Eleição, Voz, Vitória e Pornografia
Muitos podem pensar que eleição é um comportamento muito recente, e sendo assim, não tendo nada a ver com a evolução do comportamento humano, certo? Pois é, mas a dimensão cultural humana não é tão facilmente separável da dimensão biológica assim como podemos intuir. A Biologia do comportamento humano oferece importantes contribuições e implicações para pensarmos eleições, candidatos e resultados. Não estou dizendo que existia eleições democráticas com urna eletrônica e tudo mais no nosso ambiente ancestral, mas sim que aspectos básicos da nossa cognição social primata estão em cena no nosso moderno cenário eleitoral. Veremos como nossas propensões psicológicas influenciam e são influenciadas pelas eleições, como a presidencial que acabamos de ter no Brasil.
A primeira coisa que temos que entender é que o modo como nós concebemos eleições, como uma vitória democrática histórica e uma construção social moderna não são como nossa mente primata a percebe. Para nossa mente eleição nos remete à velha tarefa de escolher e aliar-se a coalizões de poder, algo que, durante o período evolutivo, foram favorecidas decisões que poderiam influenciar positivamente sua aptidão e também a sobrevivência e reprodução de seus parentes. Então se quisermos concretizar todas as implicações dos ideais de eleições democráticas modernas temos que entender melhor as nossas propensões psicológicas que influenciam a velha tarefa de escolher e aliar-se a coalizões de poder.
Escolher um representante de coalizão é uma difícil tarefa que muitas vezes tem implicações bem próximas a você e com conseqüências prolongadas. Até para aqueles que não se deixam influenciar pelo assédio ou compra de votos, não imitam a escolha de alguém importante (seja líder religioso, artístico, acadêmico ou familiar) e nem tentam seguir a maioria mostrada nas pesquisas eleitorais, existem muitas outras influências internas enviesando tal escolha. Em 2002, Stanford Gregory Jr. e Timothy Gallagher da Kant State University publicaram o estudo “Spectral analysis of candidate’s nonverbal vocal communication: Predicting U.S. presidential election outcomes”.
Eles analisaram o tom da voz de candidatos a presidência dos EUA em debates desde 1960 e obtiveram que tons de voz mais graves induziam percepções de maior dominância social, o que previa a quantidade de votos recebido em todas as 8 eleições analisadas. Parece que em nossas deisões eleitorais ainda estamos nos guiando por pistas de dominância social que, como diferentes estudos apontam, se relacionam com níveis de testosterona, força física e resistência a parasitas.
Tais parâmetros são os mesmos acessados na busca por parceiros amorosos, pois sabemos que a sobrevivência é só um meio para se chegar à própria reprodução e a de parentes. Então as disputas entre coalizões podem ser entendidas como sendo parte da competição intra-sexual por poder sobre recursos, sendo o acesso sexual um dos mais relevantes evolutivamente.
Em muitas espécies quando um macho vence o macho alfa dominante ele mata todos os filhotes induzindo as fêmeas a pararem de investir nos filhos do outro macho para investir em se reproduzir novamente, com ele dessa vez. Visto isso seria esperado que a coalizão vencedora estivesse mais motivada sexualmente, apresentando alto apetite sexual do que a coalizão perdedora. Pois bem, acaba ser publicado no número de novembro do Journal Evolution and Human Behavior uma pesquisa que testa exatamente essa hipótese com relação a eleições.
Patrick Markey da Villanova University e Charlotte Markey da Rutgers University publicaram o estudo intitulado “Changes in pornography-seeking behaviors followingpolitical elections: an examination of the challenge hypothesis”. Nele eles investigaram se aqueles que se aliaram ao partido vencedor acessam mais freqüentemente pornografia online do que os perdedores. Ele analisaram por estado a proporção das palavra-se chaves colocadas no Google nos períodos das eleições presidencias dos EUA de 2004, 2006 e 2008 comparando uma semana antes e um semana após as eleições.
Eles encontraram que nos estados em que a maioria votou no partido vencedor as pessoas usaram mais palavras no Google em busca de pornografia do que nos estados em que a maioria votou para o partido perdedor. Pois é parece que ainda lidamos com as eleições de formas semelhantes como os outros mamíferos lidam com das disputas de poder onde o acesso sexual é um dos prêmios finais.
