Por que a atmosfera do Sol é tão quente?

[ Livremente traduzido de: Why Is the Sun’s Atmosphere So Hot? ]

Novas imagens de satélites dão aos cientistas pistas para compreender o duradouro mistério do que aquece a coroa solar

Image showing jets of dense plasma shooting up from the solar
chromosphere.

Uma “cerca-viva” de espículas, ou jatos de plasma densos, se eleva da cromosfera solar.
Crédito e imagem ampliada

4 de março de 2010

O lançamento em 2006 do satélite multinacional Hinode mudou o quadro do Sol para a astrofísica. Para dois astrofísicos em particular, as imagens obtidas proporcionaram uma viagem de descoberta e a excitação de desvendar um mistério solar que persistia

A atmosfera da Terra pode obscurecer a visão com os telecópios dessasistidos com base na Terra, mas, sem este obstáculo, o telescópio de alta resolução a bordo do Hinode captura  imagens do Sol com detalhes sem precedentes.

Foi nessas novas imagens que Scott McIntosh, Bart De Pontieu, Viggo Hansteen e Karel Schrijver descobriran as melhores pistas que os levaram a descobrir uma maneira de responder ao enigma de porque a coroa solar é milhões de graus mais quente do que a superfície visível do Sol.

“Entre as regiões observadas pelo Hinode está a cromosfera solar, a área que separa a superfície do Sol – a fotosfera – de sua atmosfera estendida, a coroa”, explica McIntosh, astrofísico do Observatório de Grande Altitude do Centro Nacional de Pesquisas Atmosféricas (NCAR), patrocinado pela NSF.

Jets coming out of the sun's lower atmosphere, as seen by the Hinode Solar
Optical Telescope.


Veja o vídeo (em inglês)
Jatos vindos da atmosfera inferior do Sol, vistos pelo Telescópio Óptico Solar Hinode.
Créditp e imagem ampliada

A intuição nos leva a raciocinar que a atmosfera deveria ficar mais fria na medida em que nos afastamos da superfície do Sol, mas a realidade desmente essa suposição. Usando as imagens obtidas pelo Hinode, De Pontieu, cientista do Laboratório Solar e de Astrofísica Lockheed, McIntosh e seus colegas descobriram um novo tipo de espícula

As espículas “clássicas” (“tipo-I”) são jatos de plasma denso que se projetam da cromosfera e, quase sempre, voltam pelo caminho por onde foram, explica McIntosh. Essas espículas “tipo-II” – que McIntosh e De Pontieu recentemente batizaram de “radices”¹ – são mais quentes, efêmeras e mais rápidas do que suas irmãs tipo-I.

Faint mass-loading/heating outflows against the darker corona of a coronal
hole.


Veja o vídeo (em inglês)
Fluxos esmaecidos de plasma que transportam massa e aquecem a coroa, vistos contra o fundo mais escuro de um buraco na coroa.
Crédito e imagem ampliada

McIntosh acrescenta: “Nas imagens do Hinode, as radices pareciam disparar para cima e desaparecer, frequentemente em velocidades superiores a 100 km/seg. Esses jatos provavelmente contém plasma em uma temperatura entre os 10.000 e vários milhões de graus Celsius e tem uma vida de não mais do que entre 10 a 100 segundos. Embora os astrofísicos, inclusive o fundador do NCAR, Walter Orr Roberts, tenham estudado longamente as espículas tipo-I, sabe-se que o material nelas contido não atinge a temperatura típica da coroa – cerca de 1 milhão de graus – o que eliminava uma conexão entre as espículas e o aquecimento da coroa”.

Foi somente em um congresso científico em 2008 sobre o Hinode – quando um colega discutiu ter observado uma componente sutil com uma velocidade de elevação de mais de 100 km/seg em uma região da coroa com um forte campo magnético – que De Pontieu e McIntosh se entreolharam, pensando exatamente a mesma coisa: será que aquilo era um indício das radices atingindo as temperaturas da coroa?

Longer-lived structures showing only those that are likely
associated with chromospheric activity.


Veja o vídeo (em inglês)
Estruturas mais duradouras como estas provavelmente estão associadas com a atividade da cromosfera.
Crédito e imagem ampliada

Juntos, eles procuraram o conjunto de dados “ideal” do Hinode, um onde eles pudessem rastrear as colunas de plasma ejetadas da cromosfera para a coroa. Quando identiificaram esses dados, cada um abordou a tarefa por uma perspectiva diferente.

Ao compararem seus resultados, eles perceberam que as posições das radices e as assinaturas de velocidade ascendente observadas na coroa eram as mesmas. Eles também descobriram que as velocidades dos jatos vindos da cromosfera e os presentes nesses eventos na coroa se ajustavam muito bem.

Continuous outflows in the active region that are rooted in Type-II
chromospheric spicules.


Veja o vídeo (em inglês)
Fluxos contínuos na região ativa, associados com as espículas tipo-II da cromosfera.
Crédito e imagem ampliada

“Eses fatos indicam que as radices podem desempenhar um papel importante no suprimento e preenchimento da massa quente da coroa solar e do vento solar, explicando a diferença de temperaturas entre a coroa e a fotosfera”, diz McIntosh. “Nossos cálculos indicam que as radices podem encher a coroa com plasma quente, mesmo que apenas entre 1 e 5 % das radices atinjam as temperaturas da coroa”.

Este trabalho não proporcionou apenas a alegria da descoberta para McIntosh, De Pontieu, Schrijver (também do Laboratório Solar e de Astrofísica da Lockheed Martin) e Hansteen (da Universidade de Oslo), com o entuisiasmo de levar sua hipótese original a uma conclusão espetacular, como também o esforço tem implicações diretas para com a pesquisa climática na Terra.

A schematic diagram of the cycle of mass in the solar atmosphere.

Um diagrama esquemático do ciclo de massa na atmosfera solar.
Crédito e imagem ampliada

“A compreensão dos processos solares melhora nossos conhecimentos sobre as interações Terra-Sol, dando novas abordagens sobre como a radiação UV gerada pelas tempestades solares afeta a atmosfera superior da Terra, o ozônio da estratosfera e – potencialmente – a dinâmica do clima global em escalas de tempo longas e curtas”, explica McIntosh.

Uma missão que vai ajudar na melhoria da compreensão das radices é a Interface Region Imaging Spectrograph (IRIS) da NASA que permitirá aos cientistas investigarem a formação das radices em alta resolução. Uma nova missão para o Hinode também está agendada e o lançamento do Observatório de Dinâmica Solar (Solar Dynamics Observatory) agora em 2010 fornecerá uma série adicional de imagens da coroa e alta resolução a cada 10 segundos.

– Rachel Hauser, National Center for Atmospheric Research, rhauser@ucar.edu

[1] “Radice” (plural “radici”) é um termo em latim para “raiz”, geralmente usado em botânica. A tendência atual é absorver o latinório tomado emprestado pelo inglês e pronunciado de forma atroz: “ra-dái-ce”.


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