Esse Brasilão Imenso: nota de rodapé (4)
Por Elton Luiz Valente
Neste momento estou em Jataí-GO. Durante a viajem fiquei tecendo umas conjecturas sobre o Brasil e resolvi postar esta “nota” aqui no Geófagos.
Quem quiser ver, in loco, uma amostra da grandeza do Brasil é só viajar pelo Estado de Goiás (entre outros). O gigantismo do desenvolvimento agropecuário no nosso Planalto Central tem pouco paralelo no mundo. O custo disso não pode ser negligenciado, é uma questão importantíssima. Aliás, já sinalizei minha opinião a esse respeito no texto anterior. Para abrir espaço ao desenvolvimento foi preciso, entre outras coisas, atacar o Cerrado, o segundo maior bioma brasileiro. Mas não é disso que quero falar.
Quero dizer apenas que quem quiser vislumbrar a grandeza de que falo é só viajar, por exemplo, de Goiânia a Jataí (BR-060). Aí se entende porque o Brasil não quebra (financeiramente) apesar dos políticos e da massa acéfala de eleitores que temos!
Coisas acontecem
Acho que as coisas estão avançando. Ontem mesmo comecei a instalar meu primeiro ensaio de porte como pesquisador da Embrapa. Até agora tinha apenas sido observado por meus pares veteranos, cumprido algumas tarefas burocráticas do período probatório, escrito um projeto. Inicialmente vou trabalhar com nutrição do morangueiro (Fragaria x ananassa) cultivado sobre solo em casa de vegetação. O assunto é relevante porque a área cultivada está crescendo no Brasil e há poucos dados experimentais para as condições brasileiras. É muito bom sentir-se útil e poder aplicar com segurança o que foi aprendido em árduos anos de estudo. Havia uma dúvida inicial sobre se eu deveria trabalhar com pimentões ou morangos: há muita demanda de pesquisa para ambas as culturas, principalmente nas condições do Distrito Federal. Não nego que minha preferência estava com os morangos. Aliás, as plantas na minha foto da barra lateral esquerda são morangueiros, cultivados em casa de vegetação e fertirrigados. A casa de vegetação em questão pertence a um produtor da região de Braslândia-DF. Enfim, aproveitei o fim de semana para fazer um pequeno relato pessoal, não fugi de todo ao foco do blog e, por ser fim de semana, a audiência é um tanto baixa. Mais adiante pretendo abordar mais tecnicamente problemas de nutrição de plantas em cultivo protegido.
A Savanização do Mundo: um ensaio
Por Elton Luiz Valente
Antes de ir ao assunto destas linhas, é importante lembrar que o Cerrado não é Savana. A Savana encontra-se na África, em condições de solo e clima diferentes daqueles do Cerrado. O Cerrado é um bioma exclusivo da América do Sul. As duas vegetações têm alguma semelhança fitofisionômica e a Savana foi descrita primeiro, daí diz-se que o Cerrado é uma vegetação savânica, ou seja, semelhante à savana, mas não igual.
Já publicamos aqui no Geófagos um texto onde se comenta, em linhas breves e gerais, a relação do homem com vegetações de natureza savânica, como o Cerrado.
O homem originou-se na África, em meio à Savana. Isso implica dizer que ele foi gerado, moldado, forjado, sofreu os processos da seleção natural e da evolução das espécies em meio à vegetação savânica. Portanto, quando ele se encontra em um ambiente destes é bem possível que sejam ativados instintos atávicos, provocando sensações ancestrais nos seus cinco (ou seis, ou mais) sentidos. É mais ou menos o mesmo efeito que faz o cheiro, o calor e a pulsação do colo da mãe em um moleque, ou outro filhote de mamífero qualquer.
O homem enxerga o ambiente savânico instintivamente, com todos os seus sentidos ativados, gostando do que vê e se sentindo muito bem ali – aqueles indivíduos urbanos, hi-tech, que têm horror a picada de insetos e otras cositas mas, são uma variedade que surgiu recentemente na espécie, correspondem ao “erro amostral” desta minha “análise livre”. Observem que Gorilas e Chimpanzés, nossos primos mais próximos, também não gostam da floresta, eles gostam da borda da floresta. Quem gosta do interior das florestas são os primatas com rabo, nossos primos mais distantes. O homem pode até conservar um pedaço de floresta numa encosta, num canto qualquer, mas ele não ama a floresta, ao contrário, o homem tem medo dela, lá ele se sente ameaçado, uma presa fácil. Diferente dos ambientes savânicos, que fazem parte da sua essência evolutiva. Fazer com que o homem ame ou pelo menos preserve as florestas não é tarefa fácil, mesmo mostrando os inúmeros benefícios que a conservação delas pode nos render.
