Feliz dia de Darwin!

Hoje se comemora mundialmente os 200 anos de nascimento do naturalista inglês Charles Darwin, patrono do Geófagos, descobridor do mecanismo pelo qual as espécies mudam ou perecem, a seleção natural. Indubitavelmente um ser humano ímpar, meu ídolo pessoal, tio Charles, como gosto de chamá-lo, mudou com sua perigosa idéia simples todo o pensamento humano, definindo novos rumos para a ciência e filosofia. Darwin é daqueles raríssimos cujo mero nome é um título. A partir da leitura de seu livro sobre o papel da minhoca na formação de horizontes orgânicos em solos, The formation of vegetable mould through the action of worms, with observations on their habits, tive a idéia do nome deste blog. O Geófagos comemora entusiasticamente este dia, esperançoso de que chegue o tempo em que visões supersticiosas primitivas do mundo dêem definitivamente o lugar à visão maravilhosa da vida que o trabalho iniciado por Darwin nos proporcionou.

Um pouco de geoquímica II

Olá amigos da comunidade geofágica, depois de algumas conversas e puxões na orelha, I’m back!
Turbulências ocorridas nas minhas tarefas diárias me levaram a perda total da administração do meu tempo e, com isso, negligenciei o Geófagos. Sinceras desculpas a todos, em especial aos meus amigos autores deste blog, os quais eu crédito toda a fama, não merecida, a mim atribuída pelos leitores.
Pois bem, agora com tudo nos devidos lugares e fazendo o tempo correr a meu favor, manterei maior regularidade nas postagens em respeito a todos vocês leitores e aos meus companheiros de jornada. Obviamente a prioridade será falar de ciência, Pilar Mestre deste blog, mas já peço desculpas no caso de algum deslize.

Assim, retornando ao trabalho, vou pagar minha dívida com vocês, respondendo ao Quiz deixado na minha última postagem: Porque, de maneira geral, se observa mais feldspatos potássicos (ortoclásio, KSi3AlO8) do que cálcicos (anortita, CaSi2Al2O8) nos solos tropicais?

Na tentativa de facilitar o entendimento, vamos adotar os dados listados na tabela abaixo:

Energia molar de formação de alguns óxidos metálicos, nos minerais silicatados

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Íon

Grupo

minerais silicatados

Energia (kg/cal)

Ca2+

839

Mg2+

912

Fe2+

322

K+

299

H+(na oxídrila, OH)

525

Ti4+

2882

Al3+ (nos sais)

1878

Al3+ (nos Al silicatos)

1793

Si4+ nos MSiO4 Nesossilicato

3142 (18852)

Si4+ nos MSi2O7 Sorossilicato

3137 (21511)

Si4+ nos MSiO3 Inossilicato

3131(25048)

Si4+ nos MSi4O11 Inossilicato

3127 (27290)

Si4+ nos MSi2O5 Filossilicato

3123 (29981)

Si4+ nos SiO2 Tectossilicato

3110 (37320)

M = metal (Fe, Mg, Ca, Al, K, etc.);
Os números entre parênteses foram calculados fixando as quantidades de oxigênio

Como podemos observar, a energia de formação das pontes entre os metais alcalinos e alcalinos terrosos e oxigênio são menores em relação a ligação Al-O, que por sua vez é inferior as ligações Si-O.

Antes de responder ao quiz e indo um pouco mais adiante, a partir dos dados acima podemos extrair mais duas informações importantes: a sequência de cristalização e a estabilidade termodinâmica desses minerais, ou seja a maior ou menor resistência deles ao intemperismo. Por exemplo, a energia de formação para os diferentes grupos de minerais silicatados (dados entre parênteses) aumenta na direção dos nesossilicatos para os tectossilicatos, onde claramente há um aumento no número de íons silício por mol de oxigênio. Na medida em que ocorre este aumento, maior é a estabilidade do mineral. Deste modo, é por isso que observamos a grande quantidade de quartzo (tectossilicatos) nos solos tropicais.

Concluindo, na medida em há o aumento na substituição do Si pelo Al na estrutura do mineral, ele se tornará mais susceptível ao intemperismo por causa do enfraquecimento da estrutura cristalina. Como mencionado no post anterior, no ortoclásio (KSi3AlO8) a relação Si:Al é 1:1, contra 2:2 para anortita (CaSi2Al2O8). Respondido? Espero que sim e qualquer dúvida estamos ai para ajudar.

