Também temos o que ensinar!
O texto escrito por Jeffrey D. Sachs, economista e diretor do Earth Institute da Columbia University publicado na Scientific American Brasil (Junho, Ano 6, no. 73) intitulado ‘A Revolução Verde Africana’ atraiu minha atenção nos seguintes aspectos: de acordo com as informações contidas no texto, a produtividade alimentícia no continente africano é de aproximadamente 1 tonelada métrica de grão por hectare de terra cultiva, o que corresponde a um terço da produtividade alcançada por outros continentes. Este insucesso creditado às mudanças climáticas e a depleção dos nutrientes do solo já atingiu proporções críticas nessas regiões. Assim, estes fatores aumetam a vulnerabilidade da África à insegurança alimentar, haja visto que os preços ascendentes de alimentos no mundo impuseram uma carga paralisante ao continente, na qualidade de importadora de alimentos. Ainda no início do texto, o autor cita que para o continente africano “já está na hora de uma benção agrícola como a que impulsionou as perpectivas da Ásia” e foi está frase que me fez indagar: por que a Ásia e não o Brasil? Indubitavelemente, concordo com o autor que postula o uso de sementes de alta produtividade, fertilizantes e manejo adequado da irrigação como sendo primordiais para aceleração da produtividade agrícola, entretando, isso é “chover no molhado”. Ao invés de incitar a aquisição de insumos, que embora importante só interessa às grandes multinacionais, mais interessante seria explorar as experiências vencedoras da Revolução Verde em outros países.
É salutar lembrarmos que nas décadas de 60 e 70, o Brasil iniciou tal processo e hoje acumula experiência de sobra para superar qualquer modelo asiático financiado por agências americanas. Desenvolvemos tecnologias próprias, tanto em instituições privadas quanto em agências governamentais, como a Embrapa e as universidades. Em menos de 30 anos, o Brasil saiu de uma agricultura familiar e se firmou como um dos maiores produtores agrícolas do mundo. Exemplo mais claro é a tecnologia da fixação biologica do nitrogênio (processo pelo qual o N2 fixado da atmosfera por bactérias diazotróficas, Rhizóbios, em simbiose com as raíses de plantas é convertido em compostos nitrogenados, amônio ou nitrato, usados em diversos processos químico-biológicos do solo, especialmente importantes para a nutrição de plantas) que foi o motor propulsor que levou nosso país a ser o principal produtor de soja do mundo. Tal tecnologia também é utilizada na cultura da cana-de-açucar, pivô de ciúmes internacionais devido ao grande potencial para obter a partir dela o ethanol (combustivel limpo que atua duplamente e de forma positiva na luta contra o aquecimento global – sequetro e redução da emissão de CO2 principal gás causador do efeito estufa). Além do mais, se considerarmos a relativa “similaridade pedológica” entre Brasil e África, a experiência brasileira no que tange ao uso eficiente de fertilizantes, manejo de solos, plantio direto (somos o segundo no mundo em área plantada), uso de sementes adaptadas e de alta produtividade, uso adequado da água, dentre outros fatores associados à carência tecnológica do continente africano, temos informações e conhecimentos adquiridos (também com os erros porquê não!) suficientes para serem partilhados.
Então por que uma quantidade limitada de textos, opiniões, artigos, etc. internacionais citam o Brasil como exemplo de sucesso a ser seguido. Essa talvez seja uma das perguntas que deviriamos nos fazer! Em conversa informal entre a equipe Geófagos, nós temos a convicção de que as informações obtidas ao serem publicadas em periódicos nacionais (Revista Brasileira de Ciência do Solo, a principal do país na área das Ciências Agrárias) é um dos principais entraves à divulgação científica, uma vez que poucos países falam a lingua portuguesa. Entretanto, numa iniciativa bem pensada, de uns anos para cá a Revista Brasileira de Ciência do Solo passou a aceitar artigos científicos escritos na lingua inglesa o que aumentarrá em muito a inserção internacional dos produtos obtidos aqui. Contudo, devemos ser mais ágeis nesse sentido porque corremos o risco de não sermos lembrados uma vez que não estamos sendo vistos.
