O milagre da ressurreição

Eu ia traduzir uma notícia do The Times intitulada “Death squad policemen ‘killed hundreds’ in revenge attacks” (Esquadrões da Morte de Policiais “mataram centenas” em ataques de vingança”), acerca dos supostos “inocentes” que a polícia matou quando o PCC lançou sua onda de terror em SP. Mas se um repórter inglês tem a cara-de-pau de falar de polícia assassina (ou já esqueceram Jean Charles de Menezes?), que mata inocentes por histeria, e um jornal que se pretende respeitável publica isto na primeira página da edição de domingo, isso só exibe bem o nível de burrice e provincianismo ao qual chegaram os britânicos. Quem quizer, leia o original: o link está aí em cima.
Prefiro o artigo do The Observer que trata de uma nova descoberta sobre células tronco. Lá vai:

Cientistas transformam células mortas em tecidos vivos
Descoberta pode significar novos tratamentos para os males de Alzheimer e Parkinson mas, em vez de diminuir a oposição, é mais provável que levante novos dilemas éticos
Antony Barnett e Robin McKie
Domingo 24 de setembro de 2006
The Observer
Cientistas que trabalham em um laboratório britânico conseguiram uma das realizações mais controversiais jamais obtidas no campo da ciência das células-tronco, tomando células de embriões mortos e transformando-as em tecidos vivos.
A técnica pode ser usada em breve para criar tratamentos para pacientes que sofrem de doenças tais como os males de Alzheimer e de Parkinson. dizem os pesquisadores. A realização foi saudada por vários cientistas e experts em ética, porque poderia desbordar a oposição às experiências com células-tronco.
«Isso deveria evitar a oposição às experiências com células-tronco porque não será mais necessário usar embriões vivos em todas as experiências», disse o Professor Miodrag Stojkovic, o pesquisador que realizou as experiências no Centro de Biologia de Células-Tronco na Universidade de Newcastle, no ano passado.
Mas outros experts avisaram na noite passada que o uso de células de embriões mortos pode levar a mais dilemas éticos, não menos. «Como saber se um embrião está morto?», disse Eric Meslin, diretor do Centro de Bio-ética da Universidade de Indiana.
Células-tronco extraídas de embriões são valorizadas pelos cientistas porque são capazes de se transformar em qualquer tipo de célula ou tecido no corpo. Ao menos elas poderiam ser usadas no tratamento de doenças cardíacas e diabetes e outras doenças, argumentam os pesquisadores.
Mas a tecnologia envolve a criação e a destruição de embriões vivos para a extração das células-tronco. Usualmente, esses embriões são criados em clínicas de fertilidade, quando casais recorrem a elas para fertilização in vitro.
Entretanto, o trabalho de Stojkovic sugere que o uso de embriões vivos pode ser evitado; em lugar disso, os cientistas odem usar aqueles dos embriões que morreram naturalmente, durante o processo de fertilização in vitro. Isso significaria, também, que muitos embriões a mais ficariam disponíveis para a pesquisa e o eventual tratamento das doenças, acelerando os avanços na ciência de ponta.
As experiências de Stojkovic foram realizadas quando ele esteve trabalhando para o Centro de Biologia de Células-Tronco em Newcastle, no ano passado. Em um paper, publicado na semana passada no website do jornal Stem Cells, Stojkovic revela que ele e seus colegas usaram 13 embriões, criados para fertilização in vitro. Todos os 13 pararam de se desenvolver poucos dias após a concepção. «Eles estavam em um estágio muito inicial de desenvolvimento», disse Stojkovic, atualmente chefe da Sintocell, um centro de pesquisas médicas na Sérvia.
A equipe esperou por 24 horas para verificar que os embriões não estavam mais se dividindo, antes de começar suas experiências. «Todos eles estavam destinados a serem embriões gorados», disse Sotjkovic. «Em outras palavras, eles estavam mortos. [Porém] eles tinham a capacidade de se desenvolver em qualquer tipo diferente de célula que você pensar, inclusive células de rim, de fígado e de pele».
«Eu acho que isso é um desenvolvimento muito importante, embora células-tronco criadas dessa forma, não devessem ser encaradas como uma alternativa às criadas a partir de embriôes vivos. Elas deveriam ser vistas como uma fonte alternativa».
Nesta última noite os militantes pelo “direito-à-vida” pediram cautela. «Em teoria, se um embrião for obtido eticamente e uma célula-tronco pode ser obtida após esse embrião ter morrido naturalmente, então isso removerá todas as objeções, porque não haverá a destruição de um organismo vivo», disse Josephine Quintavalle, da “Comentários sobre Ética Reprodutiva”, um grupo de ativistas católicos. «Nós não temos objeções ao uso de tecidos e órgãos doados em outras áreas da medicina».
Mas Quintavalle alertou que o caso para o uso de células de embriões mortos não foi provado. «A questão crítica é como se sabe se um embrião está morto ou não».
George Daley, do Instituto de Células-Tronco de Harvard, disse que a abordagem do paper levanta preocupações científicas. «Se havia algo errado com o embrião, que fez ele gorar, não haveria algo errado com essas células? Nós não sabemos».
Entretanto, o trabalho de Stojkovic recebeu forte apoio de Donald Landry, no Centro Médico da Univesidade de Colúmbia em Nova York, que o chamou de uma importante contribuição para o campo. «Não importa o como você se sinta quanto à “pessoalidade” de embriões, se o embrião estiver morto, a questão da “pessoalidade” está resolvida», disse Landry.
«Isto, então, reduz a ética da geração de células-tronco de embriões humanos à ética de – por exemplo- doação de órgãos. Então, agora você estará dizendo, na verdade: “Podemos retirar células vivas de embriões mortos da mesma forma que tiramos órgãos vivos de pacientes mortos?»