PS: Observem o valor da energia de formação dos óxidos de Ti! Agora está mais claro porque a presença do rútilo (TiO2) e da ilmenita (Fe2+TiO3) tem sido rotineiramente constatada nos solos de regiões tropicais.

Juscimar Silva

O Auto da Barca do Inferno: Uma Referência

Por Elton Luiz Valente

No próximo dia 12 comemora-se o bicentenário de nascimento de “Tio Charles” (Darwin) e 150 anos da publicação de sua grande obra A Origem Das Espécies. Para a Comunidade Geofágica, esta é uma data festiva e de altíssima relevância histórica, principalmente para a História da Ciência.

Estive neste fim de semana em Belo Horizonte. Não resisti à tentação de assistir ao filme O Dia Em Que a Terra Parou, uma adaptação rasa (para não dizer plana, com ligeira inclinação para o ralo) do original de 1951, que já não era lá grande coisa, mas pelo menos tinha a Guerra Fria como trunfo (o enredo da canção homônima de Raul Seixas é muito mais plausível).

Ora direis, e daí? O que tem a ver uma coisa com a outra? Darwin, o filme, O Auto da Barca do Inferno (de Gil Vicente) e os propósitos primevos do Geófagos? Vamos lá!

O “quase misterioso” Gil Vicente encenou O Auto da Barca do Inferno pela primeira vez em 1517, em Lisboa, Portugal. A peça é uma crítica impecável às organizações sociais humanas. Uma obra prima. Portanto, Gil Vicente é considerado o fundador da moderna dramaturgia em língua portuguesa. A peça é uma alegoria dramática do julgamento das almas. Há duas barcas à espera: uma, a que vai levar a maior parte dos julgados, é guiada pelo próprio Diabo, a outra é guiada por um Anjo. Entre os “réus” há figuras “ilustres” da sociedade. Ou seja, figuras tacanhas, cuja “relevância” está em promover os vícios que corroem a humanidade.

Quanto ao filme O Dia Em Que a Terra Parou (em ambas as versões), a humanidade é, ela própria, retratada como o seu maior inimigo. Em tempos de “aquecimento global”, esse argumento (citando Erich Remark) não traz ‘nada de novo no front’. Já discutimos no Geófagos que a Terra não precisa de ninguém para “salvá-la”, ela se salva sozinha, sempre foi assim, ela é auto-regulável. Nós é que precisamos nos salvar de nós mesmos.

Darwin nos deu, senão a maior, pelo menos uma das maiores contribuições neste sentido. Mas o homem tem um problema freudiano com a evolução. O homem se recusa a aceitar que não é “a obra máxima” da criação de Deus, menos ainda da Natureza. Note-se que para ser a obra máxima da criação precisa-se de um criador, de uma figura patriarcal, que se encaixe perfeitamente em um universo de dimensões imagináveis, que esteja ao alcance de nossa compreensão demasiadamente humana, urdido em um enredo de epopéia maniqueísta. Como “constante de ajuste”, encaixa-se nessa equação a hipocrisia (pois todos têm necessidades forjadas na evolução das espécies e muitas destas necessidades são conflitantes com as “determinações do criador”).

Daí, Tio Charles, cujas armas são argumentos embasados na razão, na lucidez e no bom senso, não tem como lutar, muito menos vencer, essa batalha que é travada no terreno das freudianidades humanas. Se fossem superados esses vícios freudianos e essas ilusões, talvez pudéssemos, quem sabe, chegar ao super-homem de Nietzsche.

Platão tentou nos tirar da caverna uma vez. Darwin, com toda sua sabedoria, humildade e boa vontade nos deu uma enorme contribuição neste sentido. Nenhum teve êxito. Ou seja, enquanto isso vamos nos apertando, nos acotovelando na ante-sala da Barca do Inferno. Pois ninguém vai nos salvar de nós mesmos. É uma empreitada inglória, de teor quixotesco, tentar salvar quem não quer ser salvo.