Vejam que a primeira providência do colonizador é o desmatamento. Ele precisa de área para suas culturas e gosta muito daqueles campos imensos, savanizados, que ele próprio produz. O homem savanizou o globo terrestre. A savanização do mundo é sua obra máxima, natural, com um viés bíblico, profético. É o seu legado. Exceto por uma mancha de floresta amazônica aqui, umas coníferas ali (que estão sofrendo constante pressão de desmatamento), o restante do mundo, por onde o homem passou, já está savanizado. Some-se a isso a pressão econômica do agronegócio, que impulsiona o homem a agredir a própria Savana (o Cerrado que o diga), ou seja, por dinheiro ele é capaz de agredir o seu ambiente mais querido, “o seu lar primevo” – a ganância é outro traço marcante de nossa personalidade – Bingo! Não vai sobrar floresta no mundo. O homem vai desmatá-las todas. A degradação ambiental, as mudanças climáticas e outras questões direta- ou indiretamente vinculadas aos desmatamentos, se possível, só serão resolvidas depois, podem apostar!
A velha questão das Áreas de Preservação Permanente de novo – O caso da nova legislação Catarinense
Por Carlos Pacheco
Ontem, em matéria apresentada pelo Jornal Nacional, a velha discussão sobre as Áreas de Preservação Permentes (APP´s) voltou à tona. Dessa vez, o objeto de discórdia é o novo código ambiental catarinense. A matéria completa pode ser vista aqui. Eu não poderia deixar de dar os meus “pitacos” no assunto, é claro.
Em primeiro lugar esse fato leva-me a uma preocupante constatação. O despreparo dos administradores brasileiros vai além do que eu poderia imaginar. É princípio básico da legislação vingente no país que aquelas municipais não podem ser menos restritivas que as estaduais e que, por sua vez, não podem ser menos restritivas que as federais. Portanto, gastar-se dois anos para criar um código ambiental que fere nitidamente os princípios da legislação ambiental federal é um erro gravíssimo. Pior que isso, é um desperdício de dinheiro público. Mas, enfim, o objetivo desse blog não é discutir política e sim aspectos técno-científicos, então vamos a eles.
Não é segredo para os que acompanham o Geófagos há algum tempo que sou defensor da reforma da legislação referente às áreas de preservação permanente. Meu principal argumento sempre foi o fato de que sem um equilíbrio sócio-ambiental não se consegue um efetivo resultado na preservação e/ou conservação ambiental. Um exemplo claro disso é a retirada das “zonas” produtivas (muitas vezes, em regiões muito acidentadas, são justamente parte das APP´s de matas ciliares) de pequenos agricultores obrigando-os a migrar para centros urbanos como forma de sobrevivência, mesmo que abaixo da linha de pobreza.
Esse fato, ao invés de resolver problemas relacionados à erosão e assoreamento de corpos d’água, muitas vezes cria diversos outros de maior grau impactante graças ao problema social criado. O bom senso deveria aqui reinar, deveria-se pensar também na dignidade do ser humano. Mas isso, não deve, em hipótese alguma, ser feito de forma aleatória. É preciso a existência de critérios para definição da área protegida. Critérios esses ambientais, claro, mas também sociais. Ambientalistas e produtores devem ceder um pouco para que se atinja o bem comum. Além disso, cada caso é um caso. Cada um exige diferentes ponderações e consequentemente diferentes resultados e conclusões. Não é simplesmente reduzir a área protegida. É isso, que ao meu ver, tem sido feito em Santa Catarina. Definitivamente não é por aí. Onde estão os laudos que mostram a melhor relação “custo-benefício” do modelo proposto? Gostaria de estar errado, mas provavelmente eles não existem. Nesse caso, sem tais estudos prévios, o ambiente corre sim um sério risco.
