Neutrinos mais rápidos do que a luz?

Tem havido muito frisson sobre um resultado de medições dos neutrinos emitidos pelo Large Hadron Collider (LHC) – o Grande Colisor de Hárdrons, o maior acelerador de partículas já construído – do CERN e detectados no Laboratori Nazionali del Gran Sasso (LNGS) do Instituto Nazionale di Fisica Nucleare (Itália).

Segundo os dados obtidos no LNGS – publicados aqui no ariXiv – os neutrinos oriundos do LHC estão chegando aos sensores do LNGS mais rápido do que se fossem fótons (isso se os fótons pudessem atravessar a Terra, do mesmo modo que os neutrinos o fazem).

Um dos pilares da física – a Teoria da Relatividade (de Einstein) – postula que nada pode viajar mais rápido do que a velocidade da luz no vácuo (o termo “c”, na famosa equação E = mc²) e os fótons (as partículas fundamentais da Força Eletromagnética(EM) e a luz visível é apenas uma estreita faixa da radiação EM) só conseguem esta proeza porque não tem massa.

Ora, supõe-se que os neutrinos tenham uma massa – muito pequena, é certo, mas tem – o que tornaria impossível que eles viajassem, mesmo no vácuo – e, para eles, a Terra e o vácuo são praticamente a mesma coisa – a uma velocidade sequer igual a “c”, quanto mais a uma velocidade superior.

Então, alguma coisa certamente está errada!

Ou temos (mais provável) algum erro desconhecido nas leituras, ou temos que refinar o arcabouço da física teórica para acomodar um novo fenômeno. (Mas, seja como for, dificilmente estaremos próximos de uma “viagem no tempo”, como sugeria um subtítulo de manchete do habitualmente sóbrio The Guardian).

Para dar as notícias de uma fonte menos bombástica, apresento a tradução da notícia divulgada no Inside Science News Service, da Associação Americana de Física.

 


 

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Físicos relatam indícios de uma partícula mais rápida do que a luz

Mas adiem a revolução: os resultados precisam ser confirmados e podem não alterar radicalmente a física.

23 de setembro de 2011

Por Ben P. Stein
Inside Science News Service

OPERA Info GRAPHIC

Imagem ampliada. Crédito: Colaboração OPERA

 

(ISNS) – No que pode vir a representar a maior descoberta em física do século até agora, caso confirmada, pesquisadores anunciaram terem medido partículas se deslocando a uma velocidade superior à da luz, o que – ao menos até agora – era considerado o limite máximo de velocidade para qualquer coisa no universo.

Pesquisadores do projeto OPERA (Oscillation Project with Emulsion-tRacking Apparatus) apresentaram seus resultados na última sexta em um seminário no CERN, o Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (a sigla é em francês), em seguida à publicação antecipada de um relatório no site arXiv (vide link acima)

Porém os pesquisadores do OPERA são os primeiros a enfatizar que é cedo demais para especular sobre possíveis implicações. Embora a colaboração OPERA tenha realizado uma análise compreensiva de suas medições, os pesquisadores reconhecem a possibilidade de haver um erro que passou despercebido, ou mesmo que tenha uma causa ainda desconhecida, que pode ter causado um desvio nos resultados. Eles declaram que estão apresentando seus resultados à comunidade da física de forma a que outros possam verificar esses resultados e tentem duplicar suas experiências.

O OPERA mediu o tempo de trânsito de partículas conhecidas como neutrinos em seu deslocamento de aproximadamente 732 km entre o acelerador do CERN na Suíça e o Laboratório do Gran Sasso na Itália. Ao medir o instante de chegada de mais de 15.000 neutrinos no Gran Sasso, eles descobriram de maneira inesperada que as partículas chegavam 60 nanossegundos (bilionésimos de segundo) mais rápido do que a luz teria chegado. Isso representa uma velocidade 0,002% mais rápida do que a luz que viaja a cerca de 300.000km/seg.

“É algo bem simples; é uma medição clássica”, declarou Dario Autiero do Instituto de Física Nuclear em Lyon e membro da equipe OPERA, durante o seminário da sexta-feira.

Para determinar a velocidade, a equipe dividiu a distância percorrida pelos neutrinos pelo tempo que eles levaram para completar sua viagem de mão unica. A equipe computou uma precisão geral do tempo de percurso dentro de 10 nanossegundos. Eles dispunham de um sistema de medição de tempo sofisticado que recebia sinais de satélites GP`S, os quais, por sua vez, contam com relógios atômicos.