 

Mudanças: cultivo protegido

Nestes últimos sete meses a quantidade de mudanças por que eu e minha família passamos foi impressionante: mudamos de cidade, mudei de universidade, mudamos novamente de cidade e eu de nível, deixei de ser um estudante e me tornei até que enfim um pesquisador realmente. E mudei completamente de área de pesquisa. Durante minha pós-graduação trabalhei com a interação entre o solo e a matéria orgânica, agora trabalharei com uma das áreas da horticultura que menos utilizam o solo: o cultivo protegido.

O cultivo protegido é resumidamente um conjunto de práticas de agricultura em que se modifica drasticamente o meio para se atingir o crescimento vegetal ótimo. Para se alcançar este nível de otimização, o cultivo é realizado em um ambiente protegido, em geral estufas (greenhouses). Embora às vezes o plantio seja feito diretamente no solo, o mais comum é que se utilize práticas hidropônicas ou aeropônicas em substratos inertes. Desta forma, além de se controlar o ambiente físico, monitorando temperatura e umidade, controla-se também o ambiente radicular, a disponibilidade de nutrientes, pH da solução nutritiva, temperatura da água. É de certa forma uma visão urbana e futurista da agricultura. Aliás, se a humanidade algum dia estabelecer colônias em outros planetas ou na lua, a produção de alimentos deverá ser feita em ambientes protegidos, utilizando-se a maior parte da tecnologia desenvolvida aqui mesmo.

Na Terra, no entanto, a prática do cultivo protegido visa produzir alimentos principalmente em períodos ou lugares em que as condições climáticas locais são ou estão inadequadas ao plantio a céu aberto. Em geral, esses períodos são também aqueles em que as cotações dos produtos são mais altas, exatamente pela escassez no mercado. Eis por que as hortaliças hidropônicas são comumente mais caras. A agricultura protegida, principalmente a horticultura,  pode ser praticada inclusive em locais em que há escassez de terras. Existem inclusive propostas de criação de fazendas verticais em um mundo excessivamente urbanizado. O cultivo em ambiente protegido pode além disso tornar o uso de água e nutrientes, além de outors insumos, uma prática mais racional em um mundo de recursos naturais escassos ou escasseando.

Uma pergunta incoveniente!

Resolvi escrever esse post em resposta a uma pergunta que vem me acompanhando desde o momento em que resolvi especializar-me (em nível de mestrado e posteriormente de doutorado) em Ciência do Solo. Na entrevista de seleção do mestrado, ela foi feita pela primeira vez. O questionamento era “Por que um Engenheiro Ambiental deseja especializar-se em Ciência do Solo”? Essa incômoda perguntinha ainda seria feita em diversas outras oportunidades, inclusive em outras entrevistas para diversos fins.
Bem, para início de conversa , algumas colocações já foram por mim feitas aqui e aqui. A resposta parece-me óbivia, mas pelo que tenho visto não é. Citarei a seguir alguns dos pontos que nortearam e ainda norteiam minhas respostas e que, acredito eu, deixam claro a importância dos solos para as questões ambientais.
Em primeiro lugar gostaria de citar a prórpria definição do termo “meio ambiente”, conforme obtida no Vocabulário Básico de Recursos Naturais e Meio Ambiente, publicado pelo IBGE no ano de 2004. Tal publicação pode ser obtida aqui. Segundo ela, meio ambiente refere-se ao “conjunto dos agentes físicos, químicos, biológicos e dos fatores sociais susceptíveis de exercerem um efeito direto ou mesmo indireto, imediato ou a longo prazo, sobre todos os seres vivos, inclusive o homem”.
No meu modo de ver os solos estão enquadrados diretamente como agentes físicos e ainda indiretamente como agentes químicos, biológicos e sociais. Logo, ele também é objeto de estudo das Ciências Ambientais e consequentemente da Engenharia Ambiental, que é uma das vertentes das primeiras. As funções ecológicas dos solos são os maiores exemplos dessas relações diretas e indiretas. A capacidade de reter poluentes e/ou contaminantes, sustentar edificações, ser meio de desenvolvimento de plantas, ser meio de produção de alimentos, estar em contato direto com águas superficiais e subterrâneas, de sustentar a macro, meso e microfauna edáfica, de fornecer importantes nutrientes para o desenvolvimento da vida, participar dos ciclos biogeoquímicos ativos no planeta, entre outras, é que me permitem dizer que sim, os solos também são compartimentos ambientais de vital importância. Estão intimamente ligados à manutenção de uma boa qualidade de vida para os seres vivos, inclusive os “human beings”.
Mas por que então essa pergunta continua sendo feita constantemente e o espanto está na face do interlocutor quando o mesmo percebe que meu currículo posterior a graduação em Engenharia Ambiental foi feito com base nesse importante compartimento? Vejo diversas respostas para tal, mas duas, na minha opinião, sobressaem às demais. A primeira é que a Engenharia Ambiental deriva da Engenharia Civil e, como tal, desde o seu nascimento esteve muito voltada às questões referentes ao saneamento. É também à esse motivo que atribuo a evidente lacuna de questões biológicas no currículo dos diversos cursos de Engenharia Ambiental país a fora. Outro aspecto importante é que a Ciência do Solo, por outro lado, sempre esteve ligada às Ciências Agrárias e, portanto, ainda há “ranço” tal que questões inovadoras ligadas à ela, por exemplo as tecnológicas e ambientais, ainda sofrem certo preconceito por parte dos cientistas do solo clássicos. O conjunto da obra é, como eu disse em um post antigo, o solo como um compartimento esquecido pelas ciências ambientais.
Carlos Pacheco

