Feliz Dia de Darwin 2023!

É chegada a hora do nosso Darwin Day! Hoje, 12 de fevereiro de 2023, estamos celebrando os 214 anos de ninguém menos que Charles Robert Darwin (1809-1882). Foi ele, o geólogo e naturalista, que reuniu diversas fontes de evidências apontando para o processo evolutivo dos seres vivos. Com os mecanismos da seleção natural e da seleção sexual, ele propôs uma explicação natural e unificada para diversidade, similaridade e manutenção dos seres vivos, incluindo o ser humano, ao longo da história do planeta Terra.

Nada mais apropriado do que celebrarmos o aniversário de Darwin, sua biografia, descobertas e legado neste Darwin Day de 2023. O Dia de Darwin é uma celebração internacional que visa nos inspirar a refletir e agir seguindo os princípios de bravura intelectual, curiosidade, pensamento científico e busca pela verdade como demonstrados por Charles Darwin. Então temos que aproveitar esta celebração para nos ajuda apreciar a natureza evoluída dos seres vivos, nossa origem primata humilde, e para buscarmos as atualizações do conhecimento evolutivo fruto do legado darwinista.

Aqui no MARCO EVOLUTIVO temos, nos últimos 15 anos, continuamente celebrado o Dia de Darwin começando em 2008, passando pelo Bicentenário de Darwin e 150 anos do ‘Origem da Espécies’ em 2009, e por 20102011201220132014201520162017, pela Década de Darwin Days no Blog em 201820192020pelo sesquicentenário do “A Descendência do Homem a Seleção Sexual’ em 2021, e pelo sesquicentenário do ‘A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais’ em 2022. Neste 2023 não seria diferente.

Darwin nos mostrou a beleza e o insight profundo de ver as relações entre as espécies como as de parentescos famílias numa grande árvore da vida. Não somos idênticos aos nossos pais; assim como as pessoas, as espécies são únicas, mas as espécies irmãs tendem a ser mais parecidas entre si do que as espécies primas. É uma ótima metáfora, pois ainda mostra que da mesma forma que um galho conforme cresce vai mudando, as espécies também vão mudando ao longo das gerações (anagênese), e quando há uma bifurcação é quando ocorre o evento de especiação, o surgimento de novas espécies (cladogênese). E quando um galho seca é como um evento de extinção para as espécies daquele ramo. De forma geral a evolução biológica pode ser representada como um eterno crescimento, bifurcação, fusão (simbiose) e perecimento dos ramos da vida, todos tendo um mesmo tronco distante em comum.

Em 1857, numa carta para Huxley, Darwin escreveu que “A hora virá, creio eu, embora não viva para ver, quando tivermos árvores genealógicas muito justas de cada grande reino da natureza.” Darwin estava certo, e todos nós hoje podemos vislumbrar e explorar a maior árvore dos seres vivos já organizada. O site OneZoom mostra numa estrutura fractal continua os relacionamentos de parentescos de 2,2 milhões de espécies, de bactérias até o urso de óculos sul-americano. Além de fotos, as folhas têm cores indicando se a espécie está extinta ou em risco de extinção. É claro que além da truta, do cogumelo amanita, da maconha, do lobo, o ser humano é uma das espécies mais procuradas.

Darwin estudou a evidência de anatomia comparativa entre humanos e outros grande primatas sem rabo para prever que os humanos muito provavelmente evoluíram na África. Em 1871, Darwin escreveu que “Em cada grande região do mundo os mamíferos vivos estão intimamente relacionados com as espécies extintas da mesma região. É, portanto, provável que a África tenha sido anteriormente habitada por grandes primatas extintos, parentes próximos do gorila e do chimpanzé; e como essas duas espécies são agora as aliadas mais próximas dos humanos, é talvez mais provável que nossos primeiros progenitores tenham vivido no continente africano do que em qualquer outro lugar.”

