Os Cinturões de Van Allen são aceleradores de partículas

25 de julho de 2013
Por: Karen C. Fox
NASA’s Goddard Space Flight Center, Greenbelt, Md.

 

Particle acceleration comes from the Van Allen radiation belts.
Observações recentes realizadas pelas gêmeas Sondas Van Allen da NASA mostram que as partículas dentro dos cinturões de radiação que envolvem a Terra, são aceleradas por uma espécie de “chute” de energia local, o que ajuda a explicar por que essas partículas chegam a velocidades de até 99% da velocidade da luz.
Crédito da Imagem: G. Reeves/M. Henderson

 

Os cientistas descobriram um enorme acelerador de partículas no coração de uma das regiões mais inóspitas do espaço próximo da Terra, uma região povoada por partículas carregadas e super-energéticas, chamadas de Cinturões (de Radiação) de Van Allen. Os cientistas sabiam que algo no espaço acelerava as partículas dentro dos cinturões de radiação acima de 99% da velocidade da luz, mas eles não sabiam o que esse “algo” era. Novos resultados das Sondas Van Allen da NASA mostram que a energia aceleradora vem de dentro dos próprios cinturões. As partículas em seu interior parecem levar um chute de energia, o que as acelera cada vez mais, de forma muito parecida a empurrões perfeitamente sincronizados em um balanço em movimento.

A descoberta de que as partículas são aceleradas por uma fonte local de energia é comparável à descoberta de que os furacões nascem de uma fonte de energia local, tal como uma região de águas oceânicas aquecidas. No caso dos cinturões, a fonte é uma região de intensas ondas eletromagnéticas que tira energia de outras partículas localizadas na mesma região. Conhecer a localização da acleração irá ajudar os cientistas a melhorar as previsões do tempo espacial, porque mudanças nos cinturões de radiação podem trazer riscos para os satélites em órbita próxima da Terra. Os resultados foram publicados hoje na Science.

De forma a que os cientistas pudessem compreender melhor o que se passa dentro dos cinturões, as Sondas Van Allen foram projetadas para voar direto por dentro dessa área turbulenta do espaço. Quando missão foi lançada em agosto de 2012, ela tinha como objetivos principais compreender como as partículas dentro dos cinturões eram aceleradas até essas energias ultra-altas e como essas partículas, algumas vezes, logravam escapar. Ao estabelecer que essa aceleração ultra-intensa vem desses “chutes” locais de energia – e não de um processo mais generalizado – os cientistas conseguiram responder definitivamente a uma dessas importantes questões pela primeira vez.

“Este é um dos resultados mais esperados e entusiasmantes das Sondas Van Allen”, declara David Sibeck, cientista do projeto das Sondas Van Allen no Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, Maryland. “É o principal motivo pelo qual a missão foi lançada”.

Os cinturões de radiação foram descobertos com o lançamento dos primeiros satélites americanos que chegaram com sucesso ao espaço, Explorer I e III. Rapidamente se percebeu que os cinturões eram um dos ambientes mais perigosos que uma espaçonave poderia enfrentar. A maior parte das órbitas de satélites é escolhida para se encolher por baixo dos cinturões de radiação, ou para circular por fora deles, ou ainda, como no caso dos satélites do GPS, operar entre os dois cinturões. Quando os cinturões oscilam, por causa do “mau tempo” espacial, eles podem abranger essas espaçonaves, expondo-as a perigosas radiações. De fato, a maior parte dos defeitos permanentes nas espaçonaves foi causada pela radiação. Com um aviso suficiente, a tecnologia pode ser protegida das piores consequências, mas este aviso só pode ser emitido se realmente conhecermos a dinâmica do que acontece dentro dos misteriosos cinturões.

“Até a década de 1990, nós pensávamos que os cinturões de Van Allen eram bem-comportados e mudavam lentamente”, esclarece Geoff Reeves, o primeiro autor do artigo e pesquisador dos cinturões de radiação no Laboratório Nacional de Los Alamos, Novo México. “A cada nova medição realizada, entretanto, percebemos o quão rápido e de maneira imprevisível os cinturões mudavam. Eles basicamente jamais estão em equilíbrio, mas em um estado de contínua mudança”.

De fato, os cientistas perceberam que os cinturões nem sequer mudam de maneira consistente em resposta ao que parecem ser estímulos similares. Algumas tempestades solares faziam os cinturões se intensificarem; outras os tornavam esgotados; e algumas pareciam nem ter qualquer efeito. Tais efeitos disparatados a eventos aparentemente similares sugeriam que esta região era muito mais misteriosa do que se pensava. Para compreender – e, eventualmente, ser capaz de predizer – quais tempestades solares intensificariam os cinturões de radiação, os cientistas precisavam saber de onde vinha a energia que acelerava as partículas.