As partículas que sacodem o mundo da física

Através de suas medições, a equipe OPERA conhecia a distância do percurso de 732 km com uma precisão de ± 20 cm, aproximadamente. Em sua viagem, os neutrinos atravessas quase que unicamente rocha sólida. No Gran Sasso eles se encontravam com um detector que consiste de vários “tijolos” de filme fotográfico dentro de folhas de chumbo. Uma pequena fração de neutrinos interagia com os alvos, produzindo fótons, os quais eram observados com foto-detectores sensíveis.

“Não importa o quão bom seja a experiência, eu vou continuar cético até que seja confirmado por outra experiência independente, porque se trata de um resultado muito revolucionário”, declarou V. Alan Kostelecky, um físico teórico da Universidade de Indiana. “Afirmações extraordinárias requerem provas extraordinárias. Elas precisam de comparações cruzadas, verificações cruzadas e experiências independentes. Eu ficaria muito feliz se [uma partícula mais rápida do que a luz] fosse encontrada. Eu realmente quero ter certeza de que o efeito existe e só vou ficar convencido se ele for detectado de diversas maneiras”.

Os neutrinos acrescentam outra camada de mistérios

Os neutrinos são uma das partículas mais comuns no universo, porém também são das mais difíceis de detectar. Eles são invisíveis e raramente interagem com o resto da matéria. Foram previstos pelo físico Wolfgang Pauli em 1930 como explicação para onde ia a “energia faltante” em reações nucleares e foram finalmente detectados em experiências com feixes de partículas subatômicas em 1956 nos Estados Unidos por Frederick Reines e Clyde Cowan. São conhecidos três tipos de neutrinos: de elétron, de múon e de taon. Sabe-se que eles transportam até 99% da energia quando uma estrela explode.

“A velocidade dos neutrinos nunca foi bem caracterizada”, argumenta Alan Chodos da Sociedade Americana de Física, que, juntamente com Kostelecky e Avi Hauser, então na Universidade Yale, publicaram uma série de artigos teóricos que começou em 1985, apresentando a hipótese dos neutrinos serem “táquions” – ou seja: partículas que se movem acima da velocidade da luz.

Uma estrela supernova que explodiu em 1987 ofereceu pistas em potencial para a velocidade dos neutrinos. Ela emitiu um jato de neutrinos de elétron que chegaram à Terra antes da luz da explosão, mas Chodos pondera que outros efeitos, tais como a luz ter ficado cativa dentro da estrela que explodiu, poderia explicar essa diferença. Os neutrinos – menos sociáveis – podem ter passado de passagem [enquanto a luz ficava presa]. No entanto, a análise da supernova descobriu que a velocidade dos neutrinos estava próxima da velocidade da luz em uma parte por bilhão – um resultado 50 vezes menos significativo do que o que está sendo relatado atualmente e que era consistente com uma velocidade não superior à da luz.

Mais recentemente, a experiência MINOS (Main Injector Neutrino Oscillation Search) nos Estados Unidos relatou em 2007 indícios de deslocamentos mais rápidos do que a luz para neutrinos de muon; no entanto a qualidade dos dados estatísticos não era do mesmo nível dos resultados do OPERA.

Durante o seminário de sexta-feira, as perguntas mais frequentes de outros cientistas na audiência eram se a equipe OPERA tinha re-verificado a distência exata entre o CERN e o Gran Sasso, e se eles tinham levado totalmente em conta efeitos tais como o efeito de maré e Autiero respondeu que eles haviam realizado várias medições independentes das distâncias.

As notícias sobre “uma revolução na física” podem ser grandemente exageradas

Caso confirmada sua existência,  partículas mais rápidas do que a luz poderão causar, no mínimo, uma revisão da física moderna que se apoia em uma fundação que inclui a velocidade da luz como limite cósmico de velocidade. Embora o conceito de velocidades ainda mais altas abra as portas para toda uma pletora de questões possivelmente complicadas, uma partícula mais rápida que a luz não destrói as noções correntes de causa e efeito. Quando mais não seja, observou Chodos, se ocorre apenas com neutrinos, estes não tem um efeito notável em nossa vida diária.

A violação da causalidade, acrescenta Kostelecky, requer que a observação de uma cadeia de eventos em um referencial seja invertido em um segundo referencial e isso não ocorre necessariamente se os neutrinos tiverem interações especiais com o meio por onde passam. De acordo com Kostelecky, uma classe de teorias, conhecida como Extensões do Modelo Padrão, permite a existência de partículas mais rápidas que a luz, as quais incluiriam novos fenômenos, mas não precisariam que as leis conhecidas da física fossem radicalmente re-escritas.


Ben P. Stein é o gerente editorial de Inside Science

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