Pense Grande Nesse Grande Dia de Darwin

Hoje temos por certo que não somos o centro de nada, nem do universo nem da vida. Não somos em nada divinos, nem dependemos de nenhuma força sobrenatural para sermos como somos. Somos parentes de todos os seres vivos inclusive daqueles que não acreditam nisso. Somos o produto de um processo que não é nem intencional nem aleatório, é o meio termo entre ambos, como um sem-querer-querendo que gera criaturas sem criador. Somos projetados, mas não fomos projetados por algo mais inteligente e superior e sim por um processo cego e mecânico de seleção natural. Hoje somos totalmente livres do pensamento místico para explicar nossas origens ou qualquer outro fato da natureza.
E por isso o dia de 12 de fevereiro depois de uma votação em São Paulo foi considerado o Dia do Orgulho Ateu. E hoje estamos na primeira edição do Dia do Orgulho Ateu. Assim como Darwin conseguiu conviver e até ser casado com pessoa religiosa nós também conseguimos. E assim como ele abandonou sua fé após a morte de sua filha Annie em 1851 nós também podemos abandoná-la sem prejuízos para nossa vida moral, existência em vida nem para nossa inexistência em morte.
No Brasil ao contrário do resto do mundo dedicamos um ano inteiro a Darwin. E o Brasil, o maior pais católico do mundo, é o único que idealizou para 2009 o Ano da Biologia posteriormente transformado em Ano de Darwin, o único pais que, além de celebrar a Ciência e o Humanismo, também celebra o Ateismo hoje. Entretanto, até agora apenas 13 eventos comemorativos estão cadastrados no site do Ano de Darwin para 2009 no Brasil. Por que isso? Onde estão os tantos centro acadêmicos de Biologia do Brasil? Onde estão os professores de Ciências e Biologia? Onde está o Conselho Regional de Biologia e as sociedades científicas? Precisamos nos unir e promover muitos eventos e celebrações de uma data tão importante e mostrar que se uma teoria foi capaz de unir temas tão diversos é capaz de unir as pessoas que se interessam por eles.
Pelo menos a mídia parece mais antenada. São programas especiais sobre nosso aniversariante na Globo News, na National Geographic, entre outros. São capas inteiras dedicadas a Darwin como na Veja, na Scientific American Brasil, Netional Geographic, além de matérias como na Revista Época entre outras. Infelizmente a mídia, em sua ânsia por sensacionalismo, quase sempre apresenta a notícia do bicentenário em forma de controvérsia, debate, conflito e disputa entre cientistas e religiosos, quando não julgam os “erros” de Darwin em sua época segundo os parâmetros atuais, anacronicamente.
Temos que perceber que essa polêmica entre religião e ciência é assunto pra século XIX e XX. A verdadeira provocação de Darwin que vale apena ser levantada no século XXI é a de que invertebrados tem sentimentos, preferências, senso estético, em suma: eles pensam! Então a questão perigosa e desafiadora não é sobre a não existência de vida subjetiva após a morte e sim a existência de vida subjetiva nos invertebrados vivos!!! Então se você ficou grilado com essa notícia o grilos não ficariam. Pense nisso.
Ainda sobre o dia 12 de fevereiro, Darwin e Lincoln, além de terem nascido no mesmo dia, tinha na luta contra a escravidão uma marca própria. Darwin de família liberal anti escravocrata quase teve que voltar nadando pra Inglaterra depois de uma briga com FritzRoy sobre o modo como eram tratados os escravos no Brasil. E Lincoln graças a emancipação dos escravos americanos foi citado no famoso discurso de Martin Luther king. Mas ainda hoje existem muitos escravos no Brasil e no mundo. O que faremos?
Primeiro os escravos depois as mulheres. No dia 12 de fevereiro de 1870 as mulheres em Utah recebem o direito de voto, sendo este um dos primeiros estados ou territórios a conceder este direito às mulheres. Mas ainda hoje muitas mulheres são discriminadas e ganham menos pelo mesmo trabalho durante o mesmo período do que homens. O que faremos?
Então 200 anos parecem muito, mas o legado de Darwin está só começando. Temos muito a fazer seja para promover a Ciência promovendo e convocando celebrações, seja para expandir o senso comum, bem como a mídia ainda muito presa no desmame do pensamento místico, e sejam para concretizar de fato as conquistas de iqualdade de direitos e respeito dos direitos humens, ao mesmo tempo pensando em expandir esse direitos universais primeiro aos grandes primatas, nosso parentes mais próximos.
Obs: Até o dia 24 de novembro tem tempo suficiente para promover muitos eventos sesquicentenários!!
Vou te dar muita pressão, vou sim!
Desde Darwin e Wallace e os primórdios da seleção natural a questão sobre a consciência ou acaso das pressões seletivas era muito controvertida. O próprio Darwin salientou que “Muitos escritores têm compreendido mal, ou têm criticado o termo Seleção Natural. Alguns têm mesmo imaginado que a Seleção Natural induz à variabilidade, quando pelo contrário envolve somente a conservação das variações acidentalmente produzidas, quando são vantajosas ao indivíduo nas condições de existência em que vive. […] Outros têm objetado que o termo seleção envolve uma escolha consciente nos animais que tornaram modificados; e tem-se mesmo argumentado que sendo as plantas isentas de qualquer vontade, a Seleção Natural não lhes é aplicável!”
Como a palavra “acidentalmente” deixa bem claro as pressões seletivas da Seleção Natural não envolvem qualquer tipo de consciência – para desespero dos criacionistas de designers inteligentes. O algorítimo darwiniano é nada mais do que uma receita que independe do substrato, dadas as condições e ingredientes certos ela sempre funcionará mecanicamente. Essa é a famosa perigosa idéia de Darwin esmiuçada por Daniel Dennett (1995).