Utilização de resíduos industriais e urbanos na agricultura – Uma introdução
Recentemente muito tem-se ouvido falar na tal da “crise mundial de alimentos”. Mas até que ponto essa crise é realmente sem solução? Meu colega Ítalo iniciou em seu último post uma análise do tema. Ele abordou, principalmente, o fato dos nutrientes absorvidos pelas culturas em determinados locais onde são produzidos serem exportados para outros, onde são comercializados. A idéia central do post era que essa necessidade implicaria no retorno aos locais de produção dos resíduos urbanos da área de consumo dos produtos.
A realidade é que a grande demanda por fertilizantes junto com a tão falada alta do petróleo têm elevado de maneira assustadora os preços dos alimentos. Portanto, a necessidade de renovação dos meios produtivos é indubtável. Tem-se então uma situação onde a busca de novos insumos associada à necessidade da ciclagem efetiva dos nutrientes exportados se faz necessária. Sendo assim, a utilização de resíduos industriais e urbanos como fonte de nutrientes pode ser uma saída efetiva não só para contribuir para a redução dos altos custos de produção, mas também são interessantes soluções para problemas ambientais.
Cada vez mais é preciso conduzir estudos visando o reaproveitamento salutar desses resíduos. Muito já tem sido desenvolvido. O uso de escórias de aciaria e siderurgia, de pós de marmoraria, resíduos urbanos de lixo e também de estações de tratamento de esgoto, dentre muitos outros na agricultura são exemplos dessa nova concepção. O input desses compostos em solos muitas vezes são fontes multielementares e também apresentam capacidade de atuar não só como fertilizantes, mas também como condicionadores de solo, atuando de maneira semelhante ao calcário e, algumas vezes, ao gesso.
É claro que quando se fala em utilização agrícola de resíduos de atividades antrópicas necessariamente se fala também na necessidade de controle dos impactos ambientais negativos por esse ato proporcionados. Nesse sentido é necessário estabelecer legislações adequadas para regular tal uso. Além disso, a elaboração de técnicas que permitam determinar sítios com menor possibilidade de sofrer tais impactos também se faz necessária.
Os impactos negativos de tais técnicas vão desde a possibilidade de inserção de organismos patogênicos até a contaminação do solo e das coleções de água dos sítios de disposição.
É óbvio que técnicas adequadas de tratamento dos resíduos orgânicos como, por exemplo, a compostagem, reduzem significativamente a possibilidade de ocorrência de contaminação biológica da área. Além disso, existem técnicas auxiliares como a adição de calcário aos compostos gerados que também minimizam esse risco.
Já a possibilidade de contaminação por substâncias químicas é menor em compostos provenientes de estações de tratamento de esgoto exclusivamente urbanas. Ela também é reduzida quando uma coleta seletiva eficiente é realizada nos resíduos sólidos urbanos (lixo urbano). A definição e o mapeamento de áreas de maior risco de contaminação, que por sua vez é função de características do solo, clima, geologia e geomorfologia do sítio também apresenta-se como importante fator a ser considerado. Outro fator importante, principalmente quando se leva em consideração o solo, é a definição não só da possibilidade de contaminação e consequente lixiviação imediata das substâncias químicas presentes nesse compartimento ambiental. Alguns contaminantes apresentam características de acumulação em solos e sedimentos, o que os torna, como já dito em posts anteriores, como bombas relógio. Portanto, a melhor forma de avaliação de risco de contaminação de outros compartimentos ambientais, após o solo se contaminar, é avaliando a carga crítica do mesmo.
Sendo assim, a solução dos problemas realizados ao altos custos dos insumos agrícolas na produção dos alimentos pode estar associado ao uso de resíduos na agricultura. Além disso, se realizado de forma adequada, essa adição de tais substâncias como insumos agrícolas pode ser solução para uma série de problemas ambientais. Porém, o que é solução também pode virar um grande problema se conduzido de maneira errônea, provocando a contaminação de outros compartimentos ambientais. Riscos à vida, portanto, podem existir caso tratemos do assunto de maneira equivocada. Acredito poder-se dizer que a principal questão quando se trata de contaminação química do solo e de outros compartimentos a ele associados é temporal. Ou seja, precisamos observar o comportamento de tais substâncias associadas ao solo a longo prazo e não com o imediatismo hoje observado.
A condução de estudos para utilização de tais compostos é de vital importância tanto para a saúde do planeta, quanto para a saúde alimentar da população. Pensemos no assunto.