Darwin estava certo: não só os nossos ancestrais mais antigos desde a separação do ramo comum com os Chimpanzés e Bonobos são encontrados na África, mas também a árvore genealógica humana usando dados genéticos remonta à África. No ano passado foi publicada a maior árvore unificada da humanidade feita por meio de genomas atuais e ancestrais mostrando a riqueza de dispersões e intercruzamentos das populações. Talvez se todos conseguirmos perceber toda a humanidade e todos os outros seres vivos como literalmente nossos parentes ‘de sangue’ talvez diminuiremos com as guerras, abusos e maus-tratos ainda tão persistentes na atualidade.

Seguimos em frente nos Darwin Days, sempre disseminando os insights, as previsões, descobertas e legado de Darwin bem como as novas descobertas, as quais muitas apoiam as previsões do naturalista de revolucionou a biologia e a humanidade. Neste ano tivemos o Darwin Day da Sociedade Brasileira de Genética na UFES com exposições, palestras e mesas redondas. Estamos tento o Darwin Day do Museu de Zoologia da USP com várias atrações para os adultos e as crianças. E ainda teremos o Darwin Day da UFJF em 24 de março. Muitos outros evento ainda vão surgir, então aproveitem!

150 anos do livro A Descendência do Homem e a Seleção Sexual de Darwin

Neste dia de 24 de fevereiro há exatos 150 anos foi publicado em Londres com dois volumes de 450 páginas o The Descent of Man, and Selection in Relation to Sex de Charles Darwin. O livro foi um marco para o estudo da evolução humana e aqui no MARCO EVOLUTIVO não poderíamos deixar de celebrar esta data. Originalmente a ideia de Darwin era apenas ter um capítulo sobre humanos em seu livro The variation of animals and plants under domestication de 1866, mas como o livro já estava grande ele resolveu fazer em separado um pequeno ensaio sobre nossa ancestralidade primata e a seleção sexual, o que acabou crescendo e virando os dois volumes do The Descent of Man em 1871. Neste livro Darwin finalmente pode desenvolver tudo o que ele se referiu ao final do Origem das Espécies quando disse que, por conta da evolução por seleção natural, no futuro muita luz seria lançada sobre a origem dos humanos e nossa psicologia e história.

Intuitivamente sempre nos parece que a diferença psicológica entre humanos e outros primatas é enorme, tanto que até o Alfred Wallace abandonou a explicação evolucionista ao se tratar da mente humana por achar pouco possível de que toda nossa capacidade intelectual tenha evoluído naturalmente em contextos tribais aparentemente pouco exigentes por grandes inteligências. Muito do The Descent é uma reposta ao desafio de Wallace. Darwin argumenta que todas as nossas características psicológicas podem ser encontradas em algum grau em outras espécies, incluindo capacidades para a música, a beleza, e a moralidade. É por isso que numa carta a Wallace Darwin diz que a evolução humana era o maior e mais interessante problema para o naturalista.

Outra noção popular na época era a de que toda a exuberante beleza na natureza teria sido magicamente criada para satisfazer os humanos que seriam o ápice da evolução. Graças a Darwin e anos de pesquisa subsequente, hoje sabemos que a evolução não tem ápice e que somos tão únicos e tão especiais quanto cada uma das outras espécies. No The Descent Darwin argumenta que a beleza sonora e visual encontrada no mundo animal evoluiu naturalmente pelo processo de seleção sexual. Indivíduos mais vistosos e sonoros eram preferidos na busca por um parceiro sexual, o que ao longo de muitos ciclos de seleção, dá origem a cada vez mais beleza.

A evolução dos armamentos como chifres era mais facialmente explicada pela competição entre machos o que deixara as armas mais eficientes e maiores. Mas para explicar a evolução da beleza era necessário perceber que as fêmeas das outras espécies também têm senso estético e que a variação nesse senso estético era a pressão social favorecendo a evolução dos ornamentos animais. Portanto, para Darwin a beleza do pavão ou da ave do paraíso não necessariamente precisa indicar uma qualidade de sobrevivência, basta ela ser agradável o suficiente para as fêmeas da espécie que a ornamentação poderia evoluir sendo um fim em si mesma.