O aquecimento não é o único problema ambiental relevante

Eu não tenho dúvidas de que o maior problema das Ciências Ambientais, hoje em dia, é que elas passaram a ser tratadas como “Religiões Ambientais“. Os dogmas imperam, as decisões (pelo menos parte delas) têm sido tomadas com base em fé e não em dados concretos. É como disse anteriormente, quem vai contra é tratado como um pecador perante um tribunal de inquisição católico.
 
O pior é que atitudes como essas acabam fomentando os questionadores da “problemática ambiental”, ou mesmo os aproveitadores dela. Essa questão de crédito de carbono, por exemplo. Ela é tão ridícula que hoje é mais fácil você receber créditos caso desmate uma área e implante uma “floresta” de eucalipto do que quando o cidadão preserva a mata nativa.
 
A discussão das causas do aquecimento global também desviam o assunto em pelo menos dois sentidos preocupantes. O primeiro, refere-se ao não combate à vulnerabilidade das populações aos efeitos das mudanças climáticas (já que o aquecimento global, atropogênico ou não, é um fato consumado). O outro é bater na tecla do aquecimento e esquecer-se por completo das questões toxicológicas das emissões industriais. Ao invés de discutir-se tais aspectos, o que observa-se é uma verdadeira guerra de “egos”, onde as duas vertentes preferem ficar discutindo quem está com a razão do que tomar medidas realmente efetivas.
 
Outras questões também podem ser colocadas, uma delas é o caso Amazônia. A mídia e os políticos desviam toda a atenção para o “pulmão do mundo” enquanto o cerrado, aí no Centro Oeste, é devastado sem dó nem piedade. A Mata Atlântica então coitada, é melhor nem comentar. E Norman Myers há algum tempo já definia esses dois ecossistemas como hotspots (áreas de conservação e preseração prioritárias). E a questão do saneamento básico? Os lixões continuam  aí pelo país. Órgãos ambientais estaduais e federais se gabam por implantarem aterros “controlados” (que nada mais são que enterros de lixo, uma vez que o tratamento de efluentes não existe nesse tipo de aterro). Tratamento de esgoto efetivo está longe de ser uma realidade na maior parte dos municípios. 
 
Enfim, ficaria escrevendo por mais um bom tempo aqui, mas vou parar. Acredito que só tratando as questões ambientais cientificamente, e não religiosamente, é que pode-se chegar a resultados práticos satisfatórios. Continuando como está, muito me preocupa o futuro da humanidade (não do planeta).
Carlos Pacheco
 

Mais Uma Tese Defendida No Mundo!

Por Elton Luiz Valente

Senhores! Peço licença para anunciar que defendi na tarde de ontem (29/01/2009) minha tese de doutorado. Cujo título, sugerido pela banca, é: Relações solo-vegetação no Parque Nacional da Serra do Cipó, Espinhaço Meridional, Minas Gerais.