Gostaria de, finalizando esse post, enfatizar a necessidade de compatibilização de ações ambientais com ações sociais. Exemplos não faltam. As técnicas agroecológicas estão aí mostrando ao mundo que é possível melhorar a vida de pequenos produtores rurais mantendo uma boa qualidade ambiental. Fica também a mensagem de que assuntos ambientais são primordialmente técnicos e não políticos. Decisões a respeito dos mesmos devem ser baseados em estudos prévios e não em imposições legais, muitas vezes feitas por pessoas sem experiência no assunto. Flexibilizar a legislação é necessário, mas criteriosamente. Fica então o desafio aos “ambientólogos” de plantão, como compatibilizar o social com o ambiental?
A importância do desequilíbrio nos sistemas naturais
Por Elton Luiz Valente
O equilíbrio nem sempre é benéfico aos sistemas naturais. Poderíamos afirmar que em todos os ecossistemas o desequilíbrio, em determinadas faixas de amplitude, é mais importante do que o equilíbrio. E são muitos os exemplos que a natureza nos oferece.
Quando um sistema natural encontra-se bem estabelecido, dizemos que ele está em equilíbrio dinâmico, como uma floresta, por exemplo. A expressão dinâmico implica dizer que o sistema está em constante ajuste de suas forças, entropia e entalpia, as forças desorganizadoras contrapondo-se às forças organizadoras, e vice-versa. Assim os sistemas naturais evoluem, porque não há neles um verdadeiro equilíbrio no sentido estrito, isso permite fluxos de massa e energia entre os seus diversos compartimentos.
Uma planta só consegue absorver oxigênio, água e nutrientes porque há um desequilíbrio de forças, uma diferença de potencial, entre os seus tecidos e o meio, seja entre o sistema radicular e o solo, permitindo a absorção de água e nutrientes, seja entre a parte aérea e a atmosfera, permitindo as trocas gasosas.
O desequilíbrio é quase uma regra neste Velho Planeta. O homem não deve agredi-lo com destruições, extinções de espécies e etc., por várias razões, incluindo-se aí sua sobrevivência, mas, principalmente, por questões morais e éticas. A natureza, em sua dinâmica própria, sempre sofreu catástrofes naturais e extinções em massa que redirecionaram o seu processo evolutivo, ora para um lado, ora para o outro. Nós, por exemplo, só estamos aqui porque houve uma grande extinção de espécies há 65 milhões de anos, quando os Dinossauros reinavam impávidos sobre este Planeta. Tal processo, ou “desequilíbrio”, abriu espaço, ou nicho ecológico, para que nossa espécie pudesse surgir a partir da evolução dos mamíferos.
Se não fossem os movimentos tectônicos, o vulcanismo, a deriva continental, a orogênese (formação das montanhas e cordilheiras), as forças erosivas já teriam aplainado a crosta terrestre e esta provavelmente seria uma planície coberta pelos oceanos. Mas imaginemos que sobrassem algumas partes emersas, formando grandes planícies, perfeitamente aplainadas pela erosão, perfeitamente equilibradas do ponto de vista topográfico, geomorfológico. A região central da Austrália pode ser considerada como uma “maquete” de um sistema assim. Encontra-se lá um grande deserto, uma vasta região plana e árida, com pouco fluxo de massa, com pouco fluxo de energia e, consequentemente, com pouco “fluxo de vida”. Ou seja, o desequilíbrio de forças, a diferença de potencial, é que permite os fluxos de massa e energia que mantêm os sistemas funcionando. Se o sistema fosse perfeitamente equilibrado na Terra, este seria um planeta estagnado e sem vida.
Portanto, é preciso ter cuidado com a defesa incondicional do equilíbrio. Arrisco-me a dizer, inclusive, e já mudando o rumo desta prosa, que a famosa busca filosófica pelo equilíbrio encerra um componente perigoso, uma espécie de ovo da serpente, pois o equilíbrio pode levar à estagnação. Neste caso, o importante é o processo e não o seu fim, em outras palavras, o que importa é buscar o equilíbrio, mas não encontrá-lo. O problema é que isso contraria o senso comum, contraria cânones e dogmas, contraria o enredo cultural de uma humanidade que é essencialmente ungida na espiritualidade e na emoção, em detrimento da razão. E assim caminhamos, muitas vezes cometendo erros e equívocos, crentes que estamos no caminho da virtude, sem perceber que o abismo, ou melhor, a planura seca e árida, está logo ali na frente.