Entendendo a contaminação de solos como uma bomba relógio
Quando os solos recebem cargas de contaminantes, seus diversos componentes atuam no sentido de diminuir a mobilidade dessas substâncias. Isso caracteriza as barreiras geoquímicas de GLAZOVSKAYA (1990). Porém, os contaminantes outrora acumulados, se incorporados continuamente, atingirão a carga crítica do solo em questão. Essa carga crítica pode ser definida como sendo a quantidade máxima de um certo contaminante que um ecossistema pode suportar sem graves danos às suas funções ecológicas (NILLSSON & GREENFELT, 1988).
A liberação dos contaminantes nos solos e sedimentos pode ocorrer quando: (1) teores de contaminantes superam a carga crítica do solo ou (2) a carga crítica do solo é reduzida devido a mudanças nas condições ambientais, modificando a capacidade de retenção de compostos ou elementos químicos individuais. Possíveis fatores de modificação são mudanças climáticas, acidificação, erosão, mudanças no uso da terra, entre outras (SMIDT, 1991). Uma vez liberados, os químicos podem atingir os suprimentos de água superficiais e subterrâneas ou serem absorvidos pelos vegetais via solução do solo. Pode-se antever então a possiblidade de entrada dessas substâncias na cadeia alimentar causando risco a toda biota.
Geralmente as mudanças ambientais causadoras da liberação dos químicos são lentas, e os fatos acima descritos, então, caracterizam as chamadas liberações retardadas ou, normalmente denominadas, Bombas Químicas de Tempo (BATJES & BRIDGES, 1993).
Bombas Químicas de Tempo foram definidas por STIGLIANI (1991) sendo “o conceito que se refere a uma cadeia de eventos, resultando na ocorrência de efeitos danosos retardados e repentinos devido à mobilização de compostos ou elementos químicos estocados em solos e sedimentos em resposta a lentas alterações no ambiente”.
SMIDT (1991) define as Bombas Químicas de Tempo como sendo agentes xenobióticos acumulando-se no meio ambiente sem causar dano ao mesmo, até certo momento a partir do qual surgem, de forma inesperada, danos apreciáveis e, muitas vezes, irreversíveis. É um dano crônico, por requerer um intervalo apreciável de tempo entre a exposição e o dano, e agudo uma vez que o dano ocorre inesperadamente e intensamente.
Esses conceitos permitem o entendimento do acúmulo de algumas substâncias químicas danosas ao ambiente em solos e sedimentos como uma bomba relógio. Logicamente o termo Bombas Químicas de Tempo é utilizado apenas como uma metáfora, representando uma analogia entre as Bombas Químicas de Tempo e as bombas relógios convencionais (KLIJN, 1991).
Esta comparação se torna possível, uma vez que em ambas situações se tem um estoque de explosivos e um agente detonador. Sem um dos dois a explosão não seria possível, portanto não existiria a bomba. O estoque de explosivos é representado pelo acúmulo de compostos ou elementos químicos nos solos e sedimentos, enquanto que o detonador é representado pelas lentas alterações no ambiente (KLIJN, 1991).
Outra semelhança às bombas relógios convencionais é descrita por KLIJN (1991). A semelhança consiste na presença de um alvo de contaminação. Esse alvo pode ser entendido como o compartimento afetado pela liberação do poluente. Dessa forma, podemos entender como possíveis alvos das Bombas Químicas de Tempo, as águas subterrâneas (freáticas ou artesianas), águas superficiais ou mesmo a biota (vegetais, animais e microrganismos).
Um exemplo clássico que consegue correlacionar satisfatoriamente a ação de uma substância química acumulada durante um certo período de tempo com os efeitos intensos provocados pela sua liberação é descrito por STIGLIANI (1988 ) em sua publicação denominada “Changes in valued capacities of soils and sediments as indicators of non-linear and time-delayed environmental effects” acerca dos efeitos provocados pela intensa liberação de SO2 na bacia do Big Moose Lake, no Estado de Nova York, Estados Unidos. O pH do lago permaneceu constante entre 1760 até 1950. A partir de então o pH do lago caiu cerca de uma unidade logarítimica em um intervalo de 30 anos. Esse fato ocorreu cerca de 70 anos após o início e 30 anos após o pico das emissões. A lenta mudança ambiental, nesse caso, é a queda gradual da capacidade tampão dos solos da bacia hidrográfica pela acidificação e como conseqüência a redução da capacidade tampão das águas do lago. A redução da capacidade tampão dos solos provavelmente foi causada pelo acúmulo da substância em questão em níveis superiores à carga crítica dos solos e sedimentos, ou o que é mais provável, a redução da carga crítica desses compartimentos ambientais devido à acidificação. Essa redução acarretou em mortandade de peixes no lago, exemplificando assim todas as fases das Bombas Químicas de Tempo.