Mas será que todo termo evolucionista “seleção” está tão isento de vontade própria assim? Mas é claro que não! E foi o próprio Darwin quem matou a charada descobrindo a Seleção Sexual. Ao contrário do sentido totalmente casual e mecânico do “seleção” da Seleção Natural, a Seleção Sexual envolve sim uma vontade direcional. Mas não uma vontade direcional divina, uma vontade literalmente animal. Essa vontade intencional própria é uma das maiores pressões seletivas na evolução dos animais, pois são as mentes dos próprio animais que exercem pressão evolutiva em outros animais.
As mentes, enquanto funcionamento do sistema nervoso, são tão materiais quanto o funcionamento do liquidificador. O interessante é que um simples processo mecânico não-intencional pôde originar aparatos complexos e intencionais como as mentes animais (que maravilha de idéia perigosa). E são as escolhas por livre e espontânea vontade dessas mentes que são o obvio sujeito oculto por trás da frase de funk.
Agora que percebemos que o “eu” oculto no “Vou te dar muita pressão” não é divino, mas sexual olhamos com outros olhos o óbvio sentido sexual da letra. Além disso, as pressões seletivas intencionais não estão só restritas às escolhas que os animais fazem intra-especificamente como na seleção sexual, pois até quando se relacionam com outras espécies sejam animais ou plantas estão “dando muita pressão” também. Mas, é claro que as forças são maiores na difícil vida intra-específica grandemente abarcada pela Seleção Sexual.
Chegado o estranhamento, vamos aos indícios. Se existe uma diferença qualitativa da pressão metaforicamente seletiva da Seleção Natural para a pressão literalmente seletiva da Seleção Sexual esperaríamos encontrar adaptações mais refinadas, complexas e mais bem esculpidas fruto das pressões intencionais.
Aqui veremos um vídeo sobre como a paisagem passiva das florestas pressionou o canto das aves florestais para sons mais simples, com notas longas bem demarcadas e com menos variação de notas – características sonoras que escapam às barreiras refletoras de sons das folhas. Veremos também como a pressão seletiva é diferente no alto na floresta do chão dela. Em quanto que neste vídeo veremos como a paisagem psicológica intencionalmente ativa das aves moldou as mais requintadas cores e exibições de corte.
Depois desse texto você nunca mais ouvirá o Bonde do Tigrão do mesmo jeito. Porque o simples ato de escolher ouvir sempre ou nunca mais ouvir essa música já é “dar muita pressão” literalmente.
Referência
Carvalho, E. M. M. (Org.) (1986). O Pensamento Vivo de Darwin. São Paulo: Martin Claret.
Dennett, D. (1995). A perigosa Idéia de Darwin. Rio de Janeiro: Rocco.
Primatas do mundo uní-vos


Visando trazer a público o estado lamentável que se encontra a conservação dos nossos parentes mais próximos e direcionar soluções foi criado o Manifesto for APES and NATURE. O site visa coletar no mundo todo 1 milhão de assinaturas pela causa dos grandes primatas e de todo seu ambiente. Leia o Manifesto abaixo, entre no site assine e divulge para os outros primatas conhecidos seus.