Atualmente como parte das celebrações do sesquicentenário do The Descent, diversas iniciativas tentam resgatar o que Darwin acertou e o que Darwin errou no livro, e todos o desdobramento mais atuais nos dois tópicos centrais do livro: evolução humana e seleção sexual. O livro A Most Interesting Problem: What Darwin’s Descent of Man Got Right and Wrong about Human Evolution apresenta uma releitura da perspectiva atual de cada capítulo relativo ao ser humano. Está sendo muito bem avaliado e me pareceu muito interessante tanto para quem quer se atualizar sobre evolução humana quanto para quem quer se aprofundar nas hipóteses do The Descent. Em Darwin, sexual selection, and the brain Micheal Ryan faz uma revisão das várias linhas de pesquisa relacionadas à ideia da Darwin sobre a evolução da beleza sendo um fim em si mesma. Em Darwin’s closet: the queer sides of The descent of man (1871), Ross Brooks ressalta como Darwin integrou a ideia de variação individual nos assuntos da seleção sexual o que foi fundamental para o nascimento da sexologia moderna. No Periódico Evolutionary Human Sciences existem uma compilação de artigos celebrando os 150 anos do The Descent, por enquanto com 3 artigos e com promessa de outros mais por vir.

Claro que como todo livro, o The Descent tem várias limitações e vieses de época, mas nele Darwin deixou claro que as origens evolutivas dos humanos podem sim ser desvendadas. E nesse sentido enquanto um programa de pesquisa a ser desenvolvido, Darwin deu uma inestimável contribuição à evolução humana. E, se percebermos como aspectos morfológicos, biogeográficos, interespecificamente comparativos, mas também psicológicos e comportamentais estão integrados, o The Descent pode ser considerado bem moderno. Isto porque, de lá para cá, ainda são poucos biólogos focando na psicologia e no comportamento, e pouco psicólogos focando na evolução. Felizmente as áreas estão cada vez mais se integrando e talvez um dia cheguemos ao grau de integração que o próprio Darwin expressou 150 atrás.

Homenagem ao César Ades amanhã no CRP 06

Nosso querido César Ades receberá uma homenagem póstuma solene em cerimônia do Conselho Federal de Psicologia amanhã dia 27 de junho às 17h. Trata-se de um reconhecimento oficial para sua imensa contribuição para o desenvolvimento da profissão de Psicólogo no Brasil, passado, presente e futuro. Na ocasião, o presidente do CFP, Humberto Verona, inaugurará uma placa em memória aos serviços prestados por César Ades à Psicologia Brasileira.

A cerimônia ocorrerá no auditório do Conselho Regional de Psicologia da 6ª Região (CRP 06), em Pinheiros, São Paulo. (veja o mapa abaixo). Toda a solenidade será transmitida ao vivo pelo site do CFP e em espaços de projeção disponibilizados nos Conselhos Regionais de Psicologia de todo país e em salas de aula de cursos de Psicologia que aderirem à atividade.
Durante a homenagem, e como parte das atividades de comemoração dos 50 anos de regulamentação nacional da Psicologia, o CFP lançará o

“Prêmio Monográfico César Ades: Desafios para o futuro da Psicologia”. O prêmio visa estimular nos estudantes e profissionais da área uma reflexão acerca do futuro da profissão.