Nesse exemplo o acúmulo de SO2 e outros elementos ou compostos poluentes caracteriza os explosivos. As lentas alterações ambientais provocando a redução no poder tampão dos solos e sedimentos e consequentemente a liberação de elementos ou compostos graças à acidificação representa o detonador. Já a redução do pH das águas do lago com o aporte dos poluentes e a conseqüente mortandade de peixes são os efeitos que caracterizam que os alvos foram atingidos.
A carga crítica dos solos depende principalmente de fatores (características) do próprio solo como, por exemplo, teores de matéria orgânica, óxidos de ferro, alumínio e manganês, pH, textura e capacidade de troca catiônica. Dessa forma, é possível mapear a carga crítica dos solos utilizando-se de índices calculados de acordo com a importância de cada variável no fenômeno de retenção de poluentes em solos. Esse é o princípio da obtenção de mapas de vulnerabilidade de solos à contaminação por compostos químicos. Áreas mais vulneráveis são aquelas onde a carga crítica é menor enquanto áreas menos vulneráveis são aquelas onde a carga crítica é maior.
Todo o cenário mostrado caracteriza a importância de estudos referentes às Bombas Químicas de Tempo. Esses estudos devem se concentrar na previsão de efeitos danosos devido ao acúmulo de químicos nos ambientes e a adoção de medidas mitigadoras dos efeitos potencialmente danosos aos meios físico, antrópico e biótico. Dessa forma, é necessária a obtenção de ferramentas que permitem antever e prevenir esses efeitos. Posteriormente essas ferramentas devem ser adotadas permitindo um manejo, uso e ocupação dos ambientes mais racionais e assim constituírem um importante passo para a obtenção de um desenvolvimento ecologicamente sustentável.
Problemas ambientais atuais e desenvolvimento sustentável
A pressão exercida pelo homem sobre os ecossistemas tem aumentado desde a segunda revolução industrial refletindo na necessidade de desenvolvimento de novas técnicas de conservação, prevenção e mitigação ambientais. Essas técnicas visam reduzir os níveis de degradação ambiental recentemente observados como a contaminação das coleções d’água e dos solos, a poluição atmosférica e a substituição indiscriminada da cobertura vegetal nativa, com a conseqüente redução dos hábitats silvestres, entre outras formas de agressão ao meio ambiente (Silva, 2002).
A mudança da postura do homem com relação à natureza teve início a partir da década de 60. Marco importante no desenvolvimento das ciências ambientais foi o lançamento do livro “Primavera Silenciosa” da britânica Rachel Carson que mostrava os efeitos negativos do uso indiscriminado de insumos agrícolas. Desde então a preocupação de promover a mudança de comportamento no relacionamento entre o homem e a natureza começa a ser observado. O principal objetivo passa a ser o alcance do equilíbrio entre os interesses econômicos e conservacionistas levando à melhorias na qualidade de vida da população, dando origem aos processos que, em conjunto, futuramente seriam denominados de desenvolvimento sustentável. Tal desenvolvimento pode ser entendido como um modelo que visa atender as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de gerações futuras atenderem suas próprias necessidades.
O desenvolvimento sustentável, além do desenvolvimento social e equilíbrio ecológico, deve ainda ser acrescidos de um enfoque especial no desenvolvimento econômico como uma das principais vertentes. Nesse sentido, acrescido de um espírito de responsabilidade comum, os modelos produtivos são levados a sentidos harmoniosos, o que os torna não mais destrutivos, mas sim construtivos, como ferramenta de manutenção da qualidade de vida das gerações atuais e futuras. Dessa forma, pode-se perceber que o modelo de desenvolvimento atualmente proposto não condena o desenvolvimento econômico, muito pelo contrário, atribui a ele um importante papel social e ambiental.