– Exigir uma gestão durável e respeitosa do ambiente das florestas tropicais, o habitat dos grandes símios;
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– Proibir toda importação de madeiras tropicais não certificadas como provenientes de um comércio respeitoso do ambiente e que responda aos critérios estabelecidos pela certificação FSC;
– Contribuir para a implementação da exploração de recursos minerais (ouro, petróleo, diamantes, coltan, ferro) respeituosas do ambiente e das populações locais;
– Eliminar a caça ilegal de grandes símios, o tráfico de ‘carne do mato’ a ela associado e de jovens indivíduos vendidos como ‘animais de companhia’;
– A fim de respeitar os pontos 2, 3 e 4 deste manifesto, realizar controles severos nas empresas que trabalham em zona tropical, especialmente aquelas em que a direção está estabelecida nos nossos países ocidentais respectivos;
– Garantir os financiamentos necessários para a aplicação das cláusulas 1 a 5, especialmente para o desenvolvimento de projetos de gestão durável com as populações locais.”
“Por Neuchâtel (Suisa), 4.4.2008”
Não fique de fora dessa macacada!!
Assine a lista! Não vá em circos que tenham animais! E tenha uma visão mais positiva de nosso sparentes!
Os outros macacos agradecem!
Primatas do mundo uní-vos!!
Agradeço ao Wall pela dica de site.
Lamarck – A Verdadeira Idéia Errada






Somos dominados por genes ou por mal-entendidos?


Teste seus conhecimentos sobre a Psicologia Evolucionista descobrindo o que ela não é.
- … não diz que comportamentos adaptativos estão presentes no nascimento.

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… não diz que nosso comportamento é geneticamente determinado.
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… não diz que não temos flexibilidade comportamental.