As Sondas gêmeas Van Allen foram projetadas para distinguir duas possibilidades genéricas sobre os processos que aceleravam as partículas a tais impressionantes velocidades: aceleração radial ou aceleração local. No caso da aceleração radial, as partículas são transportadas perpendicularmente aos campos magnéticos que envolvem a Terra, das áreas de menor intensidade magnética, longes da Terra, até áreas de intensa força magnética, próximas da Terra. As leis da física ditam que as velocidades das partículas neste cenário aumentará com a intensificação dos campos magnéticos. Assim, as velocidades das partículas deveriam aumentar ao se aproximarem da Terra, de forma muito parecida com a que uma pedra que rola morro abaixo aumenta de velocidade simplesmente devido à gravidade. No caso da aceleração local, a teoria afirma que as partículas recebam energia de uma fonte local, de forma mais parecida com a qual as águas aquecidas dos oceanos alimentam furacões acima delas.

 

Graphic of Earth's radiation belts and the orbit of the Van Allen Probes.
Duas faixas de partículas que envolvem a Terra, chamados de cinturões de radiação, são um dos maiores aceleradores de partículas naturais do Sistema Solar, capaz de imprimir às partículas velocidades da ordem de 99% da velocidade da luz. As Sondas Van Allen, lançadas em agosto de 2012, descobriram agora os mecanismos por trás dessa aceleração.
Crédito da Imagem: NASA/Goddard /Scientific Visualization Studio

 

Para poder distinguir entre essas duas possibilidades, as Sondas Van Allen consistem de duas espaçonaves. Com dois conjuntos de observações, os cientistas podem medir as partículas e as fontes de energia em duas regiões do espaço simultaneamente, o que é crucial para distinguir entre causas locais e as que têm origem remota. Igualmente, cada espaçonave é equipada com sensores para medir a energia e a posição das partículas e determinar o ângulo de ataque – ou seja, o ângulo do movimento com respeito aos campos magnéticos da Terra. Tudo isso iria variar de maneiras diferentes, dependendo das forças que agem sobre elas, o que auxiliou os cientistas a distinguir entre as teorias.

Equipados com esses dados, Reeves e sua equipe observaram uma rápida elevação da energia de elétrons de alta energia em 9 de outubro de 2012. Se a aceleração desses elétrons estivesse ocorrendo por causa do transporte radial, os efeitos medidos começariam longe da Terra e se movendo para dentro, devido ao próprio formato e a própria intensidade desses campos envoltórios. Em tal cenário, as partículas que se movessem através dos campos magnéticos pulariam naturalmente de um par o seguinte, em cascata, arrebanhando energia durante o caminho – similar ao cenário da pedra que rola morro abaixo.

No entanto as observações não mostraram uma intensidade que se formasse mais afastada da Terra e gradualmente se movesse para dentro. Em lugar disto, elas mostraram um aumento de energia que começava bem no meio dos cinturões de radiação e gradualmente se espalhava tanto para dentro, como para fora, o que implicava em uma fonte de aceleração local.

“Neste caso em particular, toda aceleração ocorreu em um período de cerca de 12 hors”, relata Reeves. “Com as medições anteriores, um satélite só seria capaz de voar através de um tal evento uma vez e não teria a chance de testemunhar as mudanças realmente acontecendo. Com as Sondas Van Allen tínhamos dois satélites e, assim, pudemos observar como as coisas se modificam e onde essas mudanças começam”.

Os cientistas acreditam que estes novos resultados levarão a melhores previsões sobre a complexa cadeia de eventos que intensificam os cinturões de radiação a níveis que podem danificar satélites. Muito embora o trabalho demonstre que a energia local vem de ondas eletromagnéticas que percorrem os cinturões, não se sabe exatamente quais dessas ondas podem ser a causa. Durante o conjunto de observações descrito no artigo, as Sondas Van Allen observaram um tipo específico de onda, chamadas ondas corais, ao mesmo tempo que as partículas eram aceleradas, porém serão necessários mais estudos até que se estabeleça uma relação de causa e efeito.

“Este artigo ajuda a diferenciar entre duas soluções genéricas”, ressalva Sibeck. “Ele demonstra que a aceleração pode ocorrer localmente. Agora, os cientistas que estudam ondas e campos magnéticos vão se debruçar sobre o problema e descobrir que tipo de onda forneceu o empuxo”.

Felizmente, esta tarefa também será auxiliada pelas Sondas Van Allen Probes, que também são cuidadosamente projetadas para medir e distinguir entre os diversos tipos de ondas eletromagnéticas.

“Quando os cientistas projetaram a missão e os instrumentos das sondas, eles contemplaram as dúvidas científicas e disseram: ‘Esta é uma grande oportunidade para fazer algumas descobertas fundamentais sobre como as partículas são aceleradas’ “, disse Nicola J. Fox, cientista associado do projeto no Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins em Laurel, Maryland. “Com cinco conjuntos idênticos de instrumentos a bordo de cada espaçonave  – cada um com um amplo espectro de detecção de ondas e partículas – nós temos a melhor plataforma já criada para poder compreender melhor esta região crítica do espaço acima da Terra”.

O Laboratório de Física Aplicada construiu e opera as Sondas gêmeas Van Allen para a Diretoria de Missões Científicas da NASA. As Sondas Van Allen são a segunda missão do programa Living With a Star NASA, gerenciado pelo Centro Goddard, para explorar os aspectos do sistema Sol-Terra que afetam diretamente a vida e a sociedade.

Para mais informações sobre as sondas Van Allen (em inglês), visite:

 www.nasa.gov/vanallenprobes/

 

 

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