Três artigos do The Sunday Times

Salve, Pessoal! Uma rápida vista no The Sunday Times (on line) de Londres, e três artigos de capa me chamaram a atenção. Eu não vou passar uma tradução completa dos três, primeiro porque são muito extensos, segundo porque eu dou os links (quem quizer conferir, vá lá e leia…)
O primeiro traz o auspicioso título “Chefe da Polícia Metropolitana: Eu posso ser forçado a pedir demissão” (Met boss: I may be forced to quit), escrito por Robert Winnett and David Leppard. Começa assim:

SIR IAN BLAIR, o Comissário da Polícia Metropolitana, admitiu que ele pode ser brevemente forçado a pedir demissão, por conta do caso do assassinato de um brasileiro inocente no Metrô de Londres.
O mais alto policial da Grã-Bretanha declarou, a uma reunião privada de líderes de negócios e altos funcionários que ele terá que ir embora “muito breve” por causa da morte de Jean Charles de Menezes.
Descrevendo a pressão que está sofrendo por causa da malfadada operação, ele disse: “Onde a demissão termina? É claro, ela pode terminar muito em breve”
Ele acrescentou: “Eu prefiro renunciar do que ser demitido”.
[….]
Oficiais do alto escalão da polícia disseram que o inquérito sobre a operação revelará um “conto de terror”, quando for completado antes do Natal. Uma dessas fontes internas disse: “Ele (Blair) ficou obviamente prejudicado. Sua auto-confiança ficou prejudicada. Vocês podem ver que ele parece visivelmente mais velho”.
Blair explicou, na reunião, que sua atuação pessoal no caso estava sendo agora investigada pela Comissão Independente de Queixas da Polícia (IPCC). Blair tentou bloquear uma investigação imediata da IPCC do tiroteio na estação de metrô de Stockwell.
Em uma carta enviada ao Home Office (nota do tradutor: O ministério Inglês da Justiça), escrita poucas horas depois do tiroteio, ele dizia que ele deveria ter o poder de suspender as investigações por questões de segurança nacional. Ele foi derrotado (no original: “overruled) por Sir John Gieve, o principal funcionário do Home Office.
[….]
Ao menos 10 oficiais envolvidos no tiroteio devem ter recebido notificações disciplinares da polícia. Inclusive os agentes especiais (no original: “marksmen”) do CO19, que dispararam 11 tiros em Menezes depois que ele embarcou em um trem em Stockwell. Oficiais superiores, até o grau de Comissário Assistente podem enfrentar acusações de assassinato.
[….]
À medida em que a IPCC examina se Blair realizou declarações falsas ao público, fica claro que alguns de seus oficiais mais graduados estavam cientes, na metade da tarde de 22 de julho, que Menezes era inocente. Um Oficial Superior disse ao Sunday Times que Blair estava em uma posição que lhe permitia saber aquilo que seus oficiais já tinham descoberto.
Outra fonte interior disse: “Sérias dúvidas acerca de se eles tinham atirado no homem certo, apareceram logo após o incidente. Tudo o que eles tinham a fazer era olhar os documentos de identidade na carteira dele para ver que ele não era um terrorista”.
O Comissário também deve encontrar dificuldades em justificar sua decisão de ativar a Operação Kratos, o “procedimento padrão” secreto que autoriza os “peritos” da polícia a atirar na cabeça dos suspeitos de serem “homens-bomba”.
Essa política foi estabelecida por um comitê especial sobre terrorismo da Associação de Chefes de Polícia em 2003. Muitos dos Chefes, entretanto, estão preocupados com a base legal para tal política.
Blair continua a defender esse “procedimento padrão” em público, mas vários outros Chefes de Polícia se afastaram dessa política e diversas forças planejam jamais utilizá-la.
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O segundo artigo tem o seguinte título: Oficial da RAF enfrenta a prisão por ser contra a “Guerra Ilegal” (RAF officer faces jail over ‘illegal war’). Artigo de David Leppard. O início do artigo diz assim:

Um oficial da RAF pode ser preso por se recusar a servir no Iraque, porque ele acredita que a guerra lá foi ilegal.
O Flight-Lieutenant (Primeiro-Tenente) Malcolm Kendall-Smith deve ser submetido à Corte Marcial por “se recusar a cumprir uma ordem legal”, após dizer a seu Comandante que ele não iria para Basra.
Ele é o primeiro oficial britânico a enfrentar acusações criminais por desafiar a legalidade da guerra.
Kendall-Smith, 37, oficial médico da unidade da RAF de Kinloss em Morayshire, foi condecorado por sua atuação no apoio às operações militares no Afeganistão e por duas passagens prévias no Iraque.
Entretanto, após estudar os aspectos legais, inclusive a orientação do Lord Goldsmith, o Advogado-Geral, ele decidiu, este ano, que a guerra era ilegal e, portanto, seria errado que ele retornasse.
[…]
O principal argumento da defesa de Kendall-Smith vai ser o manual da RAF que declara que um oficial, em serviço, pode se recusar a obedecer a uma ordem, se esta for ilegal. Seus advogados também argumentam que sua comissão, concedida pela Rainha, o obriga a agir de acordo com “as regras e disciplina de guerra”.
[…]

O terceiro artigo é mais uma crítica aos costumes britânicos. Se intitula Densas núvens de hipocrisia induzida pelas drogas (Dense clouds of drug-induced hypocrisy). Artigo de Minette Marrin.

