- 1. dos riscos de vazamento durante o trasnporte do CO2 que seria aprisionado no processo da captura ou vazamento do próprio reservatório acarretando em passivo ambiental; 2. custos elevados!? Mas essas empresas já não ganharam uma avalanche de dinheiro as custas da exploração da Natureza porque não agora oferecer algo em troca…

Máquina de fazer petróleo

O título é meio estranho e na blogosfera internacional a notícia não é mais tão nova. Pesquisadores dos Sandia National Laboratories, no estado do Novo México, EUA, anunciaram a criação de uma máquina que “essencialmente reverte o processo de combustão” de material orgânico como combustíveis fósseis, por exemplo, chamada de Sunlight to Petrol, ou S2P. O interessante do projeto é que a fonte de energia para isso é a própria luz do sol. Ou seja, é uma máquina que imita o que fazem as plantas, convertem CO2, um gás, em material orgânico, utilizando como fonte de energia a radiação solar. Entendamos um pouco a química do processo, tanto na máquina como nas plantas. No CO2 (dióxido de carbono), a valência do elemento carbono é de +4, ou seja, o elemento tem a tendência de perder 4 elétrons, cuja carga é negativa, ficando com um excesso de 4 prótons, cuja carga é positiva; estas cargas positivas são neutralizadas por dois átomos de oxigênio, que têm cada um a tendência a ganhar dois elétrons. Diz-se então que o carbono foi oxidado, por ter perdido elétrons. Os organismos vivos são compostos majoritariamente de carbono, só que na forma reduzida, ou seja, com valência entre 0 e -4, ou seja, nos seres vivos, e em toda a matéria orgânica originada deles, inclusive os combustíveis fósseis, como o petróleo, o comportamento do carbono é o inverso do observado no díoxido de carbono, na matéria orgânica o carbono tende a ganhar elétrons, reduzindo-se. No caso das plantas, quem doa elétrons para que o CO2 seja reduzido é a água, daí a famosa équação da fotossíntese:
6CO2 + 12H2O + fótons → C6H12O6 + 6O2 + 6H2O, em que os fótons (“partículas” que compõem toda a radiação eletromagnética como a luz do sol) garantem a energia responsável por retirar dois elétrons de cada oxigênio da água. No caso da máquina S2P, a substância responsável por doar elétrons para a redução do CO2 é o CoFe2O4 (cobalt ferrite, talvez algo como ferrita de cobalto). Na verdade, os anéis deste composto são aquecidos pela luz solar, há perda de oxigênios com redução (ganho de elétrons) do ferro, depois os anéis são resfriados, o ferro é novamente oxidado, doando elétrons para o CO2, o qual é então reduzido. Interessante e inteligente, e uma possível alternativa para se fazer combustível, como gasolina, sem o uso de combustíveis fósseis, visando reduzir os efeitos das mudanças climáticas globais. O mundo não precisa de políticos, precisa de cientistas.

Aquecimento global, ciência e bom senso

O amigo Elton Valente, colega de doutorado e darwinista de primeira hora, tem opiniões muito próprias sobre uma série de assuntos, inclusive aquecimento global. De vez em quando manda-me uns textos interessantes, como o que agora reproduzirei no Geófagos. Embora eu ache que as evidências da origem humana do aquecimento global são muito fortes, o pensamento crítico e a opinião dissidente são importantíssimos para se formar um quadro sem viés, não preconceituoso dos fatos. Esta, na verdade, é a crucial vantagem do pensamento científico legítimo sobre as outras formas de interpretação do mundo: a inexistência de certezas inquestionáveis, os malditos dogmas. A seguir, as palavras do Elton:

“Em relação às questões ambientais (ou quaisquer outras), este irrelevante cronista que vos escreve já afirmou aqui no Geófagos que é preciso questionar, duvidar e querer saber. É preciso ser muito cético com a Mídia e com a Moda. Ambas são muito volúveis por natureza.
Existem duas coisas fundamentais para o desenvolvimento do mundo e da civilização: boa ciência e bom senso! Mas nestes tempos em que as forças políticas, econômicas e sociais do mundo estão “reorganizadas” e divididas novamente em dois blocos, de um lado o capitalismo globalizado e do outro a esquerda radical agarrada ao ambientalismo como “nova bandeira” anti-globalização (pois o seu comunismo-marxismo foi desacreditado, sem Sartre, sem o “jovem” Fidel, sem “O Muro de Berlin” e com os seus antigos ideais perdidos), a discussão tomou outros rumos, mas continua igualmente ideológica, radical e sem bases concretas.
É certo que é preciso rever o crescimento econômico desenfreado, que utiliza como principal fonte de energia os combustíveis fósseis e avança sobre os recursos naturais de forma quase irracional. Mas também é certo apontar o dedo em riste para os neo-medievalistas que querem atrasar, quando não banir, o desenvolvimento da ciência e da tecnologia.
O nosso colega e amigo Ítalo Rocha, idealizador do Geófagos, tem nos lembrado sempre, entre outras coisas, do importante papel do solo no seqüestro de carbono e da questão verdadeiramente científica a respeito do aquecimento global.
A mídia é em geral catastrofista, pois isso rende público e dividendos. Eles, portanto, não mostram que os gases do efeito estufa, e não apenas o CO2, mas o conjunto desses gases corresponde a apenas uma das variáveis da equação. Voluntariamente ignoram que, ao longo da evolução do planeta Terra, variáveis como a atividade solar, o vulcanismo e o vapor d’água, entre outras, foram e são extremamente importantes nos ciclos de aquecimento e resfriamento do planeta. E estes ciclos já foram em outras eras muito mais extremos do que no momento presente. Ou seja, estudos que se pretendam sérios não devem descartar os efeitos da emissão de CO2 antropogênico e de outros gases como agentes do efeito estufa, mas também devem considerar outros fatores, como por exemplo, a atividade solar, que parece ser uma das principais variáveis nessa complexa equação. Uma análise imparcial e criteriosa do problema sugere que, com base nas informações que se tem até agora, é sensato ter cautela antes de fazer previsões e afirmações categóricas sobre mudanças climáticas de longo prazo.
Por outro lado, é sensato também ter moderação no uso dos recursos naturais, investir em educação de qualidade, bem como em ciência e tecnologia para ricos e pobres de todos os continentes. Só assim teremos sucesso na substituição de velhas tecnologias por novas, mais eficientes e menos poluidoras.
O problema é que o capitalismo globalizado vai continuar drenando os recursos naturais do mundo ao seu modo e vai fazer de tudo para manter os países em desenvolvimento “em desenvolvimento”, ou seja, pobres. Do outro lado, as esquerdas radicais vão continuar buscando a qualquer preço uma bandeira ideológica para justificar a sua “luta contra o capitalismo”. Nesta peleja irracional, a bola da vez é o ambientalismo. Além das meias-verdades, muita besteira tem sido dita e praticada de ambos os lados a esse respeito. Sabendo-se que nas questões ambientais as variáveis são muitas, cada um ajusta o modelo como melhor lhe convém. Nesse embate, em meio à barulheira própria de quem pretende impor sua razão no grito, fazem calar a voz de quem deveria falar primeiro: a ciência e o bom senso.
Elton L. Valente 