A hora do planeta no Brasil, iniciativa sem sentido?
Por Carlos Pacheco
Parece-me que as duas últimas semanas marcaram o “renascimento” do “terrorismo ambiental” no Brasil. Todos sabemos das repercussões dadas, pelo grande público, aos programas apresentados pela grande mídia, principalmente aqueles veiculados em programas já consagrados. Alguns desses programas iniciaram há algumas semanas um bombardeio de informações sobre o aquecimento global e suas consequentes mudanças climáticas. Diga-se de passagem, grande parte dessas informações ainda sem respaldo científico algum.
Como já comentei em outros posts aqui publicados, é preciso que sejamos criteriosos ao discutir-se assuntos tão importantes e com consequências tão sérias. Trabalhar como “lobistas” do tempo não levará a resultados positivos e sim, a um grande alarmismo sem fundamentação adequada e com resultados práticos duvidosos.
Tome-se por exemplo a Hora do Planeta. Qual o sentido de apagar-se as luzes em um país cuja energia elétrica gerada é “essencialmente limpa”? Honestamente não sei. Para ser sincero até vislumbro algo no sentido de chamar atenção, mas nenhuma ação econômica efetiva. Seria mais lógico uma grande mobilização nacional pelo combate ao desmatamento, não só da Amazônia, mas também do Cerrado, da Mata Atântica, etc… Ações contra o uso abusivo de automóveis, contra o consumismo exarcebado e, principalmente, a favor da modernização e do uso do transporte público também seriam muito mais efetivas do que acompanhar os “modismos ambientais mundiais”. Talvez eu esteja equivocado em chamar tal ação de modismo ambiental, até porque, no exterior, tal ação é mais plausível, sobretudo em grande parte dos países desenvolvidos, cuja energia provém de matriz “suja” (queima de combustíveis fósseis, em geral).
É preciso que falemos menos e ajamos mais. Precisamos entender melhor o que está acontecendo e aí sim tomarmos atitudes adequadas. É óbvio que o consumismo exagerado tem que ser combatido. É óbvio também que necessitamos mudar alguns de nosos hábitos diários. Isso todos sabemos. Entretanto, ainda temos dúvidas básicas a respeito dos fenômenos do clima. Talvez a maior delas é saber se o aquecimento é ou não antropogênico ou, ainda, qual a porcentagem de culpa de cada uma delas. Outras tantas dúvidas existem. O que se sabe é que ainda é muito, mas muito cedo mesmo para atribuírmos culpa única e exclusivamente à vertente antropogênica.
Portanto eu digo, estudemos mais, leiamos mais, pensemos mais e pesquisemos mais. Após esses pequenos exercícios estaremos preparados para combater, efetivamente, o que estar por vir. Estaremos também melhor preparados para reduzir nossa vulnerabilidade em relação a tais fenômenos. Enfim, sejamos mais “ambientólogos” e menos ambientalistas.
Introducing ourselves to the world
I believe that the launching of ScienceBlogs Brazil will attract some international audience, and as Portuguese is not yet a widely spoken language, a brief introduction in English may be a good action.
First things first, Geofagos means Geophages. All of the authors of Geofagos are Soil Scientists and firmly believe that the soil is the key to the proper functioning of the environment and of human society. The name of this blog was largely intended as an homage to Charles Darwin’s last book, The formation of vegetable mould through the action of worms, with observations on their habits, in which he beatifully described how earthworms, geophagous animals, slowly build the organic matter rich upper horizon of soils from temperate regions. Earthworms, along with termites, play an outstanding role in maintaining the health and quality of soils from tropical regions, especially the very deep Oxisols, known to us as Latosols.
Brazil has recently received international attention because of its many environmental and social problems, but we are also known for our impressive tropical agriculture (bio)technology. There is no doubt that agriculture has, in many instances, increased the environmental crisis in which we live, but agricultural technology advances have also saved millions of lives from this terrible disease, famine. We believe that agriculture’s negative impact to the natural world can be greatly avoided by the knowledge and utilization of appropriate agronomic techniques. That’s what we want, spread that knowledge.