“Não conhecemos outro espetáculo tão ridículo”, diz uma citação famosa de Lord Macaulay, “quanto o público britânico em um de seus periódicos ataques de moralismo”. Parece que estamos no meio de um particularmente absurdo agora mesmo. Embora existam muitas questões de grande importância na vida pública em geral e mesmo algumas poucas na luta pela liderança entre os Conservadores, a obsessão da mídia é a tentativa de forçar David Cameron a fazer algum tipo de confissão sobre o uso de drogas. É ridículo e vergonhoso.
Cameron já disse o bastante sobre isso para satisfazer qualquer um com um devido interesse em seu passado e tanto quanto se podia esperar de qualquer figura pública, no entanto tem sido assediado por dias. Questionado, mais uma vez, no programa “Question Time” da BBC1, ele admitiu que, como muitas pessoas, ele fez coisas em sua juventude que não deveria ter feito.
“Eu me permito ter tido uma vida privada, antes de entrar para a política, na qual cometemos erros e fazemos coisas que não devíamos”, disse ele. E prosseguiu, fazendo uma distinção perfeitamente razoável entre sua vida, antes da política e suas atuais responsabilidades. Para qualquer pessoa com a mente não deturpada, isso deveria ser tudo. Fica bem claro o que ele quer dizer.
Insistir em querer que ele diga mais – e eu fico impressionada com a quantidade de pessoas que se dizem liberais e libertárias que reclamam, aos gritos, que ele deveria – é por si só desonestidade. De fato, o que estamos vendo não é tanto um ataque periódico de moralismo, quanto é um, mais comum ainda, ataque de periódico de hipocrisia.
[…]
O uso recreativo de drogas não é, em si próprio, uma matéria de moral. Isso sempre foi um dos maiores prazeres e grandes consolações da espécie humana, encontrado em todas as civilizações. Várias drogas “recreativas” são legais na Grã-Bretanha, a despeito de seus riscos reais.
[…]
Sempre me pareceu que aqueles que se viciam, são impelidos a isso por outros problemas – alguns por suas personalidades dependentes, outros pela pobreza de suas vidas ou expectativas. Uma das grandes injustiças dessa vida que as pessoas mais inclinadas a se meterem em sérios problemas com drogas, são aquelas que já estão com algum outro problema sério e que a lei não parece preocupada em protegê-los.
Por isso é que eu, há vários anos, venho sendo firmemente a favor de descriminalizar as drogas. Eu penso que, a despeito dos altos riscos envolvidos – possivelmente, para alguns – isso poria fim ao tráfico [ilegal] de drogas, ao vício-apoiando-o-crime, a drogas contaminadas e ao vasto império do mal do tráfico ilegal de narcóticos.
[…]

Comentando rapidamente essas três matérias (auto-explicativas, a meu ver…). A primeira, sobre o infame Chefe da Scotland Yard, mostra que em alguns lugares do mundo o comportamento criminoso das autoridades não acaba, necessariamente, em “pizza”. Mas também mostra que os “poderosos” são iguais, seja em Uganda, seja na Grã-Bretanha: querem todo o poder (inclusive o que a Lei não lhes confere) e não aceitam a responsabilidade por suas cagadas…
O segundo é uma outra faceta da mesma imbecilidade criminosa do governo britânico. O Tenente Kendall-Smith leva grandes chances de criar uma camisa de onze varas para o outro infame Blair. Mesmo que a Corte Marcial decida pela culpabilidade do Tenente, ele pode recorrer à Justiça Real e, como já foi dito, a posição do Advogado-Geral é de que a guerra do Iraque é ilegal, por ser baseada em mentiras comprovadas.
O terceiro, apesar de ser apenas um comentário sobre a disputa pela liderança do Partido Conservador, põe a nú toda a hipocrisia vitoriana dos britânicos e – já que eu estou falando nisso – de toda a subcultura WASP americana, na qual se apoia a camarilha do W. Bush.
Mas o mais importante é ver essas três matérias publicadas em uma mesma edição do The Sunday Times. É notável o quanto uma imprensa realmente independente pode esclarecer os cidadãos e mostrar que “o rei está nú”.
Bem diferente de um certo país da América do Sul, onde a imprensa que adora se fazer de “independente”, desavergonhadamente manipula a informação, para tentar conduzir a opinião pública na direção da “opinião que se publica”, com apelações ridículas e estatísticas distorcidas.
O caso Jean Charles de Menezes, parece estar caminhando para uma punição exemplar das “otoridades” da Scotland Yard. Já o caso Celso Daniel…

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