- … não diz que comportamentos são adaptações.
- … não diz que não precisamos aprender nada.
Pensar que instinto e aprendizagem são coisas opostas, excludentes ou inversamente proporcionais é um erro muito comum. Trata-se do velho debate inato x aprendido. Justamente porque temos instintos é que somos capazes de aprender. Não somos umas espécie que aprende muito por que temos menos instintos, mas sim por que temos muitos. Os módulos mentais são abertos e ávidos por informações ambientais. Portanto, é pela via do aprendizado que manifestamos nossa natureza, e pela via da natureza que temos as propensões
para aprender conteúdos culturais e assim participar do mundo social. No paralelo do computador é fácil perceber que até o programa de edição de texto está preparado para aprender, pois inserimos novos tipos de fontes, novas figuras. O programa aprende até palavras novas, se as adicionamos ao dicionário. E isso possibilita inclusive a impressão de mais textos diferentes, a partir de um único programa;
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… não diz que a cultura não é importante.
Como a Psicologia Evolucionista reconhece que temos muitos módulos mentais, que são abertos e calibráveis, ou seja, plásticos e maleáveis pelo ambiente, e ainda, especializados em gerar e processar conteúdos culturais, segundo sua perspectiva, o ser humano é biologicamente cultural. A cultura não é algo antinatural alheio à biologia humana. A cultura é parte essencial da natureza humana, influencia e é influenciada por nossas adaptações mentais. Portanto, a diversidade cultural não é a prova de que o comportamento humano independe de adaptações mentais, mas sim de que nossas adaptações mentais são ricamente voltadas para os contextos culturais em que crescemos;
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… não diz que as pessoas são idênticas nos comportamentos.
Assim como todas as pessoas têm um coração, dois pulmões, dois olhos e um estômago, todas as pessoas têm as mesmas adaptações cognitivas. A história de vida e o contexto ecológico-cultural de cada pessoa influencia seus órgãos, o que faz com que esportistas tenham coração e pulmões diferentes de fumantes. Assim como as adaptações mentais de cada pessoa também são fruto de uma interação única com seu ambiente, o que torna cada pessoa única. Mesmo que duas pessoas brasileiras tenham as mesmas adaptações mentais voltadas ao aprendizado da linguagem, e tenham o mesmo contexto cultural da língua portuguesa, elas podem ter sotaques e gírias diferentes segundo as regiões específicas em que cresceram. E isso não é a prova de que elas não têm adaptações mentais igualmente, mas sim de que suas adaptações mentais são abertas à informação ambiental que varia de região pra região;
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… não diz que comportamentos adaptativos estão fora de nosso controle.
A Seleção Natural moldou filogeneticamente adaptações mentais que geram tanto comportamentos adaptativos mais controláveis – como a detecção de trapaceiros e a escolha de parceiros –, quanto os mais incontroláveis – como os medos. Decisões rápidas frente a riscos reais de morte, assim como medo de cobra ou de altura, são em geral mais incontroláveis, já que uma informação ambiental e
specífica potencialmente letal dispara a reação adaptativa. Mas o fato de serem adaptativos e pouco controláveis não implica a impossibilidade de agirmos de modo a minimizar seus efeitos negativos. Saber qual informação ambiental influencia o aparecimento de tal comportamento – como ver uma cobra ou olhar para baixo na roda gigante – aumenta nossas chances de controlar por antecipação nossas tendências incontroláveis;
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… não diz que todo comportamento atual é adaptativo.
Nossos módulos mentais foram selecionados no ambiente ancestral, ou seja, no ambiente de nossa adaptabilidade evolutiva e não no ambiente moderno e tecnológico atual. Então, pelo viés da Psicologia Evolucionista muitos de nossos comportamentos atuais são compreendidos como não adaptados, por estarmos deslocados de nosso ambiente natural. Alguns comportamentos que eram adaptativos no ambiente ancestral atualmente podem não ser, a exemplo de comer doces e gordura em excesso. No ambiente ancestral era adaptativo acumularmos o máximo possível de calorias em uma única refeição, pois não havia abundância de alimentos tal como ocorre hoje. Outros exemplos vão no sentido oposto. É o caso da prática de atividades físicas. Fomos selecionados em um momento em que fazíamos grande quantidade de exercícios físicos, pois o modo de locomoção era andar. Contudo, hoje, no ambiente urbano, sobretudo, há disponíveis facilidades como os vários tipos de veículos e até mesmo dispositivos como as escadas rolantes que auxiliam a locomoção humana. Isso implica em pouca mobilidade física e acaba gerando riscos para a saúde;
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… não diz que as adaptações são perfeitas.
Mesmo se estivéssemos em nosso ambiente ancestral vivendo como caçadores-coletores nossas adaptações mentais seriam falíveis e imperfeitas. Se a seleção natural mantivesse um perfeito medo de cobras de modo a que as pessoas jamais saíssem de suas casas, seriam drasticamente reduzidos os casos de mortes por picada de cobra. No entanto, haveria um custo alto a pagar: a capacidade exploratória humana seria inexistente, o que resultari
a em falta de alimento, e conseqüentemente nos levaria à morte. As adaptações não são perfeitas porque se fossem muito eficazes seus custos ultrapassariam seus benefícios à sobrevivência e à reprodução. Além disso, as pressões seletivas são cegas quanto a um objetivo final a ser atingido futuramente pela adaptação. Sendo assim, o modo como um problema adaptativo foi solucionado pela seleção natural, ou seja pelo relojoeiro cego, quase nunca equivale àquele pelo qual um engenheiro o solucionaria, partindo do zero e pensando em simplicidade, eficiência e economia. Somado a este fato, não se pode esquecer que as adaptações nunca são exatamente iguais dentro da população, ou seja, mesmo se ela tiver atingido um nível ótimo, este nível será melhor para alguns do que para outros, pois sempre existe uma variação individual, que é a matéria-prima da evolução;