We are very happy and excited by the opportunity to be part of the ScienceBlogs outstanding group of bloggers.
Apresentação ao mundo
Não pude desperdiçar a oportunidade de escrever o primeiro post da mais nova encarnação do Geófagos. Certamente novos leitores surgirão, então um pequeno histórico pode ser relevante.
O nome Geófagos foi inspirado em dois eventos aparentados. Quando decidi criar o blog Geófagos, eu acabara de cursar minha última disciplina no doutorado em Solos e Nutrição de Plantas na Universidade Federal de Viçosa, disciplina chamada Pedogeomorfologia, que resumidamente trata da interação entre a geologia e o relevo influenciando a formação dos solos e estes “retroinfluenciando” os dois primeiros. O professor, Carlos Schaefer, durante toda a disciplina enfatizou o papel crucial da biota do solo sobre a formação e características dos solos tipicamente tropicais, como os Latossolos. Minhocas e cupins são os principais atores nesta peça milenar, ambos geófagos. Neste mesmo período eu estava lendo fascinado o último livro publicado por Charles Darwin, The formation of vegetable mould through the action of worms, with observations on their habits, que entre outras coisas trata da surpreendente ação das minhocas na formação da camada superficial, enriquecida em matéria orgânica, de solos de regiões temperadas. Novamente, geófagos fazendo solos.
Por fim, inspirado na minha impressão de que, afinal, somos todos geófagos, estava decidido o nome do blog. A decisão de escrever um blog de divulgação científica surgiu, primeiramente, pela ânsia de expor em linguagem clara o muito ou pouco que eu até então aprendera ou fizera em ciência; e pela constatação de que muitos dos blogs de ciência que eu então lia, a maioria extintos, discutia muito a divulgação científica mas não divulgava nada. A vocação, por assim dizer, de divulgador científico foi despertada em mim pela leitura fascinante da coluna que o saudoso paleontólogo americano Stephen Jay Gould mantinha na revista Natural History. Controvérsias à parte, ninguém escreveu sobre ciência tão bem quanto Gould, sinceramente acredito.
A primeira versão do Geófagos foi timidamente lançada em julho de 2006, na plataforma Blogspot. Quando realmente vi que havia leitores interessados e que o tempo não era perdido, resolvi “profissionalizar” o blog um pouco mais, principalmente em termos de visual, e mudei para o WordPress. Nesta segunda fase convidei alguns amigos do doutorado para escrever conjuntamente o Geófagos e a tarefa foi aceita pelo Carlos Pacheco, pelo Elton Valente e pelo Juscimar Silva. Elton e Juscimar, assim como eu mesmo, terminaram já o doutorado. O Pacheco está nos finalmentes. Crescemos, recebemos mais leitores do que ousáramos desejar e fomos enfim convidados pelo Carlos Hotta e pelo Átila Iamarino para fazer parte do condomínio de blogs de ciência Lablogatórios. Aceitamos entusiasticamente e não nos arrependemos.
O espírito empreendedor de Hotta e Iamarino abriram as portas para que pudéssemos hoje publicar o Geófagos na versão brasileira da maior plataforma de blogs científicos do mundo. É uma oportunidade que desejávamos mas que nem sempre acreditamos possível. Para mim em especial, esta nova etapa do Geófagos vem acompanhada de perto de uma nova e feliz etapa profissional como pesquisador da Embrapa Hortaliças. O ano de 2009 será sem dúvida memorável. Faremos tudo para manter e melhorar a qualidade dos posts publicados no Geófagos e tentaremos ser uma referência para aqueles que procurarem informações acessíveis sobre Ciência do Solo, Agricultura e Meio Ambiente. Que o Geófagos viva.
Faltam terras para a agricultura?
Em notícia originalmente publicada na Folha de São Paulo e transcrita pelo Jornal da Ciência, o Ministro da Agricultura, sr. Reinhold Stephanes, defende mudanças no Código Florestal afirmando que “se as áreas prioritárias à conservação da biodiversidade fossem implementadas hoje, não existiriam hectares disponíveis para [novas] atividades agrícolas, tampouco para o desenvolvimento urbano e econômico (…) Faltaria área para o plantio de alimentos e para o crescimento da população”. Pergunto-me, antes de tudo, se no lugar de nos preocuparmos com mais espaço para o crescimento populacional, tendo em vista a situação atual do mundo, não deveríamos nos preocupar antes em deter o crescimento da população humana.