Os textos acadêmicos inscritos para concorrer ao prêmio, tanto na modalidade psicólogo como a de estudante, deverão estar dentro de três subtemas: As Políticas Públicas e o Futuro da Psicologia; Contribuições da Psicologia na Construção do Conhecimento no Século XXI; e A Psicologia Latino-Americana: Desafios e Possibilidades. Mais informações sobre o Prêmio Monográfico César Ades e inscrições poderão ser acessadas em: http://premiocesarades.cfp.org.br

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Ades Egypti e seu Entusiasmo Contagiante

Era impossível ficar ao lado de nosso querido César Ades, que nasceu no Cairo, Egito, e não ser levado por seu entusiasmo contagiante. Conheci o César em 2003 no XX Enconto anual de Etologia (EAE) em Natal, em meu terceiro ano de graduação eu ainda não havia encontrado minha área de pesquisa. Lá depois de uma brilhante palestra sobre todos os EAEs anteriores eu estava mais do que cativado pela Etologia, principalmente voltada para os humanos. Ele autografou meu livro de resumo e me desejou um futuro brilhante.

Em meu último ano de graduação fiz um trabalho sobre a consciência animal e se não fosse um texto do César ter me tocado e me motivado não teria tirado da nota máxima.

Em 2004, ao final de meu bacharelado na Unesp de Bauru com Sandro Caramaschi, ex-aluno do Prof. César, fui conversar com ele para estudar possibilidade de um mestrado. Eu estava super nervoso, mas ele me deixou bem a vontade e no decorrer da conversa percebemos que estávamos em sentidos contrários: ele era um psicólogo mais voltado para o comportamento dos outros animais e eu um biólogo interessado no ser humano. Então, ele me indicou a Profa Vera Bussab que acabou sendo minha orientadora de mestrado e de doutorado no Bloco F do IP-USP, inaugurado pelo César enquanto diretor do Instituto anos antes.

Sua disciplina de pós sobre Comunicação Animal me forneceu bases sólidas para um estudo comparativo da musicalidade humana. Cada aula com ele era uma maravilha, ambiente descontraído, informações precisas e conexões muito bem elaboradas.

Fora as belas homenagens oficiais a ele realizadas pelo Instituto de Psicologia da USP, muitas palavras relevantes e tocantes foram colocadas aqui na nossa Série Especial do ScienceBlogs Brasil em homenagem ao César, o Grande ao meu ver.

Eu (depois de ficar uma semana e meia fora do ar devido a uma fratura e cirurgia no braço dois dias após seu falecimento) gostaria de acrescentar algo que julgo muito louvável sobre ele. César Ades era tão entusiasmado e curioso por conhecimento que ele não conseguia se conter em apenas dar aulas, fazer pesquisas, publicar, orientar, ter cargos administrativos, organizar eventos, ele também fazia e valorizava a divulgação científica.

Ao ser esse acadêmico generalista digno de um Da Vinci moderno, a divulgação científica não poderia passar em branco. Ele deu diversas entrevistas tais como a brilhante ‘Psicologia e Biologia – Entrevista com César Ades’, e a ‘Entrevista: César Ades estuda a evolução do comportamento animal’. Escreveu e deu várias contribuições para a Ciência Hoje Criança como explicando a importância da limpeza nos animais em ‘Tá limpo!’. Ele deu várias palestras e também participou de várias comemorações do Dia de Darwin. Esse ano, César compareceu ao Catavento Cultural para participar de um talk show com o Prof Nélio Bizzo. Como sempre tudo bem descontraído e informativo. Ele sempre frisava na importância de Darwin enquanto o primeiro psicólogo evolucionista. Sua importância como divulgador é crucial e assim como todas suas outras características irá continuar inspirando gerações de pesquisadores e admiradores.

Uma de suas mais atuais metas era a de reunir etólogos eminentes da América Latina para um simpósio debatendo origens, desafios e perspectivas futuras da área, de modo a gerar um livro em conjunto sobre as experiências em cada país e a semente de uma aliança Latino-Americana de Etologia. Reuniremos esforços para realizar essa grande ideia junto a alunos e profs.

Um dos mais tocantes comentários sobre o César pra mim foi o do Prof. Fernando Ribeiro quando queria destacar uma virtude dele.