Embaixadores do Clima

O British Council está selecionando três jovens interessados em meio ambiente, com idade entre 14 e 18 anos, para participar do programa Embaixadores do Clima. Os selecionados ganharão viagens com todas as despesas pagas ao Reino Unido e ao Japão, onde participarão da Conferência Internacional de Meio Ambiente, que reunirá os países do G8+5. Informações na página http://www.britishcouncil.org/br/brasil-science-chat-climate-change-climateambassador-international.htm e inscrições até o dia 31 de janeiro.

Como pagar ao meio ambiente?

A pergunta no título deste post pode parecer estranha e alguém talvez pense que me enganei ao escrever, mas não. A pergunta é relevante e pode ser melhor entendida se escrita de outra forma: se deixarmos de considerar todas as vantagens conferidas por um ambiente bem preservado e funcional como bens gratuitos e passássemos a dar valor monetário a isto, a consciência destas vantagens não seriam mais notadas e talvez melhor conservadas? Dou um exemplo. O grande desafio da humanidade atual é diminuir ou de preferência parar as emissões de gases de efeito estufa que estão causando mudanças climáticas globais de reversibilidade controversa. Tenho falado constantemente no papel dos solos como possíveis mitigadores destas emissões ao seqüestrar dióxido de carbono na forma de matéria orgânica do solo, mais conhecida como húmus. Além do efeito benéfico pela diminuição de gases de efeito estufa na atmosfera, o acúmulo e a dinâmica da matéria orgânica no solo traz uma série de outros benefícios como melhorar a fertilidade dos solos, sua estrutura, imobilizarem possíveis poluentes como metais pesados, aumentar a biodiversidade nos solos. Ora, na verdade todos estes benefícios podem ser considerados como serviços para o bem estar da sociedade. Mas o cidadão não os paga, recebe-os gratuitamente…ou melhor, não os recebe porque o acúmulo de matéria orgânica nos solos, e outros tipos de serviços ambientais, dependem da adoção de práticas de manejo dos solos principalmente por agricultores, porém não há incentivos econômicos para isto e contar com a consciência das pessoas é uma estratégia no mínimo ineficiente, convenhamos. A idéia não é nova e na verdade já há estimativas de valores para este tipo de serviço ambiental. Internacionalmente, avalia-se que o acúmulo de uma tonelada de carbono orgânico no solo em um hectare (dez mil metros quadrados) custe cerca de dez dólares. O problema é que acumular esta tonelada é muito difícil. Para se ter idéia, trabalhos recentes em áreas de pastagens nativas nos Estados Unidos avaliando o potencial de certas práticas de manejo que seqüestram carbono nos solos mostraram que se conseguia acumular em torno de meia tonelada, ou seja, 500 quilogramas por hectare, em termos monetários, míseros 5 dólares. Por comparação, em meu trabalho de tese de doutorado avaliei o quanto um determinado solo de uma região montanhosa em uma Área de Proteção Ambiental de Minas Gerais tinha acumulado de carbono. Cheguei a um valor de cerca de 300 toneladas por hectare. Trezentas toneladas multiplicadas por dez dólares são 3 mil dólares. Pouco dinheiro? Bem, considerem que nesta região a área abrangida por este solo era de cerca de 1000 hectares, acumulando em torno de 300 mil toneladas e isto já vale para 3 milhões de dólares! O ambiente natural levou milhares de anos para acumular estas 300 toneladas de carbono orgânico que custariam hoje 3 milhões de dólares para se acumular, de graça. Esta valoração no entanto nos dá uma idéia do quanto pode ser perdido se esta área for utilizada para a agricultura dita convencional, para a urbanização descontrolada e outros usos. E agora pergunto de novo: como pagar ao meio ambiente?

Categorias