O modelo de desenvolvimento atualmente proposto entende que, além da imposição legal como meio de alcance de melhorias ambientais, existem ainda os aspectos éticos, ecológicos e econômicos a ele relacionado. Pode-se entender os aspectos éticos como uma medida do grau de responsabilidade do agente impactante. Já os aspectos ecológicos permitem a escolha de melhores alternativas para minimizar as influências negativas das diversas atividades humanas. Os aspectos econômicos envolvem tanto as vantagens competitivas de uma política ambiental responsável, como a obtenção de certificados ambientais ou mesmo os menores custos das ações preventivas em relação às ações corretivas. Nesse ponto, as técnicas preventivas, como os estudos de vulnerabilidade ambiental vêm ganhando força como ferramentas que permitem planejamentos ambientais mais adequados, eficientes e baratos.
O modelo de desenvolvimento industrial (pode-se incluir nesse ítem o desenvolvimento agroindustrial) implantado após a revolução industrial no século XIX promoveu não só o aumento da extração dos recursos naturais, como também tem emitido cada vez mais produtos de alta sofisticação, cuja composição dificulta sua degradação natural. Muitos destes ao reagirem com substâncias ácidas ou fogo, liberam compostos tóxicos que podem até mesmo ser letais para os seres vivos, além de causarem uma lenta e contínua destruição do ambiente (Pereira Neto, 1996). Pode-se concluir, portanto, que a evolução da população e a forte industrialização aumentaram significativametne a geração de resíduos das mais diversas naturezas, biodegradáveis, não biodegradáveis, recalcitrantes ou xenobióticos, que determinaram um processo contínuo de deterioração ambiental com sérias implicações na qualidade de vida do homem (Bidone e Povinelli, 1999). Nesse ponto é necessário argumentar que, acompanhado de ferramentas de gestão ambiental eficientes, tal desenvolvimento industrial pode ser perfeitamente encarado como um fato positivo e não apenas como agente de degradação ambiental.
Por tudo exposto acima as questões que envolvem o tratamento e a disposição final de resíduos e outros poluentes têm se tornado cada vez mais importantes para o homem moderno. A necessidade de consciliação do desenvolvimento com a sustentabilidade ambiental tem feito com que as diversas questões referentes a esses assuntos sejam exploradas e desenvolvidas continuamente.
Ferramentas preventivas como estudos de vulnerabilidade e risco de contaminação dos diversos compartimentos ambientais (solo, água, ar) também tem sido frequentemente utilizadas como forma de antever e evitar a ocorrência de problemas ambientais. O contato íntimo dos resíduos, ou qualquer outra forma de contato de poluentes provenientes das mais diversas atividades humanas, com os solos e as conseqüências da ocorrência não planejada desses fatos tornam essa questão de vital importância para o desenvolvimento sustentável local e regional.
É importante ressaltar que técnicas para prevenção ou mitigação de impactos ambientais existem. Algumas vezes elas não são economicamente viáveis. Outras, é a falta de vontade por parte do agente impactante que não permite a implantação das mesmas. É importante que os agentes públicos, privados e até mesmo os consumidores façam sua parte. Diversos são os mecanismos que permitem saber se uma empresa é ambientalmente responsável. O principal deles é a certificação ambiental, sendo a mundialmente conhecida série ISO 14000 a mais comumente encontrada. Assim sendo, cabe também a nós observarmos a procedência dos produtos consumidos, dando preferência àqueles que, em sua produção, incorporem um padrão de qualidade ambiental. Só dessa forma podemos esperar que os resultados do meio produtivo se aproximem do desenvolvimento sustentável inicialmente e conceitualmente proposto. Fato esse ainda longe de ocorrer nos dias de hoje.