Vimos apenas dois exemplos de como a Psicologia Evolucionista pode contribuir para entendermos e, posteriormente, aprimorarmos nosso processo eleitoral. Mais pesquisas precisam ser pensadas a esse respeito em países diferentes para vermos se esse resultados se mantém. E claro como estamos a menos de uma semana após as eleições presidenciais brasileiras fique com um eslogam eleitoral evolucionista: “Dê privacidade ao computador para os que votaram no partido vencedor”.
Discussão - 7 comentários
Gostei muito do texto, Marco.
Não deu para não pensar em P.E. nos últimos três meses, e também não deu para não chegar à conclusão de que temos que dar mais atenção aos primatólogos (como De Wall, que adoro).
Muito louco isso tudo. Mas ainda sim, veja q nao li o trabalho e nem sou da área, mas qual a força desta correlação? É o suficiente para concluir algo? É a velha dúvida metodológica q paira sobre a psicologia evolucionista.
A Dilma ganhou mas eu olho a cara dela e desanimo na hora, dai não dá pra procurar porno
Hmmm, desculpe ser chato, mas há erros ortográficos no texto - coalizão, assédio, Google e erros bobos de digitação.
Sobre o texto, nada a reclamar, está ótimo. Adicionando, lembro de uma nota/matéria numa Scientific American recente que mostrava redução de testosterona nos homens que votaram em McCain.
Também é interessante perceber que a Dilma tem voz mais grave que a do Serra, além de ter estado rouca. FHC x Lula, Lula x Serra, Lula x Alckmin são exemplos positivos dessa tese. Acho que Collor não tinha esse traço, mas se mostrava muito mais jovial e bem disposto que Lula...
Será que Marina terá menos chances nas próximas eleições devido à sua voz aguda - talvez usar mais material gráfico e escrito, e mais narração nos vídeos? Como poderíamos aprimorar o processo eleitoral, tentando minimizar essa busca intuitiva por um líder másculo?
Parabéns, e até mais!
Valeu pelo comentário Rafael! Concordo que devemos ser céticos e críticos metodologicamente sempre, mas com todos estudos científicos, não apenas Psicologia Evolucionista. Acho até bom que muito são mais críticos com a PE pois daí sua qualidade aumenta mais rápido do que outras áreas. As correlações encontradas no primeiro estudo e a diferença de grupos do segundo são significantes e suficientes para os autores concluírem, em peer-review jornais de prestígio da área, aquilo que conluíram para sua própria amostra e possivelmente extrapolando para outras. Se quiser ler os artigos posso te enviar. Nos resta explorar mais o fenômeno em outros lugares do mundo com diferentes metodologias para ver se a conclusão se mantem.
Valeu Kim pelos toques sobres os erros de escrita. Não é ser chato, não!! Quando o feedback é positivo, digo a crítica é contrutiva é bem vinda! Aqui no Canadá não tenho corretor ortográfico para o português e algumas coisinhas acabam passando.
Pois é, seria bem interessante estudarmos os parâmetros da voz de uma grande amostra de canditados a presidência brasileiros. Provavelmente temos gravação da voz de muitos deles.
Acho que ainda estamos no começo dos estudos sobre as implicações das nossas preferências por líderes másculos nas eleições e ainda é muito cedo para termos medidas práticas para aprimorar o processos eleitoral. Com certeza para alguns candidatos como a Marina o uso de outras mídias mais do que a voz possa ajudar.
Valeu pelo comentário e pelos elogios!! Até!
Este estudo me parece tentador do ponto de vista evolutivo, mas acredito que precisamos de dados adicionais para confiar nessa conclusão. As vezes as explicações são mais simples do que se imagina.
Lendo este post me lembrei do livro "Carta a uma nação cristã" de Sam Harris, e resolvi comentar por ser um argumento pertinente ao artigo:
Os estados vermelhos (os republicanos; os que perderam a última eleição) são notávelmente mais religiosos, e assim sendo, são mais temerosos e menos habituados a pornografia digital. Eles são assim independentemente das eleições, se eles se desviarem na direção do pecado carnal, jamais se deleitarão em gozo eterno, pois terão cometido um crime na visão de seu criador imaginário.
Ja os estados dominantemente democratas são mais liberais, e portanto, mais abertos à exploração e expressão sexual, o que inclui pesquisas onanistas no google.
Quando for realizada uma pesquisa do mesmo teor, que prove a mesma conclusão sobre o apetite sexual pós eleições, porém com um vitorioso diferente (deste vez do lado republicano), aí então eu serei convencido de que esse fato é um resquiço evolutivo.
Muito bom o blog, continue com o bom trabalho. Boa sorte na defesa do doutorado e parabéns pela perseverança de conseguir chegar tão longe.