“Quem o vê hoje, e encanta-se com seu entusiasmo, conhece o mesmo César Ades de 40 anos atrás. E foi esse entusiasmo que escolhi, a fim de destacar uma de suas virtudes, ao cumprimentá-lo, na ocasião de sua indicação para o Instituto de Estudos Avançados, quando disse a ele: Fui percorrendo suas marcas, a inteligência, a erudição, o caráter… mas como me impus uma escolha, fiquei com o entusiasmo, sem o qual a inteligência não se acende, a erudição não se atinge, o caráter não se transmite. Sim, porque César Ades é, e sempre foi, um professor. Sua extroversão e a expressividade com que se comunica constituem sua face visível”

Fique agora com os dois vídeos de uma entrevista de César Ades concedida ao programa Trajetória da TV USP em 2011 e com o vídeo mais recente do César Ades no Dia de Darwin. Assim um pouco dele e seu entusiasmo sempre viverá em nós de modo a podermos contagiar toda uma outra geração com suas idéias e atitudes.

Dia de Darwin 2012

Três Anos de MARCO EVOLUTIVO e Palestra de Martin Daly

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É com muito prazer que comemoramos não UM nem DOIS, mas TRÊS anos de MARCO EVOLUTIVO nesse último dia 28 de novembro. Foi um ano inteiro aqui no ScienceBlogs Brasil sem mudanças de endereço virtual, mas com mudança de endereço real. Nesse ano de 2010 estive aqui no Canadá fazendo meu doutorado sanduíche na McMaster University então não tive como me dedicar mais ao blog. Mesmo assim foi um ano de tópicos importantes e interessantes.

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A maioria dos 15 posts desse terceiro ano esteve relacionando música e dança com ciência e evolução das mais diferentes formas: do rap evolutivo e a música dos genes aos valores adaptativos da dança e da música. Outros temas como o da Medicina e Psiquiatria Darwinistas receberam grande destaque. Os cinco textos mais lidos do período (em ordem decrescente) foram: 1- Coevolução e Seleção Sexual no Caso da Vespa Tarada, 2- O sexo chimpanzé e o conflito de gerações, 3- Dicas de Livros em Psicologia Evolucionista, 4- Lamarck – A Verdadeira Idéia Errada, seguido de 5- Psicologia Evolucionista e Natureza Humana. Os destaques fora os textos: A Ciência do Sex Appeal e Eleição, Voz, Vitória e Pornografia que receberam altíssimas audiências por aparecerem do compilador de links UêBA.

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No período o blog teve mais de 33 mil visitas. Tivemos 31 mil visitas no Brasil e 1400 de Portugal, EUA e Canadá com mais de 200 visitas cada, e Angola, Espanha, Reino Unido, Japão, Irlanda com 50 ou mais visitas cada. Os países com mais de 10 acessos foram, em primeiro Portugal, EUA, Canadá, Angola, Espanha, Reino Unido, Japão, Irlanda, Moçanbique, França, Alemanha, Itália, México, Suíça, Argentina, Cabo Verde, Austrália, (um país não reconhecido pelo google analytics!) e Colômbia. As palavras mais usadas antes de encontrar o MARCO EVOLUTIVO foram: “Lamarck”, “Antropocentrismo”, “Período Fértil”, “Psicologia Evolucionista”, e “Seleção Sexual”.

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E como presente evolutivo nesse terceiro aniversário estou iniciando uma série de palestras internacionais de altíssimo nível sobre Psicologia Evolucionista e Biologia Evolutiva. Trarei uma compilação única de temas importantes e professores renomados para que juntos complementemos nossa formação acadêmica nacional (e nosso listening) conhecendo de perto autores internacionais e suas idéias. Inicio nossas palestras evolucionistas com um dos fundadores da Psicologia Evolucionista, Martin Daly e sua palestra de outubro de 2010 aqui na McMaster sobre Evolved Decision Processes and Rational Choice. Descubra de forma descontraida em 53 min que nossa racionalidade para algumas coisas e irracionalidade para outras, assim como a ilusão das decisões conscientes, são mais bem explicadas a luz da evolução.