Ciência Ambiental por completo
Caros leitores,
Tantas vezes vejo nos notíciários, em conversa com profissionais da área e até mesmo em comunicados científicos um profundo desconhecimento sobre a verdadeira ciência ambiental. Quando se pensa em ambiente logo associamos a ele o verde de uma floresta ou os tons azulados da água. Isso é um reflexo puro e simples das conotações colocadas pelos grandes veículos de comunicação sobre o ambiente como meio físico ou biótico. Quando se inicia os estudos de disciplinas que se enquandram especificamente no campo das “ambientais” logo se vê que os pilares básicos para qualquer pesquisa na área são os três meios: físico, biótico e para surpresa de muitos o sócio-econômico ou antrópico, chamem-no como quiserem. Em suma isso significa que uma ação ambiental efetiva deve sempre envolver os três meios. Ou seja, não existe preservação, conservação ou planejamento ambiental, bem como quaisquer outros trabalhos correlatos sem que haja um envolvimento desses meios. Na minha opinião, inclusive, a esses três meios deveriam ser dadas importâncias iguais em trabalhos ambientais. Mas isso é uma discussão futura. Hoje o que temos visto é uma atribuição exacerbada de questões relacionadas aos meios físico e biótico. Mas pensemos bem se esse tipo de abordagem funciona. Imaginemos temas relacionados à qualidade da água em centros urbanos. É possível resolver os problemas de saneamento básico, de esgotamento sanitário e consequentemente da despoluição dos corpos d´água sem que problemas de moradia sejam solucionados? É óbvio que não. Enquanto existirem déficits habitacionais, moradores em favelas, vilas ou palafitas sem a mínima estrutura, problemas realacionados a despejos de esgotos e resíduos sólidos continuarão existindo. O mesmo raciocínio se aplica, por exemplo, aos carvoeiros do interior do Brasil ou àqueles vendedores da fauna silvestre na beira das estradas brasileiras. A escolha que essas pessoas têm que fazer é simples e negligenciada pelas autoridades. Muitas vezes, para obter o alimento da família, essas pessoas são obrigadas a “esquecer” da legislação ambiental e instintivamente optarem pela vida. Assim, se as ciências ambientais não forem consideradas por completo, inclusive com considerações acerca dos problemas sociais, trabalhos nessa área estarão fadados ao fracasso.
Intemperismo químico de rochas e salinização de solos do semi-árido
Em certo trecho no último post comentei sobre a inadequação do uso de águas subterrâneas na irrigação em solos do semi-árido desenvolvidos sobre rochas que chamei de cristalinas. Este assunto, parece-me, merece um pouco mais de explicação. As rochas do mundo dividem-se em três grandes grupos: rochas ígneas, rochas sedimentares e rochas metamórficas. As rochas ígneas são aquelas que se originam do resfriamento do magma, quer no interior de câmaras magmáticas, quer no ambiente externo, como exemplos de rochas ígneas pode-se citar os granitos e os basaltos. Rochas sedimentares são aquelas originadas a partir da litificação (“petrificação”) de sedimentos. Os sedimentos podem originar-se da intemperização de outras rochas, da precipitação de compostos, como o carbonato de cálcio, ou de restos de organismos vivos. Os exemplos são o arenito, o calcário e os diatomitos. As rochas metamórficas, por sua vez, formam-se em ambientes de elevadas pressão e temperatura. As metamórficas podem ter origem tanto em rochas ígneas quanto em sedimentares: o gnaisse pode vir tanto de um granito quanto de um argilito. O que eu chamei de rochas cristalinas, muito comuns no semi-árido nordestino, são basicamente rochas ígneas e metamórficas dos grupos do granito e do gnaisse. Estes materiais são compostos predominantemente dos minerais quartzo, micas (biotita e muscovita) e vários feldspatos. Assim como já foi diversas vezes discutido aqui, a ação dos agentes intempéricos (água, vento, temperatura, organismos vivos…) causa a decomposição da rocha, o intemperismo. O intemperismo físico é resumidamente a quebra da rocha em pedaços menores. O intemperismo químico abrange tanto a perda de elementos químicos como a formação de minerais novos, chamados minerais secundários, em contraste com os minerais primários que compunham as rochas. Em regiões úmidas, a água, principal agente intemperizador químico, dissolve e carrega os elementos químicos em profundidade e superficialmente. É por isso que solos de regiões quentes e úmidas são nutricionalmente pobres. Em regiões semi-áridas, os solos costumam ser mais férteis porque o intemperismo tanto de rochas quanto de solos é muito menos intenso. Por esta mesma razão, as águas subterrâneas das áreas sobre material geológico cristalino têm teores de sais (medidos em termos de condutividade elétrica) mais alto. Além de o intemperismo ser incipiente, a alta evaporação muitas vezes faz com que haja ascensão de água subsuperficial por um processo chamado capilaridade. Esta água é rica em sais e, quando evapora, deixa o excesso de sal na superfície dos solos. Quando se irrigam as culturas com água de alta salinidade, é também a evaporação seguida de precipitação dos sais nos solos que causam a salinização. Além dos efeitos deletérios para as espécies vegetais, o excesso de sais pode comprometer também a estrutura dos solos, por causar dispersão de argilas e colóides orgânicos, destruindo os agregados, diminuindo a porosidade, aumentando a densidade do solo e agravando o problema já grave da erosão ao diminuir a infiltração de água nos solos. Assim, tanto a pobreza nutricional de solos de regiões tropicais úmidas, a profundidade do saprolito nestas áreas, quanto a riqueza nutricional de alguns solos do semi-árido e sua predisposição à salinização, dependem da intensidade da ação do intemperismo.