Eu vou acrescentar que mesmo a maioria dos embriões gerados para fertilização in vitromesmo aqueles que não morrem – acabam sendo “descartados”. Ou seja, morrem, sem que pessoa alguma se proveite disso, sem que uma “personalidade” venha a habitar aquele “corpo em perspectiva”.
Eu duvido e faço pouco de que histéricos defensores do “direito-à-vida” como essa tal Quintavalle pensem da mesma forma ao dar de cara com uma barata… Mas a gente sempre pode esperar o embrião apodrecer e não servir para mais nada, para aplacar os pruridos éticos de Quintavalle, Meslin, et al. Enquanto isso, os pacientes com Alzheimer e Parkinson esperam esses idiotas morram, junto com suas objeções (e, se existe Justiça Divina, de um desses males degenerativos…)
Da mesma forma que os vegetarianos se esquecem que plantas também são seres vivos. Mas a capacidade humana de ser hipócrita consigo mesmo parece inesgotável…

Discussão - 2 comentários

  1. Kynismós! disse:

    Apesar de defender seu ponto de vista, sua analogia final foi de muito mau gosto. Vegetarianos, digo vegetarianos mesmo, só se alimentariam do que as plantas descartam, tipo frutas maduras caídas, grão secos, etc., ou seja, não precisariam matar as plantas para se alimentar. No mundo capitalista em que nasci, não arranjei um meio de praticar o supracitado e não estou sendo hipócrita.

  2. João Carlos disse:

    Ooops... Nada pessoal. Mas - como você mesmo admite - existem "vegetarianos" e "vegetarianos". E - mesmo os ortodoxos, como você se proclama - não conseguem seguir plenamente suas convicções, por razões alheias a suas vontades.Você não está sendo hipócrita, concedo. Mas a grande maioria é... E um tipo particularmente nocivo de hipócrita: aquele que não se contenta em defender honestamente suas convicções, mas apresentam argumentos falaciosos, só para se gabar de "ser melhor do que os outros".

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