David Attenborough, bowerbird, corvo e a orquídea mimética

David Attenborough, coroado como Sir pela Rainha da Inglaterra, vem coroar três temas de posts muito visitados aqui no MARCO EVOLUTIVO. Depois de nos falar sobre a imensa capacidade de imitação vocal do pássaro lira, David Attenborough, um dos maiores divulgador de documentários biológicos, apresenta agora três vídeos: um sobre o bower bird, outro sobre o corvo o outro sobre a orquídea que mimetiza a fêmea de vespa.

O bower bird, ave que constrói ninhos intensamente decorados como chamarizes de fêmeas foi tema de dois posts. Em Bowerbirds e a Arte de Seduzir I conhecemos os dotes artísticos na área da arquitetura e decoração desse grupo de pássaros australianos e vimos como a seleção sexual pode esculpir ornamentos extra-corpóreos.

Em Bowerbirds e a Arte de Seduzir II vimos que esses pássaros, além de exímios construtores de ninho, são imitadores de cantos de outras espécies também. E às vezes a fêmea se guia mais pela a acurácia e a variedade de espécies imitadas do que pelo próprio ninho decorado. Dessa forma até a canção pode ser encarada como um ornamento extra-corpóreo valorizado pela fêmea. No vídeo abaixo Sir Attenborough fecha a trilogia do MARCO EVOLUTIVO apresentando o bowerbird que constrói os ninhos maiores e mais ornamentados do mundo, o extremo em ornamento extra-corpóreo. Ele ressalta a dedicação e a opção de escolha dessas aves sobre o item decorativo mais esteticamente efetivo para as fêmeas.

O corvo mostrou toda sua capacidade mental ao passar no teste do autoreconhecimento no espelho em Curvando-se ao Corvo, o Pensador. Lá o próprio David Attenborough narra a façanha do uso do transito pelo corvo como uma ferramenta para abrir sementes. Cada vez mais percebemos que as capacidades intelectuais humanas não são o ápice de um grande salto qualitativo em relação aos outros animais. Mas sim são um contínuo em especialização compartilhada por muitos outros animais com ecologias semelhantes. No vídeo abaixo Sir Attenborough apresenta como o corvo com uso de ferramenta utiliza o ataque de seu oponente contra ele mesmo. Ele ressalta também como as técnicas de pesca de larvas usando ferramentas são transmitidas de geração em geração.

O caso da Orquídea que mimetiza a fêmea da vespa foi o tema do Coevolução e Seleção Sexual no Caso da Vespa Tarada. Lá vimos como um grupo de orquídeas que, ao se enveredar numa orgia pansexual com outro reino de seres vivos, acaba entrando na dinâmica de manipulação e exploração estética da seleção sexual de algumas vespas e abelhas. Vimos como os canais de estímulos sexuais estão abertos a manipulação por serem dificilmente deixados de lado na evolução sem um prejuízo na aptidão. No vídeo abaixo Sir Attenborough apresenta as diferentes maneiras que as orquídeas induzem os machos de vespa a levarem de flor em flor seus sacos de pólen numa orgia de zumbidos. Ele ressalta as formas, cores e cheiros das orquídeas que super excitam os machos.

Curvando-se ao Corvo, o Pensador

É surpreendente o fato de que algumas aves, como os Bowerbirds, naturalmente apresentam grandes manifestações custosas e cuidadosamente ornamentadas, comportamento antes só relatado em humanos. Isso nos faz ter uma visão mais humilde do ser humano. Porém, mais surpreendente ainda é o corvo capaz de se reconhecer no espelho. Isso mesmo! Agora sim você vai se sentir realmente apenas mais uma espécie animal.

O teste do espelho é bem simples: anestesie um animal e faça uma marca colorida (transparente ou cor da pele para o controle) num local do animal onde ela possa ser vista apenas pelo espelho, então apresente um espelho a ele. Se o animal interagir mais com o espelho é sinal que ele não se reconhece, mas se ele interagir mais com sua própria marca é sinal que ele se reconhece.