Mudanças climáticas e segurança nacional. I: O caso do semi-árido
Um assunto de certa urgência vem preocupando as cabeças pensantes no mundo: a humanidade, por meio dos governos nacionais, terão capacidade de lidar com catástrofes naturais resultantes das mudanças climáticas globais? Pensando em âmbito mais local, terá o Brasil algum tipo de planejamento para superar ou minimizar os efeitos destas ainda parcialmente hipotéticas catástrofes? A forma mais lógica de se avaliar o preparo brasileiro é considerar-se o que tem sido feito neste país para se enfrentar crises geradas por fenômenos naturais catastróficos. Para deixar bem claro o quão despreparado o Brasil se encontra frente a estes problemas, claro que o primeiro exemplo a ser citado é o dos episódios recorrentes e bastante previsíveis de seca na área semi-árida da região Nordeste brasileira. Ora, uma série de previsões sugerem que nos trópicos poderá haver uma extensa semi-aridificação advinda das mudanças climáticas. O Brasil tem no Nordeste um por assim dizer laboratório tanto para prever as condições futuras de partes de seu território quanto uma oportunidade desperdiçada de aplicar medidas de grande alcance para reverter os efeitos desta eventual semi-aridificação. Entretanto, age-se no Brasil, em relação às secas, como os usuários contumazes de maconha, que têm a memória de curto prazo e o raciocínio crítico severamente comprometidos. Os episódios de seca são vistos como eventos absolutamente novos e cuja previsão fora impraticável. As consequências desastrosas repetem-se a cada ciclo, comprometendo o desenvolvimento da região e dando a impressão aos habitantes que não há como se precaver nem conviver harmoniosamente com a seca. Se houver seriedade e entendimento entre vontade política, educação da população e aplicação eficaz de tecnologias existentes, há como conviver harmoniosamente com o deserto, como bem mostra Israel. Para mim parece claro que há técnicas e tecnologias já desenvolvidas que permitiriam a conviência razoavelmente tranquila com a estiagem longa. Mas não só isso. As coisas devem deixar de ser feitas com amadorismo, como se não houvesse história, como se toda pesquisa fosse a primeira, como se as instituições, principalmente governamentais, ocupadas com a região tivessem que começar a pensar nas soluções a partir do zero: há necessidade absoluta de continuidade e apartidarismo. É necessário mapear-se com o máximo de detalhes possível as áreas em que se prestam técnicas de coleta e manutenção de água, como barragens subterrâneas, que permitam a existência de uma pequena agricultura viável. Há que se informar que as áreas que se prestam a perímetros irrigados são mínimas e devem se localizar principalmente em áreas sobre material geológico sedimentar, mais poroso e cujas águas ofereceriam um menor risco de salinização e assim mesmo, fazer-se uma grande campanha, talvez usando até a lei, para que se usem técnicas de irrigação de alta eficiência e que minimizem as perdas, como o gotejamento. É necessário uma dose grande de realismo quanto a existência de áreas que simplesmente não se prestam à agricultura, nem mesmo a pequena e familiar, devido entre outras coisas ao alto coeficiente de variação da média pluviométrica, à pequena profundidade dos solos, localizadas quase sempre sobre material geológico cristalino, como granitos e gnaisses, cujas águas subterrâneas apresentam grande potencial de salinização se usadas para irrigação, inda mais quando associadas a solos pouco profundos. E, para mim talvez o mais importante, mudar o perfil da região, ganhar dinheiro produzindo ciência, transformar boa parte do semi-árido em um novo Vale do Silício, deixar para trás as histórias dramáticas de safras perdidas e animais mortos de sede. Tudo isso pode ser feito a partir da conscientização que a seca é para sempre, a região não se tornará úmida. A se continuar no ritmo que se encontra, as coisas tendem a piorar: a extinção gradual e irresponsável da caatinga só tenderá a agravar a situação de calamidade.
Qual a verdadeira qualidade da água que bebemos?