O ganhador do Prêmio Nobel da Paz, Norman Borlaug, talvez o único agrônomo internacionalmente conhecido e considerado por alguns como o maior benfeitor vivo da humanidade, já defende que se utilizem práticas agrícolas avançadas para se aumentar a produtividade agrícola para que não haja a necessidade de se abrir novas áreas. Existe uma diferença entre produção e produtividade agrícola. A primeira é o total produzido e contabilizado, por exemplo, o Brasil produz x toneladas de soja. Produtividade é a capacidade de produção de determinada área, geralmente um hectare, que corresponde a dez mil metros quadrados. Um determinado agricultor, utilizando variáveis não adaptadas à região, sem repor os nutrientes retirados do solo pela cultura, com um ineficiente controle de pragas e doenças, produzia uma tonelada de milho por hectare, digamos. Ao adotar as práticas agrícolas recomendadas, sua produtividade aumentou para seis toneladas por hectare. A produção foi multiplicada por seis sem que se tenha acrescentado um metro quadrado sequer de plantio por que o acréscimo foi de produtividade. O aumento da produção agrícola de um país pode depender ou do aumento da área plantada ou da elevação da produtividade pela adoção de melhores tecnologias agrícolas. Assim, o aumento na produtividade não está diretamente associado ao aumento na área sob agricultura. Nem o aumento da área plantada siginifica que a produção agrícola total será aumentada. Aumento de produtividade é aumento de eficiência. A abertura de novas áreas agrícolas é simplesmente uma solução mais fácil de se aumentar a produção sem que obrigatoriamente se implemente ou se adote mais tecnologia.
Dizer que o aumento de áreas naturais protegidas comprometem a produção de alimentos de um país é um argumento falacioso, talvez tendencioso. Como em outros aspectos da moderna sociedade, estamos invertendo os valores. Frente à tragédia ambiental que se aproxima, será mesmo um prejuízo que mais áreas protegidas atrapalhem a expansão urbana e agrícola? Questionemos antes o crescimento populacional irresponsável e a dificuldade em se aplicar mais tecnologia, e mais eficientemente, na agricultura brasileira.
Por que não se usa controle biológico para combater a dengue?
Em geral a agricultura, principalmente alguns setores da horticultura, é criticada pelo uso teoricamente indiscriminado de inseticidas. Não há como negar que muitos agricultores utilizam quantidades exageradas, por vezes sem respeitar prazos de carência. Há no entanto outros setores da sociedade utilizando inseticidas de forma intensa, potencialmente muito perigosa à população e aos aplicadores, de forma ineficiente mas ainda assim pouco questionada. O combate ao inseto transmissor da dengue é um caso óbvio. Uma forma alternativa, eficaz e infinitamente menos perigosa de se combater insetos, tanto na agricultura quanto em outros casos, é a utilização de controle biológico. Basicamente, o controle biológico é a utilização de inimigos naturais do inseto indesejado, em geral outros insetos, predadores, e microrganismos causadores de doenças nas pragas. Mosquitos semelhantes aos da dengue são eficientemente eliminados, por exemplo, utilizando-se a bactéria Bacillus thuringiensis, o famoso Bt, o qual infecta a população de insetos mas não afeta outros organismos. No Brasil, no entanto, utiliza-se ainda o controle químico com inseticidas convencionais, perigoso e, pelo que se vê, ineficiente. A utilização constante de um mesmo grupo de inseticidas inevitavelmente leva à seleção de populações mais resistentes de insetos. Pergunto-me, os inseticidas utilizados pelos tais fumaceiros ou fumacês serão realmente eficientes? Por que o governo brasileiro não utiliza controle biológico, tão eficientemente utilizado em países como Austrália e os próprios EUA e muitíssimo menos perigoso que inseticidas químicos, já que o organismo utilizado só é danoso ao inseto alvo? Será possível que interesses escusos de empresas produtoras de inseticidas sobreponham-se a vidas humanas? Que me respondam os bem informados.