O auto-reconhecimento ao espelho é um sinal de autoconhecimento, uma característica elevada e requintada. Algo como: reconheço-me, logo existo metalingüisticamente.

Como acompanhamos no texto Autoconhecimento em Comum, essa faculdade antes tida como exclusividade dos humanos, agora já é reconhecida nos grandes primatas, golfinhos e elefantes. O que já era difícil de aceitar agora ficou pior. A machadada final em nosso antropocentrismo foi dada por três pesquisadores alemães no paper de agosto de 2008 intitulado: “Mirror-Induced Behavior in the Magpie (Pica pica): Evidence of Self-Recognition” disponível online. Eles trouxeram a primeira evidência de autoconhecimento em aves, mais especificamente em corvos, seres conhecidamente inteligentes, capazes de resolver problemas complexos e usar ferramentas inusitadas.


Em testes iniciais, cinco corvos, ao serem apresentados ao espelho, agiram como se seu reflexo fosse outra ave, mas três deles mudaram seu comportamento e passaram a se examinar. Daí quando submetidos ao teste a mancha ao espelho, dois dos três prestaram mais atenção na própria mancha colorida do que na mancha controle. O vídeo mostra o lindo e incomodo momento do auto-reconhecimento. Resta sabermos o porquê dessa variação individual.

Esses resultados mostram que as habilidades cognitivas elaboradas responsáveis pela noção de si mesmo não são privilegio de mamíferos cabeçudos, mas evoluíram independentemente em grupos taxonômicos que se separaram evolutivamente a 300 milhões de anos atrás.


E para que a inteligência dos corvos não seja subestimada deixo outro vídeo estonteante na narração de Sir David Attenborough. Veja o que pode acontecer quando corvos usam os humanos no trânsito japonês como ferramentas para abrirem sua comida. E se você ainda não sabe usar a faixa de pedestre melhor aprender, porque eles já sabem.

Auto-reconhecimento em comum

Hoje podemos fazer coisas impensadas. Ao olharmos para o espelho há alguns séculos atrás era impensada, simplesmente inconcebível, a noção de que viemos dos macacos. Motivo de muita chacota.
Hoje, que sabemos que não viemos dos macacos que Somos Macacos, podemos vislumbrar no mesmo espelho rastros da noção de “si mesmo” em nossos parentes mamíferos. Justamente estudando o auto-reconhecimento, seu desenvolvimento e acontecimento.
No vídeo da National Geographic abaixo veremos que os grandes símios estão mais próximos de nós do que imaginávamos. Sua memória instantânea é melhor que a nossa, eles possuem centenas de palavras e uma forma de linguagem, tanto que até podemos formar inúmeras frases com o lexograma interativo de bonobos. Os grandes símios usam ferramentas mais complexas do que as que poderíamos imaginar e, além disso, são capazes de auto-reconhecimento.

O teste padrão para o auto-reconhecimento é conhecido como o teste do espelho. É um teste em que o indivíduo é marcado despercebidamente antes de ser apresentado a um espelho. Se durante o experimento ele tocar a marca do espelho não terá se percebido. Porém se ele tocar a marca em seu próprio corpo ele terá apresentado o auto-reconhecimento.
Metade das crianças de até dois anos se reconhecem no espelho e todos os grandes símios: chimpanzés, bonobos, gorilas e orangotangos, em algum momento da vida se reconhecem no espelho também.
O aparecimento evolutivo na noção de si mesmo está correlacionado com altas formas de empatia e comportamento altruísta. Recentemente as fronteiras do auto-reconhecimento no espelho se expandiram: Capacidade antes relacionada apenas com os grandes símios foi encontrada em golfinhos e em 2006 nos elefantes asiáticos.
Esqueçam do vídeo a idéia de procurarmos o ingrediente secreto que torna os humanos, humanos e os grandes símios apenas símios. Pois não estamos dominando o planeta, muito menos deixando nossos parentes símios para tráz. Estamos matando nossos próprios parentes cruelmente.