- … não diz que há genes para o egoísmo.
A abordagem do gene egoísta não é uma abordagem molecular para o egoísmo. O gene egoísta não é “aquilo” que pessoas egoístas têm. Muito menos a teoria diz que todos os genes têm desejos conscientes egoístas, como se eles só “pensassem” em si próprios. Os genes não possuem desejos conscientes. Eles simplesmente se auto-replicam. Aqueles que não se auto-replicaram não sobreviveram e não estão representados hoje. O padrão de auto-replicação cega produz resultados que por vezes são interpretados como se determinados genes tivessem interesse em ser mais representados nas próximas gerações. Tais genes não “têm” realmente esse interesse, mas agem cegamente como se tivessem. Trata-se de uma analogia com os interesses humanos. Usa-se a voz ativa e coloca-se intenção pessoal onde não há;
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… não diz que as pessoas inconscientemente visam aumentar a replicação de seus genes nas gerações seguintes.
Confundir os interesses dos genes com os das pessoas é uma das principais confusões feitas com a Psicologia Evolucionista. Exemplo: “O adultério não pode ser uma estratégia para propagar os genes egoístas, pois os adúlteros tomam providências contraceptivas”. O desejo sexual e o desejo de ter filhos não são uma estratégia das pessoas para propagarem seus genes. São uma estratégia das pessoas para obter os prazeres do sexo e os prazeres de
serem pais, e esses prazeres são a estratégia dos genes para propagarem-se nos filhos. Gene egoísta não implica em uma pessoa que faz tudo pensando em seus genes. As pessoas não pensam no que seria melhor pra seus genes, elas simplesmente comem pelo prazer de comer, pra matar a fome e por qualquer outra crença e desejo. Já os genes modelaram o desejo de comer quando se replicaram em pessoas que se alimentavam bem e conseqüentemente sobreviviam e reproduziam. O interesse dos genes e o interesse das pessoas estão separados por diferenças gigantescas em unidades de tempo. O interesse pessoal é pautado pelo hoje, ontem, amanhã, mês que vem, vida toda, enquanto o interesse do gene é pautado pela persistência de pressões adaptativas em sucessivas gerações no ambiente ancestral ao longo de milhões de anos;
Como você pôde perceber, nós vivemos em uma unidade de tempo mais rápida que a de nossos genes. Isso implica em não sermos dominados e controlados por eles. Somos livres para escolher não comer doces, se assim quisermos, e livres para seguir o propósito de não ter filhos, se assim o desejamos, livres para abdicar do sexo e até da própria sobrevivência. Temos esses pequenos viéses herdados em comer doce, ter filhos, praticar sexo e sobreviver, o que torna mais provável realizarmos tudo isso e mais difícil resistir a esses comportamentos, por sermos herdeiros de ancestrais que sobreviveram a ponto de deixar descendentes. Tais propensões foram moldadas no ambiente ancestral e não no atual. Então somos livres para fazermos o que bem entendermos agora com nosso corpo e com nossa mente.
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… não é sexista ou machista.
A Psicologia Evolucionista vem descobrindo muitas diferenças psicológicas inéditas entre homens e mulheres. Essas descobertas têm gerado confusão e muitos apregoam ser esta uma teoria baseada em machismo ou sexismo. Essa confusão vem de três problemas: Primeiro, a generalização ingênua. Assim, dizer que os homens são, em média, maiores que as mulheres não significa que todos os homens sejam mais altos do que todas as mulheres. Dizer que as mulheres têm mais fluência verbal que os homens não quer dizer que todos os homens sejam praticamente mudos. Depois vem
o preconceito. O preconceito ocorre quando ingenuamente julgamos a priori uma pessoa pela média dos atributos de seu grupo. Dizer que homens têm mais facilidade para a localização espacial não habilita ninguém a destratar, desmerecer ou desqualificar uma mulher por seu modo de dirigir. Finalmente vem a confusão entre diferença e desigualdade. Nenhuma diferença anatômica ou mental entre homens e mulheres implica qualquer julgamento de valor. Todos os seres humanos devem, por princípio, ter iguais direitos e oportunidades. Não há incompatibilidade entre sermos diferentes e termos garantias de igualdade de direitos;
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… não embasa julgamentos morais, nem justifica nossas ações.
Confundir explicações científicas com recomendações ou justificativas morais é o erro mais perigoso, por seu forte conteúdo emocional. É conhecido como falácia naturalista e implica numa nivelação equivocada entre o “é” das explicações descritivas e o “deve ser” das recomendações morais. Enquanto cientistas – cientes de que todo conhecimento tem um grau de incerteza – usam o verbo “dever” no sentido de “haver uma probabilidade de” para explicar a previsão de uma possibilidade, como na frase “Se existirem componentes herdáveis na propensão ao estupro e se alguns estupros tiverem gerado filhos, então deve ter havido uma pressão seletiva favorecendo as propensões envolvidas no estupro”; Outras pessoas ouvem o verbo “deve” no sentido de “ser moralmente preferível” e acusam esses pesquisadores de estar justificando, ou naturalizando um ato brutal e criminoso, o que não é verdade. Não somos escravos das adaptações mentais, uma vez que a própria seleção por flexibilidade de repertório conforme o contexto favorece um controle consciente dos nossos comportamentos, como a infidelidade. E, sendo um ato consciente, ele não isenta a culpabilidade daqueles que, ao satisfazerem seus desejos irresponsavelmente, expõem parceiros a danos à saúde pelo sexo desprotegido e à confiança pela traição. Nossas propensões mentais não são desculpa para nenhum ato danoso;
Causas apontadas
Por que esses mal-entendidos acontecem com tanta freqüência? Provavelmente não existe uma resposta única. Diferentes explicações foram dadas, não necessariamente excludentes.

