“Por dentro da ciência” do Instituto Americano de Física (08/10/08)

Inside Science News Service
8 de outubro de 2008
Meras Águas-Vivas Promovem um Esplendoroso Reconhecimento

O Prêmio Nobel de 2008 de Química foi para três pesquisadores americanos pela descoberta e desenvolvimento da proteína fluorescente verde, uma ferramenta para iluminar o que não se podia ver

Por Jason Socrates Bardi
Inside Science News Service

“O primeiro verde da natureza vale ouro”, escreveu uma vez o poeta Robert Frost, e nesta manhã suas palavras pareceram proféticas para os três pesquisadores de instituições americanas que acabam de receber o Prêmio Nobel de Química de 2008 por sua descoberta e desenvolvimento de uma proteína fluorescente verde — uma molécula encontrada nas águas-vivas que revolucionou a biologia e a medicina (imagem ao lado retirada da WikiPedia).

O prêmio, anualmente concedido pela Academia Sueca e com um valor em dinheiro de US$1,4 milhões, será dividido entre os três ganhadores: Osamu Shimomura do Laboratório de Biologia Marinha em Woods Hole, Massachusetts e da Escola de Medicina da Universidade de Boston; Martin Chalfie da Universidade Columbia em Nova New York; e Roger Y. Tsien da Universidade da Califórnia em San Diego.

Embora o prêmio tenha sido concedido na categoria “química”, a descoberta é uma daquelas de trespassa vários ramos da ciência. No âmago da descoberta está a proteína fluorescente verde (green fluorescent protein = GFP), uma molécula naturalmente “fluorescente”, ou seja, que brilha ao absorver a luz em uma cor e reemití-la em outra cor. Como uma ferramenta de pesquisa, esta proteína revolucionou a biologia e a medicina, declara Jeremy M. Berg, o diretor do Instituto Nacional de Ciências Médicas Gerais que faz parte do sistema dos Institutos Nacionais de Saúde.

“A GFP é uma parte do tecido da pesquisa biomédica”, declarou Berg em uma entrevista. “Ela se tornou uma ferramenta essencial para a procura da expressão de genes em todos os tipos de organismos”.

Como e onde os genes se expressam em um corpo é um dos aspectos mais fundamentais de toda a saúde (e das doenças) humana. O que a GFP permitiu aos cientistas fazerem foi “etiquetar” proteínas — os produtos dos genes — com o equivalente molecular de um farol. Isto permitem que eles olhem, através do microscópio, para tecidos e células vivos e observem quais genes estão atuando em que parte do corpo. Este tipo de informação lança luz sobre a biologia básica e aborda algumas das mais importantes questões atuais da medicina.

“As proteínas fluorescentes verdes permitem aos cientistas a quase literalmente observar o crescimento do câncer e estudar o mal de Alzheimer e outras condições que afetam a milhões de pessoas”, declarou hoje o Presidente da American Chemical Society, Bruce E. Bursten.

O Professor do Connecticut Marc Zimmer, autor do livro “Glowing Genes: A Revolution in Biotechnology” (“Genes Luminosos: Uma Revolução na Biotecnologia”) e um expert na história da GFP, comparou a descoberta da GFP à do microscópio, que revolucionou a ciência no século XVII.

“É tão significativa quanto o microscópio”, disse Zimmer, “porque nos permite ver coisas que nunca pudemos ver antes”.

Shimomura inicialmente isolou a proteína luminsecente da água-viva Aequorea Victorea, (foto ao lado: WikiPedia. Para vê-la em 1.600 x 1.200 pixels clique aqui) que se desloca ao sabor das correntes da costa Oeste da América do Norte. De acordo com Zimmer, Shimomura capturou um milhão dessas águas-vivas ao longo de 20 anos e, a partir delas, isolou a substância luminosa em 1962. Shimomura descrieveu como ela absorvia luz em uma cor e a reemitia em uma cor diferente, em um artigo publicado naquela época: “uma proteína que dá soluções que parecem ligeiramente esverdeadas à luz do Sol, embora sejam apenas amareladas sob a luz de lâmpadas de tungstênio, e exibem uma fluorescência esverdeada e muito brilhante sob o ultravioleta . . .”