Embora a ciência, necessária, prime pela objetividade, peço, humildemente, que me permitam fazer uso de adverbialidades. Pois o fato posto de defesa da tese implica dizer que encerrei minha carreira oficial de estudante (stricto sensu). Relembrando e parafraseando Vladimir Maiakovski, eu digo: ‘não estou alegre, é certo, mas também por que razão haveria de ficar triste?’

Não estou alegre porque, imagino, a vida vai exigir que eu deixe de novo a Academia. E o meu retorno a Ela foi A-B-S-O-L-U-T-A-M-E-N-T-E gratificante. Em um curto período de tempo foram diversas mudanças para melhor (de rumo, de entendimento, de aspirações). Foram mudanças rápidas, graduais e consecutivas a cada disciplina ótima que eu fazia. Além dos amigos que adquiri no percurso desta empreitada. E agora devo perdê-los de alguma forma.

Um bom exemplo desses amigos, somos nós, Os Quatro Mosqueteiros do Geófagos! Porque, vocês sabem, Os Três Mosqueteiros eram na verdade quatro. Mas existem outros excelentes amigos adquiridos aqui, alguns deles ilustres blogueiros, como Marcus Locatelli. E alguns que perdemos definitivamente na seara de Deus, que sempre vem de alguma forma ceifar seus campos e realizar sua colheita… E assim temos de seguir em frente.

Por tudo isso não estou alegre. Mas não há razão para estar triste. Como diria Maiakovski: “As ameaças e as guerras, havemos de atravessá-las, rompê-las ao meio, cortando-as como uma quilha corta as ondas.”

Numa tentativa de reconhecimento à minha Comissão Orientadora, tanto de mestrado quanto de doutorado, bem como de alguns caríssimos amigos (consultores) que me socorreram em algumas encruzilhadas desse caminho, eu escolhi uma frase atribuída a Sir. Isaac Newton, na qual ele diz, com muita propriedade: If I have seen further it is by standing on the shoulders of Giants – Se enxerguei mais longe foi porque me apoiei nos ombros de Gigantes.

É isso meus caros! Até mais ver…!

Ciência do Solo: Muito além de uma Ciência Agrária.