Já faz algum tempo, mais especificamente desde os tempos de graduação em Engenharia Ambiental que faço alguns questionamentos sobre a verdadeira qualidade da água que bebemos. Analisemos alguns aspectos muitas vezes negligenciados no dia a dia. Imaginem uma grande bacia hidrográfica. Ao longo dessa bacia diversos municípios captam água para ser consumida pelas suas populações. Segundo números publicados no site www.tratamentodeagua.com.br cerca de 75% dos municípios brasileiros apresentavam rede coletora de esgotos em 2006. Desses municípios, uma minoria apresenta estações de tratamento de esgotos em pleno funcionamento. Além disso, os métodos convencionais de tratamento de esgotos e de água não apresentam técnicas de retirada de compostos químicos de difícil degradação, como metais pesados, agrotóxicos ou mesmo medicamentos ingeridos e posteriormente excretados pela população. Especialistas atribuem à retirada dos sólidos em suspensão, tanto no tratamento de esgoto quanto no tratamento de água, a retirada paralela desses compostos que estariam adsorvidos à fração sólida presente na água ou no esgoto a serem tratados. Mas até que ponto essa afirmação é verdadeira? Até acredito que seja, porém, qual a eficiência de retirada desses compostos via tal método? Essas são perguntas ainda sem respostas, até porque no controle de qualidade da água técnicas de identificação de tais compostos não são rotineiramente utilizadas. Uma vez que as cidades estão presentes ao longo da bacia hidrográfica podemos chegar à conclusão de que as últimas literalmente estarão consumindo “ESGOTOS TRATADOS” das primeiras. Considerando então que, como já dito anteriormente, apenas métodos de tratamentos convencionais de água e esgoto estão presentes em nossa realidade ficamos com alguns questionamentos: onde vão parar todas os compostos de difícil degradação? Será que eles são realmente eliminados adsorvidos à fração sólida retirada durante o tratamento? Afinal, qual a verdadeira qualidade da água que bebemos?
Materialismo cristão e o fim do mundo
Em minha opinião, há poucas pessoas tão materialistas como o devoto cristão, presidente dos Estados Unidos da América do Norte, o Sr. George Walker Bush. Ontem saiu um editorial na Nature criticando veementemente a desastrosa atuação do administrador da EPA, a agência de proteção ambiental americana, o toxicologista Stephen Johnson, que vem agindo de forma claramente harmoniosa com o que pensa o Bush, desrespeitando as leis, a ciência e a integridade ambiental do país. Um mais ingênuo poderia perguntar “Mas como, ele não é o protetor do ambiente?” Não, como deixa bem claro o editorialista da Nature “The Bush administration has always shown more zeal in protecting business interests than the environment”, ou em português claro, a administração Bush tem sempre zelado mais pela proteção dos interesses comerciais do que pelo meio ambiente. E digo mais, provavelmente sem um mínimo resquício de remorso. Por quê? Entre outras coisas, porque eles têm a bênção divina para quaisquer de suas ações. Não pode haver nada mais hipocritamente materialista que isso. Entre outras coisas, o Johnson vetou tentativas de vários estados americanos de limitarem a emissão de gases de efeito estufa em seus territórios, principalmente de automóveis, utilizando em suas justificativas dados, por exemplo, da associação de fabicantes de automóveis. Que imparcialidade! Mas a hipocrisia não é privilégio de Bush et allii. Nosso país se vangloria abundantemente das conquistas da agricultura altamente tecnificada nos chapadões do Planalto Central e outros com um mínimo de comentários sobre o inclemente extermínio do cerrado, aliás, já não ouvi eu mesmo da boca de um pesquisador da Embrapa que a implantação da agricultura e derrubada do cerrado era uma melhoria no ambiente, já que os solos deixavam de ser inférteis?. Reclama-se dos rigores da seca no Nordeste, mas poucos se dão conta que a caatinga está rapidamente sumindo, que a própria capacidade natural de regeneração deste ecossistema em alguns lugares já está mais do que gravemente comprometida. Em todo o mundo se comenta da futura falta de água mas pouquíssimos, veramente pouquíssimos fazem algo para reverter esta previsão quase certa. Já fui ridicularizado muitas vezes por sugerir a conhecidos que desligassem o chuveiro enquanto se ensaboavam, que urinassem um certo número de vezes antes de ativar a descarga. E continuamos a ser muito bons cristãos. Preparemo-nos então para enfrentar o fim do mundo próximo.