O que Shimomura originalmente chamou de “proteína verde” foi, mais tarde, renomeado como “proteína fluorescente verde” (“green fluorescent protein”, ou GFP, abreviadamente), depois quer as bases físicas da luminescência da proteína foram melhor compreendidas. A GFP, como todas as proteínas, é uma cadeia de moléculas de aminoácidos que espontaneamente se dobram em um formato particular. O formato único da proteína dobrada permite que ela absorva luz em uma cor e a reemita como uma cor diferente (o verde característico).

Muitas moléculas biológicas são capazes de produzir essa luminosidade. Uma das mais familiares é a proteína luciferase, a molécula “fosforescente” responsável pelo lampejo dos vaga-lumes nos crepúsculos do verão. A particularidade da GFP, entretanto, é que, diferentemente da luciferase que precisa de uma complexa reação química para produzir luz, a GFP simplesmente converte  uma cor de luz em outra. O que acontece nas águas-vivas é que uma proteína totalmente diferente cuida da conversão química e lança uma luz azul sobre a GFP, que a absorve e emite a verde.

Porque a GFP é relativamente pequena e tem um mecanismo tão elegantemente simples, os pesquisadores nos laboratórios modernos podem pregá-la como uma etiqueta a quase qualquer produtos dos genes. Então, simplesmente iluminando a amostra, podem observar onde os produtos dos genes etiquetados foram distribuídos, com o que eles estão interagindo e fazer algumas das perguntas mais fundamentais sobre como a biologia funciona. Por exemplo, esse procedimento básico pode mostrar como os genes agem durante o desenvolvimento do embrião de um organismo simples, pode mostrar como o sistema imunológico interage com patógenos e poder até iluminar intrincados detalhes dos neurônios dentro de um cérebro de um rato.

Foi o co-laureado Chalfie da Universidade de Columbia quem primeiro demonstrou o valor da GFP como uma etiqueta genética que podia literalmente iluminar vários fenômenos biológicos. Em uma de suas primeiras experiências, ele usou GFP para colorir e etiquetar seis células individuais no nematóide  Caenorhabditis elegans (se você quiser ver com o que isso se parece, veja aqui). Desde este trabalho pioneiro, a etiquetagem com GFP foi adotada e apicada para quase todos os tipos de organismos estudados em laboratórios, de colônias de bactérias a células humanas.

Atualmente, a técnica é ainda mais poderosa, graças ao trabalho do co-laureado Tsien da UCSD. Ele melhorou a técnica criando uma paleta de cores que se estende além do verde. Ele desenvolveu etiquetas de várias cores, o que permite que os cientistas sigam diferentes processos biológicos ao mesmo tempo e observar como vários tipos de células e proteínas interagem.

A grande ironia disto tudo é que ninguém, até hoje, foi capaz de descobrir para que serve a GFP nas águas-vivas. “Ela serve para caçar, para atrair parceiros, ou outra coisa?” pergunta Berg. “Eu penso que ninguém sabe realmente”.

Na Web:
– Anúncio do Nobel: http://nobelprize.org/nobel_prizes/chemistry/laureates/2008/press.html.
– Histórico da descoberta da Proteína Fluorescente Verde: http://www.conncoll.edu/ccacad/zimmer/GFP-ww/timeline.html.

Este texto é fornecido para a media pelo Inside Science News Service, que é apoiado pelo Instituto Americano de Física (American Institute of Physics), uma editora sem fins lucrativos de periódicos de ciência. Contatos: Jim Dawson, editor de notícias, em jdawson@aip.org.

Discussão - 1 comentário

Envie seu comentário

Seu e-mail não será divulgado. (*) Campos obrigatórios.

Sobre ScienceBlogs Brasil | Anuncie com ScienceBlogs Brasil | Política de Privacidade | Termos e Condições | Contato


ScienceBlogs por Seed Media Group. Group. ©2006-2011 Seed Media Group LLC. Todos direitos garantidos.


Páginas da Seed Media Group Seed Media Group | ScienceBlogs | SEEDMAGAZINE.COM