Em recente discussão, nós, autores do Geófagos, decidimos por uma “volta à fazenda”, conforme proposto pelo Ítalo. Trocando em miúdos, resolvemos voltar o foco para nossa origem, a Ciência do Solo. Para selar essa volta, acredito eu, não há nada melhor que um texto que introduza o leitor ao assunto, mostrando o quão abrangente é essa ciência e que, ao contrário do que costumeiramente se vê e entende, ela abrange uma gama de assuntos que se estendem muito além das Ciências Agrárias.
Piaget diz que a multidisciplinaridade se faz presente quando “a solução de um problema torna necessário obter informação de duas ou mais ciências ou setores do conhecimento sem que as disciplinas envolvidas no processo sejam elas mesmas modificadas ou enriquecidas”. Pois bem, acredito que a ciência do solo se enquadra bem nesse conceito.
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Foto de um perfil de solo – LATOSSOLO VERMELHO-AMARELO Distrófico húmico do Parque Nacional do Caparaó (MG)
Ao contrário da visão tradicional e da “neoclássica” de Ciência do Solo, acredito que ela possui sim uma multidisciplinaridade nata, bastante evidente em uma análise crítica bem fundamentada. Tal multidisciplinaridade fica também evidente quando recorre-se aos primórdios dela, quando Dokuchaev descreveu o solo como um corpo natural dinâmico, cuja dinâmica depende de uma interação de fatores como relevo, ação da biota, clima e tempo. Desses, alguns são fatores ativos, passivos e controladores que são representados, respectivamente, pela biota e clima, tempo e relevo.
A ciência do solo é uma Geociência, principalmente, quando do campo da Pedologia. Afinal, estudar um corpo formado ao longo de centenas ou milhares de anos não nos remete ao estudo do Tempo Geológico e das muitas modificações sofridas pela esferas terrestre ao longo de sua evolução? Estudar os depósitos minerais lateríticos não nos remete à Geologia Econômica? Existem processos sedimentares sem antes haver intemperismo e pedogênese? Enfim, as respostas são claras.
Ela também é uma Ciência Agrária. O exemplos mais claros são, sem dúvida, as interações solo-planta e suas consequências. É o aspecto que tem ficado mais evidente ao longo do tempo, principalmente, devido ao viés agrícola predominante ao longo de sua evolução. Esse já foi deixado subentendido por Heródoto, Teofrasto, Crescentius, etc… Essa íntima relação e a evolução da Ciência do Solo, como um todo, é que permite a exploração agrícola de terras antes consideradas inapatas ao uso agrícola, como o cerrado brasileiro, por exemplo.
Ciências básicas como Química, Física e Biologia também fornecem importantes ferramentas para a evolução desse jovem ramo da ciência. Outras não tão básicas, como a Mineralogia, por exemplo, também o fazem. O equilíbrio químico e as relações da macro, meso e microfauna do solo são bases para estudos do intemperismo e da pedogênese, sobretudo em regiões tropicais úmidas.  A resistência mecânica das rochas é importante fator naquelas áridas e também nas geladas. A resistência de um solo aos processos erosivos está intimamente relacionada com suas características físicas e também com a mineralogia de suas argilas. A fertilidade ou toxicidade de um solo dependem não somente dos teores de nutrientes presentes, mas também de sua especiação. A mineralogia também está frequentemente ligada à maior ou menor disponibilidade de nutrientes, elementos e substâncias tóxicas. A qualidade e a quantidade de recursos hídricos subterrâneos também são fortemente dependentes da qualidade do solo, ou seja, do conjunto de fatores químicos, físicos, biológicos e mineralógicos dos solos.
Obviamente, esses exemplos não esgotam a multidisciplinaridade dessa ciência. Entretanto, eles representam bem como a Ciência do Solo vai muito além de uma Ciência Agrária. O viés agrícola foi sem dúvida o que deu sustentação ao crescimento desta como ciência, sua importância é inquestionável, mas a visão estritamente agrária dessa ciência não mais é a sua realidade.
A expansão e o amadurecimento da Ciência do Solo podem ser vistos em trabalhos recentes. Questões relacionadas à gênese, uso e a ocupação do solo têm sido atualmente reconhecidos como importantes vertentes econômicas, como importantes reservatórios e sequestradores de carbono, como fundamentais para a vida em ambientes hostis como Antártica (por exemplo, pelo transporte através de correntes marinhas do fósforo adsorvido em óxidos férricos Australianos), meio de suporte para crescimento de matérias primas energéticas, como as dos biocombustíveis, entre outras. Mas muito além disso, não tem-se perdido o foco de questões sempre presentes nas discussões, entre elas e, talvez a mais importante, a segurança alimentar (aqui incluídos aspectos qualitativos e quantitativos da produção de alimentos).
Carlos Pacheco

Mulheres na Ciência (e na chefia)

Tenho certeza que está próximo o tempo em que mulheres em posições proeminentes na Ciência serão um fato tão comum a não causarem mais surpresa. A Ciência do Solo, ramo do conhecimento a que se dedicam todos os autores do Geófagos, e a Embrapa assumem a vanguarda desta tendência. Acaba de assumir a chefia geral da Embrapa Solos, localizada no Rio de Janeiro, a pesquisadora Maria de Lourdes Mendonça Santos Brefin, engenheira agrônoma maranhense com doutorado em Pedologia e Geomática pela École Polytechnique Fédérale de Lausanne (Suíça). Doutora Maria de Lourdes é a primeira mulher a ocupar o cargo.

Nota de Rodapé (2)

Por Elton Luiz Valente

Recentemente publiquei aqui no Geófagos, em 14/12/2008, um texto no qual eu falava das decepções com alguns “ícones” de nossa história. Naquele texto, emiti minha opinião a respeito da conduta de Niemeyer na sua condição de “celebridade”. Pois bem, na penúltima edição da revista Veja, edição 2096 de 21/01/2009, saiu uma matéria interessante sobre Niemeyer e sua tentativa de “amenizar” a biografia de Stalin. Vale a pena conferir. A matéria está disponível em:

http://veja.abril.uol.com.br/210109/p_130.shtml.

PS. Ultimamente tenho refletido sobre a velhice. Se tivermos sorte (ou não), a maioria de nós vai enfrentá-la. “Em face dos últimos acontecimentos”, fiquei pensando… A velhice pode ser muito boa se o indivíduo deixar, por completo, de se comportar como o imbecil que foi na juventude.

 

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