A primeira fonte de explicação foca a causa dos mal-entendidos em nossos próprios padrões cognitivos de processamento de informações. Temos a tendência a simplificar qualquer informação para reduzir a demanda por recursos cognitivos e um forte desejo de gerar previsões a partir de casos específicos, o que nos faz incorrer na generalização. Quando esses padrões cognitivos são usados na tentativa de entender a relação entre gene, ambiente e comportamento, facilmente caímos nas supersimplificações como “gene gay” ou “gene da felicidade”, na tentativa de se aplicar o modelo mendeliano, que é simples, ao comportamento, que não o é. O desenvolvimento ontogenético é uma complexa interação singular entre genes, seqüência temporal dos ambientes externos e eventos aleatórios. Por isso, ainda não foi desenvolvido um modelo didático para descrever a influência genética no comportamento de forma lógica, como no modelo mendeliano, em que um gene é igual a uma característica.

Outra fonte de mal-entendidos envolve a aparente simplicidade da teoria da evolução. A facilidade de apreender o conceito de seleção natural leva as pessoas a pensar que entenderam completamente a evolução depois de um rápido contato com a teoria. Saber o modo darwinista de explicar o tamanho do pescoço da girafa não garante pleno entendimento do evolucionismo, principalmente quando aplicado ao comportamento humano.

Valores morais e condição animal


Agora que sabemos algumas causas dos preconceitos e mal-entendidos e sabemos como resolvê-los, faça um teste: busque notícias sobre ciência que envolvam genes, comportamento e psicologia evolucionista e veja se consegue identificar algum mal-entendido. Será mesmo que depois de ler esse texto você já está “vacinado” contra os mal-entendidos? Você agora sabe dizer o que está errado quando se fala em linguagem e infidelidade inatas? Você ainda acha que estudar diferenças entre homens e mulheres na perspectiva evolucionista é dar base moral para a dominação masculina? Considera mesmo que o fato de sermos animais nos torna escravos dos nossos genes?
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…Psicologia Evolucionária, pois esta é uma tradução errônea do inglês Evolutionary Psychology.
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…Psicologia Evolutiva, pois essa terminologia designa a Psicologia do Desenvolvimento. A teoria em que a Psicologia Evolucionista se embasa é evolutiva, logo a disciplina é evolucionista. Segundo um artigo que padroniza as traduções dos termos em inglês da área de Etologia publicado em 2002 por Yamamoto e Ades, Evolutionary Psychology no Brasil é Psicologia Evolucionista.
Referências
BUSSAB, V. S. H.; RIBEIRO, F. J. L. Biologicamente cultural. In M. M. P. RODRIGUES; L. SOUZA; M. F. Q. FREITAS (Orgs.). Psicologia: Reflexões (in)pertinentes. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1998.
LEWONTIN, R. A Tripla Hélice– Gene, Organismo e Ambiente. Companhia das Letras, 2002.
MEYER, D.; EL-HANI, C. N. Evolução: o sentido da biologia. São Paulo: UNESP, 2005.
OTTA, E.; RIBEIRO, F. J. L.; BUSSAB, V. S. R. (2003). Inato versus adquirido: Persistência de uma dicotomia. Revista de Ciências Humanas. Florianópolis, 2003. 34, 283-311.
PINKER, S. Tábula rasa. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
RIDLEY, M. O que nos faz humanos. Rio de Janeiro: Record, 2004.