A Circulação das correntes oceânicas não funciona como se pensava

Este modelo das correntes do Atlêntico Norte é posto em questão pelos novos dados obtidos pela Universidade Duke e a Instituição Oceanográfica Woods Hole. Archana Gowda, Duke

Este modelo das correntes do Atlêntico Norte é posto em questão pelos novos dados obtidos pela Universidade Duke e a Instituição Oceanográfica Woods Hole.
| Archana Gowda, Duke

[ Ocean Circulation Doesn’t Work As Expected ]

Rota misteriosa vai complicar a modelagem de mudanças climáticas

Por Monte Basgall

Quarta-feira, 13 de maio de 2009

O modelo familiar das correntes do Oceano Atlântico que mostram uma nítida “cor­reia transportadora” de águas frias e profundas fluindo na direção Sul a partir do Mar de Labrador, provavelmente está todo errado.

Uma nova pesquisa realizada pela Universidade Duke e a Instituição Oceano­gráfica Woods Hole se baseou em uma esquadra de bóias sofisticadas para mos­trar que grande parte dessa água, que se origina no mar entre a Terra Nova e a Groenlândia, é desviada na direção geral Leste quando chega à altura do Sul do estado de Massachusetts. A partir daí, ela se dispersa para as profundezas de maneiras complexas que são difícieis de seguir.

O modelo – já com 50 anos – das correntes oceâncias mostrava essa corrente sub­­marina de águas frias no sentido Sul como se formasse um laço contínuo com a familiar corrente de águas quentes que vai para o Norte na superfície, a Corrente do Golfo.

“Todos sempre pensaram que essa corrente profunda funcionasse como uma cor­reia transportadora, mas nós dizemos que esse conceito não é mais viável”, afirma a oceanógrafa da Duke Susan Lozier. “Portanto, vai ser mais difícil medir esses sinais de mudanças climáticas no oceano profundo”.

E, uma vez que se acredita que a corrente fria de Labrador influencia e até que talvez sirva como moderador para as mudanças climáticas causadas pelas atividades humanas, esta descoberta pode afetar os trabalhos de todos os que traçam prognósticos sobre o aquecimento global em todo o mundo.

Amy Bower, da Woods Hole, declarou: “Para aprender mais sobre como as águas frias e profundas se espalham, vamos precisar realizar mais medições dentro do oceano profundo e não só junto à costa, onde se pensava antes que as águas frias ficavam confinadas”.

Lozier, uma professora de oceanografia física na Escola Nicholas de Meio- Ambiente da Duke, e Bower, uma cientista senior no departamento de oceano­grafia física da Woods Hole, são as autoras de um relatório sobre as desco­bertas que será publicado na edição de 14 de maio da Nature.

A pesquisa foi financiada pela Fundação Nacional de Ciências (NSF).

Os climatologistas prestam atenção ao Mar do Labrador porque ele é um dos pontos de partida de um padrão global de circulação que transporta a água fria do Norte para o Sul, tornando os trópicos um pouco mais frios, e retorna a água quente pela superfície, através da Corrente do Golfo, para moderar as tempe­raturas da Europa do Norte.

Uma vez que as previsões dizem que os efeitos do aquecimento global devem ser ampliados nas latitudes mais altas, isto torna o Mar de Labrador um foco de atenção mais importante ainda. Lá, as águas da superfície absorvem o dióxido de carbono atmosférico que captura calor. E uma quantidade substancial desse CO2 é então levado por debaixo d’água, onde ele não pode mais aquecer o clima da Terra.

“Nós sabemos que uma boa parte do dióxido de carbono produzido pelas atividades humanas desde a Revolução Industrial está agora nas profundezas do Atlântico Norte”, lembra Lozier. E, de cambulhada, vão as variações na tem­peratura das águas que têm origem no mesmo ponto do Mar de Labrador.

A questão é: como esses sinais de mudanças climáticas se espalham mais para o Sul? Os oceanógrafos sempre pensaram que toda essa água do Mar de Labra­dor se movesse para o Sul ao longo do que é chamado de Corrente Profunda Limí­trofe Ocidental (Deep Western Boundary Current  = DWBC), que abraça a plataforma continental Leste da América do Norte até a Flórida e daí segue para o Sul.

Porém, estudos realizados na década de 1990, usando bóias submersíveis que seguiam as correntes submarinas, “mostraram haver poucos indícios de que exis­tisse uma vazão das águas do Mar de Labrador para a Deep Western Boundary Current (DWBC),” dizia um relatório da Nature.

Os cientistas contestaram esses estudos anteriores, entretanto, em parte por­que as bóias tinham que retornar à superfície para relatar suas posições e ob­ser­vações para receptores montados em satélites. Isso significava que “os dados poderiam ter sido distorcidos pelas correntes da superfície do oceano quando subiam periodicamente”, acrescentava o relatório.

Para resolver essas críticas, Lozier e Bower lançaram 76 bóias especiais, do tipo Range and Fixing of
Sound
(RAFOS) na corrente ao Sul do Mar de Labrador entre 2003 e 2006. Essas bóias “RAFOS” podiam permanecer submersas entre 700 a 1.500 metros de profundidade e ainda enviarem seus dados até 1.000 km de alcance, usando uma rede especial de sinais de baixa frequência e de amplitude sísmica.

Porém apenas 8% das bóias RAFOS seguiu a correia transportadora da Deep Western Boundary Current, de acordo com o novo relatório para a Nature. Cerca de 75% delas “escapou” da trilha de águas profundas próximas da costa e garraram para o oceano quando rodearam a ponta Sul dos Grandes Bancos.

Oito porcento “é um número notavelmente pequeno, à luz das expectativas de que a DWBC fosse o caminho dominante para as águas do Mar de Labrador”, registraram as pesquisadoras.

Estudos anteriores feitos por Lozier e outros pesquisadores tinham sugerido que as águas poderiam seguir tais “caminhos interiores”, em lugar da correia transportadora, no trajeto para as regiões subtropicais do Atlântico Norte. Porém, “o rastreamento dessas bóias mostra os primeiros indícios da dominância desse caminho em comparação à DWBC”.

Já que as rotas das bóias RAFOS só podiam ser rastreados por dois anos, Lozier, seu estudante de pós-graduação Stefan Gary e o oceanógrado alemão Claus Boning, também se valeram de um programa de modelagem para simular o lançamento e a dispersão de mais de 7.000 “e-bóias virtuais” desde o mesmo ponto de partida.

“Assim podíamos enviar muito mais bóias do que na vida real e por um tempo maior”, explica Lozier.

Submetendo essas “e-bóias” às mesmas condições dinâmicas submarinas que as bóias reais, os pesquisadores traçaram as rotas de seu movimento. “Elas se espalharam e as trajetórias das bóias RAFOS, após dois anos, é muito parecida”, segundo eles.

“As novas observações das trajetórias de bóias e bóias simuladas fornece indí­cios de que o caminho inteiror para o Sul é mais importante no transporte das águas do Mar de Labrador para as regiões subtropicais do que a DWBC, ao contrário do que se pensava”, conclui o relatório.

“Isso significa que vai ser mais difícil medir os sinais climáticos no oceano profundo”, observa Lozier. “Nós pensávamos que podíamos simplesmente medí-los na Deep Western Boundary Current, mas realmente não podemos”.


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